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Tutela antecipada no projeto do CPC

"Fica claro que o texto processual teve em vista situar a tutela cautelar em contraponto com a satisfativa, dando por certo que aquela não tem por escopo esgotar por completo a jurisdição, mas apenas assegurar o resultado útil do processo, ao contrário desta", afirma a autora.

14/8/2013

O capítulo que trata da tutela antecipada no projeto do CPC foi um dos que recebeu grandes modificações.

O art. 295 do projeto indica que "a tutela antecipada pode: I. ser satisfativa ou cautelar". Portanto, a partir desse texto, a tutela antecipada passou a gênero, do qual as tutelas satisfativa e cautelar são espécies.

Da forma como colocado, fica claro que o texto processual teve em vista situar a tutela cautelar em contraponto com a satisfativa, dando por certo que aquela não tem por escopo esgotar por completo a jurisdição, mas apenas assegurar o resultado útil do processo, ao contrário desta.

Assim colocado, finalmente recebeu o tema um tratamento sistemático e tecnicamente adequado, podendo com isso evitar o uso (que se verifica inclusive no STJ) da indevidamente denominada "cautelar satisfativa", que na verdade, está a considerar como cautelar ação que não tem essa categoria, posto que refoge de modo completo à sua teleologia, ou seja, embora denominadas cautelares tais ações e no diploma anterior algumas delas tenham sido inclusive topologicamente plantadas no capítulo destinado às cautelares, são de natureza diversa, verdadeiro processo cognitivo, a ponto de delas ser dispensada a providência de indicação da lide e seu fundamento e da propositura da ação principal, o que apenas se justifica diante da inexistência, àquele tempo, da tutela antecipada que veio a ser consagrada em reforma processual posterior.

A tutela antecipada pode ser concedida nos procedimentos especiais, independente dos requisitos específicos e desde que presentes os indicativos dos arts. 295 e seguintes deste capítulo do projeto.

Com isso, maior rigor foi imprimido ao princípio da adstrição (que restringe a decisão aos limites da causa de pedir e do pedido) nos casos de tutela antecipada satisfativa e de tutela antecipada cautelar. No primeiro caso (tutela antecipada), encontra-se o juiz absolutamente vinculado, não podendo, de modo algum, antecipar mais ou diferente do que está descrito na inicial; no segundo (cautelar), por se tratar de cautela, que pode inclusive ser concedida ex officio, pode o juiz tomar todas as medidas que julgar necessárias a evitar o perecimento do direito.

Nesse tema, evoluiu de modo favorável o novo texto, dando tratamento adequado aos institutos da tutela satisfativa e cautelar, de acordo com o conceito legal.

Consagrando esse novo tratamento classificativo, o art. 307, parágrafo único do projeto previu regra de fungibilidade procedimental genérica, de sorte que, requerida como medida cautelar, mas tendo caráter satisfativo, o rito deixa de atender a esse dispositivo, para automaticamente submeter-se àquele previsto para as tutelas satisfativas.

A regra inversa tem aqui plena aplicabilidade, ou seja, requerida como tutela satisfativa a cautelar, aquela será recebida como esta, sujeitando-se ao rito apropriado e previsto nos arts. 307 e seguintes do projeto, uma vez que não mais pairam os problemas de inadaptabilidade de procedimento, ausente no projeto o óbice constituído com a contemplação de medidas típicas, que têm requisitos específicos, além de prever o referido dispositivo o câmbio de procedimentos nesse caso.

O novo texto não deixa clara essa opção, dando margem à renovação do debate doutrinário e jurisprudencial, mas, tendo em conta o teor dessas discussões que foram travadas sob a égide do ordenamento atual, resulta conhecido o desfecho no sentido de se admitir a denominada fungibilidade de mão dupla.

Também não mais vigora a respeito à vedação de fungibilidade pela aferição da intensidade do direito reclamado, antes considerado de menor grau o exigido para as tutelas cautelares e de maior semelhança (a denominada verossimilhança) para as tutelas agora denominadas satisfativas, uma vez que o art. 301 do projeto generalizou tais requisitos para ambas as situações, dispondo que, nas duas hipóteses, será aferida a probabilidade do direito e o perigo na demora, sendo mais correto mencionar que, nos casos de tutela cautelar, essa probabilidade será aferida em relação ao risco do direito e não a este em si.

A toda evidência que a aplicação do dispositivo não carece da avaliação dos requisitos apropriados a cada medida, para ser reconhecida a fungibilidade e deferida a antecipação.

A tutela antecipada de urgência, nos termos do art. 301 do projeto, será concedida quando presentes a probabilidade do direito e o perigo na demora da prestação jurisdicional, de forma que restou unificado o sistema de requisitos de concessão das tutelas antecipadas, satisfativas ou cautelares, tornando inócua a discussão acerca do maior ou menor grau de intensidade do direito, quando diante de tutela satisfativa ou cautelar.

Isso porque, no dicionário, verossímil será tudo o que tem aparência de verdade e provável, aquilo que tem aspecto de verdade, o que coloca as expressões como praticamente sinônimas, como sempre foram.

Não significa dizer, portanto, que tenha sido reduzida essa mesma aferição, ao trocar o vocábulo verossimilhança por probabilidade, mas apenas que, como sempre, a prova pré-constituída oferecida ao juízo deverá ser convincente o suficiente do direito e da situação de risco, para ordenar a sua imediata execução, em desfavor da situação contrária.

O projeto ainda contempla a reversibilidade como requisito da tutela antecipada, de todo modo, consoante vasta jurisprudência do STJ, esse mesmo dispositivo do atual CPC vem sendo constantemente mitigado em favor do cotejo de valores em questão, ou seja, presente irreversibilidade para ambas as partes, deverá ser aferida a de maior impacto.

Poderia, para evitar a renovação do debate, ter disciplinado a conduta no caso de confronto de irreversibilidades, contemplando exceção à regra da impossibilidade de concessão nesses casos.

