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Inconstitucionalidade da "taxa do lixo" instituída pela Lei Municipal nº 13.478/02

A Lei Municipal nº 13.478/02 instituiu a Taxa de Resíduos Sólidos Domiciliares - TRSD, destinada a custear os serviços divisíveis de coleta, transporte, tratamento e destinação final de resíduos sólidos domiciliares, de fruição obrigatória, prestados em regime público, nos limites territoriais do Município de São Paulo.

24/4/2003

Inconstitucionalidade da "taxa do lixo" instituída pela Lei Municipal nº 13.478/02

Daniel Gatschnigg Cardoso*

A Lei Municipal nº 13.478/02 instituiu a Taxa de Resíduos Sólidos Domiciliares - TRSD, destinada a custear os serviços divisíveis de coleta, transporte, tratamento e destinação final de resíduos sólidos domiciliares, de fruição obrigatória, prestados em regime público, nos limites territoriais do Município de São Paulo.

Constitui fato gerador da Taxa de Resíduos Sólidos Domiciliares - TRSD a utilização potencial dos serviços divisíveis de coleta, transporte, tratamento e destinação final de resíduos sólidos domiciliares, de fruição obrigatória, prestados em regime público.

São contribuintes da Taxa de Resíduos Sólidos Domiciliares - TRSD os munícipes-usuários inscritos no Cadastro Imobiliário Fiscal do Município, os usuários dos serviços que integram o Sistema de Limpeza Urbana do Município de São Paulo, que compreendem as seguintes atividades:

I - a coleta, transporte, tratamento e destinação final de resíduos sólidos de qualquer natureza;

II - a varrição e asseio de vias, túneis, abrigos, monumentos, sanitários, viadutos, elevados, escadarias, passagens, vielas, praças, mercados e demais logradouros públicos;

III - a raspagem e remoção de terra, areia e quaisquer materiais carregados pelas águas pluviais para as ruas e logradouros públicos pavimentados;

IV - a desobstrução de bueiros, bocas-de-lobo, poços de visita, galerias pluviais e correlatos;

V - a implantação e operação de transbordo e transferência, bem como de unidades de processamento, tratamento e destinação final, necessárias à execução dos serviços previstos no inciso I;

VI - a limpeza de ruas e logradouros públicos onde se realizem feiras públicas e outros eventos de acesso aberto ao público;

VII - os serviços de conservação de áreas verdes de domínio público;

VIII - a capinação, a raspagem, o sacheamento e a roçada, bem como o acondicionamento e coleta dos resíduos provenientes dessas atividades, visando à salubridade ambiental e a promoção da estética urbana do Município;

IX - a implantação e operação de sistemas de triagem e separação dos resíduos sólidos;

X - a limpeza de áreas e tanques de contenção de enchentes.

Como se sabe, o inciso II do artigo 145 da Constituição Federal conferiu aos municípios a competência para instituição de taxas, em razão do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição.

Ocorre que os artigos 21 a 24 da Lei Municipal nº 13.478/02, em total descompasso o arquétipo constitucional idealizado pelo legislador originário, ampliaram a competência tributária do município, ao classificar os serviços prestados da seguinte forma:

Art. 21 - Segundo sua natureza, os serviços de limpeza urbana prestados em regime público classificam-se em:

I - serviços divisíveis;

II - serviços indivisíveis essenciais; e

III - serviços indivisíveis complementares.

Art. 22 - Integram os serviços divisíveis as atividades de coleta, transporte, tratamento e destinação final de:

(...)

Art. 23 - São serviços de limpeza urbana indivisíveis essenciais, entre outros:

(...)

Art. 24 - São serviços indivisíveis complementares os demais serviços indivisíveis de limpeza urbana, que tenham natureza paisagística ou urbanística.

Diante disso, os artigos 21 a 24 da Lei Municipal nº 13.478/02 recaíram em inarredável inconstitucionalidade, ao ampliar a classificação dos serviços passíveis de tributação por meio de taxas municipais instituídos pela Constituição Federal.

Isto porque, os serviços passíveis de "taxação" pelos municípios seriam somente aqueles prestados sob a característica da divisibilidade, não sendo possível a tributação de serviços indivisíveis quaisquer que sejam, os quais já são tributados por meio dos impostos.

Partindo-se dessa premissa, seria admissível tão somente como fato gerador a coleta dos resíduos sólidos na residência de cada contribuinte, não abrangendo o serviço de limpeza das vias e logradouros públicos, sob pena de infringir, de imediato, a natureza divisível da taxa. Nesse particular, o Min. Ari Pargendler manifestou-se com inequívoco acerto, quando analisou situação semelhante ao tema:

TRIBUTÁRIO. TAXAS. LEI 6.989/1966, NA REDAÇÃO DADA PELA LEI 10.921/ 1990, DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO. LEI 8.822/1978. TAXA DE LIMPEZA URBANA. 1. A taxa de limpeza urbana, no modo como disciplinada no município de São Paulo, remunera - além dos serviços de "remoção de lixo domiciliar" - outros que não aproveitam especificamente ao contribuinte ("varrição, lavagem e capinação"; "desentupimento de boeiros e bocas-de-lobo"); ademais, a respectiva base de cálculo não está vinculada à atuação estatal, valorizando fatos incapazes de mensurar-lhe o custo 3 (localização, utilização e metragem do imóvel) - tudo com afronta aos arts. 77, "caput", e 79, II, do CTN. 2. A taxa de conservação de vias e logradouros públicos, assim como instituída no município de São Paulo, tem como fato gerador serviços que beneficiam toda a comunidade (de conservação do calçamento e dos leitos não pavimentados das ruas, praças e estradas do município), insuscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários, contrariando o disposto no art. 79, III, do CTN. 3. Taxa de combate a sinistros. O fato de o município de São Paulo assumir, contratualmente, a responsabilidade pelo custeio, em parte, dos serviços prestados pelo estado de São Paulo no combate e extinção de incêndio ou de outros sinistros, não o autoriza a instituir taxa para obter os recursos correspondentes. Recurso Especial não conhecido.(RESP 61604/SP; STJ; Segunda Turma; Relator Min. ARI PARGENDLER; Julgado em 05/06/1997)

Ademais, como bem observou o juiz Guilherme de Souza Nucci, da 9ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, em decisão que suspendeu a cobrança da taxa do lixo cobrada pela Prefeitura de São Paulo de um condomínio da cidade, a proposta da prefeitura em permitir que o próprio contribuinte indique a quantia de produção de lixo demonstra que o custo do serviço é indivisível.

Finalmente, a inclusão do serviço de limpeza urbana dentre os serviços custeados pela "taxa do lixo" caracterizaria bi-tributação, uma vez que o IPTU já incorporou uma alíquota destinada ao custeio do serviço de limpeza pública.

Por este motivo, poderia ser questionada a constitucionalidade da "Taxa do Lixo" instituída pela Lei Municipal nº 13.478/02 mediante a propositura da medida judicial cabível, a fim de afastar suas exigências.

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*escritório Thiollier e Advogados.

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