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A Constituição e a Reforma Trabalhista e Sindical

Colocamo-nos entre aqueles que clamam por uma nova lei trabalhista compatível com a nova realidade do Brasil, defendendo-se e preservando-se, de qualquer forma, os legítimos interesses nacionais, mesmo sob uma perspectiva do processo de globalização que aflige o mundo atual.

12/4/2005

A Constituição e a Reforma Trabalhista e Sindical


José Eduardo Duarte Saad*

Colocamo-nos entre aqueles que clamam por uma nova lei trabalhista compatível com a nova realidade do Brasil, defendendo-se e preservando-se, de qualquer forma, os legítimos interesses nacionais, mesmo sob uma perspectiva do processo de globalização que aflige o mundo atual.

A Consolidação das Leis do Trabalho, com suas normas rígidas e uniformes, não se adapta, em muitos pontos, às transformações ocorridas no meio social e econômico de um país que, a largos passos, deixa de ser subdesenvolvido, para ser considerado, por muitos, potência emergente.

Examinando-se as diversas e respeitáveis correntes existentes neste processo de “Reforma Sindical” e “Reforma Trabalhista” desencadeado pelo atual Governo, pode-se dizer que elas se manifestam nos seguintes termos:

a) elaboração de uma Emenda Constitucional para suprimir, do art. 8º., da Constituição Federal, o inciso II (que consagra o sindicato único, dando margem, assim, à instituição do pluralismo sindical); o inciso IV (que trata das contribuições compulsórias às entidades sindicais) e inciso VI (que assegura a obrigatoriedade da participação dos sindicatos nas negociações coletivas).

b) nessa Emenda Constitucional, deverá, ainda, haver a redução do casuísmo do art. 7º. , no arrolamento dos chamados direitos dos trabalhadores, permitindo que eles sejam passíveis de negociação coletiva. Com essa redução do casuísmo de direitos indisponíveis, haverá a dilatação do campo reservado para a negociação coletiva. Atente-se que, no caso, poder-se-á manter a redação atual desse artigo 7º,., acrescentando-lhe que tais direitos são passíveis de negociação coletiva. Por certo, tal negociação coletiva não poderá acarretar a supressão de direitos que são considerados necessários para a preservação da efetiva dignidade na natureza de Ser Humano do trabalhador e de seus familiares. Não poderão ser suprimidos, por negociação coletiva, por exemplo, os seguintes direitos: ao salário mínimo; ao seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário; ao 13º salário; ao repouso semanal remunerado, às férias; à redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança; ao reconhecimento dos pactos coletivos de trabalho, dentre outros que a lei ordinária venha estabelecer.

c) elaboração de lei ordinária para compatibilizar a celebração dos pactos coletivos com o pluralismo sindical;

d) elaboração de uma lei complementar fixando os limites da legislação supletiva dos Estados no campo do Direito do Trabalho, na forma do art. 22, parágrafo único, da Constituição/88. Com essa possibilidade dos Estados legislarem supletivamente, por certo que as normas ficarão mais flexíveis para atender os diversos níveis de desenvolvimento socioeconômico existentes no país.

O unitarismo sindical é inconciliável com o regime democrático que tem, como um de seus postulados, a liberdade de associação. Inconsistente, a mais não valer, o argumento de que a uniformidade dos interesses dos trabalhadores induz e justifica o sindicato único.

É infenso à liberdade sindical a cobrança obrigatória de contribuições de trabalhadores e de empresários, o que justifica o expurgo do inciso IV, do já citado art. 8º, da Constituição.

Quanto ao inciso VI desse artigo, que assegura a participação obrigatória dos sindicatos nas negociações coletivas, claro está que tal obrigatoriedade não se coaduna com a liberdade sindical. Trabalhadores e empregadores devem ter a liberdade de decidir se devem negociar diretamente ou se devem contar com a assistência de uma entidade sindical, mesmo que seja de outra categoria econômica ou profissional. Esta liberdade de escolha é o cerne da liberdade sindical. Na vida real já temos, inclusive, que, inexistindo entidade sindical, é tradicionalmente aceito que os trabalhadores, por meio de comissão que livremente constituírem, possam entabular negociação coletiva com seu empregador.

O espaço reservado a este artigo é muito pequeno para dissertarmos sobre todas as nuances da “Reforma Trabalhista” e da “Reforma Sindical” pretendida pelo Governo. Sobre ela, já discorrermos, longamente, em nosso livro “CLT Comentada”, editora LTr, 38ª edição, notadamente nas notas 4 e 5 do seu artigo 1º, pelo que remetemos o leitor interessado a elas.

Conclusão:

a) No âmbito do trabalho assalariado ainda há muito que fazer no sentido de tornar o País apto a enfrentar, com êxito, a problemática gerada pela globalização da economia e pela crescente interdependência das nações. Como já dissemos, devemos ficar atentos à globalização nessa reforma trabalhista, mas sem perder de vista os relevantes e inafastáveis interesses nacionais do Brasil e de sua gente. É prudente, todavia, atentar-se para o fato de que o decantado “custo Brasil” não se exaure, completamente, no processo de modificações da legislação trabalhista. Muitas outras medidas, com esse objetivo, precisam ser adotadas fora dessa órbita, como, por exemplo, baixa dos juros, melhores transportes terrestres, modernização dos portos, redução de tributos, reformas tributária, administrativa e da previdência etc.

b) É equivocado afirmar-se que, decorridos mais de 60 anos, a CLT envelheceu. O que ocorreu foi que nossa realidade social e econômica passou por intenso processo de mudança, dando nascimento a relações absolutamente novas no campo socioeconômico.

Equivoca-se quem tenta ideologizar a matéria ou subordiná-la a ambições menores. Observa-se que todos querem colocar, simplesmente, a legislação trabalhista em perfeita adequação à realidade. Não se pode perder esta oportunidade para o bem do próprio Brasil.
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*Advogado membro do Instituto dos Advogados de São Paulo - IASP







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