Migalhas de Peso

Meras coincidências

Agora, vendo o que vemos, quase dois milhões de pessoas numa praça do Cairo exigindo a renúncia de Mubarak, num movimento sem líderes, acima dos partidos, vem ao caso lembrar o que de exato se passa com os que mesmo sem o apoio da maioria do povo conseguem vencer eleições.

16/2/2011

Meras coincidências

Edson Vidigal*

Outro dia em São Paulo numa conversa sobre essas coisas do Maranhão um editor me disse não entender como é que eles, os Sarney e os do seu grupo, sempre ganham as eleições.

Foi aí que eu lembrei o caso mais recente que está atraindo as atenções do mundo, o do Egito. Lá também o Mubarak sempre ganha eleições.

No Egito também há partidos de oposição, candidatos de oposição, mas quem faz maioria no Parlamento é o Mubarak. E o presidente há 30 anos, eleito pelo voto direto, é ele.

Agora, vendo o que vemos, quase dois milhões de pessoas numa praça do Cairo exigindo a renúncia de Mubarak, num movimento sem líderes, acima dos partidos, vem ao caso lembrar o que de exato se passa com os que mesmo sem o apoio da maioria do povo conseguem vencer eleições.

Os cenários são quase sempre muito parecidos.

O déspota de agora é alguém que num passado remoto se inscreveu e atuou em alguma batalha de libertação defendendo valores e princípios logo esquecidos no poder que açambarcou.

O Mubarak, por exemplo, esteve entre os que lutaram contra a opressão do império britânico no seu país.

No Maranhão houve uma luta de 20 anos contra a opressão do caciquismo político que só atrasava o Estado piorando as condições de vida do povo.

Depois da vitória, o que se vê ainda hoje, 50 anos depois?

O que se vê no Maranhão ainda hoje é o mesmo caciquismo político em edição ampliada consolidando o poder de uma oligarquia decadente, pobre apenas em espírito público, odiosa e de métodos gerenciais muito anacrônicos segurando a pobreza sobre um povo porque um povo pobre e dependente, ainda mais descrente nas opções oferecidas, demora muito a se levantar.

Os princípios republicanos da alternância do poder entre a pluralidade de programas e de ideias e da igualdade de todos perante a mesma lei foram atirados para escanteio.

No dever de casa a primeira providência é produzir a apatia da população, disseminando a pobreza, o analfabetismo, o entretenimento vulgar, o controle dos meios de comunicação, o suborno por meio de todo tipo de vantagem ilícita e também dos empregos públicos, das despesas públicas, de todas as verbas públicas.

Salvo as exceções que a prudência e a boa educação mandam sempre que se faça, no Maranhão hoje todos, do analfabeto ao professor, do braçal ao intelectual, quem não depende do poder público, leia-se do poder político da oligarquia, para sobreviver?

Daí que para eles, da família, fica menos difícil vencer eleições. Vencer, não. Tomar. Quando não há condições de igualdade na disputa não se vence, se toma.

Mas aqui, como no Egito de Mubarak, não conta só o poder. Não conta só a violência e a cooptação do poder e a corrupção do dinheiro.

Conta, sobretudo, a opressão do poder e a força do dinheiro mandado pelo aliado de fora.

No Egito, contou o apoio até há pouco incondicional dos Estados Unidos. No Maranhão, conta o apoio ainda hoje incondicional do Governo Federal.

Os Estados Unidos, agora sob nova direção, vendo mais de dois milhões de pessoas numa praça do Cairo reclamando contra o atraso de 30 anos no Egito, cuidou logo de retirar seu apoio a Mubarak.

Aqui ainda vamos ter que tocar o coração de cada maranhense, do analfabeto ao intelectual, do vendedor ambulante ao empresário, animando a todos contra essa dolorosa apatia.

Para que, enfim, todos despertados sensibilizem como agora no Cairo o Governo Federal? Qual nada.

Primeiro vamos ter que ganhar deles o Governo do Estado e as cadeiras do Maranhão no Congresso Nacional. Tarefa difícil, mas nunca impossível.

Do jeito que está é que não dá. Não dá mais.

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*Ex-Presidente do STJ e Professor de Direito na UFMA

 


 

 

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