Ainda, o projeto sujeitou a tutela antecipada às normas referentes ao cumprimento de sentença (art, 298, único), de sorte que poderá ser exigida caução real ou fidejussória, bem como qualquer outro tipo de contracautela, já que o artigo 298, caput, do projeto, admite a adoção de todas as medidas que o juiz considerar adequadas, a título de contracautela, tendo decidido o STJ, ainda no sistema anterior, que "(..)a revogação do art. 588 do CPC, pela lei 11.232/05, não leva à perda de eficácia da remissão feita a ele pelo art. 273, §3º do CPC. A revogação desse dispositivo foi meramente formal, já que a regra nele contida, do ponto de vista substancial, continua presente no art. 475-O do código, com redação quase idêntica. Assim, a interpretação teleológica do CPC recomenda que remissão feita a um dispositivo, seja lida como se indicasse o outro. Não há incompatibilidade entre o procedimento da antecipação de efeitos da tutela, e a exigência de caução. Apesar de o art. 475-O mencionar, apenas, a execução provisória do julgado, sua proteção deve ser estendida, 'no que couber', aos provimentos antecipatórios."

Há ainda a exigência expressa de fundamentação da decisão acerca da tutela antecipada, que, a rigor, nem seria necessária, ante o disposto no art. 93, X da CF. Ocorre que o art. 299 do projeto manteve, ao especificar a necessidade de justificação, de modo claro e preciso, das razões do convencimento judicial, impedindo que sejam proferidas decisões, como costumeiramente se verifica, onde há apenas superficial alusão à presença dos requisitos legais, sem o indispensável confronto entre estes e a realidade fática trazida com a inicial, a ponto de o relato do autor, acompanhado das razões judiciais, coincidir com as condições exigidas pela norma.

Assim se verifica no atual ordenamento, sem que, contudo, tenha sido modificada a conduta judicial, no sentido de evitar decisões genéricas e comprometedoras da ampla defesa. De toda sorte, uma vez demonstrado que a generalização coloca em risco essa garantia constitucional, cabível o inconformismo.

A concessão de tutela antecipada contra a Fazenda Pública agora vem regrada também no texto do projeto, art. 1.069, segundo o qual se aplica à tutela antecipada (satisfativa ou cautelar) o disposto nos arts. 1º, 2º, 3º e 4º da lei 8.437/92, bem como o disposto no § 2º do art. 7º da lei 12.016/09.

O projeto revigora, portanto, a regra de vigência da lei 8.437/92, mantendo incabível a concessão de medida liminar toda vez que a mesma providência não puder ser concedida em ações de mandado de segurança (art. 1º). Mantém-se também a vedação de medida liminar satisfativa, assim considerada a que esgote, total ou parcialmente, o objeto da ação (parágrafo 3º). O parágrafo 5º do mesmo artigo prevê ainda que "não será cabível medida liminar que defira compensação de créditos tributários ou previdenciários."

Também não será competente o juízo de 1º grau para a concessão de medida liminar nos casos de competência originária de tribunal, exceto nos casos de ação popular ou ação civil pública (parágrafos 1º e 2º do art. 1º).

Será cabível a medida liminar contra a Fazenda Pública no mandado de segurança e na ação civil pública e nesses casos, será necessária a intimação do representante judicial do órgão ou entidade, para manifestação no prazo de 72 horas (art. 2º da lei 8.437/92).

Vigente a mesma sistemática do modelo atual, há que ser considerada como atual a jurisprudência existente a respeito, no STJ, que admite a tutela antecipada contra a Fazenda Pública em matéria previdenciária em atendimento à súmula 729 do STF, segundo a qual "a decisão na ação direta de constitucionalidade 4 não se aplica à antecipação de tutela em causa de natureza previdenciária", reafirmando que não cabe emprestar ao parágrafo 3º do artigo 1º da lei 8.437/92 exegese estranha a esse sistema, que trata apenas de vencimentos e vantagens de servidores, conferindo-lhe em decorrência, autonomia normativa a fazê-lo incidir sobre cautelar ou antecipação de tutela de qualquer matéria.

A jurisprudência admite, portanto, a antecipação de tutela em desfavor da Fazenda Pública, desde que a situação não esteja inserida nas hipóteses do art. 1º da lei 9.494/97, que são as que versem sobre reclassificação, equiparação, concessão de aumento ou extensão de vantagens de servidores públicos.

Apesar do novo sistema de eficácia, foi expressamente mantido o disposto no art. 3º da lei 8.437/92, ao dispor que "O recurso voluntário ou ex officio, interposto contra sentença em processo cautelar, proferida contra pessoa jurídica de direito público ou seus agentes, que importe em outorga ou adição de vencimentos ou de reclassificação funcional, terá efeito suspensivo", revelando exceção legal.

Foi reafirmada a possibilidade da suspensão de segurança prevista no art. 4º, a propósito de "(..) execução da liminar nas ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes, a requerimento do Ministério Público ou da pessoa jurídica de direito público interessada, em caso de manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas", aplicável à sentença proferida em processo de ação cautelar inominada, no processo de ação popular e na ação civil pública, enquanto não transitada em julgado.

Nesses casos, poderá ser ouvido o autor e o MP, em setenta e duas horas e, do despacho que conceder ou negar a suspensão caberá agravo, no prazo de cinco dias, ainda que esse recurso não mais esteja contemplado na atual sistemática processual, que somente o contempla sob a forma de instrumento.

Mantida ou restabelecida a decisão que se pretende suspender, será cabível novo pedido de suspensão ao presidente do Tribunal competente para conhecimento do recurso especial ou extraordinário.

Mantendo o sistema atual, o projeto prevê, apenas para as tutelas antecipadas cautelares a possibilidade de concessão ex officio e somente em casos excepcionais ou expressamente autorizados por lei, fundado no poder geral de cautela do juiz (art. 302), devendo, nos casos de tutela satisfativa, haver requerimento expresso (art. 301), certo que a doutrina já anuía com essa condição, porque a tutela antecipada não se destina a dar apoio ao processo e ao exercício da jurisdição, mas apenas em favor de uma das partes.

