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A Lei 11.101, a nova Lei de Recuperação e Falências

A Lei 11.101, a nova Lei de Recuperação e Falências, promulgada em 9.2.05 e com vigência a partir de 9.6.05, com origem no projeto 4376, de 1993, – portanto, com trâmite legislativo que se estendeu por 12 anos -, começa a sofrer agora as constantes avaliações dos estudiosos da matéria, para que se examine como a dogmática pura se purifica (ou não) ante a hermenêutica “prática”, se é que tais termos são possíveis.

10/8/2005

A Lei 11.101, a nova Lei de Recuperação e Falências


Manoel Justino Bezerra Filho*

A Lei 11.101, a nova Lei de Recuperação e Falências, promulgada em 9.2.05 e com vigência a partir de 9.6.05, com origem no projeto 4376, de 1993, – portanto, com trâmite legislativo que se estendeu por 12 anos -, começa a sofrer agora as constantes avaliações dos estudiosos da matéria, para que se examine como a dogmática pura se purifica (ou não) ante a hermenêutica “prática”, se é que tais termos são possíveis. Simplificando, o que se quer dizer é que agora, passados dois meses da vigência da lei, começam as tentativas de avaliação de como está funcionando a teoria, na prática.

Há diversos pedidos de recuperação espalhados pelo País, dois deles emblemáticos: o primeiro, o pedido feito pela Varig, que corre ante a 4ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro; o outro, da Parmalat, que corre ante a 1ª Vara de Recuperação e Falências de São Paulo. Diversos outros pedidos estão sendo ajuizados e o exame de tais pedidos não possibilita qualquer conclusão, a não ser no sentido de demonstrar que grandes empresas em crise parecem efetivamente interessadas no sistema implantado pela nova lei. No entanto, observe-se que não houve tempo sequer para o decurso do prazo de 60 dias, previsto no artigo 53, para apresentação do plano de recuperação, o que torna restrito o campo de análise da prática do processo. Nos dois casos emblemáticos acima anotados, um aspecto curioso já é possível ressalta: em ambos, os juízes respectivos deferiram o processamento (art. 52) de forma bastante expedita, o que é louvável, denotando a preocupação do Judiciário com a nova lei; ao mesmo tempo, pode ser indicação de que pedidos, se corretamente apresentados, podem ser rapidamente mandados processar.

No entanto, o que mais traz expectativas não será propriamente o decurso de 60 dias do artigo 53 e sim, o decurso de 180 dias do § 4º do artigo 6º, prazo após o qual os credores financeiros, garantidos por alienação fiduciária e arrendamento (leasing), estarão autorizados, pelo § 3º do artigo 49, a buscar, apreender e reintegrar, os bens garantidores dos respectivos financiamentos. O que se vê é que o legislador, a partir da premissa absolutamente irreal de que a recuperação estaria solucionada em 180 dias e que, portanto, a partir daí, os negócios voltariam à normalidade, criou uma expectativa catastrófica, no sentido de no 181º dia ser decretada a falência, porque todos os bens foram retirados pelos credores no 180º dia.

Porém, felizmente, a própria lei trouxe remédios para evitar esta quebra certa, pois o artigo 47 - único artigo que manteve seus princípios inalterados desde o longínquo ano de 93, data do primeiro projeto -, indica quais as prioridades que a lei quis estabelecer, ao dizer que a recuperação tem por objeto “permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores”. Conforme pacífico entendimento dos estudiosos da matéria, a lei colocou estas prioridades nesta ordem, não por acaso e sim, por ordem de importância. Portanto, o interesse dos credores está subordinado aos dois princípios anteriores e toda a lei está subordinada ao princípio da manutenção da fonte produtora.

Assim, o remédio que a própria lei traz no artigo 47, mais do que autorizar, encaminha a atividade jurisdicional no sentido de impedir a retirada dos bens ao cabo dos 180 dias, se esta retirada vier a subverter a ordem de preferência, colocando em primeiro lugar os interesses dos credores e impedindo a manutenção da fonte produtora. Caberá ao juiz do processo perquirir se a eventual retirada dos bens financiados virá a colocar em risco a manutenção da fonte produtora e, se isto ocorrer, deverá suspender a retirada dos bens pelo tempo suficiente ao afastamento do perigo.

Enfim, a lei indica ao magistrado a necessidade de busca de elementos que propiciem a manutenção da atividade empresária plena e, se as exceções dos parágrafos do artigo 49 puserem em risco tal objetivo, caberá ao juiz aplicar o artigo 47, com toda a força de sua letra e de seu princípio, impedindo a retirada de qualquer bem essencial à preservação da atividade da sociedade empresária em recuperação. Alternativamente, para que se evite a criação de impasses, sempre seria possível examinar a possibilidade de pagamento do credor financeiro com garantia, por meio de acordo nos próprios autos da recuperação, o que a nova lei, extremamente flexível, sempre poderia propiciar.
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*Juiz de Direito





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