O decreto-lei 288/67, que tem eficácia de lei complementar por ser lei condicionante de legislação ordinária, surgiu como imposição da realidade ao governo da época, ou seja, que sem incentivos fiscais, não se conseguiria o desenvolvimento do Norte do país 1. Pautou-se no já bem sucedido plano para desenvolvimento do Nordeste, iniciado, em sua fase atual, por Celso Furtado, no início da década de 60. Buscou-se, assim, criar um núcleo central de desenvolvimento que alavancasse os primeiros esforços de estímulos à região amazônica iniciados com o SPVEA, nos moldes da Sudene.
A ideia de centrar em Manaus este foco de desenvolvimento para atrair empresas, que compensariam a distância entre os centros de produção do país e dos mercados com os incentivos outorgados, desfazendo-se a imagem de que a Amazônia deveria ser apenas um "museu do índio" e limitar-se a trabalhar com produtos naturais ou artesanais, levou o governo militar à edição do Decreto-lei n. 288/67, que é, de rigor, um diploma com um único intuito: outorgar INCENTIVOS FISCAIS em prol do progresso regional, todo o resto sendo decorrência 2.
A visão de seus articuladores revelou-se, no tempo, consistente, sendo hoje a Zona Franca de Manaus e a Amazônia um polo de crescimento, graças a tais incentivos.
Os excelentes resultados que decorreram da implantação dessa política foram de tal ordem, que os constituintes decidiram manter tais estímulos por 25 anos (CF 88 – art. 40), prorrogados por mais 10 anos, com a EC n. 42/033.
Como advogado do Governo do Amazonas, sustentei perante a Suprema Corte que o espectro de tal política estimuladora não se refere exclusivamente aos tributos existentes quando de sua implantação, mas a todos aqueles que viessem a ser criados com espectro semelhante, com o reconhecimento do Pretório Excelso, por unanimidade, da procedência da tese 4, reafirmando, inclusive, decisão anterior, prolatada em processo no qual também atuei 5.
Em outras palavras, o DL 288/67, com eficácia de lei complementar naquilo que suas normas condicionaram a produção normativa de todos os entes da Federação, passou a ser norma constitucional, a partir do artigo 40 do ADCT, com vigência até 2023 por força do artigo 92 do ADCT, introduzido pela E.C. 42/03 6.
Tal exegese, repetidas vezes, foi confirmada pela Suprema Corte, reconhecendo-lhe caráter mais abrangente que o espectro dos benefícios fiscais concedidos quando de sua edição 7.
Até 2023, portanto, permanece todo o arsenal de incentivos, pois passou a ter tratamento supra-administrativo, visto que nenhuma legislação complementar, ordinária ou regulamentar poderá alterar sua consolidação, nos termos em que foi estabelecido pelos artigos 40 e 92 do ADCT 8.
À evidência, o estatuto próprio de tal política de incentivos exigia, desde o início, um tratamento também diferencial na administração dos estímulos, não só para concedê-los, como para permitir sua livre fruição, sujeita à fiscalização também especial, pois o próprio Ministro da Fazenda, neste campo, estaria adstrito aos limites impostos pelo regime jurídico da Zona Franca e pelo Ministério do Interior, o verdadeiro administrador da área estimulada da Amazônia.
A Suframa, portanto, constitui-se num órgão não só de administração do polo desenvolvimentista, mas de fiscalização, desde a aprovação dos projetos considerados vitais para a região, com poderes de definir, inclusive, a qualidade dos produtos, sua tipologia, classificação e autorização dos benefícios a serem usufruídos por quem resolva acatar os desafios sinalizados pela Zona Franca de Manaus 9.
E este ponto é crucial para o presente breve estudo.
A criação da Suframa, como órgão administrador, em todos os aspectos, desta presença estimuladora de empresas no polo de progresso colimado, foi o caminho encontrado para permitir que a necessária descentralização econômica e regional alavancasse o desenvolvimento da região amazônica através da Zona Franca.
A função da Suframa, portanto, passou a ser de promotora dos investimentos, identificando todas as alternativas econômicas da região, atraindo empreendimentos e objetivando a geração de empregos e renda.
