Dia Internacional do Consumidor
Leonardo Augusto Pires Soares*
Realmente o tema é apaixonante e a data marca o nascimento do desdobramento positivo de nós, cidadãos: quando consumindo diretamente ou afetado por um consumo de risco, somos outro: O CONSUMIDOR !
Este outro sujeito, o consumidor, veio ao mundo, oficialmente, em 1962, após o memorável pronunciamento do então presidente americano John Fitzgerald Kennedy, que, pressionado pela sociedade e pela forte expansão industrial, reconheceu que todo e qualquer consumidor tinha direito "à segurança, à informação, à escolha e de ser ouvido". Esse é o grande marco para nós consumidores. O marco zero da moderna concepção de consumidor. É o nascimento da criatura.
É claro que consumir é algo primitivo, rudimentar na história humana. Mas alguém o chamar de consumidor, não. E é aí o grande diferencial. O mercado olhar para você e encontrar um cidadão com status de consumidor, dotado de direitos, muitos deles, ao contrário do que pensa uma minoria, não para se ter vantagem sobre os fornecedores de produtos ou serviços, mas para equilibrar essa relação, igualar forças, garantir a "paridade de armas".
A partir do momento em que o termo "consumidor" foi caindo no gosto da sociedade, passamos a buscar, e ainda buscamos, o efetivo amadurecimento dos mercados. No Brasil, especificamente, após a promulgação da lei 8.078/90 (clique aqui), que deu a luz ao CDC – Código de Defesa do Consumidor, começamos a passar por uma grande transformação. Lenta, é verdade. Mas forte e irreversível.
Instituições como o PROCON de São Paulo, fundado em 1976, e o IDEC – Instituto de Defesa do Consumidor, em 1987, criaram as bases para que outras instituições, como os Procons municipais, ganhassem força, que se multiplicou com a atuação do Ministério Público e a criação dos Procons estaduais e com o fortalecimento do DPDC – Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor, vinculado ao Ministério da Justiça.
Enfim, com a implantação do SINDEC – Sistema Nacional de Defesa do Consumidor, essencial para a integração dos diversos órgãos de defesa do consumidor, estamos nos fortalecendo, nos organizando. Atualmente temos centenas de Procons Municipais país afora, além dos Procons Estaduais e outros órgãos de defesa do consumidor e regulamentação de setores de consumo importantes.
Em outro front, diversos movimentos sociais foram surgindo, como o MDC – Movimento das Donas de Casa, fundado em 1983, em BH, e atualmente se espalhando. Advogados, Promotores, Magistrados, e diversos outros profissionais, passaram a se aprofundar no estudo do Direito do Consumidor e dele extrair verdadeiros estimulantes para a luta na harmonização das relações de consumo. Foram chegando às câmaras de vereadores, assembleias legislativas, ao Congresso Nacional, novas forças. São vários nomes de importância, mas cito as minhas referências, como o Ministro do STJ, Antônio Herman Benjamin, as juristas Cláudia Lima Marques e Ada Pellegrini Grinover, e os, atualmente, políticos Celso Russomano, de São Paulo, e Délio Malheiros, de MG, este ativo e combatente advogado consumerista. Vários outros foram, e são, importantíssimos, repito. Mas são estes, principalmente, aqueles nos quais tentei, e tento, me espelhar, desde a minha primeira experiência na área, quando chefe do PROCON do meu Município, em 2001, 10 anos atrás.
Lembro das minhas dificuldades iniciais. PROCON e Direito do Consumidor eram palavras, para uns poucos atrasados, proibidas, perniciosas. Imaginem vocês, então, em 1976, quando criado o PROCON do Estado de São Paulo. Ah, quanta resistência, quanto preconceito.
Interessante que, mesmo em 1990, quando promulgada a lei 8.078/90, mãe do CDC, havia uma grande preocupação com as reações discriminatórias contra os consumidores conscientes, altivos. O CDC nasceu, e ainda permanece, proibindo, em seu artigo 39, fornecedores de produtos e serviços de "repassar informação depreciativa, referente a ato praticado pelo consumidor no exercício de seus direitos". Veja bem a dificuldade que existia na época, a ponto de uma legislação ter que mencionar isso.
Pois bem, elencados os pontos acima, finalizo fazendo uma reflexão sobre um ponto que entendo ser, atualmente, um dos maiores problemas dos consumidores brasileiros: a despersonalização do atendimento aos consumidores.
É deveras triste, amargurante e até desumano ter que se submeter aos SACs, 0800 e similares impostos pelos grandes fornecedores de produtos e serviços, principalmente as operadoras de telefonia, as administradoras de cartões de crédito, bancos e grandes redes de comércio de produtos.
Não me venham falar de regulamentação dos serviços de SACs. Pouco ou, francamente, quase nada mudou. É um grande absurdo que o consumidor tenha de se submeter a um regime de atendimento onde tudo o que é dito, falado, tratado e destratado fique somente na posse da empresa reclamada. Isso quando realmente está se gravando alguma coisa. Gravações de atendimento ao consumidor, falo por experiência, são muito pouco vistas, mesmo em processos judiciais. Triste!
E, infelizmente, confesso, nos deparamos com alguns juízes que têm enorme dificuldade de inverter o ônus de prova, mesmo quando a prova está somente ao alcance da empresa reclamada. Isso é uma das grandes agruras do consumidor brasileiro. Isso tem de mudar.
Pois bem, encerro aqui sabendo que me limitei a falar de alguns pontos. Sei, por outro lado, que muito será dito ainda, que estamos num processo de amadurecimento das relações de consumo, da mocidade do Código de Defesa do Consumidor, que, lembremo-nos, deve passar por reforma brevemente.
O mais importante é que temos hoje uma cara, somos conhecidos e reconhecidos. Temos, portanto, de fazer nossa parte, empunhando o CDC e exigindo respeito.
Fica aqui o meu grande abraço a todos, consumidoras e consumidores brasileiros. Cidadão consciente, brioso e aguerrido tem um nome: CONSUMIDOR!
________________
*Advogado do escritório Almeida, Soares & Albeny Advogados Associados e presidente da Comissão de Defesa do Consumidor da OAB de Coronel Fabriciano
________________