Migalhas de Peso

Ainda a questão dos assassinos, confessos uns, evidentes outros.

O jornalista Antonio Marcos Pimenta Neves, que assassinou a tiros a ex-namorada Sandra Gomide, no dia 29 de Agosto de 2000. No dia 23/03/2001, foi beneficiado por habeas corpus concedido pelo ministro Celso de Mello, do STF. Em seu despacho, Celso de Mello determinou que a decisão fosse comunicada com urgência ao juizo da 1ª Vara da Comarca de Ibiuna, para que, com urgência, fosse expedido o alvará de soltura. O ministro considerou destituída do fundamento a alegação de que, caso Pimenta Neves fosse mantido em liberdade, ele seria capaz de interferir no andamento do processo. Duas coisas para lembrar: a primeira é que, logo no início, os advogados do jornalista anunciaram que iriam abandonar o caso, em razão do excesso de interferência de familiares e amigos de Pimenta Neves no seu trabalho. Outra coisa é concluir que talvez essa interferência de fato exista, já que estamos no final de 2005 e não há novidades quanto ao julgamento do assassino confesso, que continua em liberdade.

17/11/2005


Ainda a questão dos assassinos, confessos uns, evidentes outros.

Wilson Silveira*

O jornalista Antonio Marcos Pimenta Neves, que assassinou a tiros a ex-namorada Sandra Gomide, no dia 29 de Agosto de 2000. No dia 23/03/2001, foi beneficiado por habeas corpus concedido pelo ministro Celso de Mello, do STF. Em seu despacho, Celso de Mello determinou que a decisão fosse comunicada com urgência ao juizo da 1ª Vara da Comarca de Ibiuna, para que, com urgência, fosse expedido o alvará de soltura. O ministro considerou destituída do fundamento a alegação de que, caso Pimenta Neves fosse mantido em liberdade, ele seria capaz de interferir no andamento do processo. Duas coisas para lembrar: a primeira é que, logo no início, os advogados do jornalista anunciaram que iriam abandonar o caso, em razão do excesso de interferência de familiares e amigos de Pimenta Neves no seu trabalho. Outra coisa é concluir que talvez essa interferência de fato exista, já que estamos no final de 2005 e não há novidades quanto ao julgamento do assassino confesso, que continua em liberdade.


Os irmãos Cravinhos, que assassinaram, por motivo torpe e fútil, o casal Richthofen, na cama, enquanto dormiam, a golpe de porretes cuidadosamente manufaturados para a ocasião, assessorados pela filha do casal. Suzana Richthofen, foram colocados em liberdade ontem, tendo o voto vencedor no julgamento desse habeas corpus, julgado interessante estender aos irmãos assassinos o benefício antes concedido à filha assassina dos pais, um crime que horrorizou o público. Que até hoje horroriza. É bom lembrar que os assassinos, os dois irmãos praticaram um homicídio cuidadosamente premeditado, saquearam a casa das vítimas como prêmio por terem auxiliado a filha do casal em seu desiderato e, na seqüência, um deles foi com a namorada, Suzana, para um motel, onde passaram algumas horas em alegre transa, enquanto que o outro, de posse de dinheiro roubado dos assassinados, foi dormir para acordar bem disposto na manhã seguinte e, com a consciência tranqüila do dever cumprido, comprar uma motocicleta, velho desejo ainda não satisfeito. O que aceitaram os membros do STJ? A alegação de que se tratavam de réus primários, que contam com residência fixa e que, essa é a parte melhor, não constituem risco para a ordem pública.


Gil Rugai, acusado de matar o pai, Luiz Rugai, e a mulher dele, Alessandra, a tiros, em 28/03/2004. Esse nada confessou. Nega a autoria. E está preso desde então, aguardando julgamento, negados que foram diversos pedidos de habeas corpus, mesmo sendo primário e tendo residência fixa.


O requisito de garantia da ordem pública como fundamento da manutenção da prisão de uma pessoa acusada de cometer uma determinada infração penal, deve ser analisado, diante de tantas e discrepantes situações, principalmente as decisões que retornam assassinos confessos ao convívio social.


Julio Pabbrini Mirabete (Código de Processo Penal Interpelado) pontifica: “O conceito de ordem pública não se limita a prevenir a reprodução de fatos criminosos, mas também acautelar o meio social e a própria credibilidade da justiça em face da gravidade do crime e sua repercussão”.


Vários julgados abordam a questão, dentre os quais:

“No conceito de ordem pública, não se visa apenas prevenir a reprodução de fatos criminosos, mas acautelar o meio social e a própria credibilidade da Justiça, em face da gravidade do crime e de sua repercussão. A conveniência da medida deve ser revelada pela sensibilidade do juiz à reação do meio ambiente à ação criminosa”.