Tem entendido a doutrina que o preceito não entra em rota de colisão com a indisponibilidade do direito, posto que a cautelar, agora ainda mais, tem lugar apenas para a cobertura dos riscos do processo, revelando-se interesse de ordem pública e sendo dessa natureza todos aqueles que convergem para o processo civil, como ocorre, por exemplo, nos casos do artigo 315 do projeto, onde será facultado ao juiz ordenar atos urgentes durante o período de suspensão do processo.

Bom destacar que, agora com maior ênfase, face ao disposto no art. 299 do projeto, deverá o juiz fundamentar de modo adequado a decisão, explicitando os aspectos para os quais considera tenha concorrido essa antecipação, em especial a excepcionalidade, quando tratar-se de situação não contemplada expressamente por lei.

Quanto ao tema do cumprimento das obrigações da fazer oportuno mencionar que o art. 550 do projeto, segundo o qual, "para cumprimento da sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de fazer ou de não fazer, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento, para a efetivação da tutela específica ou a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente, determinar as medidas necessárias à satisfação do exequente" e o art. 551 admite que "a multa periódica independe de pedido da parte e poderá ser concedida na fase de conhecimento, em tutela antecipada ou sentença, ou na execução em, desde que seja suficiente e compatível com a obrigação e que se determine prazo razoável para o cumprimento do preceito".

O cumprimento da obrigação de pagar também no projeto não comporta tutela antecipada, não só por falta de previsão legal, como porque tem regramento próprio, diverso daquele destinado às obrigações de fazer, não fazer e dar, tendo decidido o STJ que "(..)o pronto pagamento da indenização pretendida pelos recorrentes não pode ser efetuado pela Administração, pois há um procedimento constitucional para o adimplemento das obrigações de pagar decorrentes de sentença judicial (artigo 100 da CF)."

A tutela antecipada – satisfativa ou cautelar – conserva sua eficácia na pendência do processo, mas pode, a qualquer tempo, ser revogada ou modificada, em decisão fundamentada, dispõe o art. 297 do projeto e, nos termos do parágrafo único do mesmo dispositivo, conservará a eficácia durante o período de suspensão do processo.

Com isso, a interposição de recurso recebido em qualquer efeito, não terá o condão de retirar a eficácia natural da tutela antecipada, satisfativa ou cautelar1, dependendo de revogação expressa.

A doutrina ainda reforça o argumento, sob a inconveniência de conferir instabilidade a essa antecipação, uma vez concedida, tendo em conta que eventual resultado do recurso implicará, de modo automático, nessa reversão.

Ocorre que esse raciocínio aplica-se apenas quando procedente a demanda, tendo o STJ decidido que "(..) a improcedência da demanda implica a revogação da medida antecipatória com eficácia imediata e ex tunc. Já vinha sendo aplicada no processo de conhecimento, por analogia, o enunciado da súmula 405/STF, de seguinte teor:" denegado o mandado de segurança pela sentença, ou no julgamento do agravo, dela interposto, fica sem efeito a liminar concedida, retroagindo os efeitos da decisão contrária" e perdeu o legislador a oportunidade de regulamentar essa condição.

Essa exegese revela-se correta, na medida em que a improcedência do pedido, uma vez reconhecida, retira importante fundamento da medida antes concedida, qual seja, o da probabilidade do direito, sem o qual, não pode prevalecer.

Pode ainda ser concedida a tutela de urgência em grau de recurso, sob os mesmos fundamentos da antecipação de tutela inicial ou durante o curso do processo, conforme previsto no art. 300, parágrafo único do projeto, sendo nesse caso competente o órgão designado para julgar o mérito recursal, sendo incumbência do relator, nos termos do art. 945, II do mesmo projeto, apreciar o pedido de tutela antecipada nos recursos, e, nos termos do art. 1.032, em cinco dias, (inciso I) poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão.

Sendo certo que o art. 1048 do projeto prevê que "os recursos, salvo disposição legal ou decisão judicial em sentido diverso, não impedem a eficácia da decisão" e o parágrafo único dispõe que "A eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por decisão do relator, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano gravo, de difícil ou impossível reparação e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso", inexiste no sistema projetado qualquer diferenciação, sendo aplicável esse método a todo e qualquer recurso, o que retira de foco a possibilidade de interposição do mandado de segurança para essa mesma finalidade, pois esse remédio somente era prescrito para as hipóteses de omissão legislativa.

Também a medida cautelar, frequentemente utilizada para conferir efeito suspensivo a recursos, com a redação dada ao art. 300, parágrafo único do projeto, perde a utilidade, pois, de acordo com esse dispositivo, poderá ser requerida tutela antecipada de modo autônomo, desde que dirigida ao órgão competente para o exame do mérito recursal, revelando-se despicienda a providência pela via cautelar, frequentemente utilizada quando ainda não esgotada a admissibilidade do recurso.

O art. 298, parágrafo único do projeto, a exemplo do texto atual, manteve o termo efetivação e não execução, da tutela antecipada, ao relacionar a sua consecução às regras do cumprimento provisório de sentença.

A doutrina consagra essa técnica, por considerar que execução é providência ligada à execução forçada das obrigações de pagar e efetivação compreende as formas de execução indireta e imprópria, mediante executoriedade imediata ou expedição de ordem, sendo que, a utilização desse termo traduz a inexigibilidade de título executivo líquido e certo, sendo portanto inaplicável o principio nulla executio sine titulo e o procedimento previsto para a defesa do executado, exceto na via recursal.

A técnica de antecipação de tutela condenatória, nada mais representa do que a antecipação dessa própria execução, mas sob a forma procedimental de efetivação, como vem acentuando a doutrina. Na sede declaratória e constitutiva, ainda paira resistência doutrinária, sendo certo que tem sido admitida, ainda nesses casos, a cura dos efeitos marginais do processo, que para alguns tem sido considerada antecipação dos efeitos da tutela satisfativa e, mais correto, apenas a garantia do resultado útil do processo, portanto, com natureza cautelar.

