Discriminação dos direitos sociais pelo STF
José Alberto Couto Maciel*
Da Academia Nacional de Direito do Trabalho
O recurso extraordinário no processo trabalhista pode ser considerado como UM RECURSO EXCEPCIONALÍSSIMO, julgado mediante jurisprudência discriminatória a qual transforma a matéria constitucional relativa ao direito do trabalho, quase sempre em questões constitucionais reflexas, ou seja, raramente encontra a Corte Suprema uma violação direta à Constituição no que concerne ao direito do trabalho, entendendo que as normas trabalhistas, embora em sua maioria, integrantes do texto constitucional, não ultrapassam da legislação ordinária possibilitando sua apreciação pelo STF.
Diz a Constituição da República em seu artigo 102, III, a), que cabe ao STF julgar em recurso extraordinário as causas decididas em única ou última instância, quando a decisão recorrida CONTRARIAR DISPOSITIVO DESTA CONSTITUIÇÃO.
Este artigo não estabelece diferenciação de processos tendo em vista a matéria, não discriminando, como efetivamente não poderia, as causas trabalhistas das demais.
O art. 7º da referida Constituição enumera quais os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que sejam dispostos legalmente e fixa o prazo prescricional quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho.
No artigo 8º do texto constitucional está regulamentada a associação profissional ou sindical e no artigo 9o o direito de greve.
Por outro lado, dispõe o artigo 5º, LV, da Carta Magna, que aos litigantes, em processo judicial ou administrativo e aos acusados em geral, são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.
É de se ressaltar que tal artigo também não discrimina quanto aos litigantes trabalhistas, sendo que o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada são institutos garantidos também a todos os trabalhadores, e não apenas a uma parcela de litigantes.
Pois bem, acontece que o STF somente admite recursos extraordinários trabalhistas eventualmente, podendo se dizer que raros são os recursos apreciados pela Excelsa Corte quando derivados da última decisão do TST, embora alguns tragam em seu bojo natureza efetivamente constitucional.
Digo que, por exceção, os Ministros da Suprema Corte, em um caso ou outro, determinam sua subida e julgam o extraordinário, não sendo este, porém, o critério geral que é, como se constata da uníssona jurisprudência, totalmente denegatório desses recursos.
Após a vigência da EC 45, de 8 de dezembro de 2004, que estabeleceu no parágrafo 3º do inciso III, do artigo 102 da CF/88, que no recurso extraordinário o recorrente deverá demonstrar a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso, nos termos da lei a fim de que o tribunal examine a admissão do recurso, evidentemente que o recurso extraordinário se tornou um recurso mais seletivo para todos os ramos do direito, pois há de ser nele demonstrado um interesse maior, de repercussão não só no caso em debate, mas de interesse geral.
Nesse sentido a jurisprudência da Suprema Corte que já vinha restringindo os processos oriundos da Justiça do Trabalho, passou a limitar de forma a propriamente afastar do exame constitucional questões trabalhistas da mais alta relevância.
Mas vejamos como vinha evoluindo a jurisprudência do STF, quanto aos processos trabalhistas, nos últimos tempos, anteriormente à EC 45 de dezembro de 2004.
A ementa de acórdão no AI 339.862, 2ª turma, relator Ministro Celso de Mello, repetida por quase todos os Ministros, algumas com maior amplitude, evidencia bem a questão:
"A jurisprudência do STF pronunciando-se em causas de natureza trabalhista deixou assentado que, em regra, as alegações de desrespeito aos postulados da legalidade, do devido processo legal, da motivação dos atos decisórios, do contraditório, dos limites da coisa julgada e da prestação jurisdicional, podem configurar, quando muito, situações de ofensa meramente reflexa ao texto da Constituição, circunstância essa que impede a utilização do recurso extraordinário. Precedentes..."
