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Liberdade, Liberdade

A despeito do compromisso público da Presidente eleita com a liberdade de imprensa, existe um movimento político forte dentro do Governo Federal e nos Estados para estabelecer o controle da mídia digital e, com a janela, impor controle sobre todos os meios de comunicação.

7/12/2010


Liberdade, Liberdade

João Humberto Martorelli*

A despeito do compromisso público da Presidente eleita com a liberdade de imprensa, existe um movimento político forte dentro do Governo Federal e nos Estados para estabelecer o controle da mídia digital e, com a janela, impor controle sobre todos os meios de comunicação. O ministro Franklin Martins (Comunicação Social) articula as discussões no plano federal, pretendendo a criação de uma agência para controlar o conteúdo divulgado por meios de comunicação digital, e já declarou que as levará adiante ainda quando não haja consenso, a dizer, abriu abertamente o confronto. São palavras dele: "A discussão está na mesa, está na agenda, ela terá de ser feita. Pode ser feita num clima de entendimento ou de enfrentamento". Trata-se de evidente ameaça. Nos Estados do Ceará, Bahia, Alagoas e Piauí, as assembléias estaduais estudam e se preparam para votar a criação de conselhos estaduais de comunicação destinados ao controle social da mídia. Obviamente, nos bastidores desses movimentos, há confluência de interesses econômicos e políticos, sendo clara na abrangência política do assunto a interferência do ranço autoritário do Partido dos Trabalhadores. Parece que o PT, em seu projeto de perpetuação do poder, quer abafar as críticas sofridas ao longo dos últimos oito anos e as muitas que virão, as quais minaram indelevelmente sua imagem de partido ético.

O Brasil não pode deixar renascer a censura de triste e ainda recente memória. A mídia, por qualquer de seus meios, não pode e nem deve ser limitada, a pretexto algum. O limite por conselhos políticos contém forte dose de subjetividade, de cor partidária e de submissão aos humores do governante do momento, comprometendo o Estado de Direito, a democracia, a liberdade. E temos boas regras no ordenamento positivo brasileiro a dar conteúdo normativo adequado para os exageros, infrações, desrespeito à imagem das pessoas e a todos os atos que violentem direitos individuais ou causem danos a todos os brasileiros. Prevalece, aqui, o princípio da ética da responsabilidade, que consiste na obrigação de os meios de comunicação responderem pelos resultados previsíveis de suas ações. Significa que, mantendo-se a liberdade de imprensa e de todas as formas de manifestação de pensamento, os proprietários dos veículos de comunicação e os autores da manifestação respondem pelos resultados previsíveis decorrentes de seus atos. Com efeito, a Constituição Federal (clique aqui), embora assegurando, no art. 5º, IV, a livre manifestação de pensamento, assegura, no inciso imediatamente seguinte, o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem. E estabelece mais a Carta: "Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. 1º - Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV. 2º - É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística." Note-se que, compreendendo a vedação "qualquer forma, processo ou veículo", inclui a internet e todos os meios de comunicação digital, de logo abortando a feliz iniciativa do ministro e dos Estados. Nos países civilizados é assim, a liberdade é a regra e a infração enseja reparação posterior. O controle é feito pela punição ao bolso do autor da ofensa.

Devemos resistir, portanto, à incursão contra a liberdade de imprensa que advém das iniciativas aqui mencionadas, que esbarram na Constituição Federal. Fiquemos sempre atentos a todas as investidas contra a liberdade, nosso bem maior, para que ela deixe de ser objeto de regra legal e possa, como diz o poeta Thiago de Mello, ser suprimida do pântano enganoso das bocas, para se tornar algo vivo e transparente, como um fogo ou um rio, sendo a sua morada o coração do homem.

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* Vice-Presidente da Seccional do CESA/PE. Sócio fundador de Martorelli e Gouveia Advogados










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