Releva notar ainda a respeito que o art. 9º do projeto dispõe que "não se proferirá sentença ou decisão contra uma das partes sem que esta seja previamente ouvida, salvo nos casos de tutela antecipada de evidência previstos no parágrafo único do art. 306 e nos de tutela antecipada de urgência", restando claro que o atual sistema consagra, em sede de tutela antecipada satisfativa ou cautelar, o contraditório diferido.

Andou mal o projeto ao manter esse sistema, pois a concessão de tutela antecipada inaudita altera pars somente se justifica nos casos em que, ouvida a parte contrária, esta puder frustrar a efetivação da medida; nos demais casos, salutar a oitiva da parte contrária, ainda que mediante curtíssimo prazo para manifestação, pois pode trazer subsídios importantes à melhor análise da antecipatória, que pode ser grave para o desfavorecido e representar comprometimento da garantia constitucional da ampla defesa, já que o contraditório exercido a posteriori nem sempre se revela suficiente e adequado.

O art. 298 do projeto prevê que o juiz poderá determinar as medidas que julgar adequadas para a efetivação da tutela antecipada. Esse dispositivo acompanha a atual sistemática processual, antes inaugurada na sede das obrigações de dar, fazer e não fazer, estas também objeto da tutela antecipada, que confere ao juiz poderes para atuar a decisão, sendo de há muito aplicadas ao antigo art. 273 do CPC em vigor, que cuida da antecipação de tutela, as disposições do art. 461 do CPC, por serem consideradas figuras do mesmo microssistema de tutelas, e sendo cambiáveis tais moldes, como no caso de imposição das astreintes, aplicando-se integralmente, portanto, o regime dos arts. <_st13a_metricconverter productid="830 a" w:st="on">830 a 839 do projeto.

Também convém registrar que fica vedado ao jurisdicionado criar embaraços à efetivação da tutela antecipada (art. 77, inciso IV do projeto), configurando ato atentatório ao exercício da jurisdição (parágrafo 1º), devendo o juiz aplicar ao responsável multa fixada de acordo com a gravidade da conduta e não superior a vinte por cento do valor da causa, sem prejuízo das sanções criminais, civis e processuais cabíveis (parágrafo 2º), sendo essa penalidade diversa da consequência indenizatória e, portanto, cumuláveis.

No caso da tutela antecipada satisfativa, a efetivação seguirá o rito previsto para o cumprimento provisório de sentença, onde, da mesma forma, está prevista a reparação dos danos causados pela execução antecipada, nos mesmos autos (art. 534, incisos I a IV do projeto), sujeito à iniciativa da parte, além da exigência de caução em casos específicos, carregados dos efeitos da irreversibilidade. Aplica-se ainda à exigência de caução as hipóteses de dispensa previstas no art. 535, incisos I a III e parágrafos 1º e 2º, certo que a doutrina já vinha defendendo, na vigência do sistema atual, que a reparação do dano (via caução ou qualquer espécie de contracautela) viria a preencher o requisito da reversibilidade.

Bom destacar que, embora o art. 298 do projeto remeta, no que couber, às regras do cumprimento provisório de sentença, no que se refere à exigência de caução não está sujeita às limitações do art. 534, IV do projeto (que exige caução apenas para: (i) o levantamento de depósito em dinheiro, (ii) a prática de atos que importem transferência de posse ou alienação de propriedade ou de outro direito real, ou dos quais possa resultar grave dano ao executado), porque há disposição especifica no art. 301, parágrafo 1º do projeto, segundo o qual "para concessão da tutela de urgência, o juiz poderá, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que o réu possa vir a sofrer, ressalvada a impossibilidade da parte economicamente hipossuficiente", deixando claro que, em qualquer situação antecipatória (e não apenas naquelas do art. 534,IV do projeto), será cabível a exigência, visando prevenir a reparação do dano.

De todo modo, o parágrafo 3º do art. 301 do projeto prevê expressamente que a tutela antecipada não será concedida se houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão, ao menos em regra, ou seja, quando suas consequências forem irreversíveis, apenas mencionando, agora com maior correção, alusão a efeitos e não à tutela, como aliás já vinha alertando a jurisprudência, ao mencionar que "(..) o Código de Processo Civil alude à irreversibilidade, ele se refere aos efeitos da tutela antecipada, não ao provimento final em si, pois o objeto de antecipação não é o próprio provimento jurisdicional, mas os efeitos desse provimento".

E, estando presente essa condição desde o direito anterior, receberá da jurisprudência a mesma interpretação, ou seja, de que, havendo confronto de irreversibilidades, prevalece a de maior importância, ou "quando o mal irreversível for maior", ou ainda, que "o perigo da irreversibilidade, como circunstância impeditiva da antecipação dos efeitos da tutela, deve ser entendido cum grano salis, pois, não sendo assim, enquanto não ultrapassado o prazo legal para o exercício da ação rescisória, não poderia nenhuma sentença ser executada de forma definitiva, dada a impossibilidade de sua desconstituição, aplicando-se, na letra da doutrina, o princípio da proporcionalidade.

Essa condição não tem aplicabilidade no campo da tutela de evidência, não apenas porque topologicamente inserido no capítulo das tutelas de urgência, como porque de natureza diversa, já que a exacerbação do grau de probabilidade diminui ou praticamente anula a possibilidade de irreversibilidade, porque, como considera a jurisprudência, “é sob a ótica de probabilidade de êxito do autor quanto ao provimento jurisdicional definitivo que o julgador deve conceder ou não a antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional".

A efetivação da tutela antecipada correrá por responsabilidade do exequente, com caráter objetivo (art. 304, parágrafo 2º, do projeto), tendo em vista o efeito ex tunc da revogação da liminar, conforme jurisprudência que também admite a modulação desse efeito, para adaptação à realidade fática instaurada, ou ainda, deixa de aplicar o mesmo princípio, quando envolvidos direitos fundamentais, como o direito à saúde, à vida, etc.