Ora, lendo com atenção esta ementa, e outras, seguida pelos demais Ministros, era possível concluir, QUE NÃO CABE MAIS RECURSO EXTRAORDINÁRIO PARA O SUPREMO TRIBUNAL DE MATÉRIA TRABALHISTA, A NÃO SER QUE O MINISTRO, EM UM OU OUTRO CASO, ACEITE APRECIAR A HIPÓTESE COMO EXCEÇÃO, COMO ALIÁS , EM ALGUNS CASOS ACONTECIA.
Mas o que impressiona nos textos ementados da Suprema Corte negando, por despacho, os recursos extraordinários e agravos, é que todos se referem a recursos EM SEDE PROCESSUAL TRABALHISTA (RTJ 120/912, RE 326333 DF, AI 182.811 e outros).
Não apreciavam mais os Ministros se, nos casos trabalhistas, houve violação à coisa julgada, falta de prestação jurisdicional, ou qualquer outra violação constitucional, quando poderiam, daí sim, dizer que, naquele caso a violação é reflexa. Passou-se à generalização, sendo que todos os recursos advindos da Justiça do Trabalho, com honrosas exceções, refletiam situação de ofensa indireta ao texto constitucional.
É evidente que existem muitos recursos extraordinários interpostos contra a última decisão da Justiça do Trabalho e, excetuando-se os procrastinatórios, que podem existir em todos os ramos do direito, são eles mais numerosos porque o constituinte, por vontade popular, inseriu na Constituição todos os direitos básicos do trabalhador, dando-se até mesmo ao texto o apelido de "Constituição Cidadã".
Quando assim agiu o constituinte, aprovando a Constituição, inserindo em seu corpo todos os direitos trabalhistas, se estes forem violados certamente que seu texto será violado, não havendo como a Suprema Corte fugir dessa verdade, a não ser julgando inconstitucionalmente, o que me parece contrário a todo o direito, pois o STF é o guardião da Constituição, não podendo discriminar os processos que lá chegam por matéria, por celeridade, ou seja por qualquer outra razão.
Certo que o desrespeito ao princípio da legalidade, artigo 5º, II), não deve servir sempre como fundamento para o recurso extraordinário, pois, na maioria das vezes, evidencia uma violação legal, ferindo o texto constitucional por via reflexa.
Quando os Ministros querem, porém, altera-se o entendimento da Corte e cria-se nova tese em favor de um caso específico, especialmente se não é ele trabalhista.
Por exemplo, no recurso extraordinário 158655-9, do Pará, acórdão publicado no DJ de 2/5/97, entendeu a Egrégia 2ª turma do STF, exatamente ao contrário do que vêm entendendo pacificamente todos seus Ministros com relação ao recurso extraordinário no processo trabalhista, interposto por violação ao citado artigo 5º, LV, da EC 1, quanto ao devido processo legal, assim dizendo a ementa do acórdão:
"Defesa – devido processo legal – inciso LV do rol das garantias constitucionais – exame – legislação comum. A intangibilidade do preceito constitucional assegurador do devido processo legal direciona ao exame da legislação comum. Daí a insubsistência da ótica segundo a qual a violência à Carta Política da República, suficiente a ensejar o conhecimento de extraordinário, há de ser direta e frontal. Caso a caso, compete ao Supremo Tribunal Federal exercer crivo sobre a matéria, distinguindo os recursos protelatórios daqueles em que versada, com procedência, a transgressão a texto constitucional, muito embora torne-se necessário, até mesmo, partir-se do que previsto na legislação comum. Entendimento diverso implica relegar à inocuidade dois princípios básicos em um Estado Democrático de Direito – o da legalidade e do devido processo legal, com a garantia de ampla defesa, sempre a pressuporem a consideração de normas estritamente legais."
Vejam bem, no acórdão citado anteriormente, da 2ª turma, em processo trabalhista, afirma o Ministro Celso de Mello que o devido processo legal não viabiliza recurso extraordinário constitucional trabalhista.
A mesma 2ª turma, conforme disposto na ementa acima, em processo comum, considera que o devido processo legal deve ser respeitado e aprecia então violação constitucional, ensejando o provimento de recurso extraordinário.
