Dos efeitos tributários decorrentes da contabilização do crédito do PIS/PASEP não cumulativo – Lei nº 10.637/02
Pedro Anan Jr.
Marcos Botter*
I – Introdução
A Lei nº 10.637, de 30 de dezembro de 2002 (Lei 10.637/02) introduziu no Direito Tributário Brasileiro, entre outras disposições, a cobrança não cumulativa das Contribuições ao Programa de Integração Social (PIS) e ao Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Públic
A não cumulatividade pretendida pelo Governo Federal consubstancia-se na possibilidade de descontos, sobre o valor da contribuição a ser recolhida, de créditos calculados em relação a bens, serviços e despesas intrinsecamente relacionados à atividade operacional da empresa
Diferentemente do bônus de adimplência da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), previsto na mesma Lei 10.637/02, cujos procedimentos de contabilização encontram-se claramente delineados no texto legal, a lei não fez qualquer menção quanto à necessidade e/ou procedimento a ser adotado para o registro contábil do crédito do PIS/PASEP.
Passaremos a seguir a comentar as alternativas a serem utilizadas pelas empresas no registro contábil do mencionado crédito, bem como suas consequências tributárias.
II – Das alternativas
II.1 – Do registro em Lucros Acumulados
A respeito da conta contábil de lucros ou prejuízos acumulados, o artigo 186 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976 (Lei das S/A) determinou o seguinte:
"Artigo 186 - A demonstração de lucros ou prejuízos acumulados discriminará:
I - o saldo do início do período, os ajustes de exercícios anteriores e a correção monetária do saldo inicial;
II - as reversões de reservas e o lucro líquido do exercício;
III - as transferências para reservas, os dividendos, a parcela dos lucros incorporada ao capital e o saldo ao fim do período.
§ 1º Como ajustes de exercícios anteriores serão considerados apenas os decorrentes de efeitos da mudança de critério contábil, ou da retificação de erro imputável a determinado exercício anterior, e que não possam ser atribuídos a fatos subseqüentes.
(...)" (Os destaques são nossos)
No caso específico dos ajustes de exercícios anteriores, podemos observar que a Lei das S/A previu duas hipóteses para a utilização desta conta, quais sejam a mudança de critério contábil e a retificação de erro imputável a determinado exercício anterior.
Relativamente à mudança de critério contábil, o artigo 177 da Lei das S/A determina que a escrituração das pessoa jurídicas deve ser mantida observando-se métodos ou critérios uniformes no tempo. Assim, se for adotado um critério de avaliação ou registro de algum ativo ou passivo em determinado exercício, este critério deverá ser observado nos exercícios seguintes. Isto não quer dizer, entretanto, que esses métodos ou critérios não possam ser alterados em nenhuma hipótese.
Assim, quando houver necessidade de alteração ou mudança desse critério, para que melhor seja refletida a situação patrimonial da companhia nas suas demonstrações financeiras, a mesma deve ser colocada em prática. Essa alteração pode gerar efeitos diversos, influenciando ou não a apuração do resultado da pessoa jurídica. Quando essa mudança afetar diretamente a apuração de resultados, tal efeito deverá ser lançado em conta de lucros ou prejuízos acumulados, de sorte a não influenciar o resultado do exercício de maneira indevida.
Já na hipótese de retificação de erro imputável a determinado exercício anterior, esta deverá ocorrer quando a pessoa jurídica tinha informações e as condições para fazer adequadamente a contabilização de determinada receita ou despesa e, de maneira injustificada, não a fez naquele exercício, fazendo-a em exercício posterior.
Não se trata, nesse caso, de erro o fato da empresa não dispor de informações ou condições suficientes para um cálculo correto, sendo que só posteriormente venha a ter a possibilidade e efetuar o cálculo perfeito. É preciso algo grosseiro, normalmente não admissível, para que se possa conceituar como erro.
Como se pode observar, a utilização da conta contábil de lucros ou prejuízos acumulados para o registro de créditos de natureza fiscal, mesmo nos casos em que a legislação tributária assim determina, contrapõe-se às situações previstas para tal na legislação societária.
