Com o crescimento do país e da busca constante do mercado por inovações, verifica-se um aumento de pedidos de patentes, registros de desenhos industriais e softwares no INPI - Instituto Nacional da Propriedade Intelectual e, consequentemente, de ações judiciais envolvendo empregados/funcionários pleiteando indenizações de empregadores por terem desenvolvido patentes, softwares ou desenhos industriais sob o contrato de trabalho.
Tais ações tem tido bastante repercussão, pois os empregados têm buscado a Justiça do Trabalho, onde a propriedade intelectual é pouco difundida, para resolver questões dessa natureza.
Entretanto, a questão da autoria sobre bens imateriais é simples e pode ser resolvida facilmente.
Quanto às patentes, desenhos industriais e softwares criados pelo empregado no ambiente de trabalho, a legislação é clara ao prever que os direitos sobre essas criações pertencem exclusivamente ao empregador, desde que não haja previsão contratual em contrario e que não haja provas de que o empregado/funcionário tenha criado/desenvolvido o produto fora do ambiente do trabalho, com seus próprios recursos. Confira-se:
- Artigo 88, da lei da Propriedade Industrial (9.279/1996).
"Art. 88. A invenção e o modelo de utilidade pertencem exclusivamente ao empregador quando decorrerem de contrato de trabalho cuja execução ocorra no Brasil e que tenha por objeto a pesquisa ou a atividade inventiva, ou resulte esta da natureza dos serviços para os quais foi o empregado contratado.
§ 1º Salvo expressa disposição contratual em contrário, a retribuição pelo trabalho a que se refere este artigo limita-se ao salário ajustado.
§ 2º Salvo prova em contrário, consideram-se desenvolvidos na vigência do contrato a invenção ou o modelo de utilidade, cuja patente seja requerida pelo empregado até 1 (um) ano após a extinção do vínculo empregatício".
- Artigo 4°, da Lei de Software (9.609/1998).
"Art. 4º Salvo estipulação em contrário, pertencerão exclusivamente ao empregador, contratante de serviços ou órgão público, os direitos relativos ao programa de computador, desenvolvido e elaborado durante a vigência de contrato ou de vínculo estatutário, expressamente destinado à pesquisa e desenvolvimento, ou em que a atividade do empregado, contratado de serviço ou servidor seja prevista, ou ainda, que decorra da própria natureza dos encargos concernentes a esses vínculos.
§ 1º Ressalvado ajuste em contrário, a compensação do trabalho ou serviço prestado limitar-se-á à remuneração ou ao salário convencionado.
§ 2º Pertencerão, com exclusividade, ao empregado, contratado de serviço ou servidor os direitos concernentes a programa de computador gerado sem relação com o contrato de trabalho, prestação de serviços ou vínculo estatutário, e sem a utilização de recursos, informações tecnológicas, segredos industriais e de negócios, materiais, instalações ou equipamentos do empregador, da empresa ou entidade com a qual o empregador mantenha contrato de prestação de serviços ou assemelhados, do contratante de serviços ou órgão público.
§ 3º O tratamento previsto neste artigo será aplicado nos casos em que o programa de computador for desenvolvido por bolsistas, estagiários e assemelhados".
Desse modo, resta claro que, independentemente da existência de contrato particular de cessão de direitos celebrado entre o empregador e o funcionário acerca da criação de um determinado produto (patente) ou software, os direitos sobre a criação são exclusivos do empregador.
Quanto às obras intelectuais, artísticas e cientificas a Lei de Direitos Autorais (lei 9.610/98) não regulamenta especificamente a questão das criações realizadas por funcionários contratados para tanto, diversamente das leis da Propriedade Industrial e do Software.
Entretanto, levando-se em consideração que os direitos autorais se dividem em direito moral, que é o direito de ter a autoria indicada cada vez que a obra for reproduzida, ou mencionada; e patrimonial, que é o direito de reprodução, publicação e divulgação da obra, tem-se que, se o empregado criar/desenvolver uma obra intelectual ou artística passível de proteção pela lei 9.610/98, ele será o seu autor e terá os direitos morais sobre a obra, ou seja, terá o seu nome atribuído a ela (artigo 24).
