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Inconstitucionalidade da exigência de ICMS nas operações de compra à distância

18 Estados brasileiros estão exigindo inconstitucionalmente o pagamento de ICMS sobre compras à distância feitas por consumidores localizados em seus territórios, mas que não são contribuintes.

12/3/2012

Maria Ednalva de Lima

Inconstitucionalidade da exigência de ICMS nas operações de compra à distância

Cada dia mais, os contribuintes sentem-se acuados e sufocados com os atos desrespeitosos a seus direitos, praticados pelo Estado com sua sanha arrecadatória.

Há casos em que a afronta a direitos, assegurados pela Constituição Federal, beira à imoralidade, porque o Estado conta com a possibilidade de muitos contribuintes optarem por pagar os tributos, ao invés de lutarem pelo respeito a seus direitos. Além de contar com essa possibilidade, o Estado utiliza métodos já considerados inconstitucionais pelo Supremo Tribunal Federal, como coagir, por meio da apreensão de mercadorias, o contribuinte a efetuar pagamento de tributo indevido. Isso vem se passado com o ICMS exigido por 18 Estados sobre operações de compra à distância feitas por consumidores localizados em seus territórios, mas que não são contribuintes.

Muitos consumidores localizados nos Estados do Norte, Nordeste e Centro Oeste compram mercadorias para uso próprio, por meio não presencial, de empresas situadas nos Estados do Sul e Sudeste.

Para surpresa dessas empresas, elas passaram a ser consideradas, indevidamente, devedoras de ICMS, nas tais operações de compra à distância, dos Estados destinatários. A posição de devedoras lhes tem sido atribuída por leis específicas de cada Estado, as quais, aparentemente, encontram legitimidade no Protocolo ICMS 21/2011, que já é objeto de ação direta de inconstitucionalidade.

O protocolo (acordo) consiste num arremedo que beira à imoralidade e não tem como escapar à pecha de agressão à Constituição Federal praticada pelos Estados que o assinaram com a alegação de que estão a ser prejudicados com as compras efetuadas à distância pelos consumidores situados em seus territórios.

Os Estados que celebraram o tal acordo, e o vem aplicando, sabem que as empresas que vendem à distância para consumidores finais não são suas contribuintes e, também, que não podem ser substitutas tributárias de consumidores que não são contribuintes.

A conduta dos Estados, para além de afrontar a Constituição Federal, que estabelece ser partilhado o ICMS apenas se as operações interestaduais destinarem bens a contribuintes, banaliza-a.

Banaliza-a porque foi celebrado um acordo para com ela ombrear simplesmente porque contam com a possibilidade de a maioria das empresas pagarem o ICMS duplamente para não terem suas mercadorias apreendidas.

A Constituição Federal estabelece que, se o destinatário da mercadoria não for contribuinte, o ICMS é devido para o Estado de origem mediante a aplicação da alíquota interna (alínea b, inciso VII do § 2º do artigo 155), o que é suficiente para demonstrar a inconstitucionalidade do Protocolo ICMS 21/2011 e das leis específicas dos Estados.

De forma igualmente clara, a Constituição Federal determina que o ICMS equivalente à diferença entre a alíquota interna e interestadual só é devido ao Estado de destino, se o destinatário da mercadoria for contribuinte do imposto (inciso VIII do § 2º do artigo 155).

Em síntese: em obediência à Constituição Federal, o ICMS só pode ser partilhado com o Estado destinatário se a operação interestadual for efetuada entre contribuintes (pessoas que praticam atos de compra e venda de mercadorias). Se a operação ocorrer entre um contribuinte (comerciante – remetente) e um consumidor final (não comerciante – destinatário), o ICMS é devido apenas ao Estado de origem.

Quando a empresa efetua venda à distância a consumidor final não comerciante, ela não é contribuinte do Estado destinatário e, por isso, não lhe deve ICMS. Não tem validade jurídica um protocolo assinado pelos Estados para alterar determinações constitucionais com o intento de atender aos seus anseios arrecadatórios.