A jurisprudência tem admitido também nesses casos de antecipação de tutela satisfativa, como objetiva a responsabilidade do exequente, pelo simples fato da sucumbência e sem indagação de culpa, tendo o STJ decidido que "(..) a obrigação de indenizar o dano causado ao adversário, pela execução de tutela antecipada posteriormente revogada, é consequência natural da improcedência do pedido, decorrência ex lege da sentença e da inexistência do direito anteriormente acautelado", mas não foram estendidas às demais hipóteses, previstas na cautelar, para o rol das situações sujeitas à indenizabilidade, sendo fato que caso será de reparação apenas quando ao final negado o direito, pois não está prevista a cessação da eficácia da medida em outras circunstâncias, como no caso de não efetivação da liminar ou da citação.

A jurisprudência não admite ainda a utilização dessa via pelo terceiro prejudicado pela efetivação da medida liminar, ou seja, não tem ele direito de ingresso nos autos para liquidação de danos, sendo o direito, todavia, exercitável em ação autônoma.

No caso da cautelar, aplica-se o disposto no art. 304 do projeto, de acordo com o qual o autor responde ao réu pelo prejuízo que lhe causar a efetivação da tutela antecipada cautelar, se (I) a sentença lhe for desfavorável (definitiva ou terminativa e em qualquer grau de jurisdição); (II) obtida liminarmente em caráter antecedente, não fornecer os meios necessários para a citação do requerido dentro de 5 dias; (III) ocorrer a cessação da eficácia da medida em qualquer dos casos legais; (IV) o juiz acolher a alegação de decadência ou de prescrição, tudo sem prejuízo da apuração de dano processual, de natureza diversa.

Ou seja, nos casos dos incisos I, e IV, corre a responsabilidade pelo simples fato da sucumbência e, nos casos dos incisos II e III, pela caducidade da medida ou cessação de sua eficácia (falta de propositura da ação principal; falta de efetivação da liminar no prazo legal), sendo que nestas, tratando-se de conduta omissiva (descumprimento do dever legal de agir), tem caráter de ilícito (rectius culpa), que deve ser avaliada, conforme entendimento doutrinário, exceto no caso do art. 311,inciso III do projeto, onde mais uma vez faz referência ao fato da sucumbência, com ou sem resolução de mérito, sendo neste caso hipótese de responsabilidade objetiva, ou seja, sem apuração de culpa.

E, havendo reconhecimento da prescrição ou da decadência, por força do dispositivo legal, será devida a indenização ainda que, mesmo podendo, não tenha o juiz decretado de oficio tais impeditivos.

Em se tratando de cautelar antecedente, há na doutrina debate sobre a decisão na qual será aferida a sucumbência a que se refere, havendo divergência doutrinária a respeito, mas sendo orientação jurisprudencial a aferição na sentença da ação principal, certo que, não raro, têm sido emitidas as decisões da cautelar e da ação principal em um único ato.

Assim, ocorrida qualquer dessas situações, cujo rol apresenta-se taxativo, será apurada, pela via da liquidação e nos mesmos autos, o dano causado pela antecipação da cautela, fixando-se o valor reparatório, sendo certo que se faz necessário o prévio título judicial, sendo por isso requisito o reconhecimento do evento na sentença, caso contrário, apenas por ação autônoma será possível o debate acerca do direito indenizatório.

Convém salientar, embora matéria atinente ao direito material, mas intrinsecamente ligada a este terreno, que o atual CC (art. 186) prevê o ilícito de dano, de sorte que apenas nos casos de dano efetivo a ser apurado em liquidação, poderá ser determinada a ressarcibilidade, sendo de todo inviável a reparação nos casos de liquidação negativa.

Destaque-se que, nos moldes da jurisprudência, ainda quando concedida ex officio, a tutela antecipada cautelar será objeto de responsabilidade pelo beneficiário da medida e não pelo Estado-Juiz, uma vez que o projeto, art. 303, contém disposição expressa a respeito, não fazendo distinção para os casos de requerimento da parte ou concessão de ofício.

O projeto prevê no art. 1.022, que não comportando agravo de instrumento por indicação legal expressa, as questões deverão ser suscitadas apenas no recurso de apelação.

Os arts. 299, parágrafo único e 1.028, inciso I do projeto, preveem expressamente o cabimento do recurso de agravo de instrumento a propósito da decisão que conceder, negar ou revogar a tutela antecipada, certamente por estar intrínseco em tais atos a incompatibilidade com a espera do resultado do recurso cabível para as decisões definitivas.

Caso concedida, revogada ou negada a medida liminar de antecipação de tutela, de qualquer natureza, apenas na sentença, o ato será impugnável no recurso de apelação, nos termos do art. 1.025 do projeto.

E, consoante o parágrafo 2º, inciso V, do mesmo art. 1.025, começa a produzir efeitos imediatamente após a sua publicação, a sentença que confirma, concede ou revoga a tutela antecipada.

O projeto admite a concessão de tutela antecipada satisfativa ou cautelar em caráter antecedente ou incidental (art. 295,II).

O rito a ser adotado, no primeiro caso, será o previsto no art. 304, caput, parágrafo 1º, incisos I e II e parágrafos 2º a 6º do projeto .

De acordo com o art. 304, caput do projeto, poderá o autor da demanda requerer, em face da urgência, tão-somente a antecipação da tutela satisfativa, indicando o pedido de tutela final e a exposição sumária da lide, além da demonstração do perigo na demora da prestação da tutela jurisdicional, bem como o valor da causa (304,II,parágrafo 4º).

Concedida a tutela antecipada satisfativa, será aditada a inicial, sem novas custas e nos mesmos autos (304, II, parágrafo 3º) com o acréscimo de fatos e argumentos necessários, juntada de novos documentos e ratificação do pleito, no prazo de 15 dias ou em outro prazo que o juiz considerar suficiente ao caso (304,I). Negada a antecipação, será o autor intimado a emendar a inicial em 5 dias, pena de extinção sem resolução de mérito (304,II, parágrafo 6º do projeto).