Já os direitos patrimoniais de utilização da obra não pertencem, necessariamente, ao criador. Depende do que prevê a lei ou contrato de trabalho celebrado entre empregador e empregado.
Os artigos 17, parágrafo 2°, e 36, ambos da lei 9.610/98, regram duas situações em que os direitos patrimoniais da obra não pertencem ao autor, quais sejam:
"Art. 17. É assegurada a proteção às participações individuais em obras coletivas.
[...]
§ 2º Cabe ao organizador a titularidade dos direitos patrimoniais sobre o conjunto da obra coletiva."
"Art. 36. O direito de utilização econômica dos escritos publicados pela imprensa, diária ou periódica, com exceção dos assinados ou que apresentem sinal de reserva, pertence ao editor, salvo convenção em contrário."
Além dessas duas previsões legais, para saber a quem pertencerão os diretos patrimoniais da obra, deve-se analisar os termos do contrato de trabalho celebrado entre o empregador e o funcionário.
Se o contrato de trabalho previr que o funcionário foi contratado para criar/ produzir determinadas obras, o direto patrimonial da obra pertencerá à empresa.
Assim, se houver contrato de trabalho que tenha a criação como seu objeto, os direitos de comercialização, publicação, reprodução serão do empregador. Entretanto, se não houver relação de emprego, como no caso de trabalhador autônomo ou de contratação de prestação de serviços, os direitos patrimoniais da obra pertencerão ao criador da obra.
Diante de todo exposto, conclui-se que, para que o empregador evite problemas no futuro, os funcionários contratados para criação/desenvolvimento de patentes, desenhos industriais, softwares ou obras artísticas devem ser registrados nesta função desde o inicio de suas atividades.
Existem inúmeras decisões, como a proferida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª. Região, que, ao julgar o Recurso Ordinário 00474-2008-043-03-00-9, em 2010, manteve a decisão que condenou o empregador a indenizar o funcionário por ter contribuído no aperfeiçoamento de maquina, sem que o seu contrato de trabalho previsse contratação para essa função, confira-se:
"INVENÇÃO DE MAQUINÁRIO – MÁQUINA DE DESECARTEIRAR E RECUPERAR CIGARROS – ‘DISPOSITIVO ESPERANÇA’ - AUTORIA E CO-AUTORIA – APLICABILIDADE DA LEI N° 9.279/96 - CONTRIBUIÇÃO PESSOAL DO EMPREGADO NO APERFEIÇOAMENTO DA MAQUINA. A interpretação que se dá à lei 9.279/96, que regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial, em seu artigo 91, § 2°, é no sentido de que o empregador deve pagar ao empregado uma “justa remuneração”, na hipótese em que o trabalhador contribui com sua atividade intelectiva e irradia de sua personalidade, para a criação e/ou aperfeiçoamento de invento, cujo produto será revertido em benefício da exploração econômica do empregador. In casu, o acervo probatório comprova que o Reclamante, valendo-se de suas aptidões intelectivas, colaborou no desenvolvimento e aperfeiçoamento da máquina apelidada de 'UM SC 30’'- 'Projeto esperança’ - extrapolando suas obrigações contratuais, para se enquadrar no permissivo legal em comento. Sentença que se mantém".
Desse modo, resta claro que, independentemente do objeto a ser desenvolvido/criado (patentes, desenhos industriais, softwares, obras intelectuais, artísticas ou científicas), se o contrato de trabalho previr que o funcionário foi contratado para desempenhar a função de criação desde o inicio de suas atividades, os direitos sobre a referida criação serão do empregador, a não ser no caso de obra intelectual, artística ou científica e software em que os direitos morais da obra são inalienáveis e irrenunciáveis de seu criador (artigo 27, da lei 9.610/98).
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*Renata Rocha Fanucchi é advogada do escritório Newton Silveira, Wilson Silveira e Associados Advogados
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