Nesta função, a autarquia criada pelo DL 288/67 ganhou relevância de tal ordem, que a Zona Franca, em todos os aspectos tributários, administrativos, financeiros e econômicos, tornou-se dependente da Superintendência criada por este diploma legislativo 10.
E aqui é fundamental esclarecer um aspecto diferenciador das funções pertinentes ao Ministério da Fazenda e ao Ministério do Interior, definindo quais as frentes de atuação de um e outro no aspecto essencial da criação da Zona Franca, ou seja, o usufruto de incentivos fiscais, de benefícios tributários, de estímulos vinculados a impostos e outras espécies fiscais.
A aceitação e aprovação de um projeto para gozar dos benefícios da Zona Franca deixou de ser da competência do Ministério da Fazenda, como ocorreria em qualquer outro estímulo de natureza não regional ou setorial, e passou a ser exclusivamente do Ministério do Interior e de sua autarquia, que ganhou competência para definir o projeto a ser aprovado, o estímulo a ser outorgado, a classificação fiscal a que pertiniria o produto a ser fabricado, competência esta não compartilhada, mas exclusiva. Já ao Ministério da Fazenda competia e compete, UMA VEZ APROVADO O PROJETO, apenas verificar se as condições estimuladas e as condições impostas pela Suframa para o gozo do benefício, estão sendo cumpridas 11.
O DL 288/67 e o artigo 40 do ADCT não ofertaram ao Ministério da Fazenda outros poderes, senão aqueles de fiscalizar o rigoroso cumprimento das condições impostas pela Suframa para gozo dos benefícios.
É de se lembrar que sempre que outros Ministérios ou o próprio Governo Federal pretenderam reduzir o espectro da abrangência dos poderes do Ministério do Interior, da Suframa e os direitos dos beneficiários de incentivos CONSTITUCIONALIZADOS DESDE 05/10/1988, não foram bem sucedidos, e sim atalhados em sua invasão maculadora da lei maior, pelo Pretório Excelso 12.
Funções, portanto, claras e distintas entre a Suframa e a SRFB. A aprovação com o reconhecimento da plenitude do gozo de incentivos ao beneficiário que preencha os requisitos previstos em lei, pela Suframa; e direito a ampla fiscalização pela SRFB quanto à verificação do efetivo cumprimento dos termos e condições aprovados.
Em nenhum momento foi permitido à SRFB, quer pelo DL 288/67, quer pelo art. 40 do ADCT, anular incentivos aprovados, a pretexto de sua incorreta aprovação - a não ser em caso de dolo, fraude ou culpa risco de a própria União poder ser responsabilizada por danos patrimoniais e morais (art. 37, § 6º, da CF), com direito a ação de ressarcimento, IMPRESCRITÍVEL, contra o agente público que assim tiver agido, levando o erário a responder pelos prejuízos causados por sua conduta. Mesmo depois de deixar a função ou cargo até o fim de sua vida, estará o agente público sujeito a tal ação de ressarcimento, por força do § 5º do artigo 37 da lei suprema 13.
Parece-me, pois e para concluir, que, no que concerne aos estímulos outorgados pela Suframa em projetos pela instituição examinados, técnica e juridicamente, sua competência transcende a da Secretaria da Receita Federal do Brasil, que, todavia, continua com plenos poderes para fiscalizar o cumprimento dos termos autorizados pela autarquia federal para gozo de incentivos.
