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Juros monetários nas demandas judiciais - a aplicação do artigo 406 do CC.

Não é incomum nos depararmos com sentenças condenatórias determinando que a parte vencida efetue o pagamento de condenação líquida, devidamente corrigida, acrescida de juros legais.

27/12/2013

Não é incomum nos depararmos com sentenças condenatórias determinando que a parte vencida efetue o pagamento de condenação líquida, devidamente corrigida, acrescida de juros legais.

Assim, com fundamento no caput do artigo 406 do CC, combinado com o parágrafo primeiro do artigo 161 do CTN, tornou-se corriqueira a aplicação de juros moratórios à razão de um por cento ao mês.

No entanto, importante ressaltar que o atual Código Civil não fixa os juros de mora em um por cento. Veja-se:

“Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional” (grifo nosso).

Portanto, ao contrário do Código Civil de 1916, que fixava os juros de mora em seis por cento ao ano, o atual Código Civil apenas determina que, caso as partes não tenham pactuado uma taxa de juros aplicável, deverá ser fixada a taxa que estiver em vigor para o pagamento de impostos da Fazenda Nacional.

Com a atenta leitura desses dispositivos, surge o questionamento quanto à taxa aplicável para os casos em que não tenha havido estipulação antecedente expressa.

Inúmeros julgados endossam a aplicação de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, sendo estes fixados pelo artigo 161, §1º, do Código Tributário Nacional, conforme verifica-se:

“[...] CONSOLIDAÇÃO DO MONTANTE DEVIDO Juros de mora Incidência a razão de 1% ao mês, a contar da citação Exegese do disposto no artigo 406, do Código Civil, e artigo 161, § 1º, do Código Tributário Nacional Atualização monetária Aplicação da Tabela Prática do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS Impugnação do quantum devido a título de verba honorária Incidência à razão de 10% sobre o valor da condenação Aplicação do disposto no artigo 20, §§ 3º e 4º, do Código de Processo Civil”1.

No entanto, o Código Tributário Nacional, expressamente, determina a aplicação da taxa de 1% (um por cento), apenas nos casos em que a lei não dispuser de modo diverso: “Art. 161. O crédito não integralmente pago no vencimento é acrescido de juros de mora, seja qual for o motivo determinante da falta, sem prejuízo da imposição das penalidades cabíveis e da aplicação de quaisquer medidas de garantia previstas nesta Lei ou em lei tributária. § 1º Se a lei não dispuser de modo diverso, os juros de mora são calculados à taxa de um por cento ao mês.” (grifo nosso)

Contudo, outra corrente jurisprudencial vem se estabelecendo, autorizando a aplicação da Taxa Selic, com fundamento nos artigos 13 da lei 9.065/95 e 39, §4º, da lei 9.250/95.

Isso porque as leis mencionadas são posteriores ao Código Tributário Nacional e fixam a taxa SELIC para cálculo de juros de títulos federais, como é o caso do artigo 13 da lei 9.065/95:

Art. 13. A partir de 1º de abril de 1995, os juros de que tratam a alínea c do parágrafo único do art. 14 da Lei nº 8.847, de 28 de janeiro de 1994, com a redação dada pelo art. 6º da Lei nº 8.850, de 28 de janeiro de 1994, e pelo art. 90 da Lei nº 8.981, de 1995, o art. 84, inciso I, e o art. 91, parágrafo único, alínea a.2, da Lei nº 8.981, de 1995, serão equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC para títulos federais, acumulada mensalmente. (grifos nossos)

Merece destaque, ainda, a lei 9.250/95, que trouxe alterações sobre a arrecadação do Imposto de Renda e reforça a aplicação da Taxa Selic para títulos federais, nos seguintes termos:

“§ 4º A partir de 1º de janeiro de 1996, a compensação ou restituição será acrescida de juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC para títulos federais, acumulada mensalmente, calculados a partir da data do pagamento indevido ou a maior até o mês anterior ao da compensação ou restituição e de 1% relativamente ao mês em que estiver sendo efetuada.” (grifo nosso)

Aliás, esse é o entendimento da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça:

"CIVIL. JUROS MORATÓRIOS. TAXA LEGAL. CÓDIGO CIVIL, ART. 406. APLICAÇÃO DA TAXA SELIC. 1. Segundo dispõe o art. 406 do Código Civil, "Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à Fazenda Nacional". 2. Assim, atualmente, a taxa dos juros moratórios a que se refere o referido dispositivo é a taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia - SELIC, por ser ela a que incide como juros moratórios dos tributos federais (arts. 13 da Lei 9.065/95, 84 da Lei 8.981/95, 39, § 4º, da Lei 9.250/95, 61, § 3º, da Lei 9.430/96 e 30 da Lei 10.522/02). 3. Embargos de divergência a que se dá provimento."2 (grifos nossos)

Tal entendimento da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça estabeleceu o posicionamento do STJ sobre o tema.

Por outro lado, ainda nos deparamos com julgados aplicando os juros de 1% ao mês, conforme recente decisão da 21ª Câmara de Direito Privado de São Paulo:

“CONTRATO BANCÁRIO - CAPITALIZAÇÃO DE JUROS - Legalidade - Prestações fixas - Conhecimento prévio do ágio bancário que descaracteriza ilícita capitalização para fins de usura – JUROS DE MORA - incidência no percentual de 1% ao mês, a teor do que prescreve o artigo 406 do Código Civil, combinado com o art. 161, § 1o do Código Tributário Nacional - Recurso provido em parte - Sentença reformada em parte. RESPONSABILIDADE CIVIL - Indenização por danos morais - Inclusão do nome do autor em banco de dados - Prejuízo de ordem moral não comprovado - Autor já possuía restrições quando do apontamento aqui discutido - Recurso provido em parte - Sentença reformada em parte”.3 (Grifos nossos)

Como se vê, o Código Civil é claro ao dispor que os juros moratórios deverão ser fixados com base na taxa em vigor para cálculo da mora de tributos devidos à Fazenda Nacional, qual seja, a taxa SELIC, conforme disposto por leis especiais posteriores ao Código Tributário Nacional.

A análise do artigo 406 do Código Civil mostra preocupação do legislador pela aplicação de uma taxa variável para os juros de mora, evitando que a norma confronte com a realidade econômica. Essa também é a razão fundamental pela qual o legislador buscou na mora dos tributos devidos à Fazenda Nacional a taxa aplicável ora em exame, demonstrando uma clara intenção de adequar a execução dos julgados à realidade econômica do País.

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1 Embargos de Declaração nº 0000388-64.2009.8.26.0590 – Des. Rel. Fermino Magnani Filho – 5ª Câmara de Direito Público – TJSP – DJ. 30.9.2013

2 Embargos de Divergência em Resp nº 727.842-SP – Rel. Min. Teori Albino Zavascki – Corte Especial – STJ – DJ. 8.9.2008

3 Apelação nº 0006429-04.2012.8.26.0344 – Rel. Des. Ademir Benedito – 21ª Câmara de Direito Privado – TJSP – DJ. 22.4.2013

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O presente trabalho não representa necessariamente a opinião do Escritório, servindo apenas de base para debate entre os estudiosos da matéria. Todos os direitos reservados”.

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* Gilberto Canhadas Filho é advogado de Trigueiro Fontes Advogados.

* André Tan Oh é advogado de Trigueiro Fontes Advogados.

 

 

 



 

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