Digamos que a parte recorra extraordinariamente, demonstrando que a Justiça do Trabalho se negou a julgar recurso a que estava obrigada, não assegurando ao recorrente a ampla defesa. Por que, nessa hipótese, é incabível o recurso extraordinário? Qual a via reflexa? Como discriminar o processo trabalhista dos demais processos se a Constituição não faz tal distinção?
Por que os limites da coisa julgada podem ser desobedecidos pela Justiça do Trabalho e contra esse tema as partes não podem ter seu recurso extraordinário apreciado pelo STF? Esta matéria não é reflexa de violação legal, como dizem as citadas ementas.
Por que não se entender que a violação reflexa é à lei sendo direta à Constituição? No grau de hierarquia a segunda precede à primeira.
O cerco se fazia à unanimidade das matérias recorridas. Em despacho no Ag de Inst. 488.917 – 2, tratando-se de prescrição do FGTS, diz o r. despacho
"Agravo de Instrumento contra decisão que inadmitiu RE, interposto em face do acórdão do TST assim ementado:
"O FGTS referente à ajuda de custo aluguel, paga pelo empregador ao empregado ao longo da execução do contrato de emprego submete-se à prescrição trintenária (Súmula 95 do TST). Cuidando-se de parcela remuneratória paga durante o contrato, a mera circunstância de reconhecer-se-lhe a natureza salarial em juízo não afasta a incidência da prescrição trintenária para a cobrança do FGTS. A Súmula 206 do TST concerne à situação bem diversa de parcelas não pagas e postuladas em juízo, a respeito das quais se declara a prescrição parcial com inexorável reflexo na prescrição do acessório (FGTS).
Embargos que não se conhece".
É inviável o RE. A questão da prescrição, no caso em que se discute somente o direito a diferenças de FGTS sobre valores pagos fora do salário – se trintenária ou quinquenária – situa-se no âmbito infraconstitucional, insuscetível de apreciação em RE."
Data vênia, esta matéria de maior profundidade constitucional trabalhista, deve ser apreciada pelo STF uma vês que a prescrição trabalhista, está repetida no novo texto do artigo 11 da CLT, pois foi totalmente regulamentada pelo artigo 7º, inciso XXIX do texto constitucional.
Não trata mais a Constituição de prescrição de direitos trabalhistas, mas sim de créditos resultantes das relações de trabalho.
É preciso que o Poder Judiciário Trabalhista seja esclarecido pela Corte Suprema sobre o alcance dos créditos resultantes das relações de trabalho, matéria repetida na lei, e portanto, inviável de ser elaborado o recurso extraordinário por via reflexa.
Se o FGTS atualmente está expresso no referido artigo 7º da Constituição, e se dele deriva um crédito em razão da relação de trabalho, porque a ele não se aplica a prescrição citada no artigo 7º, inciso XXIX da Constituição, mas sim a prescrição trintenária, tal matéria não é constitucional e isto visto antes da EC 45?
É de se salientar que nem todos os despachos denegatórios de matéria trabalhistas têm caído na vala comum da generalidade. Como se vê do DJ de 11/3/04, no AI 489955-8, ao despachar negando provimento ao agravo em matéria trabalhista, disse o Ministro Sepúlveda Pertence que não era cabível o extraordinário porque na hipótese não era possível de se falar em negativa de prestação jurisdicional.
Analisou, então, o eminente Ministro, as alegações da parte, demonstrando que o que se pretendia não era ter havido a falta de prestação jurisdicional, mas sim uma insatisfação com o que foi decidido.
Perfeito o despacho do ilustre Ministro, pois não discriminou o recurso como gênero dos que não podem ser admitidos por tratar de matéria processual trabalhista, (VIOLAÇÃO REFLEXA), mas sim porque, no caso, teria havido a devida prestação jurisdicional.
