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Mais excessos do populismo penal

É um grande equívoco (da população, da mídia e do legislador) imaginar que leis penais mais rigorosas "solucionam" o problema da criminalidade, da violência e da insegurança pública. A persistência nesse caminho errado vem gerando consequências muito drásticas para nosso país.

3/11/2010


Mais excessos do populismo penal

Luiz Flávio Gomes*

É um grande equívoco (da população, da mídia e do legislador) imaginar que leis penais mais rigorosas "solucionam" o problema da criminalidade, da violência e da insegurança pública. A persistência nesse caminho errado vem gerando consequências muito drásticas para nosso país. De acordo com os dados do IBGE, de 2010, a taxa de mortes por homicídio no país aumentou de 19,2 em 1992 para 25,4 em 2007, para cada 100 mil habitantes. Aumento de 32%!

Pesquisa revelada pelo Índice de Homicídios na Adolescência – IHA (pesquisa em 267 municípios com mais de 100 mil habitantes) dá conta de que, entre 2006 e 2012, serão assassinados mais de 33 mil adolescentes no Brasil.

De 1940 a 2009 o legislador brasileiro (atendendo as demandas punitivistas da população e da mídia) aprovou 122 leis penais, das quais 80,3% de caráter punitivista (tese de doutoramento de Luís Wanderley Gazoto). Já são 70 anos de política criminal equivocada. Basta! É hora de o Brasil abrir os olhos (de acordar para a realidade).

Os crimes, sobretudo os hediondos, têm que ser punidos (não há nenhuma dúvida sobre isso), mas não se pode confundir repressão com a verdadeira prevenção. O direito penal e a pena, quando chegam, já é tarde demais: o crime já aconteceu, a vida humana já se foi, o patrimônio já foi depredado. Como confiar (só) numa coisa (na lei penal) que nos é "vendida" como (única) "solução" para o problema da violência endêmica no nosso país?

Solução mesmo (para a criminalidade, violência e insegurança pública) só se pode esperar com uma política preventiva séria (coisa que o Brasil nunca fez eficazmente), fundada nas suas vertentes primárias (arrumar as raizes do problema), secundárias (criar obstáculos ao crime) e terciárias (evitar a reincidência). Fora disso, é triste, mas é preciso proclamar, é pura enganação, simbolismo, emotividade, emergencialismos, irracionalidade e desproporcionalidade.

No mesmo dia em que o STF admitia penas substitutivas (alternativas) para (pequenos) traficantes (1/09/10, HC 97.256), julgando inconstitucionais partes do art. 33, § 4º e do art. 44 da lei de drogas (lei 11.343/06 - clique aqui), que proibiam qualquer tipo de pena substitutiva - alternativa - para todo tipo de traficante, a CCJ do Senado aprovava projeto de lei que aumenta o rigor da punição dos autores dos crimes hediondos, incluindo-se o tráfico de drogas, passando a exigir 4/5 de cumprimento da pena de prisão em regime fechado, para que haja progressão para o regime semi-aberto: 4/5 significa 80% da pena. Isso é uma burla ao princípio da progressão de regime.

A exigência de cumprimento efetivo de 80% da pena prisional em regime fechado para só depois se permitir a progressão (para o regime semi-aberto) é flagrantemente inconstitucional, por violar o princípio da proporcionalidade (razoabilidade). O STF já julgou inconstitucional a lei dos crimes hediondos na parte em que proibia qualquer tipo de progressão de regime. Agora terá pela frente a tarefa de julgar inconstitucional a eventual lei (vamos ver se o projeto do Senado passa pela aprovação da Câmara dos Deputados) que quer exigir 80% de cumprimento da pena para a progressão de regime. Isso é irracional e desarrazoado.

Não se trata de uma exigência equilibrada, sensata. Quanto vão exigir do reincidente? 99%? Falta-lhe proporcionalidade (a mais não poder). Por via indireta o legislador está criando uma espécie de impossibilidade (prática) de progressão de regime, em flagrante burla ao princípio da individualização da pena e à decisão do STF.

Mais uma vez estamos diante do fenômeno chamado populismo penal, que só tem o propósito de enganar a (incrivelmente crente) população brasileira que, induzida pelo populismo midiático, continua vendo no rigorismo penal a "solução" para o problema da criminalidade, da violência e da insegurança pública.

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*Diretor Presidente da Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes







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