Migalhas de Peso

Crédito indevido e multa inconstitucional

A multa para o contribuinte que pleiteia restituição de imposto indevidamente viola o pricípio da razoabilidade.

23/8/2012

A Instrução Normativa (IN RFB) nº 900, de 2008, que regulamenta a restituição de tributos administrados pela Receita Federal do Brasil e de receitas arrecadadas via Darf ou GPS, impõe pesadas multas ao contribuinte que pleitear indevidamente a devolução de valores recolhidos aos cofres públicos.

As multas isoladas por compensação indevida, permeadas por fraudes ou consideradas não declaradas, advêm desde 2003, nos termos da lei 10.833 daquele ano. Mas as multas isoladas por pedido de ressarcimento tido como indevido ou de compensação não homologada, sem apuração de fraude, foram introduzidas pela lei 12.249, de 2010, e regulamentadas pelas alterações implementadas na IN RFB nº 900/2008.

Assim, atualmente, o contribuinte que buscar o ressarcimento ou a compensação embasado em crédito indevido, sem apuração de fraude, será apenado com multa de 50% sobre o valor do crédito.

Em que pese todo o rigorismo na imposição de sanção por pedido de ressarcimento ou compensação realizado incorretamente, os contribuintes do Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) sujeitos ao regime não cumulativo dificilmente conseguem passar de uma revisão fiscal sem constatar que existem valores recolhidos indevidamente, estando, portanto, fadados a pleitear a sua restituição.

Isso porque as leis instituidoras do regime não cumulativo introduziram conceitos abstratos com relação aos créditos a serem utilizados, implicando em uma multiplicidade de custos e despesas que podem gerar créditos de PIS e Cofins.

A regra geral determina que os bens e serviços adquiridos como insumos e que sofreram a incidência do PIS e da Cofins na etapa anterior e que gerarão receita sujeita a essas contribuições devem gerar crédito, reduzindo o valor a ser recolhido.

A aplicação da multa isolada viola o princípio da razoabilidade

Mas fato é que ao longo dos anos, a Receita Federal editou instruções normativas e publicou respostas às consultas e soluções de divergência que restringiram o alcance do conceito de insumos geradores de tais créditos. Contudo, é sabido que o Ministério da Fazenda não tem posição uniforme quanto aos créditos passivos de utilização na sistemática não cumulativa do PIS e da Cofins.

Os agentes fiscais entendem que o conceito de insumo, para esse fim, se aproxima daquele utilizado para apuração de créditos de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), consubstanciando-se, somente, em matérias-primas, produtos intermediários, materiais de embalagem e outros bens que sofram alteração no processo de industrialização; ou seja, para a Receita, "são os bens e os serviços aplicados diretamente no respectivo serviço prestado".

Já o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), órgão do Ministério da Fazenda, em julgamento no fim de 2010, afirmou que insumo é qualquer custo ou despesa necessário à atividade da empresa - critério aplicado no cálculo do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ); após o que, muitos contribuintes passaram a aproveitar custos e despesas antes desprezados na apuração da base de cálculo das contribuições.

Por sua vez, a Câmara Superior de Recursos Fiscais, órgão julgador de última instância do Carf, em julgamento ocorrido no fim de 2011, determinou que o conceito de insumo não se assemelha ao do IPI (muito restritivo) e tampouco ao do IRPJ (muito amplo). É um conceito próprio, baseado na essencialidade e necessidade do caso concreto, de cada contribuinte, seja no desenvolvimento da prestação de serviços ou na fabricação de bens.

Essa posição da Câmara Superior de Recursos Fiscais, embora mais favorável aos contribuintes do que a posição da Receita Federal, cria uma incerteza jurídica, trazendo a solução da controvérsia para o âmbito da individualidade; e, gera valores recolhidos indevidamente pelos contribuintes que adotaram, anteriormente, o entendimento do Fisco.

Nesse cenário, e considerando que o pedido de ressarcimento ou a declaração de compensação serão analisados por um fiscal que tem o dever funcional de levar em conta as determinações normativas, são inúmeros os casos de aplicação da multa isolada.

Diante da controvérsia e das sanções aplicadas, muitas empresas têm se socorrido do Poder Judiciário, seja para obter uma decisão declaratória do conceito de insumo aplicável a sua atividade, seja para afastar a aplicação das pesadas multas.

A aplicação da multa isolada por tentativa de restituição baseada em crédito considerado indevido, nesse ambiente de insegurança jurídica, aonde são encontradas diversas posições de entes ligados à administração pública e até mesmo do Carf no que se refere aos créditos que podem ser aproveitados na apuração do PIS e da Cofins, equipara o contribuinte que cometeu mero equívoco àquele que age com dolo, simulação ou fraude na tentativa de burlar o Fisco e viola o princípio da razoabilidade, por apenar rigorosamente aquele que comete um simples equívoco na elaboração de procedimento formal.

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* Fabiana de Almeida Chagas é especialista em Direito Tributário, sócia do escritório Glézio Rocha Advogados Associados

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