Bom anotar que o dispositivo indica o termo "novos documentos" e não "documentos novos", o que significa dizer que podem ser eles existentes ao tempo do pleito inicial, embora não juntados desde logo.

Ainda a respeito, o juiz poderá conceder prazo superior ou inferior ao de 15 dias, conforme entenda suficiente ao caso, sempre de modo fundamentado.

A citação do réu será expedida imediatamente ao pedido inicial, mas o prazo de defesa somente terá curso a partir da intimação do aditamento (304, parágrafo 1º II, do projeto) e também o do recurso a propósito da decisão antecipatória, já que somente após o aditamento tem o réu pleno conhecimento da causa e entendimento diverso levaria ao comprometimento do contraditório e da ampla defesa, assegurados constitucionalmente.

Da lei consta "intimação", de sorte que o ato segue as regras dos arts. 274 e 275 do projeto, segundo os quais, não havendo disposição em contrário, serão feitas as intimações pelo correio ou pela via eletrônica e por oficial de Justiça, se frustradas as tentativas anteriores.

Não feito o aditamento a que se refere à lei, o processo será extinto, sem resolução de mérito e, no caso da tutela antecipada satisfativa antecedente, concedida torna-se estável, na ausência de recurso e o processo será julgado extinto (art. 305 e parágrafo 1º do projeto). A partir daí, qualquer das partes poderá demandar a outra, com o intuito de discutir a tutela satisfativa estabilizada (parágrafo 2º), podendo requerer o desarquivamento dos autos (parágrafo 4º) e esta conservará seus efeitos, enquanto não revista, reformada ou invalidada por decisão de mérito proferida na ação de que trata o parágrafo 2º (parágrafo 3º).

O direito de desfazer a tutela antecipada previsto no parágrafo 2º do art. 305 extingue-se após dois anos contados da decisão que extinguiu o processo, conforme disposto no parágrafo 1º, sendo decadencial a natureza desse prazo.

Significa dizer que, concedida a tutela antecipada, e contra ela não tendo sido tirado recurso, aperfeiçoa-se a tutela, que, ainda quando não aditada a inicial e julgado extinto o processo, permanecendo em vigor e podendo ser debatida pelas partes em ação própria, no prazo legal.

Essa sistemática, a pretexto de abreviar o rito, na verdade, revela-se causadora de inúmeros percalços e resulta na multiplicação de recursos. A primeira dificuldade fica por conta do ônus da prova: se o réu assumir a condição de autor, terá a seu cargo a reversão desse ônus, passando a ter que se desincumbir daquilo que originalmente seria a contraprova a respeito do fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito, contrariando o artigo 380, II do projeto?

A possibilidade de distribuição dinâmica do ônus da prova, encampada pelo projeto, não incide sobre essa hipótese, posto que tem pressuposto próprio, de demonstração de dificuldades ou impossibilidade de cumprimento do encargo, em contraponto com a maior facilidade da parte contrário (projeto, art. 380, parágrafo 1º), pressuposto que em nada coincide com a inversão de papéis proporcionada pela estabilização da tutela antecipada.

Essa fórmula tem sido denominada na doutrina de técnica monitória e gera o contraditório diferido (mas não ausente, ou seria inconstitucional). Mas fica mais uma dúvida: A decisão estabilizada gera a coisa julgada? Na redação anterior do Projeto, havia dispositivo a respeito, que foi retirada da atual versão, levando a crer que não surtiria essa imutabilidade após o biênio.

Mas a instabilidade não se conforma à segurança jurídica e, a se admitir esse aperfeiçoamento, fica sem resposta a situação criada na decisão proferida contra a Fazenda Pública, nos casos em que sujeita a decisão ao reexame necessário. A doutrina considera que a coisa julgada não guarda compatibilidade com a provisoriedade da tutela antecipada, ainda que estabilizada.

Mais um problema: Durante o biênio decadencial pode eventualmente operar-se a prescrição antes de escoado esse prazo. Estaria ele estendido por força da previsão de prazo para estabilização? É de recear que não, porque inexiste previsão legal expressa de suspensão e/ou interrupção desse lapso durante o período previsto para a propositura da ação.

A falta de impugnação da tutela antecipada diz respeito expressamente à atividade recursal e não à contestação, tendo sido expresso o projeto nesse sentido, ao proclamar, no caput do art. <_st13a_metricconverter productid="305, a" w:st="on">305, a estabilização da tutela nesse caso de omissão de recurso. Ou seja, se aditada a inicial e citado o réu, não tem aplicação o rito da estabilização de tutela, seguindo o processo o rito ordinário, independente da apresentação de contestação.

Aqui reside a real expectativa da proliferação de recursos: Em casos nos quais ordinariamente não eram manejados recursos, agora, apenas para evitar a temida estabilização e suas consequências para o réu, será interposto o agravo de instrumento.

Finalmente, mais uma questão que certamente trará novos problemas: A doutrina admite que, sendo parcial a antecipação da tutela e transitada em julgado a decisão, considera-se que teria havido renúncia tácita aos demais pleitos não antecipados, todavia, genericamente a jurisprudência não admite, em sede de renúncia, a falta de pedido expresso, de sorte que, apresentado o pedido e deferida a tutela antecipada parcial que venha a se estabilizar, com relação ao restante, somente por meio de ação autônoma e dentro do prazo prescricional, poderia ser novamente pleiteado o bem da vida, inclusive porque a ação a que se refere o art. 305, parágrafo 2º do projeto, não poderá ter outra amplitude que não a delimitada pelo objeto da tutela estabilizada, numa multiplicação de demandas..

No caso de litisconsórcio, a impugnação apresentada por um, a todos aproveita, por força do disposto no art. 117 do projeto, segundo o qual os atos benéficos estendem-se aos demais e no art. 1.018, de acordo com o qual o recurso do litisconsorte também comunica da mesma forma.

