Quem vê de fora acredita que viajar a trabalho é o máximo. Não é. Acredite. Outro dia ouvi que a melhor viagem a trabalho é a primeira, e só.
Claro que dá orgulho colecionar carimbos no passaporte, mas normalmente tudo o que conhecemos numa viagem são: a) o aeroporto (ou melhor, um terminal, no máximo dois, porque os aeroportos lá fora são imensos), b) o trajeto até o hotel e c) alguma sala de reunião. E no fim todos os hotéis e salas de reunião são iguais, em qualquer lugar do mundo. Sem falar que viajar cansa. E aeroportos cansam. E a comida é péssima.
Talvez para tentar driblar os inconvenientes de tanta viagem de trabalho, os viajantes frequentes vão criando suas rotinas. Como, por exemplo, sempre reservar o mesmo assento, chamando as letras pelos códigos do pessoal da aviação: 2 fox ou 13 delta. Ou saber qual a fila do raio x que costuma ser mais rápida. Dizem os experts que não se deve entrar em fila que tenha muita mulher, porque sempre um cinto, um brinco, ou um detalhe do sapato fazem apitar o detector de metais. Eu mesma, aliás, tenho a rotina de viajar de legging, camiseta, sapatilha (para facilitar na hora de tirar e calçar) e não usar nada que possa “apitar”.
Durante o voo as pessoas também têm seus costumes, muitas vezes bem curiosos. Soube de um sujeito que disse para a comissária de bordo, assim que as portas do avião se fecharam: “122 passageiros e 4 extras”. Explicou que viajava com frequência e havia desenvolvido o hábito de contar os passageiros. Não errava nunca.
Uma opção para voos longos é já entrar no avião com os fones de ouvido, tanto os do celular quanto aqueles enormes que estão na moda de novo. Evita conversas desagradáveis com pessoas desconhecidas que por acaso vão dormir – e roncar – ao seu lado por umas 9 horas. Aliás, em qualquer voo com mais de 9 horas de duração o ideal é ter um planejamento estratégico para poder usar o banheiro. Normalmente durante as refeições é o ideal. Você vai ficar sem comer, é verdade, mas a comida é péssima, lembra?
Voos longos também são uma ótima oportunidade para colocar a leitura ou o cinema em dia (de São Paulo para Los Angeles, num voo direto, dá para assistir a uns 5 filmes), ou então preparar aquele relatório complicado que você adiou por alguns dias. Ou simplesmente dormir, para quem consegue. Pensando bem, dormir não é uma opção. Esqueça.
Quanto às malas, quanto menos, melhor. Se puder ser de mão, bem prática, não corre o risco de você chegar num país e sua mala só chegar 3 dias depois, quando você já está voltando. Ninguém merece sair correndo para comprar roupas novas na véspera de uma reunião importante. E quem vai fazer a bainha da calça, se precisar?
Um capítulo à parte são os hotéis. Por que os corredores de hotéis têm que ser tão confusos? Não sei se sou só eu, mas tenho dificuldade de lembrar para que lado ir ao sair do elevador. Definitivamente não sou só eu não, porque já encontrei uns perdidos perambulando pelos corredores. Chegamos até a trocar olhares de mútuo reconhecimento. Sim, somos da mesma espécie. Já inventaram um GPS para hotéis?
Um executivo me contou que viajava tanto a trabalho, dormindo cada noite num hotel diferente, que acabava se confundindo com a disposição dos móveis e se acidentava quase sempre que se levantava. A solução? Deixar algumas luzes acesas, para não correr o risco de errar o caminho até o banheiro.
No capítulo comidas de viagens, não aprendi ainda a refrear meu impulso de tentar experimentar a culinária local. Com isso já me ofereceram insetos, frutos do mar que pareciam alienígenas spielberguianos e outras coisinhas mais. Na Suécia eu comi carne de rena, e juro que foi por engano. Não li que era rena, apenas que era roast-beef. Se o Papai Noel tiver uma rena a menos no trenó, já sabem de quem foi a culpa. Tem quem goste, mas eu fiquei arrasada depois. Na Suíça me recusei a comer carne de cavalo; compensei com queijo. Comi frango frito no coffe-break da manhã numa reunião no Panamá. E não tenho muita certeza do que comi na China – mas gostei de quase tudo.
Mesmo a trabalho, no fim, as viagens acabam sendo uma oportunidade para ampliarmos nossa percepção do mundo. Tem muita coisa diferente por aí e muita gente interessante. E nas viagens, quando estamos longe de tudo e de todos, acabamos nos conhecendo um pouco melhor. Além de colecionar muitas estórias – a maioria, boas.
Um amigo, muito bem casado, viveu a estória mais engraçada que conheço a respeito de viagens a trabalho. No avião, na hora do desembarque, ofereceu ajuda a uma passageira que viajava sozinha com um bebê de colo. Ao invés dele sair carregando a bolsa, como havia imaginado, acabou descendo do avião com o bebê no colo e a mãe do bebê a tiracolo. Claro que deu de cara com um vizinho, que foi logo lhe dando um tapinha nas costas, uma piscadinha de cumplicidade e comentando, em tom malicioso: “Viajar muito dá nisto...”. Pois é.
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* Christina Montenegro Bezerra é diretora de assuntos jurídicos da América Latina da empresa Edwards Lifesciences, integrante do Jurídico de Saias
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