Leitura, problemas e um assunto indigesto que se intrometeu
Francisco Cesar Pinheiro Rodrigues*
Lamentavelmente, não é isso que ocorre — o interesse pela leitura instrutiva —, apesar de existir um impressionante universo de conhecimentos ao alcance de todos, via imprensa e internet.
Conversando com alguns idosos que conseguiram dominar o "pavor do computador" — inacreditavelmente, alguns, até bem inteligentes, temiam "não conseguir aprender"... —, constatei que muitos deles empregam seu vasto tempo livre em joguinhos eletrônicos, leitura de fofocas políticas — se em poucas linhas... — e assuntos de baixo nível de dificuldade. Não querem mais "quebrar a cabeça".
"Meu tempo já passou...", dizem, erroneamente, porque até o momento da morte sempre se pode extrair algo útil desse milagre biológico chamado cérebro humano — desde que utilizada a técnica adequada. Ocupam-se, tais idosos, em buscar netos nas escolas, viajar em grupo, aprender a dançar tango, com vigorosas piruetas e trançados de perna — de preferência com jovens argentinas — e, uns poucos deles, experimentar pílulas capazes de proporcionar algum vigor — mais farmacêutico que natural —, em áreas ligadas a um romantismo tardio. — "Um coicezinho final antes de esticar as canelas", dizem alguns, com olhos tristes, carregados de dúvidas ou culpas; outros, com uma piscadinha matreira de malandro improvisado.
Nada a estranhar, sob o ângulo apenas biológico, quanto ao desejo de usufruir, na velhice, aquilo que gostariam de ter feito, mas não fizeram quando moços, pressionados pela moral, pela lei, pelo medo do — quem sabe? —, castigo divino. Medo, principalmente, do fuxico da vizinhança, do rancor dos filhos, das novas despesas com mulher bem mais jovem ou das doenças relacionadas com o amor pago por tarefa. Medo ainda, real, poderoso e algo contraditório, de magoar a antiga e honrada companheira que — ele reconhece —, bem que mereceria um marido cem por cento, o que não foi o seu caso.
O temido "comportamento ridículo" — como todos os juízos, sempre fáceis, sobre a conduta alheia —, deve ser encarado com compreensão quando tal comportamento não implica — o que é raro —, em grande sofrimento de terceiros. Geralmente "terceiras", as esposas, ou companheiras, angustiadas com a conclusão de que "Meu marido endoidou! Que devo fazer? Temo a solidão, mas minhas amigas exigem uma atitude!"
Do lado do marido, sua mente ensaia técnicas de defesas, inclusive chicanas, no tribunal da consciência: — "Para mim, não é nada ridículo. Sei o que digo! Há anos! Até agora só vivi para os outros! Afinal, o impulso de preencher uma omissão na área instintiva é fenômeno não só humano, como de todo o reino animal. E tenho também meu lado animal, confesso, infelizmente. Se há tanto empenho em proteger os "animais", por que nenhuma ONG me protege? A "quota" de instintos, com que todos nascemos, cobra "seus direitos de expressão", que considera imprescritíveis — essa terminologia mental ocorre apenas nas mentes jurídicas —, não importa a cor dos meus cabelos e a curvatura da minha coluna".
Quanto à psicologia das mulheres, na mesma faixa etária, convém não arriscar conjeturas sobre o que se passa no cérebro delas. É uma alvoroçada assembleia de opiniões gritadas com voz aguda. Não há dúvida, porém, que elas, de modo geral, são mais resignadas com o que lhes reservou o destino, mesmo pouco recompensador — considerando o trabalho delas dentro e fora do lar. Suportam mais as decepções da convivência. Enterraram, quase totalmente, os românticos "sonhos loucos" da mocidade. Pensam só nos filhos e netos. Tornaram-se zelosas guardiãs da família. Acostumaram-se com o peso da cruz. Se a cruz sofrer um enfarte, podem até sentir alguma falta do lenho. Querem apenas morrer com a consciência em paz. Geralmente acreditam em outra vida, com, talvez — "quem me dera!" — alguma recompensa pelas suas renúncias silenciosas. — "Não é possível que eu não encontre justiça, nem mesmo depois de morta!"
Como conciliar a satisfação de tais "quotas" instintivas masculinas, e talvez femininas, com regras legais e morais é o grande problema que só será resolvido daqui a várias décadas, quando religiões, ciência e lei chegarem a um acordo — realista — de cavalheiros. Isso acontecerá, inevitavelmente, porque a humanidade sempre lutou contra a sensação de dor. Toda dor, física ou moral. A dor física, aguda, só pelo fato de ser insuportável, já foi dominada pela medicina. A dor moral da frustração, mais apaziguável, ainda não. E fujamos do perigoso assunto porque vejo no horizonte a formação de nuvens ameaçadoras que lembram vultos femininos portando formas cilíndricas, parecidas com rolos de macarrão. Esse inocente instrumento de cozinha foi, em passado não distante, poderoso amaciador de massas cerebrais masculinas, propensas às milenárias fraquezas e filosofias que as justificassem.
