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Parcelamento de crédito e a recuperação judicial

A inovação maior trazida com a lei 11.101/05 não está, exatamente, na nova disciplina da ação de falência, mas na benfazeja e oportuna criação da ´ação de recuperação judicial´ que, com mais amplitude, substitui a anacrônica concordata preventiva e a concordata suspensiva de falência.

20/1/2011

Parcelamento de crédito e a recuperação judicial

José Anchieta da Silva*

A inovação maior trazida com a lei 11.101/05 (clique aqui) não está, exatamente, na nova disciplina da ação de falência, mas na benfazeja e oportuna criação da 'ação de recuperação judicial' que, com mais amplitude, substitui a anacrônica concordata preventiva e a jurisprudência e a doutrina nascentes já a admitem, também, como substituta da concordata suspensiva de falência.

Divididos os créditos em classes (I - trabalhistas e de acidentes do trabalho; II - com garantia real; III - quirografários e com privilégios, especial ou geral, ou subordinados), o 'Plano de Recuperação Judicial' há de ser aprovado pelos credores, se for o caso, em assembleia geral de credores, onde não tem assento e não votam os créditos tributários das fazendas públicas. Tal ocorre em face da indisponibilidade do crédito tributário (impostos, contribuições, taxas e afins).

Como as obrigações de natureza tributária respondem por significativo passivo dos empresários (individuais e sociedades empresárias), fica a impressão de que, mesmo com boa vontade do devedor recuperando e de sua comunidade de credores, a solução da recuperação judicial pretendida, não teria garantia de êxito sem solução razoável para a dívida tributária existente e demonstrada na elaboração de competente 'Plano de Recuperação'.

Quando da elaboração da lei, tal não passou despercebido. A LC 118/2005 (clique aqui), elaborada em função da Lei de Recuperação Judicial, fez prever em seu artigo 1º. que: A Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional (clique aqui), passa a vigorar com as seguintes alterações: (...) Art. 155-A [...] # 3o. Lei específica disporá sobre as condições de parcelamento dos créditos tributários do devedor em recuperação judicial. Ocorre que, até hoje – passados mais de cinco anos – essa lei específica não foi editada.

Essa lacuna tem representado dor de cabeça para o melhor desempenho das ações de Recuperação Judicial propostas, sendo certo que a melhor jurisprudência tem admitido a dispensa da apresentação de certidões de tais débitos, exatamente em face da inexistência dessa lei específica.

A insegurança, todavia, permanece, porque a dívida tributária não se beneficiaria do 'Plano de recuperação judicial' embora aprovado. É incerteza que se expande e contamina toda a comunidade de credores beneficiários do 'Plano' posto. Neste ponto é preciso trazer a texto a norma do art. 68 da mesma lei a dizer que: As Fazendas Públicas e o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS poderão deferir, nos termos da legislação específica, parcelamento de seus créditos, em sede de recuperação judicial, de acordo com os parâmetros estabelecidos na Lei 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional.

É, todavia, norma visivelmente insuficiente para resolver a questão porque: (a) não se trata do parcelamento especial aludido na lei complementar já referida; (b) o texto legal está a dizer de um ...poderão deferir... não dando segurança ao cidadão quanto a seu deferimento. O jurisdicionado não despacha com o ministro da Fazenda e nem com o presidente do INSS, mas, com o funcionário de balcão. (c) os parcelamentos ordinários, em geral, são insuficientes para, em termos de prazos e condições comporem-se de modo razoável com um efetivo 'Plano de Recuperação'. (d) o legislador brasileiro não se desincumbiu de sua obrigação de dar aos empresários aquela lei de parcelamento em condições especiais.

É preciso, portanto, propor a criação de uma 'recuperação fiscal' dentro da própria 'recuperação judicial', o que se obterá cuidando-se da elaboração daquela lei a que a LC 118 determinou que se fizesse. Disso nos é devedor o Poder Legislativo brasileiro. É preciso preencher essa lacuna legal. Eis a proposta concreta para tal desiderato (em destaque) (i) A consolidação dos débitos do empresário recuperando, se faria pelo total da dívida tributária atualizada, despida das multas; (ii) Quanto ao prazo, este haverá de ser, exatamente, aquele o conferido pelo 'Plano de Recuperação' proposto e aprovado pelos credores. O fisco receberá de acordo com o prazo conferido aos credores que receberem as prestações em maior prazo de tempo; (iii) Quanto às classes, se mantém aquilo que já vigora na lei, isto é, não se altera. (iv) Quanto às instâncias de Estado (União, Estado, Municípios e Autarquias) as parcelas pagas o seriam de modo proporcional a cada uma delas. E assim estaria criada a figura saudável da 'recuperação fiscal' dentro da vitoriosa ação nova da 'recuperação judicial'.

Levamos esta ideia a debate no Instituto Brasileiro de Estudos de Recuperação de Empresa – IBR, que mensalmente se reúne nas Arcadas da Faculdade de Direito da USP, no Largo de São Francisco, em São Paulo. Foi bem recebida e a proposta estará sendo encaminhada ao Congresso Nacional nos próximos dias.

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*Presidente do IAMG - Instituto dos Advogados de Minas Gerais e advogado do escritório José Anchieta da Silva Advocacia - JASA


 

Foto: Élcio Paraíso

 

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