Havendo mais de uma tutela antecipatória ou sendo ela fracionada, no caso de mais de uma medida urgente ou de medida divisível, respectivamente, a estabilização será sempre individual, caso apenas uma delas sofra a providência recursal, sendo independentes entre si, situação que igualmente atrairá grande confusão no rito procedimental.

A estabilização de tutela não tem aplicabilidade nos casos de tutela antecipada incidental e também nas concedidas posteriormente, como tutela de evidência, por falta de previsão no projeto.

Tocante à Fazenda Pública, bom asseverar que, considerando as similaridades do tema com a técnica monitória e tendo em conta que por longo tempo discutiu-se a aplicabilidade desta ao caso, fácil antever que será admitida a providência também nesse caso. Todavia, bom asseverar que o reconhecimento da coisa julgada com o advento do biênio sem a propositura de demanda pelas partes implica em sujeição da decisão ao reexame necessário, nos termos do art. 507 e incisos do projeto, como antes mencionado.

A doutrina tem também afastado a possibilidade de estabilização da tutela nas ações declaratórias e constitutivas, por ser indispensável, nesses casos, a produção da coisa julgada, sendo de todo incompatível com a regra que induz a precariedade2.

Já no caso das cautelares, aplica-se o procedimento dos arts. <_st13a_metricconverter productid="307 a" w:st="on">307 a 311 do projeto, sendo que, nos termos do artigo 300, caput, em ambos os casos a competência da antecedente será a mesma da ação principal, ressalvando-se, nos termos do parágrafo único do mesmo dispositivo, as ações de competência originária dos tribunais e, nos recursos, onde a tutela antecipada será requerida perante o órgão competente para apreciar o mérito.

O art. 307, caput, do projeto, prevê a cautelar antecedente, em cuja inicial deve constar a indicação da lide, seu fundamento e a exposição sumária do direito que visa assegurar, além do perigo na demora da prestação da tutela jurisdicional.

Em resumo, deve constar a descrição do risco como ameaça ao direito e a urgência, bem como antecipar o fundamento da lide principal, tal qual o sistema atual, sendo certo que permanece a obrigação de propositura da demanda principal no prazo de 30 dias (art. 310 do projeto), todavia, sua apresentação será nos mesmos autos em que veiculado o pedido de tutela cautelar e não mais em apenso, ficando ainda isento do pagamento de novas custas processuais, bem como podendo ser aditada a causa de pedir (parágrafo 2º), tudo sob o crivo do contraditório.

Assim, conquanto o parágrafo 3º contenha previsão de, apresentado o pedido principal, ser desnecessária nova citação, está previsto o direito de apresentação de contestação à ação principal, no prazo do art. 336 do projeto, ou seja, em quinze dias contados da audiência conciliatória, quando não houver acordo ou da data do pedido de cancelamento da audiência, por desinteresse e, não sendo designada, no rito comum do art. 231 do mesmo projeto.

O art. 311 do projeto prevê a caducidade da medida concedida de modo antecedente, na falta da propositura da ação principal (inciso I); na falta de efetivação da medida no prazo de 30 dias (inciso II) ou no caso de improcedência do pedido principal ou extinção sem resolução de mérito, situação em que fica vedada, salvo novo fundamento, a renovação do pedido cautelar (parágrafo único).

Sendo independentes teleologicamente as tutelas cautelar e satisfativa, o indeferimento da cautelar não obsta a ação principal, salvo nos casos de reconhecimento de prescrição e decadência, referindo-se ao objeto da demanda principal.

O parágrafo 1º prevê ainda a possibilidade de pedido incidental da tutela cautelar, podendo, portanto, ser desde logo deduzido em conjunto com a ação principal, no bojo do qual será ofertada, também do mesmo modo, a defesa do réu, inclusive quanto à cautela perseguida.

O tema das condições de admissibilidade sempre se revelou tormentoso em sede cautelar. Tendo em vista o objeto da cautelar, de prevenir o risco ao direito, este – o risco -, deve ser desde logo demonstrado, sendo a respeito dele que exige-se o requisito da probabilidade, mas, por certo que o direito a que se refere deve vir delineado de tal forma que também revele-se convincente, perante o juiz, a necessidade de ser garantida a sua eficácia futura, pois a um direito que desde logo se mostra indevido, não vale a pena a atuação da jurisdição em sua garantia.

Na sistemática do projeto, onde apenas operam como condições de admissibilidade a legitimidade e o interesse processual, temos que os requisitos específicos da cautelar, quais sejam, a probabilidade (do risco) e a urgência, revelam-se como matéria de mérito no bojo estrito da cautela, ainda que antes enquadrados como situações capazes de se submeter à avaliação do interesse de agir e da possibilidade jurídica do pedido, hoje inexistentes, sendo apenas a sua utilização inadequada (falta de interesse processual) ou incoação por pessoa que não seja o titular do objeto litigioso, aspectos capazes de resultar no afastamento formal do pedido, à parte as exigências específicas de propositura da ação principal no prazo legal e de efetivação da medida.

A decisão em sede de processo cautelar não produz coisa julgada, ainda mais na sistemática do projeto, onde a ação principal não mais se coloca em separado, sendo esta sim sujeita à definitividade operada pelo trânsito em julgado.

Assim, qualquer matéria debatida em sede cautelar, pode perfeitamente ser renovada e discutida em sua abrangência tocante ao pedido principal, situação que tem sido reconhecida na jurisprudência, sendo certo, todavia, que tem sido vedada, inclusive reforçada no projeto, a possibilidade de renovação do pedido cautelar sem novo fundamento, mas não sob esse enquadramento e sim, pela evidência da ausência dos requisitos específicos da cautela (probabilidade do direito e perigo na demora), conforme asserto jurisprudencial.