Também, apreciando uma rara tese considerada constitucional em recurso extraordinário trabalhista, o Ministro Carlos Mário Velloso como relator no RE 198.092, bem como os demais Ministros, na mesma linha, consideraram que a contribuição sindical não se confunde com a contribuição confederativa, prevista no art. 8º, IV, primeira parte, da Constituição Federal.
Mas esta é uma, dentre talvez um máximo de dez, ou vinte decisões, colhidas dentre milhares de outras prolatadas em recursos extraordinários interpostos da Justiça do Trabalho, apreciada pelo STF.
Um dos eminentes Ministros da Corte Suprema, atualmente já aposentado, chegou a ementar em diversos despachos denegatórios de recurso extraordinário, que não caberia tal recurso em matéria trabalhista, (AI 276866 e AI 272170).
Em despacho no Recurso Extraordinário 414.878-1, oriundo da Justiça do Trabalho, disse a Egrégia 2ª turma, que o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada encontram proteção em dois níveis, em nível infraconstitucional, na Lei de Introdução ao CC, art. 6º, e em nível constitucional, art. 5º, XXXVI, C.F. Todavia, o conceito de tais institutos não se encontra na Constituição, art. 5º, XXXVI, mas na lei ordinária, art. 6º, da LICC. Assim, a decisão que dá pela ocorrência, ou não, no caso concreto, de tais institutos, situa-se no contencioso de direito comum, que não autoriza a admissão do RE.
Ora, com todas as vênias, se não cabe recurso extraordinário contra a violação ao ato jurídico perfeito, ao direito adquirido e à coisa julgada, resta pouco de garantias constitucionais para o Supremo Tribunal apreciar, devendo ser ressalvado que este entendimento se repete, sempre, em matéria trabalhista.
Essas garantias são básicas e fundamentais ao ser humano e decorrem dos mais relevantes princípios constitucionais. É certo que sua definição está no CC, mas nem por isso passam a ter uma predominância de direito legal, pois ninguém viola a definição do que venha a ser direito adquirido, coisa julgada ou ato jurídico perfeito, mas sim os próprios direitos constitucionais, lá definidos.
O curioso, entretanto, é que quando o Supremo Tribunal Federal quer ele julga a matéria trabalhista mesmo que seja efetivamente referente a tema processual.
Assim é que, em agravo, contra despacho do Ministro Carlos Veloso, que entendia, coerentemente, que a matéria processual debatida nos autos era de natureza infraconstitucional, considerou a Segunda Turma, em acórdão da lavra do Ministro Gilmar Mendes, que a rescisória interposta no Tribunal Regional do Trabalho, pedindo a rescisão da sentença e não do acórdão regional, abrangeria também o referido acórdão, pois sentença teria um significado amplo, daí determinar a Turma o retorno dos autos ao Tribunal Regional do Trabalho para julgamento de mérito da ação rescisória, (RE 395662 AgR/RS).
Na hipótese acima sim, seria de se perguntar, qual a matéria constitucional que a Suprema Corte encontrou para decidir que uma rescisória foi interposta de forma processual correta, uma vez que sentença pressupõe também acórdão. Entretanto, casos esporádicos como esse, acontecem e o advogado fica entre a cruz e a espada, sem saber se no seu processo interpõe ou não recurso extraordinário, pois, repentinamente, o que era processual é conhecido e provido e o que era inconstitucional é tido como definido legalmente.
É certo que existem extraordinários protelatórios, nos quais a parte tenta demonstrar a violação constitucional, certamente que por meios reflexos, como acontece quando não aceita uma decisão a ela contrária e alega, então, falta de prestação jurisdicional.
Mas essas hipóteses, que podem existir em todos os ramos do direito, são decorrentes de recursos mal elaborados, aos quais pode ser aplicada a multa correspondente, não devendo, entretanto, servir como exemplo para se generalizar a negativa do extraordinário na área trabalhista, para todas as demais questões.
O advogado que milita na Justiça do Trabalho, gostaria de ter uma resposta do STF relativamente às limitações impostas no recurso extraordinário a PROCESSOS DE NATUREZA TRABALHISTA, pois, ao meu ver, não existe essa diferença de natureza das causas para que se alcance a apreciação da mais alta Corte do País em matéria constitucional.
