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O juízo arbitral e as necessárias alterações legislativas

O Congresso Nacional vem tendo atuação das mais destacadas, no Brasil moderno - verdadeiro respiradouro da democracia, como afirmei, durante a palestra que proferi, na 1ª Conferência Nacional de Áreas Contaminadas no Brasil, em 18 de maio de 2005, na Câmara dos Deputados, no Auditório Nereu Ramos, defendendo a utilização da arbitragem como meio necessário também para a composição de conflitos sobre direitos indisponíveis, o que já é possível, com base na legislação especial e em farta doutrina.

10/10/2005


O juízo arbitral e as necessárias alterações legislativas


Leon Frejda Szklarowsky*


O Congresso Nacional vem tendo atuação das mais destacadas, no Brasil moderno - verdadeiro respiradouro da democracia, como afirmei, durante a palestra que proferi, na 1ª Conferência Nacional de Áreas Contaminadas no Brasil, em 18 de maio de 2005, na Câmara dos Deputados, no Auditório Nereu Ramos, defendendo a utilização da arbitragem como meio necessário também para a composição de conflitos sobre direitos indisponíveis, o que já é possível, com base na legislação especial e em farta doutrina.1


Lei 9307/96


O Parlamento aprovou a Lei nº 9307, de 1996, com fonte no Projeto de Lei, de autoria do Senador Marco Maciel, que consolidou e modernizou esse instrumento de justiça privada, recebendo os aplausos do Supremo Tribunal Federal, que a considerou constitucional, em histórico julgamento. Louve-se o trabalho do senador pelo seu esforço e inteligência.


Trata-se de lei enxuta, singela e objetiva, fruto de significativa luta, visando minorar o sofrimento do povo brasileiro em busca de instrumental adequado que lhe propicie a prestação de justiça a que tem direito impostergável, inscrito na Constituição como direito fundamental, em tempo bastante curto, sem maiores delongas, porque justiça tardia não é justiça.


A arbitragem é conhecida, desde os mais remotos tempos, e sempre foi praticada pelos povos, com invulgar êxito, antes mesmo da institucionalização do Estado.


As nações mais adiantadas e prósperas utilizam-na como forma de driblar a morosidade da Justiça, em que uma causa pode levar de 10 a 20 anos para ser julgada, consoante depoimento do eminente Ministro José Augusto Delgado, em conferências que têm proferido, não por culpa do Judiciário, senão em vista da falta de estrutura deste Poder e do Código de Processo Civil cartorário, que mais se assemelha a uma estrada, com inúmeros obstáculos e esburacada, que não leva a lugar nenhum.Entretanto, trata-se de obra, fruto do notável saber de um dos maiores processualistas brasileiros, Professor Alfredo Buzaid.


Para a época, em que foi editado2 , há mais de trinta anos, realmente, constituiu-se, em avanço extraordinário da processualística, merecendo, todavia, total reformulação, como vem ocorrendo, em fatias, em comunhão com a revolução tecnológica e científica das últimas décadas. Todos reconhecem esse fenômeno desastroso.


Não obstante, também a lei de arbitragem deve harmonizar-se com a constante e célere transformação da sociedade que exige imediata posição de vanguarda do legislador.


Sentença arbitral e execução extrajudicial


O Ministro José Augusto Delgado manifesta apoio à nossa tese de que esse diploma legislativo deve ser alterado “para permitir que suas decisões sejam executadas imediatamente, quando não atendidas pela parte vencida, sem necessidade da intervenção do Judiciário...”, impondo-se ao vencido que não cumprir sentença arbitral a pena de multa, autorizando a lei, desde logo, a expedição de ofício do mandado executório e utilizando-se, mediante simples permissão do juiz da comarca, dos meios coercitivos facultados pelo Código de Processo Civil.3


Sustentamos que a sentença arbitral – título executivo judicial - seja executada pelo próprio juízo arbitral, seguindo, com as necessárias adaptações, o modelo do Decreto-lei nº 70, de 1966 (artigos 31 a 38). Este diploma autoriza o funcionamento de associações de poupança e empréstimo, institui a cédula hipotecária e autoriza a execução extrajudicial, julgada constitucional pelo Supremo Tribunal Federal e por outros Pretórios Superiores.


