Tenho escutado muito em Brasília que somente as pessoas mais inteligentes e astutas podem ver e compreender o revolucionário espírito moralizador e o brilho judicante do ministro Joaquim Barbosa. Seus admiradores se embriagam com a inflexível e mais íntegra justiça emanada da sua pena e do seu verbo, sempre rica em princípios republicanos, de raríssima intelectualidade e exótica (por não ser costumeira) firmeza contra a impunidade – diz o próprio ministro e o eco dos seus discípulos numa eterna vigília da lei e da ordem em câmara ardente. Diante de tanto ouro, prata e seda; enfim, tantas loas tecidas para o ministro presidente do Supremo Tribunal Federal, não consigo afastar meu pensamento do conhecidíssimo conto “a roupa nova do rei”.
Voltemos à realidade: em 14 de março de 2013, o ministro Joaquim Barbosa, ao negar o pedido de restituição de bens apreendidos do publicitário Duda Mendonça e sua sócia, fez coro ao parecer exarado pelo Procurador Geral da República, Roberto Gurgel, sob o seguinte fundamento: “embora Duda e Zilmar tenham sido absolvidos, remanesce a possibilidade, ainda que remota, de alteração desse quadro, caso esta Corte, por exemplo, venha a acolher embargos de declaração a serem eventualmente opostos pela acusação”.
Conforme consta da decisão do ministro Joaquim Barbosa, “o procurador-geral da República, na petição nº 9.491/2013, manifesta-se contrariamente ao pleito, tendo em vista a ‘possibilidade de modificação do julgado em sede de embargos de declaração’”.
À luz, portanto, da motivação decisória do presidente do Supremo Tribunal Federal, denota-se peso e medida (tanto do ministro, quanto do procurador Geral da República) sobre embargos de declaração interpostos em ações penais em trâmite na Corte Constitucional (especificamente, inclusive, na AP 470): é possível a modificação do julgado em sede dessa espécie recursal!!!
Pois bem, interpostos embargos de declaração pelos réus da Ação Penal 470, sem nenhuma surpresa para esse articulista, o peso altera-se e a medida diverge: em viagem à Costa Rica, o ministro Joaquim Barbosa afirmou – segundo diversas fontes jornalísticas - que “tecnicamente, os embargos de declaração no processo do mensalão não teriam poder de mudar o resultado do julgamento, como pediram os réus”.
Afinou-se, portanto, à manifestação do procurador Geral da República no sentido de que os embargos de declaração não poderão reduzir penas ou levar a absolvições: "a posição da PGR é no sentido de que não se pode obter pelos embargos de declaração qualquer alteração na decisão, inclusive quanto à dosimetria da pena". A PGR, como promovedor de qualquer ação penal, não tem o dever de ser imparcial e sua posição – apesar de descurar-se do fair-play – é juridicamente aceitável.
O mesmo raciocínio não se aplica aos julgadores. A esses protagonistas que detém o poder-dever jurisdicional, a imparcialidade não se espera, se exige!!! Ora, a pouco, o próprio ministro revelou seu posicionamento na respeitável decisão já mencionada, que negou a restituição de bens do Duda Mendonça e sua sócia, afirmando que a alteração do quadro – embora remota – seria possível em sede de embargos de declaração. Entende-se: seja para absolver quem já fora condenado ou condenar quem já fora absolvido.
Não é crível que um ministro da Suprema Corte exare peso e medida específicos e exclusivos para o órgão acusador, uma vez que - até onde se sabe – o Brasil ainda vive sob um regime democrático de direito. E o velho ditado popular se aplica com perfeição até mesmo na Corte Constitucional: “pau que dá em Chico, dá em Francisco”.
Vê-se, diante desse gráfico confuso, a inelutável constatação que o próprio ministro presidente da Suprema Corte do Brasil nos revela a sua própria nudez, ao admitir possuir diversos pesos e inúmeras medidas, o que já era – diga-se de passagem – de conhecimento de todos.
Muitos jornalistas, como os ministros fictícios do rei, soltam suspiros de admiração pela coragem do ministro Joaquim Barbosa (nesse ponto não sei dizer se verdadeiros ou falsos) e açulam a vaidade – que já transborda em níveis internacionais – do nobre e supremo magistrado.
Se os embargos de declaração interpostos vão ou não modificar o resultado do julgamento já proferido é outra discussão. O que não se admite em nenhum país civilizado e sujeito a um regime democrático de direito, onde princípios republicanos e garantias individuais estão constitucionalmente previstos de forma explícita e rigorosamente resguardados, é que o órgão acusador possua vantagens indevidas sobre a defesa, por pior que seja o crime ou mais cruel seja o criminoso, sob pena de inversão da lógica jurídica contemporânea.
Mais tenebroso ainda e revelador da sua natureza despótica, é quando o ministro presidente do Supremo Tribunal Federal revela possuir pesos e medidas diferentes por baixo da sua toga e que ao seu bel prazer ou interesse lhe é facultado utilizar-se de uns ou de outras, conforme o seu humor do dia. Com todas as vênias, não vislumbro o julgamento do mensalão como sendo político, mas – por outro lado – com toda certeza o ilustre ministro Joaquim Barbosa não permaneceu distante do caso o suficiente para ser possível atestar com precisão a sua esperada imparcialidade.
Ao contrário, suas declarações napoleônicas sobre o caso, aliado ao desrespeitoso comportamento durante as sessões de julgamento, notadamente no que se refere às desnecessárias e rasteiras agressões verbais aos demais ministros que ousaram dele divergir, denotam tratar-se muito mais de uma cruzada pessoal do que um julgamento como outro qualquer.
Nessa toada, o julgamento dos diversos embargos de declaração ofertados na AP 470 caminham para a devida apreciação na Suprema Corte Constitucional e o ministro Joaquim Barbosa – infelizmente - engendra, orgulhosamente, marcha exibicionista e midiática, como sua majestade do clássico conto dinamarquês, talvez a esperar que algum espírito ingênuo e de pureza infantil grite a plenos pulmões – parafraseando Hans Christian Andersen – O MINISTRO ESTÁ NU!!!
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* Adriano José Borges da Silva é advogado