Incidentemente, ocorre-me a ideia — mera desconfiança, certamente caluniosa — de que o islamismo, permitindo a poligamia, em variados graus no número de esposas, incentivará adesões masculinas, em todo o planeta, inclusive no mundo ocidental. A mera possibilidade de conciliar, sem o menor drama moral, a religião com a moral e com o instinto natural da poligamia, funcionará como um incentivo, um "bônus" para conversões. Obviamente, nenhum candidato ao islamismo mencionará que esse "estímulo" pesou na decisão, mas se Freud fosse vivo, e consultado a respeito, certamente diria que o subconsciente deve ter feito o seu trabalhinho.
Por outro lado, havendo grande difusão da instrução e informação nos países islâmicos, não só árabes — via internet e imprensa livre — a ideia da monogamia ganhará progressivo espaço. Consequência do esforço das mulheres locais, que aspiram à maior dignidade e raramente são livres do instinto do ciúme. Já que falamos em instinto, frise-se que as leoas do grupo, na savana, mordem leoas estranhas que se aproximam do leão ainda em condições de lutar e procriar. Não admitem nem a troca de rugidos cerimoniosos. Se vier a prevalecer apenas a racionalidade, a monogamia legal, mais democrática, triunfará em todo o planeta, com a mera consideração de que há um quase empate estatístico no nascimento de homens e mulheres. Como, entretanto, o homem tão cedo não mudará sua natureza, a poligamia continuará presente, embora residual, sorrateira, como ocorre com crimes e contravenções. Gostaria de estar entre os vivos daqui a cem anos, para saber como a civilização — se ainda não incinerada ou "radioativada" — resolveu o problema.
(As óbvias considerações acima entraram no texto sem serem convidadas, mas não foram expulsas porque podem interessar a algumas pessoas com "parentes distantes" às voltas com problemas desse tipo).
Voltando ao tema central. Por que as pessoas não se interessam tanto pela leitura dos assuntos mais complexos e fascinantes? Afinal, a admiração dos ouvintes, em reuniões sociais, ouvindo o sabichão, compensaria o esforço de muitas horas lendo temas áridos. Moças belas, ainda sem dono definitivo, quando não preocupadas com o futuro financeiro imediato, ouvem com interesse o tipo insignificante, de óculos, que desperta admiração pelo que sabe com tanta segurança. Refletem: — "Esse caretinha pode ter um futuro promissor..."
A meu ver, o desinteresse pela leitura origina-se mais de uma deficiente técnica de movimentar os olhos, no ato de ler, do que de uma deficiência de inteligência. Assim como há variados tipos de artes marciais, há, também, variadas técnicas visuais e mentais na "briga" pela compreensão dos textos mais difíceis, extraindo deles o que neles se contem; tanto na superfície como "lá no fundo", na real intenção do autor. Às vezes, ressalve-se, nessas "profundidades", não há nada de útil. Apenas pose intelectual ou obscuridade proposital.
O pensamento enigmático, enevoado, mas em roupagem brilhante, seduz mais que o pensamento claro, terra-a-terra. Isso porque o leitor acaba preenchendo as abstrações vagas, ocas, com sentimentos e pensamentos próprios, sempre merecedores de autoaprovação, é evidente. Só mergulhando e dissecando o material é que é possível concluir, em certa medida, se há, ou não, fraude na obscuridade. O médico e escritor Dráuzio Varella, em uma crônica, "Acontecimentos inesquecíveis", disse que em um congresso a que compareceu, em Baltimore, USA, em 2001, com cerca de 500 pesquisadores, o coordenador, Dr. Robert Gallo, concedia apenas quinze minutos, prorrogáveis por mais cinco, para o especialista expor sua descoberta. Dizia que "quem não consegue explicar, em quinze minutos, o que faz é porque não sabe direito o que está fazendo".
Para adquirir o hábito prazeroso da leitura não basta ser alfabetizado. Nem mesmo ter frequentado escolas por vários anos. Qual a origem dessa rejeição à leitura, principalmente em jovens de inteligência mediana e que lucrariam com a aquisição de novos conhecimentos?
A explicação, mais frequente, está na existência de algum problema neurológico ou visual. Quando a mídia insiste em nos lembrar que alto percentual de alfabetizados não consegue compreender o que leu, os tais "analfabetos funcionais", a solução proposta, usualmente — muito superficial — estaria na construção de grande número de bibliotecas públicas. Ora! Se o jovem não consegue, no recesso de seu quarto, longe de intervenções, compreender bem o que lê, por que passaria a compreender os textos dentro de uma biblioteca, próximo a pessoas cuja mera presença provoca distrações?