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1 Em livro coordenado por Carlos Alberto de Moraes Ramos Filho, Marcelo Magalhães Peixoto e por mim, com a colaboração de Marco Aurélio Greco, Valéria Furlan, Alísio Cláudio Barbosa Ribeiro, Danielle Maia Queiroz, Ellen Larissa de Oliveira Frota, Ernesto dos Santos Chaves da Rocha, Fábio Pereira Garcia dos Santos, Glauco Lubacheski de Aguiar, Omara Oliveira de Gusmão, Rachel Benchaya, Rogério Emílio de Andrade, Ives Gandra Martins, Adilson Rodrigues Pires, Vânya Senegalia Morete Spagolla, Yuri Dantas Barroso, Maria de Fátima Ribeiro, German Alejandro San Martin Fernández, Marco Evangelista, Carlos Alberto de Moraes Ramos Filho, Monique Cruz, Vera Carla Nelson de Oliveira Cruz, André Elali e Ézio Giobatta Bernardinis, procuramos, comemorando os 40 anos da Zona Franca de Manaus, ofertar uma visão abrangente do que representou tal pólo de desenvolvimento para a Amazônia (Tributação na Zona Franca de Manaus (comemoração aos 40 anos da ZFM), Ed. APET/MP Editora, São Paulo, 2008).
2 André Elali lembra que: “ No caso da Zona Franca de Manaus, infere-se que ela foi instituída pelo Decreto-lei n° 288, de 1967, para tornar a região um pólo de desenvolvimento industrial e, no mesmo diapasão, servir para reduzir desigualdades regionais e sociais.
A implementação da Zona Franca de Manaus, de 1970 a 1985, causou um aumento expressivo na população de Manaus — de 300 mil para 800 mil habitantes.
Ao seu turno, atividades antes sem qualquer importância econômica passaram a ser fomentadas, como a pesca e o extrativismo, destacando-se os seguintes produtos: madeira de lei, castanha-dopará, borracha, goma e piaçava.
A legislação que vem sendo editada para a manutenção da Zona Franca em questão instituiu vários incentivos diferentes, tais como: (i) isenção de II e do IPI em relação à importação de insumos destinados à exportação e à produção para consumo local, (ii) redução de II sobre insumos necessários em determinados processos de industrialização, (iii) equiparação, para fins fiscais, à exportação quanto à venda de mercadorias do restante do Brasil com isenção de IPI e de ICMS, (iv) isenção de IPI e de ICMS sobre vendas ao exterior, (v) redução de 250/o para 100/o do IOF sobre operações de câmbio no que diz respeito às importações, (vi) restituição de ICMS, no âmbito estadual, de 45°/o a 100%, a depender da atividade envolvida, (vii) isenção, para alguns serviços, de ISS, (viii) isenção por dez anos, prorrogáveis, do IRPJ das empresas instaladas na região e (ix) regime especial de IRPJ para empresas que atendam a determinados requisitos.
Por tais motivos, houve um crescimento evidente do setor industrial local, fomentando toda a produção e o comércio da região, com o conseqüente aumento de empregos e redução de desigualdades regionais e sociais, promovendo-se, pois, o desenvolvimento econômico. De alguns anos para o atual, tem sido evidenciado o crescimento econômico da região, como nos anos de 2003, 2004 e 2005, em que as atividades apresentaram aumento de produção de quase 40°/o em relação aos anos anteriores” (Tributação na Zona Franca de Manaus (comemoração aos 40 anos da ZFM), coordenação de Ives Gandra Martins/Carlos Alberto de Moraes Ramos Filho e Marcelo Peixoto, ob. cit. p. 470/471).
3 Comentei: “O artigo 40 foi imposição do Estado do Amazonas à Constituinte, pois seu relator era Deputado amazonense (Bernardo Cabral).
Todos os incentivos foram mantidos pelo prazo de 25 anos, isto é, até 2.013.
Entendo que a redação assegura o direito adquirido no regime jurídico existente para as empresas lá situadas até 2.013, independentemente de alterações feitas, por lei federal, para novos projetos ou empreendimentos.
Em outras palavras, na leitura que faço deste dispositivo, o regime jurídico, para todos os beneficiários dos estímulos mencionados até 2.013, está garantido, podendo as variações que no futuro vierem a ser introduzidas por lei federal, apenas atingir empreendimentos novos, pois, para estes não há regime assegurado no que diz respeito a critérios de aprovação. Não há direito adquirido. Para mim, o Decreto nº 205/91, no que modificou o regime passado, é inconstitucional por criar obrigação modificativa, só permitida por lei, no que concerne a novos critérios” (grifos meus)
(Comentários à Constituição do Brasil, 9º volume, Ives Gandra Martins/Celso Ribeiro Bastos, Ed. Saraiva, São Paulo, p. 366/367).
