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Nova lei concorrencial: avanço ou retrocesso

O advogado questiona se não seria mais proveitoso alterar pontos-chave da atual lei concorrencial, ao invés de revogá-la.

13/10/2011

Roberto De Marino Oliveira

Nova lei concorrencial: avanço ou retrocesso

Desde 2004, o mercado aguarda com grande expectativa, bem como com certo grau de receio, pela aprovação do texto que pretende reestruturar o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e, consequentemente, revogar a lei 8.884/94 (clique aqui).

O PL 3.937/04 (clique aqui) foi aprovado pela Câmara dos Deputados no final de 2008 e pelo Senado Federal em 2010. Em 5 de outubro de 2011, a Câmara dos Deputados votou e aprovou o projeto, rejeitando algumas alterações que haviam sido propostas pelo Senado. O texto será agora submetido à sanção presidencial.

Apesar de a opinião de empresários e especialistas variar no que diz respeito às vantagens e desvantagens das alterações que estão sendo propostas, uma coisa é certa: mudar é, sem dúvida alguma, uma necessidade. Isto porque a dinâmica das relações entre os agentes econômicos não tem sido acompanhada por um eficiente controle da administração pública, o que inviabiliza negociações e engessa a atividade econômica.

Uma das alterações que mais tem promovido discussões diz respeito à mudança dos critérios pelos quais as empresas devem submeter atos de concentração à apreciação das Agências Brasileiras de Defesa da Concorrência. De acordo com a lei atual, as operações em que qualquer um dos participantes tenha registrado faturamento bruto anual, no Brasil, equivalente ou superior a R$ 400 milhões, ou que impliquem em participação superior a 20% de determinado mercado relevante, devem ser submetidas à aprovação dos órgãos concorrenciais.

O PL propõe a exclusão do critério de market share, sendo apenas obrigatória a notificação das operações em que um dos grupos envolvidos possua faturamento anual, no Brasil, igual ou superior a R$ 400 milhões, bem como que o outro grupo envolvido também tenha tido, no Brasil, faturamento bruto anual de pelo menos R$ 30 milhões.

A proposta inicial do Senado de elevação do critério do faturamento para R$ 1 bilhão foi rejeitada pela Câmara dos Deputados, que também reduziu a segunda trava de R$ 40 milhões para R$ 30 milhões. O fato dos critérios serem cumulativos representa um avanço, pois reduziriam significativamente o número de atos de concentração submetidos à análise das agências concorrenciais, possibilitando uma alocação mais eficiente dos escassos recursos que o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência dispõe. Além disso, é praticamente consenso entre empresários e acadêmicos que a exclusão do critério de market share é necessária, principalmente pela dificuldade enfrentada pelas empresas em mensurar a participação que detêm em seu respectivo mercado de atuação.

Outra mudança polêmica refere-se à análise prévia dos atos de concentração. Hoje em dia as empresas têm o prazo de até 15 dias úteis para apresentar os atos de concentração à apreciação das agências concorrenciais, devendo tal prazo ser contado da assinatura do primeiro instrumento vinculante celebrado entre as partes. A obrigatoriedade de apresentação prévia dos atos de concentração fará com que as operações não possam ser realizadas sem antes terem sido aprovadas pelas autoridades concorrenciais, o que poderá levar até 240 dias. O descumprimento a tal exigência sujeitará a empresa a multa, cujo valor poderá variar de R$ 60 mil a R$ 60 milhões, e a operação será considerada nula.

Uma possível defesa desta alteração seria que a medida visa impedir que operações já consumadas tenham que ser desfeitas, ou até mesmo que fiquem por anos aguardando uma decisão. Outro fator positivo seria a redução no tempo de análise dos atos de concentração pelas agências concorrenciais. Pela sistemática atual as agências (SEAE, SDE e CADE) têm até 120 dias para analisar o ato, mas este prazo pode ser suspenso mediante a solicitação de qualquer informação ou documento adicional. Caso o PL seja aprovado o prazo máximo será de 240 dias, sob pena de a operação ser tacitamente aprovada. Por fim, a adoção do sistema de análise prévia alinha as práticas adotadas no Brasil com aquelas existentes na maioria dos demais países.

Outra controvertida mudança diz respeito aos tipos de operações que se enquadram no conceito de ato de concentração. De acordo com a atual sistemática, os atos que visem qualquer forma de concentração, seja por meio de fusão, incorporação, constituição de sociedade ou qualquer forma de agrupamento societário, além das operações que possam prejudicar a livre concorrência ou que preencham os critérios objetivos de faturamento e mercado relevante, devem ser apreciados pelo CADE. Logo, a atual Lei Concorrencial optou pela adoção de um rol exemplificativo para determinar que tipo de operação daria ensejo ao ato de concentração.

O PL propõe um rol taxativo para definir as operações que seriam consideradas como ato de concentração, enumerando unicamente as operações de: fusão, aquisição, incorporação, joint venture ou consórcio. A principal crítica a esta questão consiste no fato de que a existência de um rol taxativo faz com que inúmeras operações não tenham que ser examinadas pelo CADE, bem como incentiva a criação de complexas operações e estruturas societárias que dificultariam enquadrar a operação como ato de concentração.

Também houve mudança no que se refere ao valor das multas impostas às empresas que violarem a ordem econômica. A atual multa, cujo valor varia de 1% a 30% do faturamento bruto do grupo ao qual a empresa pertence, foi alterada para multa de 1% a 30% incidente sobre o faturamento bruto da empresa no mercado efetivamente afetado, i.e., sobre a receita auferida pela empresa apenas no ramo de atividade empresarial em que ocorreu a infração (ao invés de considerar o faturamento do grupo inteiro).

A mensuração da multa considerando apenas o mercado afetado é positiva, na medida em que estabelece uma correlação entre o valor da multa aplicada e a extensão do efeito produzido pela conduta ilícita. Além disso, a Câmara dos Deputados rejeitou a proposta do Senado de diminuição do teto e piso do faturamento para 20% e 0,1%, respectivamente, o que tornaria a lei mais branda e iria de encontro ao esforço dos órgãos antitruste em reprimir e punir severamente os infratores, postura adotada até então e que contribuiu para que o CADE fosse consagrado como a melhor agência antitruste das Américas em 2010.

Por fim, cabem aqui algumas reflexões: até quando teremos que aguardar pelo interesse do Governo em aprovar as regras que nortearão as futuras práticas concorrenciais? Até que ponto não teria sido mais simples e rápido alterar apenas os pontos-chave da nossa Lei Concorrencial, ao invés de revogá-la? Estamos cada vez mais próximos da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016, onde certamente as atenções do mundo estarão voltadas para o Brasil e a nossa economia poderá ter o seu apogeu em termos de operações envolvendo infraestrutura e investimento, e precisamos de soluções rápidas e compatíveis com o dinamismo da nossa economia.

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*Roberto De Marino Oliveira é membro da área Societária e Concorrencial do escritório Peixoto E Cury Advogados

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