As bibliotecas públicas atualmente só servem para aquela minoria feliz que não tem "problemas de leitura"; ou que descobriu, geralmente por conta própria, como contorná-los. Antes de se pensar apenas em bibliotecas, ou doações de livros, será preciso investigar melhor porque jovens e adultos, até bem alertas — ou "espertinhos" — detestam ler. Uma prova de que há algo de errado com a técnica de ler está no fato de muitos alunos de baixo rendimento escolar conseguirem se destacar, quando adultos, até mesmo em atividades intelectualizadas. Muitas biografias de pessoas que adquiriram notoriedade no comércio, na política, no jornalismo, nas ciências e mesmo nas letras, comprovam que, não raramente, "os últimos serão os primeiros". Conheci um cidadão que passou seis anos no primeiro ano primário, acabou desistindo de escolas, mas tornou-se um hábil construtor de casas e depois empresário. Para ele, ler era "uma tortura!" De "burro" ele não tinha nada.
A solução para a questão do "analfabetismo funcional" é a seguinte: verificando, a professora, que o aluno, apesar de não ter graves problemas de saúde e familiares, não consegue assimilar o que lê, deve chamá-lo, educadamente, para uma conversa amigável com um profissional especializado.
Para começar, um exame de vista. Para ser bom aluno, ambos os olhos devem funcionar bem, embora com a ajuda de óculos. Como mero exemplo, cito meu caso. Fui um aluno bem medíocre, antes de entrar na universidade. Raramente fazia lição de casa e também não estudava as lições. Apesar de não me considerar intelectualmente abaixo da média, não conseguia, satisfatoriamente, prestar atenção ao material impresso, não obstante sentir curiosidade pelas ideias de grandes pensadores.
Só fui bom aluno na Faculdade de Direito. Isso porque tive que inventar um método próprio de leitura. Concretamente, uma forma de movimentar os olhos no ato de ler. Só muito mais tarde, fazendo um exame de vista, com medição da pressão intraocular e do campo visual, fiquei sabendo que meu nervo ótico do olho direito é deficitário, talvez consequência de um glaucoma até então desconhecido. Na vista direita, palavras com letras pequenas ficam embaçadas, mesmo usando lentes corretivas. Como as duas vistas trabalham em cooperação —, embora com ligeira preponderância de uma delas —, o fato é que na leitura de uma linha começo entendendo bem — porque lemos da esquerda para a direita. Porém, quando o olho esquerdo "passa o bastão", na maratona da leitura, para o olho direito, o olho fraco, direito, enxerga meio "borrado", dificultando a compreensão do período. Aí, o leitor pensa que seu problema é de compreensão, quando é apenas de visão. O resultado é o desinteresse geral pela leitura. Algo assim como ouvir mal, perdendo várias palavras, o que diz um conferencista.
A solução que encontrei foi providenciar uma técnica própria de ler: dou uma boa "espiada", sem ler, principalmente no lado direito do parágrafo e só depois começo a ler. Se a coisa se complica, repito a operação. O único inconveniente é que essa técnica, embora permita compreender muito bem o texto, ocasiona uma certa demora. Se eu lesse livros em árabe, penso que meu problema de velocidade seria menor, porque textos em árabe são escritos da direita para a esquerda. Eu avançaria mais depressa porque "a estrada textual à frente" estaria bem clara. Não sei se a "técnica" acima, da mera "espiada" antes de ler, serviria também para pessoas com as duas vistas em perfeitas condições, com ou sem óculos.
Trata-se, aqui, de mero exemplo individual a demonstrar que os pais que se revoltam com a falta de dedicação do filho aos estudos precisam, antes de pensar em castigo e recriminações, verificar se o menino não tem algum problema de vista — em ambos os olhos — ou de audição, procurando corrigi-lo. Não basta constatar que o menino não é cego nem surdo. E convém, também, verificar se o jovem tem alguma deficiência endócrina, principalmente o hipotiroidismo. Testes de inteligência podem ser prejudicados, na sua exatidão, por problemas visuais, porque o tempo para as respostas é muito valorizado, nesses exames, e para ler depressa as perguntas é preciso vista boa. Finalmente, não se alegue que pessoas cegas de um olho lêem bem. Isso ocorre porque a cegueira total de um olho força o outro a dobrar sua eficiência. Analogicamente, em uma sociedade comercial, é melhor não ter sócio algum do que ter um sócio incompetente, que não vê claramente os problemas da firma.
Peço desculpas ao leitor por esta anômala excursão de leigo em assunto oftálmico e pedagógico. É que a maior parte do saber entra pelos olhos e ouvidos. Corrigir, ou contornar, problemas dos órgãos do sentido pode melhorar muito o futuro de um filho, ou filha, que no momento o decepciona. Quis apenas ajudar, com o relato acima, pode crer.
Em outro artigo falarei sobre o ato de escrever, assunto muito mais interessante, assim espero. Prometo não falar em olho.
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*Desembargador aposentado
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