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A Anvisa e a produção de remédios manipulados

A ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária, criada pelo governo federal para controle das práticas de produção de medicamentos, vigilância, registros de laboratórios e de produtos farmacêuticos, licenças, etc. realizou, sob o título “Manipulare”, uma consulta “pública” sobre a continuidade de produção de medicamentos por farmácias de manipulação. A pretensão desse expediente foi não só fiscalizar suas atividades como também, diante de suas muitas e severas exigências, reduzi-las significativamente.

27/9/2005


A Anvisa e a produção de remédios manipulados


Juracyr G.A.Saint-Martin*


A ANVISA - Agência Nacional de Vigilância Sanitária, criada pelo governo federal para controle das práticas de produção de medicamentos, vigilância, registros de laboratórios e de produtos farmacêuticos, licenças, etc. realizou, sob o título “Manipulare”, uma consulta “pública” sobre a continuidade de produção de medicamentos por farmácias de manipulação. A pretensão desse expediente foi não só fiscalizar suas atividades como também, diante de suas muitas e severas exigências, reduzi-las significativamente.


A Agência já proibiu os farmacêuticos magistrais, inclusive, de manipularem medicamentos que já estejam disponíveis em farmácias, fabricados por grandes laboratórios multinacionais. Se por um lado a pretendida fiscalização e o controle de qualidade representam uma iniciativa válida, por outro acaba favorecendo, e muito, aqueles laboratórios e prejudicando a população brasileira na aquisição de medicamentos, sobretudo as classes menos favorecidas.Isso porque medicamentos manipulados custam em média mais barato que os industrializados, inclusive os genéricos que, quando aqui foram lançados, obrigou o governo a suportar imensas pressões por parte dessas indústrias que, já em 2002, movimentavam mais de 12 bilhões de dólares de faturamento anual.


A Associação Nacional de Farmacêuticos Magistrais entrou na briga, e com razão, porque um farmacêutico magistral, como bom conhecedor de química que ele deve ser, tem como obrigação saber se o medicamento receitado pode causar efeitos colaterais, choque anafilático e até mesmo se o doente é alérgico ou não a aromatizantes, corantes e conservantes. Ele prepara o medicamento para idosos e crianças em cápsulas de tamanhos condizentes com a pessoa, podendo se valer de outras formas farmacêuticas como xaropes, para facilitar a ingestão; manipula o produto na quantidade necessária, sem sobras, desobrigando o doente de comprar uma caixa inteira para só utilizar parte dela, dentre outras situações mais que beneficiam o consumidor.


O repórter Carlos Nascimento, do Jornal da Band, apresentou recentemente uma matéria indagando se “os remédios interessavam mais aos doentes ou aos laboratórios”, informando também que estes ofereciam vantagens a médicos para receitarem seus produtos que acabavam onerando o preço do medicamento. Ele terminou dizendo que os representantes de laboratórios foram procurados, mas não quiseram comentar o assunto.


É interessante observar que a Constituição Federal estabelece que a saúde é um direito de todos e um dever do estado (art.196); preceitua o princípio da garantia da liberdade de escolha do profissional (art.5º-III), significando que a pessoa tem o direito de procurar um médico, um farmacêutico ou um Terapeuta Naturista para cuidar de sua saúde e tratar-se através de medicamentos (produtos químicos, sintéticos) ou pelas Terapias Naturais (fitoterapia, homeopatia, acupuntura, etc.); e dispõe que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (art.5º-II). Por outro lado, farmacêuticos e farmácias são fiscalizados pelos Conselhos de Farmácia e estes, inclusive, pela Vigilância Sanitária.


Logo, é de se estranhar, no mínimo, que a ANVISA esteja desenvolvendo aquela pesquisa (de nº 31, veiculada no Diário Oficial da União de 20-04-05, que poucas pessoas lêem, e pelo seu site, que muito pouca gente conhece e/ou consulta), porque ela fere direitos constitucionais e legais do consumidor, interfere em áreas que pertencem a outros órgãos, beneficiam laboratórios multinacionais, sacrifica aposentados e pessoas de baixa renda na aquisição de medicamentos e ainda desconsiderou que no Brasil existem cerca de 40 milhões de pessoas sem acesso a eles e, essencialmente, a opinião do grande público consumidor.

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*Advogado e membro do IAMG – Instituto dos Advogados de Minas Gerais







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