(STF, 2ª Turma – RHC 65.043 – rel. Min. Carlos Madeira in RTJ 124/1033)

“A prisão preventiva pode ter como fundamento a garantia da ordem pública. A constrição ao exercício do direito de liberdade é justificada cautelarmente, a fim de evitar repetição de conduta delituosa ou reagir a vilania do comportamento delituoso, que, por suas características, gera vigorosa reação social”.

(STF, RHC 2775-4, rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro, julgado em 13/09/93)

Nos dias de hoje, mesmo os que consideram que a mera conceituação de ordem pública não seja suficiente para a manutenção de prisão preventiva, e que exigem critérios legais objetivos que disciplinem taxativamente as hipóteses que necessitem ou mereçam a privação da liberdade, concluem que para a definição de tais critérios objetivos a serem levados em conta para a decretação e manutenção da prisão com fundamento na garantia da ordem pública, concluem úteis para o estabelecimento de tais critérios, que se leve em conta a natureza do crime imputado, a existência ou não de violência na conduta do acusado e as conseqüências advindas do crime, tanto para as vítimas, quanto para a sociedade.


O motivo da presente indignação é a análise dos casos de início mencionados. Em primeiro lugar pela ao menos aparente incoerência em colocar em liberdade réus confessos de crimes brutais e premeditados (Pimenta Neves e irmãos Cravinhos/Richthofen), negando a liberdade ao que nega veementemente a autoria do crime (Rugai), o que não é bom para o entendimento e aceitação dos cidadãos sobre o que, de fato, é ou não justo.


Mas, o importante é a desconsideração da necessidade de garantia da ordem pública, considerada como tal não só a prevenção da reprodução de fatos criminosos pelos mesmos agentes, mas a necessidade de acautelar o meio social e a própria credibilidade da justiça em face da gravidade do crime e sua repercussão, como entende Mirabete.


Como dizer, analisando o que se sabe (em razão não só da confissão mas também da reconstituição do crime) que os irmãos Cravinhos, que assassinaram brutalmente o casal Richthofen por motivos fúteis e torpes, que a natureza do crime não seja um critério objetivo para a manutenção da prisão?


Há qualquer dúvida sobre a violência na conduta dos acusados, que admitiram a premeditação e confeccionaram porretes especiais para o crime? Não é de enorme violência terem os acusados, aí incluída a própria filha do casal assassinado, após o bárbaro crime, terem se dedicado a folguedos sexuais em motel e à compra de motos, sem contar com a frieza demonstrada por todos ao acompanhar o enterro dos que assassinaram?


E quanto às conseqüências advindas do crime, não só para as vítimas, mas para seus familiares, inclusive para o irmão mais moço que, até mesmo, era amigo dos assassinos?


Finalmente, e para a sociedade?


Quais as conseqüências do crime?


A sociedade se sente horrorizada, cheia de pavor e amedrontada pelo crime horripilante.


E hoje essa mesma sociedade é obrigada a aceitar em seu seio o convívio com os assassinos confessos. A verdade é que o absurdo da liberdade dos irmãos Cravinhos (e também de Pimenta Neves) é tão grande que até seus pais e familiares terão dificuldade em recebê-los na própria casa. Os vizinhos não tem obrigação de aceitar o convívio com pessoas desse tipo. Sentir-se-ão óbviamente constrangidos e amedrontados na presença de pessoas capazes de matar com tal desfaçatez e frieza.


É possível que a presença dos assassinos gozando sua imerecida liberdade venha a influenciar até o mercado imobiliário local, já que um bairro em que assassinos confessos vivem pode não ser considerado saudável para constituir família e criar filhos.


Em resumo, a libertação dos irmãos Cravinhos, como conseqüência de manter a incoerência da libertação da filha do casal, com a conseqüente extensão do benefício aos demais agentes do mesmo crime, não acautela o meio social, já que não o defende e nem resguarda. E, como conseqüuência pior, atenta contra a própria credibilidade da justiça, já tão abalada pela notoriedade de decisões contraditórias, discrepantes, incoerentes para o entendimento do cidadão, proferidas por muitos membros do judiciário.


O pior de tudo, com certeza, é a desconfiança do cidadão com a certeza das instituições, enfraquecidas com a inaceitável e inadmissível atividade dos integrantes, não só do poder executivo e legislativo, mas também do judiciário, última trincheira da manutenção da ordem pública.

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*Advogado do escritório Newton Silveira, Wilson Silveira e Associados - Advogados e membro do CRUZEIRO/NEWMARC PROPRIEDADE INTELECTUAL








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