A permanecer como está, as partes conseguirão ter resolvido a dissensão em até 6 meses (prazo máximo para a conclusão da arbitragem), contudo, se tiver que executar a sentença, deverá ter muita paciência e esperar por longos dez, quinze ou mais anos! É a “vitória de pirro. Ganha, mas não leva!” Ou, segundo o ditado popular, é o mesmo que chover no molhado!


PEC da Reforma do Judiciário


Outro ponto de suma importância, que não pode ser olvidado, diz respeito à parte do projeto de emenda constitucional nº 45, que retornou à Câmara dos Deputados. O projeto inseriu um parágrafo ao artigo 98, conferindo permissão aos interessados resolverem seus conflitos por meio da arbitragem. Trata-se de conquista, sem precedentes, igualando-se a Portugal.Não obstante, ao afastar as entidades de Direito Público, vedando-lhes esse direito, operou um retrocesso merecedor do mais veemente repúdio. Eis o texto, tal qual aprovado na Câmara: “Ressalvadas as entidades de direito público, os interessados em resolver seus conflitos de interesse poderão valer-se do juízo arbitral na forma da lei”.


No Senado, porém, o relator, Senador José Jorge, proferiu parecer no sentido de suprimir a ressalva do referido preceito, com o que essas entidades poderão continuar a submeter os litígios ao juízo arbitral. Em memorável sessão, o Senador Romeu Tuma apresentou destaque (DVS 935), que foi aprovado, com o objetivo de manter-se a orientação do relator. O Senador Marco Maciel foi ardoroso defensor dessa idéia, que recebeu a anuência de seus pares.


Assim, a parte do projeto da emenda, alterada na Câmara Alta, incluindo esse destaque, retornou à Câmara dos Deputados, para nova votação. A outra foi promulgada em 8 de dezembro de 2003.


Oxalá, os deputados, num rasgo de sensibilidade, considerem o destaque e suprimam a malfadada ressalva, contribuindo para que o Brasil não se afaste do melhor caminho e continue na vanguarda, em consonância com a consciência universal e com os postulados consagrados pelo Direito alienígena e pelo Direito Público nacional.


Projeto de Lei 4891/2005 do Deputado Nelson Marquezelli


O nobre Deputado Nelson Marquezelli apresentou projeto de lei, com o objetivo de regular o exercício das profissões de árbitro e mediador, o que demonstra sua suma preocupação com a lisura da arbitragem e da mediação e com a impunidade dos que dela fazem uso pernicioso, com incalculáveis prejuízos para a nação e, notadamente, para as pessoas, maculando esse instituto e os juízes arbitrais honestos e cônscios de sua responsabilidade. A regulamentação realmente faz-se necessária, com a previsão de um código de ética rigoroso. A lei deverá proceder a essa regulamentação.


Entretanto, com a devida vênia e à guisa de colaboração com Sua Excelência, permito-me fazer algumas ponderações e propostas.


O árbitro exerce atividade que não é exatamente uma profissão e indispõe-se com a exigência de experiência anterior, título universitário, diplomas ou certificados registrados nos conselhos regionais, federais ou nas escolas oficiais ou reconhecidas. É da essência da arbitragem e da mediação a livre escolha de qualquer pessoa capaz, nos termos da lei civil, desde que gozem da plena confiança das partes litigante.


A especialidade e os conhecimentos técnicos e científicos constituem a conditio sine qua nom para arbitrar um conflito.Não é necessário que o árbitro escolhido seja doutor, mestre ou cientista. Poderá valer-se também de peritos ou auxiliares. Basta que seja especialista ou conhecedor da matéria ou dos fatos em si, objeto da arbitragem ou mediação. Caso contrário, estar-se-á criando uma casta superior e inatingível ou uma justiça formal e incompatível com a arbitragem.


Exemplifique-se com a hipótese de um proprietário de automóvel que apresentar defeito, após ter-se valido de uma oficina mecânica de renome. Se ingressar no juízo natural, a demanda poderá levar anos e, quando for dada a sentença, esta terá perdido o objeto, pela demora na prestação jurisdicional. Ora, nada mais prático que apelar para a justiça privada – a arbitragem ou a mediação.