4 “Supremo Tribunal Federal - COORD. DE ANÁLISE DE JURISPRUDÊNCIA - 07/12/2000, D.J. 07.11.2003, TRIBUNAL PLENO, EMENTARIO N°2131 -2 AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N. 2.348-9 DISTRITO FEDERAL
RELATOR : MIN. MARCO AURÉLIO
REQUERENTE: GOVERNADOR DO ESTADO DO AMAZONAS
ADVOGADO: PGE-AM - JORGE HENRIQUE DE FREITAS PINHO
ADVOGADO: IVES GANDRA DA SILVA MARTINS
REQUERIDO: PRESIDENTE DA REPÚBLICA
ZONA FRANCA DE MANAUS - PRESERVAÇÃO CONSTITUCIONAL.
Configuram-se a relevância e o risco de manter-se com plena eficácia o diploma atacado se este, por via direta ou indireta, implica a mitigação da norma inserta no artigo 40 do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias da Carta de 1988:
Art. 40. mantida a Zona Franca de Manaus, com suas características de área livre de comércio, de exportação e importação, e de incentivos fiscais, pelo prazo de vinte e cinco anos, a partir da promulgação da Constituição.
Parágrafo único. Somente por lei federal podem ser modificados os critérios que disciplinaram ou venham a disciplinar a aprovação dos projetos na Zona Franca de Manaus.
Suspensão de dispositivos da Medida Provisória n. 2.037-24, de novembro de 2000.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, preliminarmente, por unanimidade de votos, quanto ao artigo 14, § 2º, inciso I, da Medida Provisória n 2.037-24, de 23 de novembro de 2000, em não conhecer do pedido formulado na ação no que direcionado contra a expressão “ou em área de livre comércio”. Votou o Presidente. Prosseguindo no julgamento, o Tribunal, por unanimidade, deferiu a cautelar para suspender a eficácia do artigo 32 da citada medida provisória. Votou o Presidente. Relativamente ao artigo 51, o Tribunal deferiu a liminar para emprestar interpretação conforme, considerado o que decidido quanto ao artigo 32 da mesma medida provisória. Votou o Presidente. Em seguida, após o voto do Senhor Ministro- Relator, deferindo a cautelar, com eficácia ex nunc, para suspender a expressão “a empresa estabelecida na Zona Franca de Manaus, na Amazônia Ocidental”, constante do artigo 14, § 2º, inciso I, da medida provisória, o julgamento foi suspenso por falta de quorum, em virtude da saída ocasional do Senhor Ministro Carlos Velloso (Presidente). Ausentes, justificadamente, os Senhores Ministros Celso de Mello e Maurício Corrêa. Falou pelo requerente o Dr. Ives Gandra da Silva
Martins. Plenário, 6.12.2000.
Prosseguindo no julgamento, o Tribunal, por unanimidade, após o Senhor Ministro Marco Aurélio (Relator) ter reajustado a extensão de seu voto, limitando-o à Zona Franca de Manaus, deferiu a cautelar com eficácia ex nunc, quanto ao inciso 1 do § 2 do artigo 14 da Medida Provisória n 2.037-24, de 23 de novembro de 2000, para suspender a eficácia da expressão “na Zona Franca de Manaus”. Votou o Presidente. O Ministro-Relator, na seqüência dos trabalhos, chamou o processoà ordem, propondo complementação do julgamento. Deliberou o Tribunal, por unanimidade, conceder a liminar para, sem redução de texto, suspender a eficácia do artigo 51 da Medida
Provisória n2 2.037-24, de 23 de novembro de 2000, relativamente ao inciso I do § 2º do artigo 14 quanto à expressão “na Zona Franca de Manaus”. O Senhor Ministro Carlos Velloso (Presidente) não votou nesta proposição de complementação do julgamento em virtude de sua saída ocasional.
Plenário, 7.12.2000.
Brasília, 7 de dezembro de 2000.
