Fernando Borges Vieira
Assédio sexual – A conduta do empregador e a ética corporativa
A lei 10.224/01 prevê pena de detenção de um a dois anos àquele que – prevalecendo-se de sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerente ao exercício de emprego, cargo ou função – constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual.
Todavia, o fato de haver tipificação penal da conduta denominada de "assédio sexual" não é suficiente para que este constrangimento deixe de ser observado. Juntamente com o assédio moral e lesão à honra ou à imagem do trabalhador, o assédio sexual se afigura como uma das espécies de um gênero que se pode considerar como medidas de constrangimento no ambiente de trabalho.
Há que se ter, dada a seriedade da conduta, muita cautela ao se afirmar tratar-se uma hipótese de assédio sexual, o que somente poderá ser considerado como tal se observados, grosso modo, os seguintes requisitos caracterizadores: a) liame entre assediador e assediado configurado pela relação de trabalho; b) conduta exercida pelo assediador sobre o assediado sob o escopo de favorecimento sexual em troca de vantagens ou imputação de desvantagens; c) rejeição da conduta por parte do assediado; e d) reiteração da conduta por parte do assediador.
Perceba-se que não consideramos a relação hierárquica como requisito imprescindível, pois o assédio sexual no ambiente de trabalho não precisa, necessariamente, ser praticado pelo superior em relação ao inferior, podendo ser tanto ascendente como descendente e até mesmo horizontal, quando praticado por um par.
Estes requisitos têm de ser muito bem apurados, sob pena de se afigurar outra modalidade de constrangimento que não o assédio sexual. Por exemplo, se um chefe se manifesta sobre o decote de sua secretária e elogia o seu colo estamos diante sim de um ato inadequado capaz de provocar um real constrangimento, mas não se trata de assédio sexual. Agora, se este mesmo chefe solicita à mesma secretária que sucumba à sua pretensão libidinosa em troca de um aumento ou sob a ameaça de que, se não sucumbir, será demitida, estamos sim diante de verdadeiro assédio sexual.
Qual o limite, porém, entre um galanteio e o assédio? A linha que separa um do outro é muito tênue e perigosa, pois dependerá da compreensão subjetiva das pessoas envolvidas. Contudo, é possível afirmar que o limite é traçado pelo grau de constrangimento de quem recebeu o galanteio, não importando se homem ou mulher para a caracterização do assédio sexual, podendo ocorrer entre pessoas de mesmo sexo.
Vale dizer, para que alguém seja vítima de assédio sexual deverá vivenciar um constrangimento efetivo, uma angústia perceptiva, um medo real de sofrer algum prejuízo ou deixar de receber alguma vantagem se não ceder ao apelo de quem assedia.
Em que pese tratar-se de uma questão adstrita a uma relação direta entre partes, as empresas podem ser responsabilizadas pela prática de assédio sexual; inclusive, o mesmo é considerado como motivo ensejador de rescisão indireta do contrato de trabalho e de indenização pelos prejuízos psicológicos experimentados.
Como, pois, as empresas hão de evitar esta tão indesejada prática? Infelizmente, há situações que fogem ao controle da administração de algumas empresas, haja vista o grande número de empregados. Felizmente, porém, independentemente do número de empregados é sempre possível estabelecer um política interna voltada à ética corporativa. A conduta do empregado é reflexo direito da conduta do empregador.
Por conseguinte, sugerimos em breve síntese algumas medidas preventivas: a) estabelecimento de um código de ética corporativa; b) adoção de medidas com o intuito de tornar este código conhecido e compreendido por todos; c) adoção de política afirmativa voltada à conscientização acerca do assédio sexual e suas implicações no ambiente de trabalho; d) criação de um núcleo de atendimento e orientação àqueles que compreendem vítimas de assédio sexual; e) apuração e acompanhamento de situações que potencialmente se afigurem como assédio sexual; f) adoção de medidas administrativas no sentido de cessar o constrangimento.
Insistimos, o mais poderoso instrumento a favor dos empresários é a formação e manutenção da ética corporativa que, de um modo muito simplório, pode ser definida como a maneira de ser de uma organização, a qual há de ser orientada por princípios e valores reconhecidamente consistentes e dos quais resultem o engajamento de todos que a integram.
A ética corporativa retrata a cultura organizacional e se a mesma for implementada e difundida de sorte a passar a ser a própria cultura de cada qual, o risco de problemas desta natureza se diluem.
Por fim, nossa recomendação aos empregadores que considerem a relevância da questão trazida a lume e adotem medidas preventivas. Como costumamos afirmar: é melhor prevenir do que indenizar! Por certo que sim.
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*Fernando Borges é sócio sênior do escritório Manhães Moreira Advogados Associados, responsável pela coordenação da equipe que atua na Área Trabalhista
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