Investimentos no futebol
O futebol, visto sob uma perspectiva econômica, é um negócio que, desde que bem explorado, possui perspectivas de alta rentabilidade. Esquecendo por ora o mercado brasileiro e focando no Europeu, fortes investimentos foram feitos no ano passado e neste que inicia, especialmente na Inglaterra. A título ilustrativo, a Fly Emirates, companhia aérea dos Emirados Árabes, fechou com o Arsenal um acordo de patrocínio de 150 milhões de dólares, o que lhe possibilitará a exploração do “naming rights” do novo estádio do clube por 15 anos, além de estampar sua marca na camiseta por 8 anos. O famoso milionário americano Malcolm Glazer ratificou em fevereiro deste ano uma proposta de 800 milhões de libras para a compra do Manchester United. O Barcelona recebeu proposta para que, pela primeira vez na sua história, estampe a marca de uma empresa em sua camiseta por 15 milhões de euros/ano. Ou seja, para muitos, altos investimentos no futebol parecem ser bons negócios.
Logicamente não apenas de números positivos vive o futebol. No mês de fevereiro dois tradicionais clubes europeus expuseram sua fragilidade: o Servette da Suíça foi à falência e o Borussia Dourtmund, primeiro clube alemão a abrir o capital no mercado de valores mobiliários, quase tomou o mesmo rumo, tendo conseguindo, porém, uma moratória junto aos credores. Ademais, como outro número significativo, o Chelsea, do bilionário russo Roman Abramovich, estabeleceu na temporada 2003-2004 o recorde de prejuízo no futebol inglês: 166 milhões de dólares.
No mercado internacional, assim como no Brasil, está se consolidando um novo agente de investimentos no futebol: os fundos. Tal comunhão de recursos assume duas formas: uma, regulamentada pelos órgãos do mercado de capitais, e a outra, com formatação jurídica livre, representada pela comunhão de recursos para investimentos no futebol. O objetivo destes fundos tem sido a aquisição de direitos econômicos sobre as transferências de jogadores. O exemplo mais bem sucedido de fundo de investimento, regulado, é o FP Football Players Fund, do Futebol Clube do Porto, atual campeão da Copa Intercontinental.
Quanto ao mercado brasileiro, o mesmo foi fortemente sacudido com a entrada do Media Sports Investments (MSI) no Corinthians. Ressalvadas as discussões travadas sobre a origem dos recursos, a verdade é que os investimentos que estão sendo feitos, principalmente na aquisição de jogadores de expressão mundial, como é o caso de Carlito Tevez, em uma operação de aproximadamente U$ 20 milhões (a maior da história no Brasil), são extremamente positivos pois voltam a focar as atenções internacionais nos clubes do Brasil. O único problema que deve ser equacionado, e com o qual os clubes já se depararam em meados da década de 90, é com a volta da inflação salarial, quando os clubes brasileiros, irresponsavelmente, tentaram pagar salários iguais aos padrões europeus. As conseqüências disto são sabidas.
O produto futebol possui peculiaridades que poucos segmentos do mercado possuem, eis que, sobretudo, existe um forte vínculo emocional entre o torcedor-consumidor e o clube-jogador. O problema é que para que este produto seja atrativo a investidores, a rentabilidade não pode apenas ficar adstrita à formação e transferência de jogadores ao exterior. Deve se procurar alternativas de arrecadação que propiciem aos clubes condições de manter seus melhores jogadores em solo nacional. O problema é que os clubes, de uma forma geral, não têm logrado êxito nesta empreitada, estando as fontes de receitas adstritas às tradicionais rubricas: televisão, transferências e patrocínio.
Por exemplo, na temporada 2003/2004 o Mancheter United gerou receitas, contabilizadas apenas aquelas ligados à “matchday, commercial and broadcasting”, na ordem de 259 milhões euros, cuja composição é a seguinte: receitas de dia do jogo - 36%; receitas de transmissão de jogos - 36%; e receitas comerciais - 28%. No Brasil, em uma boa parte dos clubes que disputam a Série A do Campeonato Brasileiro, as receitas de televisão superam facilmente a faixa dos 50%. Isto sem contar que as receitas de bilheteria são poucos significativas (a não ser nos dias de estádio lotado, o que nem sempre ocorre) e o licenciamento de marcas ainda é um sonho a cada dia destruído pela pirataria e pela incapacidade dos administradores na sua exploração. Destarte, em face da imensa dependência dos recursos de televisionamento, para equacionar as receitas e despesas só resta uma saída: vender o craque do time.
Portanto, a nosso ver, os clubes brasileiros não prescindem de um investidor para manutenção de suas atividades. Está mais do que provado que os clubes não possuem condições próprias para gerar receitas suficientes a manter um elenco competitivo. Receber um investidor, seja ele nacional ou estrangeiro, não significa “vender” o clube, como muitos apregoam. Significa sim estar atento ao ambiente micro e macro-desportivo, no qual os resultados no futebol deixaram de ser apenas os desportivos para inserirem-se com força no panorama financeiro e mercadológico. Agora, o êxito de uma parceria vai depender muito da negociação entre as partes, de caso a caso. O que não se pode é generalizar que todas as parcerias são boas ou que todas são ruins. Isto dependerá do ponto de equilíbrio a ser encontrado entre clube e investidor.
Como vários outros negócios, o futebol é um investimento de risco. Tanto se pode perder todo o investimento como se pode obter uma lucratividade que dificilmente se obteria em outros segmentos. Atualmente esta lucratividade está centrada nas receitas de transferências de jogadores ao exterior. Porém, há muitas possibilidades de se explorar outros negócios dentro deste contexto, como o “naming rights”, a construção de arenas, a formação de fundos de investimentos regulados pela CVM, etc. Já temos os melhores jogadores do mundo. É necessário agora termos os melhores clubes do mundo. Para isso, sejam bem vindos os investidores internacionais.
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* Advogado do escritório Carlezzo Advogados Associados e diretor do Instituto Brasileiro de Direito Desportivo - IBDD