CARLOS VELLOSO PRESIDENTE
MARCO AURÉLIO – RELATOR” (grifos meus).
5 “Supremo Tribunal Federal - COORD. DE ANÁLISE DE JURISPRUDÊNCIA, D.J. 12.04.2002,
EMENTÁRIO Nº 2064 – 1, 18/03/98, TRIBUNAL PLENO.
ACÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N. 1.799-2 DISTRITO FEDERAL
RELATOR : MIN. MARCO AURÉLIO
REQUERENTE: GOV. DO ESTADO DO AMAZONAS
ADVOGADOS: OLDENEY SÁ VALENTE E OUTRA
ADVOGADO: IVES GANDRA DA SILVA MARTINS
REQUERIDO: PRESIDENTE DA REPÚBLICA
REQUERIDO: CONGRESSO NACIONAL
ZONA FRANCA DE MANAUS - MANUTENÇÃO - INCENTIVO FISCAIS. Ao primeiro exame, concorrem o sinal do bom direito e o risco de manter-se com plena eficácia medida provisória que, alterando a redação de dispositivo de lei aprovada pelo Congresso Nacional - do artigo 77 da Lei n° 9.532, de 10 de dezembro de 1997- projeta no tempo a mitigação do quadro de incentivos fiscais assegurado relativamente à Zona Franca de Manaus, por vinte e cinco anos, mediante preceito constitucional.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em deferir o pedido de medida cautelar, para suspender, até a decisão final da ação direta, a eficácia do § 1º do art. 77, da Lei n. 9.532, de 10/12/97, na redação dada pelo art. 11 da Medida Provisória n° 1.614-16, de 05/03/98; em indeferir a cautelar relativamente ao seu § 2°; e julgar prejudicado o pedido de cautelar quanto ao § 3°.
Brasília, 18 de março de 1998.
CARLOS VELLOSO - PRESIDENTE
MARCO AURÉLIO – RELATOR”.
6 O artigo 92 do ADCT tem a seguinte dicção:
“Art. 92. São acrescidos dez anos ao prazo fixado no art. 40 deste Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003) (Vide Decreto nº 7.212, de 2010)”.
7 Esta foi a decisão que orientou todas as demais manifestações da Suprema Corte:
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N. 310-1 - DISTRITO FEDERAL (MEDIDA CAUTELAR).
REQUERENTE: GOVERNADOR DO ESTADO DO AMAZONAS
REQUERIDOS: SECRETÁRIOS DE FAZENDA OU FINANÇAS DOS ESTADOS E DO DISTRITO
FEDERAL, MINISTRA DA ECONOMIA FAZENDA E PLANEJAMENTO.
E M E N T A — Ação direta de inconstitucionalidade. Convênios ICMS 1, 2 e 6, de 1990. Alegação plausível de ofensa ao artigo 40 ADCT/88, que, em face da ponderação dos riscos contra postos, oriundos da pendência do processo, aconselha a suspensão liminar dos atos normativos impugnados. Liminar deferida.
2. Ação direta de inconstitucionalidade de convênios interestaduais sobre o ICMS, celebrados em reunião do CONFAZ - Conselho Nacional de Política Fazendária: litisconsórcio passivo dos Estados pactuantes.
ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, em deferir a medida cautelar e suspender, até o julgamento final da ação, a vigência dos Convênios ICMS nºs 1, 2 e 6, todos de 30/5/90, firmados em reunião do Conselho
Nacional de Política Fazendária da mesma data.
Brasília, 25 de outubro de 1990.
NÉRI DA SILVEIRA — PRESIDENTE
SEPÚLVEDA PERTENCE - RELATOR” (D.J. 16.04.93, EMENTÁRIO N. 1699-1, 25.10.90, Tribunal Pleno).