O art. 305 do projeto cuida da antecipação de tutela de evidência, nos casos de (I) abuso do direito de defesa ou manifesto protelatório do réu; (II) evidência documental sem oposição eficiente do réu; (III) prova exclusivamente documental acompanhada de tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em súmula vinculante e (IV) pedido reipersecutório fundado em prova documental adequada (contrato de depósito) para entrega do bem custodiado, situações em que considera exacerbada a probabilidade exigida nos demais casos de antecipação de tutela.

O parágrafo único dispõe – e nem precisaria -, que apenas nos casos dos incisos III e IV será concedida a tutela antecipada liminarmente, o que se afigura evidente, diante da necessidade, nos demais casos (incisos I e II), da aferição da conduta do réu para o aperfeiçoamento da evidência.

As situações previstas nos incisos I e II, diversamente do que tratou a doutrina, não têm caráter sancionatório, pois, também com base no dizer da doutrina, se de sanção se tratasse, teria que sobreviver ao decreto de improcedência do pedido, certo que não se poderia admitir esse ato como anistia à improbidade processual.

Além disso, não poderia ser cumulada com outras sanções, como as da litigância de má-fé (projeto, art. 77). Trata-se apenas de situação na qual o grau de probabilidade do direito pretendido eleva-se, pela conduta do réu, ao ponto de tornar-se suficiente a ser desde logo proporcionado o gozo do direito, por evidenciado. É, portanto, apenas espécie de tutela antecipada e não de sanção e pode, ocorrendo a coincidência de eventos, ser cumulada a antecipação com a imposição de multa prevista para a espécie.

De todo modo, a doutrina tem considerado, para enquadrar a atitude do réu à espécie, que se busque coincidência com a definição legal de litigância de má-fé (art. 80, incisos I a VII do projeto).

Em caso de litisconsórcio, haverá algumas nuances: se for comum, pode haver antecipação de tutela em relação a um deles e não em relação aos demais; se for unitário, essa possibilidade fica prejudicada, porque não é possível a antecipação individual, já que a solução deve ser idêntica para todos, não sendo lícito punir quem não agiu deslealmente, além de a defesa leal aproveitar aos demais.

A versão final do projeto abandonou, como tutela de evidência, a situação de incontrovérsia, parcial ou total, que passou a ser objeto não mais de tutela antecipada, mas sim, de julgamento antecipado parcial de mérito (art. 363,I do projeto), do que exsurgem duas situações: (i) se ao invés de apresentada defesa inconsistente, for omitida defesa, resultará em incontrovérsia capaz de, ou determinar o julgamento antecipado da lide ou, considerando o juiz que há necessidade de dilação probatória, examinar antes a possibilidade, diante da realidade do caso, de antecipação da tutela; (ii) se houver omissão relativa ao documento capaz de assegurar a evidência (e não apenas contraprova), poderá também nesse caso ser considerado evidente o direito a que se reporta.

Foi ainda contemplada a hipótese de prova documental inconteste, mercê da qual, evidenciado o direito, contra ele nada foi produzido capaz de lhe retirar a presunção em grau máximo, e de traduzir, do mesmo modo, evidência a favor do autor da demanda.

Esse conceito, na lição da doutrina, pode ainda abarcar situações outras, como aquelas decorrentes da notoriedade, para a qual o direito civil dispensa prova, ou ao menos inverte o ônus de sua produção; a prova emprestada, ou seja, aquela produzida em outro processo, mas sob o crivo do contraditório entre as mesmas partes; questão prejudicial ocorrida em outro processo e posta como premissa daquele onde aferida a evidência; provas produzidas antecipadamente, entre outros.

O projeto classifica a tutela de evidência a par da tutela de urgência, demonstrando, estreme de dúvida, que a urgência, no sentido estrito do termo, não se apresenta como requisito à antecipação, sendo certo que sob o atual direito, o STJ chegou a decidir que a evidência não seria suficiente à antecipação, exigindo a demonstração do perigo na demora (....). Ocorre aí apenas um incremento à probabilidade afirmada na inicial, que revela mais uma vez o grau máximo, tornando de todo despicienda a espera, como tem admitido a doutrina, ao mencionar que a razão de ser não coincide com o perigo de dano

No caso do inciso III, não tem relevo a atuação da parte contrária, sendo suficiente a possibilidade de aliar a prova documental a questões que já se encontram pacificadas, seja em sede de recursos repetitivos, seja por força de súmula vinculante.

O inciso IV prevê situação de presunção em grau máximo, decorrente da prova da existência de contrato de depósito hábil à perseguição do bem custodiado. Trata-se do que a doutrina denomina como "presunção legal de evidência do direito" capaz de revelar-se limitadora da atuação discricionária do juiz, uma vez que não deixa liberdade de arbítrio, diante da ocorrência fática documentada.

O projeto contempla a classificação das tutelas antecipadas em satisfativas ou cautelares, podendo ser fundamentadas em urgência ou em evidência, sendo por isso plausível, como vem admitindo a jurisprudência, a tutela cautelar de evidência (...) e não apenas nos casos de tutela satisfativa.

Em conclusão, genericamente pode-se considerar positiva a mudança projetada, na parte que trata a tutela antecipada com melhor técnica, permitindo que as consequências de sua aplicabilidade sejam medidas em razão de sua natureza jurídica.

Apenas alguns detalhes ainda permanecem omissos e podem dar margem a debate, o que deveria ser evitado, como nos casos do confronto de irreversibilidades e a solução adequada; de revogação automática da tutela antecipada em caso de improcedência da demanda; de falta de previsão do contraditório, exceto nos casos em que esse exercício pudesse comprometer a sua efetividade.

A inovação mais problemática fica por conta da previsão de concessão preparatória de tutela antecipada e sua estabilização que, ao contrário de abreviar o rito, revela-se prenhe de incidentes, capazes de traduzir a multiplicação de recursos.

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1 Cf Talamini, Tutela de Urgência no Projeto de Novo Código de Processo Civil: A estabilização da medida urgente e a “monitorização” do processo civil brasileiro. Revista de Processo 209, p.16 – jul/2012.

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* Mirna Cianci é procuradora do Estado de SP.

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