Sabe-se que milhares são os recursos na Justiça do Trabalho, como também ninguém desconhece do volume impressionante de recursos extraordinários para o Supremo Tribunal, esgotando-se a Corte e seus Ministros com uma carga de trabalho inadmissível.
A reforma processual, tão necessária a amenizar esse sofrimento e atraso processual no Brasil, não pode, entretanto, ser feita mediante limitações da jurisprudência, ao meu ver inconstitucionais, especialmente porque discriminam determinado tipos de causas por sua natureza.
Isto significa dizer que, quando um processo tem origem em outro Tribunal, com matéria, por exemplo, sobre os limites da coisa julgada, cabível é o recurso extraordinário, mas se a mesma tese tem origem no TST, tal questão é de norma legal, reflexa à Constituição.
A jurisprudência do STF exige que o conflito no extraordinário seja direto e frontal, mas a violação da coisa julgada, do direito adquirido, a falta de prestação jurisdicional, o ferimento à prescrição, a negativa ao ato jurídico perfeito, bem como afrontas diretos a direitos constitucionais trabalhistas inscritos no referido artigo 7º do texto constitucional, se realmente forem violações demonstradas no recurso extraordinário, podem e devem ser apreciadas pela Suprema Corte, como todas as demais matérias, pois ferem diretamente o texto da Carta Magna.
Existem temas na Justiça do Trabalho de alta relevância constitucional, podados, data venia, pela atual jurisprudência do STF. Exemplificando, em despacho em agravo de instrumento trabalhista, foi ele inadmitido pela Suprema Corte, até com multa para a parte, porque se pretendia apreciar os efeitos jurídicos de uma transação, realizada com a homologação do sindicato, e negado seu valor pelo TST.
Disse a Corte Suprema que tal violação seria reflexa, pois se discutia transação na área do trabalho, somente havendo reflexo constitucional e não afronta direto à Constituição. Não seria possível aos Ministros apreciarem no extraordinário se houve um ato jurídico perfeito em uma transação, homologada judicialmente, com a concordância do sindicato profissional?
Questões sobre planos econômicos, como as URPS de abril e maio de 1988, sobre as quais o STF abriu suas portas para, durante anos, modificar toda a jurisprudência sumulada do TST, evidenciando que não havia direito adquirido aos referidos planos, salvando as empresas no país, atualmente não estão sendo mais apreciadas, por considerar a Suprema Corte que tais questões teriam sido julgadas à luz da legislação infra-constitucional.
Ora, é exatamente em decorrência da legislação infra-constitucional trazer em seu corpo direito adquirido ou não, é que foram centenas de recursos extraordinários julgados pelo STF , sendo que, atualmente, de forma paradoxal, tornam-se incabíveis os recursos quanto a essas matérias.
Mas essas restrições feitas pelo STF, ora citadas, podemos afirmar que se afiguravam antes da EC 45, que ora exige para que o extraordinário seja apreciado que haja repercussão geral demonstrada.
E, nesse aspecto, agora, com muito mais rigor, tem entendido a Egrégia Suprema Corte que:
Constitucional, processual civil, agravo regimental em agravo de instrumento, ausência de prequestionamento, súmula 282 – legislação local, alegada ofensa ao art. 5º, XXXV, LIV, LV da Constituição Federal. Ofensa reflexa. Agravo Improvido. 1. – Inadmissível recurso extraordinário se a questão constitucional suscitada não tiveer sido apreciada no acórdão recorrido. A tardia alegação de ofensa ao texto constitucional, apenas deduzida em embargos de declaração não supre o prequestionamento. II – A jurisprudência da Corte é no sentido de que a alegada violação ao art. 5º, XXXV, LIV e LV da Constituição, pode configurar, quando muito, situação e ofensa reflexa ao texto constitucional, por demandar análise de legislação processual ordinária. III – O acórdão recorrido dirimiu a questão dos autos com base na legislação infraconstitucional, local, aplicável à espécie. Inadmissibilidade do RE, ante a incidência da Súmula 2890 do STF. Agravo Regimental improvido (AI 631711 relator Ministro Ricardo Lewandowski.).