Registre-se que, por ordem constitucional, se o destinatário da mercadoria for contribuinte do ICMS, o Estado onde ele está localizado tem direito ao ICMS correspondente à diferença entre a alíquota interna e a interestadual. Se o destinatário não for contribuinte, o Estado de origem tem direito à totalidade do ICMS mediante a aplicação da alíquota interna.

Cumpre deixar bem vincado que, afora não ser contribuinte, a empresa que vende à distância também não pode ser colocada na condição de substituta tributária, pois não substitui ninguém, dado que o consumidor final não comerciante não é contribuinte. Também nisso o Protocolo 21/2011 e as leis específicas dos Estados que o assinaram desrespeitam a Constituição Federal.

Consoante o §7º do artigo 150 da Constituição Federal, a condição de substituto tributário somente pode ser atribuída a sujeito passivo da obrigação tributária. Ou seja, a Constituição permite que a lei eleja um contribuinte como responsável para cumprimento da obrigação tributária de outro. Ao consumidor final não pode ser atribuída a responsabilidade pelo pagamento de ICMS devido pela empresa da origem da mercadoria, que os Estados signatários do mencionado protocolo pretende sejam suas devedoras.

Não há dúvida de que somente um contribuinte pode ser substituído por outro contribuinte. Se não há contribuinte a ser substituído, não existe substituição tributária. Logo, a empresa que vende para consumidor final não contribuinte localizado nos Estados signatários do Protocolo ICMS 21/2011 não está obrigada a pagar ICMS para ele e tampouco o consumidor tem a obrigação de fazê-lo.

Os 18 Estados que assinaram o Protocolo ICMS 21/2011 são proibidos, também, pela Constituição Federal, de exigirem o ICMS do consumidor final não comerciante, se a empresa vendedora não efetuar o que alguns têm rotulado de retenção.

Por não terem direito ao ICMS, tais Estados não podem exigir comprovante de pagamento no momento do ingresso, em seus territórios, das mercadorias compradas à distância. Tampouco podem efetuar a apreensão dessas mercadorias com o propósito único de receberem o imposto que não lhes é devido.

Apesar de a Constituição Federal não deixar margem para dúvida de que o Estado destinatário de mercadorias só tem direito ao ICMS se a operação interestadual for realizada entre contribuintes, as empresas que efetuam venda não presencial vêem-se diante da necessidade de optar por uma de três situações: (1) pagar o ICMS duas vezes, uma, para o Estado de destino com a aplicação da alíquota interestadual, para não terem suas mercadorias apreendidas pela fiscalização de tal Estado, e, outra, para o Estado de origem com a aplicação da alíquota interna, para não serem autuadas; (2) não pagar o ICMS para o Estado de destino, hipótese em que verão suas mercadorias apreendidas pela fiscalização desse Estado, e pagar para o Estado de origem, para quem, constitucionalmente, é divido, situação em que não serão multadas; (3) acionar o Poder Judiciário para obter decisão judicial desobrigando-se de pagar o ICMS para o Estado de destino porque é devedora, nos termos da Constituição Federal, apenas do Estado de origem, para quem deve recolher o imposto com a aplicação da alíquota interna. Somente nessa última hipótese, a empresa não terá suas mercadorias apreendidas no momento do ingresso no território do Estado de destino, pois estarão acompanhadas de decisão judicial que assegura seu direito, bem como verão satisfeito seu direito de pagar o ICMS uma única vez.

Atualmente, vigoram decisões liminares do Supremo Tribunal Federal em Ações Diretas de Inconstitucionalidade que suspenderam lei do Estado do Piauí e da Paraíba que exigiam o ICMS das empresas nas operações à distância para consumidores finais não contribuintes. Ainda não foi apreciado o pedido de decisão liminar formulado nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade do Protocolo 21/2011.

Importa assinalar que o deferimento do pedido de medida liminar com a suspensão da aplicação do Protocolo 21/2011 pelo Supremo não impede a cobrança indevida feita pelos outros 16 Estados, pois haverá necessidade de declaração de inconstitucionalidade de cada lei específica.

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* Maria Ednalva de Lima é causídica da banca Maria Ednalva de Lima Advogados Associados

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