Migalhas de Peso

Insultos

Há toda uma parafernália oficial para tomar teu dinheiro com multas, mas não te incomodas. Avanças os sinais vermelhos, ultrapassas as velocidades permitidas, não respeitas as faixas exclusivas dos pedestres.

27/9/2013

Só porque dominando esta máquina, podendo levar teu carro para onde queres e do jeito que entendes, tu te achas no direito de não respeitar o direito do outro de atravessar a pista sem sobressaltos ou de caminhar por alguma calçada ou meio fio com um mínimo de segurança?

Há toda uma parafernália oficial para tomar teu dinheiro com multas, mas não te incomodas. Avanças os sinais vermelhos, ultrapassas as velocidades permitidas, não respeitas as faixas exclusivas dos pedestres.

Em letras enormes está escrito pare, mas não paras. É como se não existisse. Como se o pedestre fosse um ninguém. Não fosse um ser humano num tempo de leis severas a protegerem a flora e também a todo tipo de animal. Inclusive tu, assassino em estado latente, que tens a teu favor o direito a ampla defesa e até com embargos infringentes.

Sabes que não só corres risco como também ameaças outras vidas além da tua com essa transgressão sistemática de segurares o volante com uma mão ocupando a outra com o telefone celular colado ao ouvido. Sabes do perigo, mas não estás nem aí para a lei, nem para ninguém.

O motor do carro é a extensão da tua potência e necessitas com certeza te exibir já não bastando a velocidade desmedida. Precisas te mostrar também chamando a atenção do mundo com a descarga barulhenta.

De onde retiras tantas frustrações para acumulando-as em ansiedades tão promiscuas buscares nas ameaças que causas às vidas dos outros as endorfinas que te esperam?

Ao te considerarem habilitado para dirigires um carro certamente que as autoridades ao te liberarem não tiveram como te avaliar psicologicamente com exatidão e daí não puderam dar conta do assassino, do monstro em forma de frasco humano, do óleo de rícino que ocupa o espaço que seria o da tua alma, dessas deformidades todas que resultam no que és.

Tens pai? Dirás num rompante – nem mãe. É possível que nem tenhas nascido e que sejas nem mesmo o resultado de algum amor sem começo, um refugo da talidomida, um fiapo da prova plástica de um resquício de encontro que não deu certo.

Se tu tens pai e mãe ou se algum dia os teve, não aprendestes nada sobre o amor à vida, sobre o respeito aos direitos dos outros, sobre a importância de se viver em paz. Se tu achas que tens família, filhos, amigos, mentes para ti mesmo toda vez em que liberas tua porção mais irresponsável e dirigindo um carro te assumes no trânsito como o monstro perigoso, assassino em potencial, furando os sinais vermelhos, ignorando as faixas privativas dos pedestres, tirando fino nos motociclistas, nos ciclistas, nas calçadas.

Nós, tuas vitimas de todo instante, estamos nos organizando para campanhas as mais agressivas buscando te resgatar, oh infeliz, para a direção civilizada no trânsito. Se te achas em verdade um filho de Deus, ainda tens jeito.

Se ninguém te motivar e nem lei alguma te alcançar em boas novas para te resgatar de dentro de ti a tua condição de ser humano, te restará a vida – mãe e mestra das mais inesquecíveis lições.

____________

* Edson Vidigal é ex-presidente do STJ e professor de Direito na UFMA

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