A quem deverá recorrer o prejudicado, senão ao mecânico ou ao técnico, de sua plena confiança e da outra parte. Aquele, e não o doutor, o bacharel ou o detentor de título universitário, é que poderá solucionar o conflito e, sem duvida, tentar a todo custo a conciliação que é o mote da arbitragem. Eis que o árbitro escolhido poderá não ostentar um diploma universitário ou de pós-graduação, mas certamente gozará da confiança das partes e terá condições, devido à sua especialidade, de resolver a contento o litígio e até conseguir o acordo. Vingando o projeto na forma proposta, mutatis mutandi, os jurados do tribunal do júri também deveriam ser portadores de título universitário ou de pratica em julgamento do júri, o que é um verdadeiro contra-senso e desvirtuará a natureza desse juízo. Ocorrerá o mesmo com a arbitragem.


O registro em conselhos criará uma casta indesejável, sob todos os aspectos, e atenta contra esse instituto. Há que se criar um código de ética e a infração dessas normas deverá merecer severa punição. Para isto, existe um Judiciário livre e altivo. Da mesma forma que um funcionário público é processado e sancionado, também o será o árbitro infrator, no exercício da função ou em razão dela. A lei já o equipara a funcionário público, para os efeitos da legislação penal.


Conclusão


Há que se aproveitar esse projeto, para extirpar, da Lei 9307, de 1966, os artigos que mandam as partes para o Judiciário, a todo o momento, resolvendo-se as questões, na própria corte de arbitragem, visto que a submissão a este tribunal é consensual, mesmo que uma das partes seja entidade de Direito público.4


A execução deverá ser feita pelo próprio tribunal arbitral, sob pena de frustrar a existência desse instrumento de grande valia, se bem utilizado.


Lei deverá regular a conduta dos juízes arbitrais, por meio do código de ética, prevendo sanções civis e penais rigorosas para os infratores.


Os deputados federais têm a missão, das mais importantes, no sentido de aprovar o destaque, da forma como veio do Senado Federal, por ocasião da discussão do projeto de emenda constitucional.

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1*Cf. Sobre a arbitragem, sua história, evolução, origem, utilização, no direito pátrio e comparado, constitucionalidade da lei de regência, propostas de alteração e observações sobre a PEC 45, consulte-se nosso artigo “A nova visão da arbitragem”, publicado na REVISTA TRIBUTÁRIA E DE FINANÇAS PÚBLICAS, RT, São Paulo, nº 58, setembro-outubro de 2004 – 1ª parte; 2ª parte publicada na Revista Tributária e de Finanças Públicas nº 59, novembro/dezembro 2004, e, na íntegra, na Revista Portuguesa de Direito do Consumidor, Coimbra, Portugal, nº 39, setembro de 2004.

* Consulte-se também nosso artigo A arbitragem e a reforma do Poder Judiciário, publicado no Suplemento Direito & Justiça, do Correio Braziliense, de 29 de novembro de 2004, p. 3. Consultem-se ainda nossos trabalhos, sobe a matéria, publicados na Revista Prática Jurídica, Editora Consulex, Brasília, nºs. 27, de 30 de junho de 2004, 28 de 31 de julho de 2004, 29 de 31 de agosto de 2004, 30 de 30 de setembro de 2004, 31 de 31 de outubro de 2004, 32 de 30 de novembro de 2004, 33 de 31 de dezembro de 2004, 34 de 31 de janeiro de 2005, 35 de 28 de fevereiro de 2005, 36 de 31 de março de 2005 e 38 de 31 de maio de 2005.

* O filme, Uma Mulher de Talento, protagonizado pela excelente atriz Julia Roberts, retrata, com fidelidade e realismo, que a morosidade do Judiciário na prestação de serviço jurisdicional não é fenômeno apenas brasileiro e a submissão da solução dos conflitos à arbitragem é um imperativo inafastável.
2 Cf. Lei 5869, de 11 de janeiro de 1973.

3Cf. Entrevista à Revista Jurídica Consulex nº 161, de 30 de setembro de 2004, p. 11, Editora Consulex, Brasília, DF.

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*Advogado, escritor e juiz arbitral





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