8 O Ministro Marco Aurélio de Mello, na ADIN n. 2348-9/DF esclarece: “A jurisprudência tem-se mostrado harmônica com essa óptica. No julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade Q 310.1, o Relator, Ministro Sepúlveda Pertence, entendeu pelo conflito, com a Carta da República, de toda e qualquer norma que, no prazo de vinte e cinco anos, restrinja, reduza ou elimine favores fiscais existentes, como veio a ocorrer com a edição da Medida Provisória n 2.037/24. Ao acompanhar Sua Excelência, considerado o conflito com a Constituição Federal de convênio que acabava por reduzir o “statu quo” fiscal da Zona Franca de Manaus, tive oportunidade de ressaltar: “Quando se alude a incentivo fiscal, estabelece-se a necessidade de preservação da prática fiscal tal como operada à época da promulgação da Carta.
Assim, creio que procede a argumentação do nobre Relator no que aponta que há relevância jurídica para deferir-se a liminar, suspendendo-se os convênios, no que esses convênios implicaram modificação, repito, do “statu quo” existente no campo dos incentivos fiscais à época da promulgação da Carta”” .
9 Em 1979, com Miguel Colasuonno coordenei livro intitulado “A desconcentração econômica no Brasil – Norte/Nordeste” (Estudos sobre o Amanhã, caderno n. 3, co-ed. GESA Gabinete de Estudos sobre o Amanhã, IMEPA Inst. Metrop. de Estudos e Pesquisas Aplicadas-FMU e Ed. Resenha Universitária, São Paulo, 1978), com a colaboração dos seguintes autores: Alberto Xavier, Donaldo Toledo Piza, Edvaldo Brito, Geraldo Ataliba, Geraldo de Alencar, Hugo de Almeida, Ives Gandra da Silva Martins, Luiz Loreti Neto, Miguel Colasuonno, Nilson Holanda, Paulo Dante Coelho, Paulo Kazuaki Muranaka, Roberto Cavalcanti de Albuquerque, Vicente da Costa Silva, Walfrido Salmito Filho e Wilson Abrahão Rabahy, em que a relevância e a autonomia da Zona Franca foram realçadas.
10 Valéria Furlan, lembrando Mario Jorge Góis Lopes, esclarece: “Demonstra, ademais, que a Zona Franca de Manaus não constitui efetivo regime de zona franca, entendida esta locução em sua acepção própria, técnico-econômica e jurídico-aduaneira. A rigor, Zona Franca de Manaus significa Subregião de Manaus, pois não se cuida de área aduaneira de livre comércio internacional, e, sim, âmbito espacial parcelar de nosso ordenamento jurídico inerente a determinado regime de intervenções de desenvolvimento, tendo em vista a criação de condições ao desenvolvimento da Amazônia Ocidental.
De igual modo, entende o autor que a Suframa é Superintendência da Subregião de Manaus e não titulariza mero serviço público de administração de uma zona franca propriamente dita, mas, sim, serviço especializado de operacionalização de ações de direção e intervenção econômica aplicáveis a determinado processo de promoção de desenvolvimento regional. São suas as palavras acerca da estrutura da Zona Franca de Manaus:
1) área de incitações fiscais especiais; 2) área de atuação de administração econômica de determinada entidade subregional de desenvolvimento (a SUFRAMA); e 3) área qualificada legalmente como receptáculo de um pólo econômico, dotado de condições que propiciem o desenvolvimento da Amazônia Ocidental.
De seu turno, também enfatiza Rubens Gomes de Souza que a importância dos incentivos fiscais internos a que se refere o Decreto-lei n° 288 “não pode ser subestimada, desde que se trata de
fazer da ZFM, não mais (como inicialmente) um simples veículo de importações, ancilar de economias alheias, mas sim (como atualmente) um mecanismo eficaz do desenvolvimento econômico nacional”. Frisa, ainda, o autor:
’Assim, de um simples entreposto aduaneiro, limitado a mercadorias estrangeiras destinadas ao consumo local, ou, eventualmente, à reexportação para outros países, a ZFM passou a ser um instrumento de promoção do desenvolvimento regional, visando à integração da Amazônia na comunidade econômica brasileira, através da criação de condições que lhe assegurem, nessa comunidade, o lugar que lhe compete em função do pleno emprego de suas capacidades potenciais’
” (grifos meus) (Tributação na Zona Franca de Manaus (comemoração aos 40 anos da ZFM), coordenação de Ives Gandra/Carlos Alberto de Moraes R. Filho e Marcelo Magalhães Peixoto, ob. cit. p. 33/34).