No caso dos créditos do PIS/PASEP, a Lei 10.637/02 em nenhum momento determina o registro contábil do crédito contra lucros ou prejuízos acumulados. além do fato de esta espécie de registro não se encontrar prevista na legislação societária, somos da opinião de que tal procedimento não encontra amparo legal para a sua realização.
II.2 – Do registro em contas de resultado
O artigo 1º da Lei 10.637/02 determinou que a base de cálculo do PIS/PASEP é o faturamento, assim entendido como a totalidade das receitas da pessoa jurídica, independentemente da sua classificação contábil.
Dessa forma, caso as empresas optem por registrar contabilmente o crédito daquela contribuição em conta de resultado (redutora de custo ou de despesa), com contrapartida a débito em conta de ativo, este crédito poderia vir a ser considerado eventualmente pelas autoridades fiscais como receita e, consequentemente, como objeto da incidência da própria contribuição ao PIS/PASEP.
Não obstante, somos da opinião de que tal crédito não deve ser tributado novamente pelo PIS, uma vez que não representa ingresso de nova receita para o contribuinte.
O artigo 1º, parágrafo 3º, inciso V, alínea "b" da Lei nº 10.637/02 prevê que determinados tipos de receitas, dentre elas as reversões de provisões e recuperações de créditos baixados como perda, que não representem ingresso de novas receitas, não integram a base de cálculo do PIS.
Ora, se tais situações são admitidas pela lei como não representantes de ingresso de novas receitas, não sofrendo a incidência do PIS, tratamento diverso não poderia ser conferido ao crédito do próprio PIS lançado em conta de resultado, já que o mesmo também não representa para o contribuinte receita ou acréscimo patrimonial.
Por fim, cumpre mencionar que o Conselho Federal de Contabilidade (CFC) manifestou, por meio do Comunicado CFC nº 01, de 24 de janeiro de 2003, o entendimento de que o crédito deveria ser registrado contabilmente em conta de resultado (redutora de custou ou despesa).
Entretanto, o referido Comunicado teve seu cancelamento publicado no Diário Oficial da União (DOU) do dia 27 de fevereiro do mesmo ano, permanecendo indefinidos os procedimentos a serem adotados pelos contribuintes.
II.3 – Do registro da obrigação líquida do crédito
Uma terceira forma de contabilização do crédito da contribuição ao PIS/PASEP seria o lançamento, em conta de passivo circulante, da obrigação líquida do crédito, ou seja, após descontados tais créditos, por meio controles extra-contábeis.
Esta alternativa nada mais é do que uma forma simplificada do registro comentado no item II.2 acima, uma vez que a contrapartida deste lançamento no passivo circulante da empresa será uma despesa, também líquida do crédito da contribuição devida (crédito em conta de resultado).
Dessa forma, todos os comentários relativos à tributação ou não de novas receitas contidos naquele item são válidos neste caso.
III – Conclusão
A inexistência de orientação legal sobre a necessidade e forma de contabilização dos créditos do PIS/PASEP traz ao contribuinte total insegurança acerca dos procedimentos a serem adotados.
O registro de tais créditos em conta de lucros ou prejuízos acumulados não é previsto na legislação s
Nesse sentido, espera-se uma regulamentação por parte do Executivo Federal, que permita (i) o registro em lucros acumulados, como ocorre no caso do bônus da CSLL, ou (ii) a exclusão do crédito em conta de resultado da base de cálculo da contribuição, por conta do não ingresso de novas receitas.
Nossa opinião é no sentido de que o referido crédito deverá ser registrado em conta de resultado, com contrapartida em ativo circulante, sendo que aquele lançamento em resultado deverá ser considerado como receita não tributável pelo PIS, dado não representar ingresso de nova receita para o contribuinte.
Enquanto isso não for regulamentado, permanecerá o contribuinte exposto, dentre tantas outras, a mais uma insegurança jurídica promovida pela legislação tributária.
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*associados do escritório Amaro Stuber Advogados Associados.
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