E cito outro acórdão apenas para evidenciar a orientação
Pacífica da Suprema Corte após a vigência da repercussão geral:
“Recurso Extraordinário. Inadmissibilidade. Ausência de razões novas. Decisão mantida. Agravo regimental improvido. Nega-se provimento a agravo regimental tendente a impugnar , sem razões novas, decisão fundada em jurirprudência assente na Corte.
Recurso Extraordinário. Inadmissibilidade. Alegação de ofensa ao art. 5º, II, e XXXVI da CF/88. Ofensa constitucional indireta. Agravo regimental não provido. As alegações de desrespeito aos postulados da legalidade, do direito adquirido e do ato jurídico perfeito se dependentes do reexame prévio de normas inferiores, podem configurar, quando muito, situações de ofensa meramente reflexa ao texto da Constituição.”(RE Agr 551426/DF, relator Ministro Cesar Peluso – DJ de 18.02.2008).
Somente pelas duas ementas acima expressas, vemos a quase impossibilidade de apreciação da Suprema Corte, verificando a repercussão geral, de questões constitucionais trabalhistas.
Certamente que a violação do direito adquirido, do ato jurídico perfeito e da legalidade serão sempre, ao ver da Corte Suprema, matérias de ofensa meramente reflexa ao texto da Constituição, porque teria de ser apreciada a norma legal violada, como se fosse possível ser apreciada a violação à legalidade, ao ato jurídico perfeito ou ao direito adquirido diretamente, sem uma análise da norma legal que foi violada.
Por outro lado, normas processuais, mesmo que abranjam matéria constitucional, e nem se diga que a Constituição não trata de processo, tais normas não são passives de apreciação em recurso dirigido do TST para o Supremo Tribunal.
Alegar ofensa ao artigo 5º, XXXVI da Constituição será sempre uma violação constitucional indireta, mesmo que atingida a própria coisa julgada.
A lesão ou ameaça de direito que viole a Constituição, inciso XXXV de seu artigo 5º, não pode ser objeto de extraordinário porque, no entender do Supremo Tribunal, em matéria trabalhista, não traz em seu bojo a repercussão geral necessária.
Da mesma forma, os incisos LIV e LV do artigo 5º da Constituição, que tratam do devido processo legal e da ampla defesa, contraditório e recursos a ela inerentes, não possibilitam recurso extraordinário por repercussão geral, porque, ao ver dos Ministros do STF, são matérias de violação constitucional indireta, reflexa.
Ora, o que acima visto, e somente em duas ementas de agravos, evidencia que não há possibilidade constitucional de que os direitos sociais, a não ser com rara exceção e muito boa vontade, alcancem a apreciação constitucional pela Suprema Corte, devida a todos os cidadãos brasileiros, em especial aos trabalhadores e empresas que constroem e estruturam este país.
Creio, porém, que se faz necessário uma análise de maior relevância sobre a repercussão geral, especialmente quanto aos direitos trabalhistas.
Após a Constituição de 1988, “Constituição Cidadã”, foram os direitos sociais inseridos no texto constitucional, e não o foram por mero descuido dos constituintes, mas sim porque o objetivo principal dos que elaboraram seu texto for dar maior ênfase ao social, predominando sobre o econômico, e conceder ao direito do trabalho uma garantia mais ampla, PORQUE OS DIREITOS, ESPECIALMENTE DOS TRABALHADORES, SÃO DE NATUREZA PESSOAL, ALIMENTAR E DE REPERCUSSÃO GERAL A TODO O PAÍS.
Assim, quando os direitos e deveres individuais e coletivos foram inseridos no Título II da Constituição, entre os direitos e garantias fundamentais, passaram a ter força eminentemente constitucional e repercussão nacional, porque abrangem todos os trabalhadores brasileiros, assim como os setores econômicos da nação.
