Atualmente estamos diante de uma orientação pautada no cuidar diligente em relação às pessoas menos favorecidas economicamente, uma vez que tal questão está vinculada a causas sociais, econômicas, políticas e humanitárias.
A problematização versa na busca de soluções que promovam a diminuição da pobreza e a inclusão social voltada ao desenvolvimento humano, a cidadania e o crescimento econômico.
No Brasil a situação não é diferente, pois as classes menos favorecidas estão mais frequentemente expostas às doenças, acidentes, mortes e a uma série de perdas e danos relacionados aos bens e a propriedade em função da natureza de suas atividades e do ambiente em que vivem.
Estas ocorrências, além dos impactos sociais e econômicos causados aos mais carentes, geram a cada período uma série de gastos extraordinários para o Governo, cujos recursos poderiam ser mais bem empregados, caso houvesse algum tipo de mecanismo que oferecesse uma proteção adequada para os segmentos mais pobres da população.
Por essa razão uma das alternativas encontradas pelas autoridades governamentais e pela iniciativa privada foi a criação do Microsseguro.
Assim, o Microsseguro vem se constituindo como parte da estratégia dos governos de muitos países para diminuir a pobreza, ao tornar os sistemas financeiros mais inclusivos por meio da promoção do acesso a serviços como poupança, crédito e seguros para a população de baixa renda.
A definição clássica de Microsseguro é apresentada pelo "Consultative Group to Assist the Poorest Working Group on Microinsurance" (CGAP), um dos mais ativos grupos na divulgação e pesquisas sobre o tema, que assim prescreve:
"Microsseguro é a proteção da população de baixa renda contra perigos específicos em troca de pagamentos regulares de prêmios proporcionais à probabilidade e custo do risco envolvido."
Neste sentido podemos analisar o microsseguro sob dois prismas, sendo um voltado a extensão da proteção social aos mais carentes, visando assim amenizar as desigualdades sociais, e outro, objetivando oferecer um serviço financeiro essencial para as famílias de baixa renda ao desenvolver um modelo de negócios apropriado que permita que essas pessoas se tornem um segmento de mercado rentável para o seguro comercial.
Isso dá a entender que seria possível uma abordagem comercial do mercado de seguro associada à responsabilidade social.
Para se ter uma ideia do potencial alcance de tal instituto, a Fundação Getulio Vargas (FGV) estima que os 100 milhões de clientes em potencial para os microsseguros poderão ser alcançados nos próximos 10 anos, dos quais 40 milhões até 2016.
Os microsseguros oferecem o atrativo da inclusão social e de permitir que mesmo clientes de baixa renda consigam se proteger de eventuais tragédias.
Para que isso seja possível e viável, alguns pontos devem ser analisados e discutidos tais como: as apólices devem conter condições simples e fáceis de entender, prêmios de baixo valor, flexibilização de pagamento de prêmio, canais alternativos de venda, fácil acesso para reclamação de sinistros, entre outros, buscando assim a criação da cultura de seguro nos clientes.
Neste diapasão, a Superintendência de Seguros Privados (SUSEP), na qualidade de órgão responsável pelo controle e fiscalização dos mercados de seguro, previdência complementar aberta, capitalização e resseguro, atendendo às diretrizes governamentais para incentivar a criação de produtos e serviços financeiros adaptados à realidade da população de baixa renda e dos microempreendedores formais e informais, no final de 2003 iniciou discussões internas com o objetivo de implementar ações para incentivar a comercialização de seguros simplificados e de baixo custo.
Já em 2008 o CNSP - Conselho Nacional de Seguros Privados criou a Comissão Consultiva de Microsseguros, presidida pelo Superintendente da SUSEP e composta por diversas entidades governamentais e privadas ligadas ao setor, o que incentivou em abril deste mesmo ano a apresentação do projeto de lei 3266, que dispõe sobre a criação das sociedades seguradoras especializadas em Microsseguros, dos corretores de seguros especializados e dá outras providências, o qual atualmente continua em trâmite no Congresso Nacional.
Em nosso país a definição do marco regulatório seria bem vinda para reduzir custos operacionais e aumentar a massa segurada. A espera pela regulamentação do Microsseguro tem gerado grande expectativa entre os agentes do setor de seguros, uma vez que, isso definiria a participação do governo nesse seguro, contemplando medidas de incentivos fiscais às seguradoras que investirem na sua comercialização.
Outra definição aguardada é a simplificação dos processos de subscrição e regulação de sinistros, que possam eliminar algumas exigências impostas aos seguros tradicionais, como os extensos contratos e a assinatura do segurado.
Quanto maior a massa de segurados, menor será o custo de processamento em virtude do ganho em escala, e maior será a rentabilidade, já que a pulverização do risco reduzirá a sinistralidade.
As seguradoras querem normas específicas para os microsseguros, que minimizem a burocracia e os custos, permitindo pagar menos para os corretores e igualmente ficar livres de formalidades como notificar os segurados pelo correio.
A regulamentação e implementação no Brasil, tão logo ultrapasse os entraves burocráticos e algumas barreiras como a tributária e a de distribuição, poderá significar instrumento poderoso capaz de ajudar, juntamente com demais ações de proteção econômica e social, a erradicar de vez as linhas mais baixas de pobreza e infortúnio desse nosso País.
Essa visão pode ser tanto mais abrangente se em sua essência o Microsseguro assumir a característica de macro proteção social, com o significado não só de ajudar a proteger as camadas mais necessitadas da população, como o de levar, por extensão, a toda sociedade e ao País melhores perspectivas para um crescimento socioeconômico equilibrado.
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*Gustavo de Camargo Hermann é advogado do escritório Küster Machado - Advogados Associados.
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