11 Na ADIN 2348-MC/DF, o Ministro Nelson Jobim, concluiu seu voto, dizendo: “A Zona Franca de Manaus, por força do referido Decreto, é tratada como área estrangeira; isso significa que vendas ou remessas de mercadorias, seja para consumo, seja para reexportação ou industrialização, enviadas para a Zona Franca de Manaus, são tratadas, repito, por força do
Decreto-Lei n° 288, como exportação para o exterior.
Diz expressamente: “será para todos os efeitos fiscais, constantes da legislação em vigor, equivalente a uma exportação brasileira para o estrangeiro’ Ou seja, toda a venda de mercadorias do território nacional, por exemplo, mercadorias originárias de São Paulo destinadas à Zona
Franca de Manaus, para consumo ou industrialização na Zona Franca, ou reexportação, são tratadas, pelo Decreto, para efeitos fiscais, como uma exportação brasileira para o estrangeiro.
O terceiro diz respeito ao art. 50: Decreto-Lei n° 288/67, art. 50: “Art. 50 A exportação de mercadorias da Zona Franca para o estrangeiro, qualquer que seja sua origem, está isenta do imposto de exportação’.
Exemplificando: temos que a circulação de mercadorias de São Paulo para a Zona Franca é uma exportação. A transmissão da mercadoria de São Paulo para o Rio de Janeiro e para o exterior seria tratada da mesma forma, Esse mecanismo de incentivos foi consolidado no art. 40 do Ato das
Disposições Constitucionais Transitórias, com a seguinte linguagem:
“Art. 40. É mantida a Zona Franca de Manaus, com suas características de área livre de comércio, de exportação e importação, e de incentivos fiscais, pelo prazo de vinte e cinco anos, a partir da promulgação da Constituição.”
Isso mostra que o sistema legal do Decreto-lei n° 288 foi congelado pela Constituição, por força do art. 40 do ADCT, pelo período referido, não podendo, portanto, ser alterado, porque é mantida a
Zona Franca com a modelagem vigente à época da Constituição. A modelagem do Decreto-Lei n° 288/67, com eventuais alterações posteriores em outros dispositivos” (Incentivos Fiscais – questões pontuais nas esferas federal, estadual e municipal, coordenação Ives Gandra/André Elali e Marcelo Magalhães Peixoto, Ed. MP Editora/APET, São Paulo, 2007, p. 210).
12 O Ministro Marco Aurélio de Mello, na ADIn n° 2348-9/DF esclarece: “A jurisprudência tem-se mostrado harmônica com essa óptica. No julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade Q 310.1, o relator, Ministro Sepúlveda Pertence, entendeu pelo conflito, com a Carta da República de toda e qualquer norma que, no prazo de vinte e cinco anos, restrinja, reduza ou elimine favores fiscais existentes, como veio a ocorrer com a edição da Medida Provisória n° 2.037/24, o acompanhar Sua Excelência, considerado o conflito com a Constituição Federal de convênio que acabava por reduzira status quo fiscal da Zona Franca de Manaus, tive oportunidade de ressaltar: ‘Quando se alude a incentivo fiscal, estabelece-se a necessidade de preservação da prática fiscal tal como operada à época da promulgação da Carta.
Assim, creio que procede a argumentação do nobre relator no que aponta que há relevância jurídica para deferir-se a liminar, suspendendo-se os convênios, no que esses convênios implicaram modificação, repito, do status quo existente no campo dos incentivos fiscais à época da promulgação da Carta” (grifos meus) (Incentivos Fiscais – questões pontuais nas esferas federal, estadual e municipal , coordenação Ives Gandra Martins, André Elali e Marcelo Magalhães Peixoto, ob. cit., p,. 208).
13 Os § § 5º e 6º do artigo 37 da CF estão assim redigidos:
“§ 5º - A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento. § 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.”
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* Ives Gandra da Silva Martins é fundador e presidente emérito do CEU-IICS Escola de Direito
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