O debate sobre a garantia no emprego, a prescrição de créditos trabalhistas, a redução de salários, pisos salariais, amplitude das convenções coletivas, remuneração do trabalho e sua diversidade, horas-extras e todas as proteções ao salário, participação nos lucros, jornadas, saúde higiene e segurança do trabalho, serviços insalubres e perigosos, Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, discriminação de salários e critérios de admissão do trabalhador, trabalho de portadores de deficiência, assim como sindicalismo, greves e outros direitos, são questões da mais alta relevância para o país, cujas teses constitucionais devem ser pacificadas pelo Supremo Tribunal Federal, e não discriminadas, como tendo interesses meramente reflexos.
O que acontece, entretanto, é que com a orientação da Suprema Corte, nem os agravos de instrumento contra despachos do Presidente do Tribunal Superior do Trabalho que inadmite recursos extraordinários trabalhistas, estão sendo processados, porque há uma delegação para que a própria presidência do Tribunal de origem aplique diretamente a jurisprudência da Suprema Corte de que as matérias (quase todas) em debate não possuem repercussão geral.
A conclusão é que, quanto aos direitos sociais, com raríssimas exceções, não há uma Corte constitucional que os aprecie para dar o entendimento acorde com o texto constitucional em vigor.
Mas necessário é alertar sobre o procedimento atual adotado no próprio TST.
O recurso extraordinário julgado por aquela Corte Trabalhista é o chamado recurso de revista, decorrente de violação legal ou constitucional, ou de divergências entre os Tribunais Regionais, ou, ainda da própria Seção de Dissídios Individuais do TST.
Com a alteração nos embargos para a SDI I, que atualmente só são admitidos por divergência entre as Turmas ou com os acórdãos da própria SDI I, tal recurso, que unificava a jurisprudência trabalhista para todo o país está ficando cada vez mais escasso.
É que os Presidentes dos Regionais quase que indeferem todos os recursos de revista interpostos. Chegam eles às Turmas do TST, mediante poucas revistas e muitos agravos. Os agravos são julgados em uma estatística que pela prática podemos afirmar como sendo improvidos em mais de noventa por cento.
Por outro lado, os recursos de revista, que alcançam julgamento no TST, após passar pelo crivo do Presidente do Regional e do próprio Ministro Relator, estatisticamente não são conhecidos em um volume relevante, sobrando poucos a serem julgados quanto ao mérito, e desses é que é possível interpor recursos de embargos para a Seção de Dissídios Individuais I, e quando há divergência.
Quanto aos processos coletivos, cujo poder normativo trazia ao TST teses da mais alta relevância para o país, que eram aqui discutidos em número elevado, semanalmente, após a Emenda Constitucional n. 45, passaram esses recursos a serem poucos, e na maioria extintos, uma vez que se exige atualmente o acordo entre as partes para que haja o conflito, o que me lembra a situação do título de eleitor no Brasil, ou seja, só não é exigido para votar. Ora, como se admitir que as partes, para entrar com um conflito na Justiça, façam acordo sobre isso?
Feita essa apreciação o que vemos é que, na prática, a jurisprudência em matéria trabalhista, especialmente em razão do não conhecimento dos recursos de revista, última decisão do processo na Justiça do Trabalho, e a inviabilidade de alçar essas teses a nível constitucional com sua apreciação pela Suprema Corte, passa a ser determinada pelos próprios acórdãos do Tribunais Regionais, cada um com suas peculiaridades locais, o que traz para o direito do trabalho no Brasil, uma legislação, embora federal, com feições regionais frente à interpretação local que é dada pelas Cortes de Cada Estado, como se houvesse um direito do trabalho regendo cada localidade do país, sem que haja, realmente uma unificação, quer a nível de norma federal, pelo TST, quer a nível constitucional, pelo STF.
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*Sócio do escritório Advocacia Maciel
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