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Suprema injustiça

Às vezes, mesmo diante da rejeição popular a determinado entendimento, o julgador precisa munir-se de coragem para decidir do modo que considera mais correto. Um dos assuntos pouco compreendidos pelos leigos, e, por incrível que pareça, também por operadores do Direito, é o relacionado ao direito de defesa. Em regra, pensa-se que direito de defesa é desculpa para o culpado protelar ou mesmo fugir de sua punição. Há casos em que realmente dá-se esse fenômeno, em outros, porém, o direito de defesa, com todas as regras que o disciplinam, é o meio de que se tem para não se submeter arbitrariamente a uma acusação injusta e infundada.

17/11/2005


Suprema injustiça


Raquel Cavalcanti Ramos Machado


Às vezes, mesmo diante da rejeição popular a determinado entendimento, o julgador precisa munir-se de coragem para decidir do modo que considera mais correto. Um dos assuntos pouco compreendidos pelos leigos, e, por incrível que pareça, também por operadores do Direito, é o relacionado ao direito de defesa. Em regra, pensa-se que direito de defesa é desculpa para o culpado protelar ou mesmo fugir de sua punição. Há casos em que realmente dá-se esse fenômeno, em outros, porém, o direito de defesa, com todas as regras que o disciplinam, é o meio de que se tem para não se submeter arbitrariamente a uma acusação injusta e infundada.


Recentemente, esse assunto sobre o direito de defesa tem sido mais discutido por conta de algumas decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em face do julgamento do deputado José Dirceu.


Apesar de não concordar com as últimas decisões proferidas monocraticamente pelo Min. Eros Grau, não as discutirei no presente texto. Mas ainda assim, elas podem ser examinadas como parâmetro para avaliar a lógica e a coerência do STF em julgamentos nos quais também se discutia a amplitude do direito de defesa.


Em muitos julgados recentes do STF, o Min. Eros Grau tem dado conceito bastante rígido e curto ao direito de defesa. Por exemplo, diante de julgamento sobre a validade de sanção política, há muito repelida pela jurisprudência, o Ministro foi voto vencido e declarou a possibilidade de sua aplicação. No caso, tratava-se da não autorização para impressão de bloco de nota fiscal, porque o solicitante do bloco de notas estaria com supostas dívidas tributárias. Ora, vejam: o cidadão estava claramente tendo tolhido seu direito de discutir o tributo (se era devido ou não) e ainda o direito ao livre exercício da profissão. Ou pagava sem questionar a quantia exigida pelo Estado ou não podia realizar seu trabalho. Em outros termos, o Ministro entendeu que não violava a ampla defesa retirar do contribuinte o direito de sequer questionar a exigência. Em palavras mais claras ainda: para ele, não seria uma violação ao direito de defesa o fato de o contribuinte não poder exercer qualquer defesa que fosse enquanto não pagasse, sem questionar, o tributo que lhe era exigido. É um contra senso sem igual. E não fossem os outros ministros, o direito de defesa, nesse caso, teria sido violado da forma mais contundente possível.


Quando, porém, agora, tem-se o julgamento do deputado José Dirceu, reparo que o direito de defesa teve seu significado elastecido. Cada mínima formalidade não observada pelo Conselho de Ética da Câmara é tida como motivo para exclusão de documentos e até refazimento de relatório.


Ora, seja o conceito de direito de defesa mais amplo ou mais restrito, o que não se pode aceitar, de forma alguma, numa democracia, é a incoerência, a falta de isonomia no tratamento entre governantes e cidadãos. Se alguma distinção pudesse haver, teria de ser para reconhecer mais direitos aos cidadãos, submetidos que estão aos atos unilaterais do Estado, e não o contrário. A única certeza, portanto, que se pode ter ante esta dubiedade de tratamento é que se trata de uma suprema injustiça.
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*Advogada e membro do ICET - Instituto Cearense de Estudos Tributários







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