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Adicional de ICMS no Estado do Rio de Janeiro

A Lei nº 4.056/02 padece de inconstitucionalidade, cabendo aos contribuintes o questionamento judicial com boas perspectivas de êxito

18/2/2003

Adicional de ICMS no Estado do Rio de Janeiro

Claudio de Abreu

Douglas Mota*

INTRODUÇÃO

Por meio da Emenda Constitucional n.º 31 ("EC 31/00"), promulgada em 14 de novembro de 2000, que acrescentou ao Ato das Disposições Constitucionais Transitórias ("ADCT") os artigos 79 a 83, foi criado o Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza.

Além do fundo formado com recursos federais, a referida EC determinou a criação de Fundos Estaduais, Distritais e Municipais, nos seguintes termos:

"Art. 82 - Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios devem instituir Fundos de Combate à Pobreza, com os recursos de que trata este artigo e outros que vierem a destinar, devendo os referidos Fundos ser geridos por entidades que contem com a participação da sociedade civil.

Parágrafo 1º - Para o financiamento dos Fundos Estaduais e Distrital, poderá ser criado adicional de até dois pontos percentuais na alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços - ICMS, ou do imposto que vier a substituí-lo, sobre os produtos e serviços supérfluos, não se aplicando, sobre este adicional, o disposto no art. 158, inciso IV1, da Constituição.

Parágrafo 2º - Para o financiamento dos Fundos Municipais, poderá ser criado adicional de até meio ponto percentual na alíquota do Imposto sobre Serviços ou do imposto que vier a substituí-lo, sobre serviços supérfluos.

Art. 83 - Lei federal definirá os produtos e serviços supérfluos a que se referem os arts. 80, inciso II, e 82, parágrafos 1º e 2º."

Neste ponto é interessante notar que a EC 31/00 previu a criação de um adicional, cuja receita deve ser destinada a um fundo. A natureza de tal adicional é a de imposto, uma vez que o respectivo fato gerador independe de qualquer atividade estatal afeita ao contribuinte, consoante prevê o artigo 16 do Código Tributário Nacional.

A conseqüência das hipóteses previstas nos artigos 82 e 83 do ADCT é a violação ao artigo 167, inciso IV, da Constituição, que veda a vinculação do produto arrecadado com impostos.

Cabe destacar que o Plenário do Supremo Tribunal Federal- STF declarou, quando do julgamento (18.09.97) dos autos do Recurso Extraordinário n.º 183.906/SP, tendo como relator o Ministro Marco Aurélio, a inconstitucionalidade de legislação2 paulista que aumentou a alíquota do ICMS de 17% para 18%, bem como destinou o produto resultante da referida arrecadação ao custeio de programas habitacionais.

Por tais fundamentos, entendemos que a referida EC padece do vício de inconstitucionalidade.

DO FUNDO CRIADO PELO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Não obstante a inconstitucionalidade da EC 31/00, o Estado do Rio de Janeiro editou, com fulcro na referida EC, a Lei n.º 4056, publicada em 31 de dezembro de 2002 (Lei n.º 4056/02), a qual autorizou a instituição do fundo estadual de combate à pobreza e às desigualdades sociais.

A referida lei prevê que o Fundo será composto dos seguintes recursos:

o produto da arrecadação adicional de um ponto percentual (1%) correspondente a um adicional geral da alíquota atualmente vigente do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias- ICMS, ou do imposto que vier a substituí-lo, com exceção das incidências sobre energia elétrica tributadas pela alíquota de 25%3 e sobre serviços de comunicação4, que, além, do referido acréscimo, terão mais quatro pontos percentuais (4%), transitoriamente até 31 de dezembro de 2006;

Com esse aumento, a alíquota de ICMS praticada pelo Estado do Rio de Janeiro passará:

a) como regra, de 18% (dezoito por cento) para 19% (dezenove por cento);

b) de 25% (vinte e cinco por cento) para 30% (trinta por cento) nas operações com energia elétrica, cujo consumo seja superior a 300 quilowatts/hora mensais, e nos serviços de comunicação.

(ii)

doações, de qualquer natureza, de pessoas físicas ou jurídicas do País ou do exterior;

(iii)

outros recursos compatíveis com a legislação, especialmente com a Emenda Constitucional Nacional nº 31, de 14 de dezembro de 2000.

Para regulamentar as disposições da lei estadual, foi publicado, em 09 de janeiro de 2003, o Decreto n.º 32646 (Decreto n.º 32.646/2003).

DAS INCONSTITUCIONALIDADES PRATICADAS PELO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

A partir da análise da Lei nº 4.056/02, verifica-se que o aumento do ICMS praticado pelo Estado do Rio de Janeiro não encontra respaldo no texto da EC ora em comento.

De acordo com o parágrafo 1º do citado artigo 82 do ADCT, a criação de um adicional de até 2% (dois por cento) à alíquota do ICMS, somente será possível para as operações envolvendo produtos e serviços supérfluos, os quais, segundo o artigo 83, devem ser relacionados em Lei Federal.

Contudo, mesmo tendo estabelecido como regra geral o adicional de 1% (um por cento), o legislador do Rio de Janeiro ultrapassou o teto definido pela EC nº 31/00, ao prever que, além do adicional geral de 1% (um por cento), as vendas de energia elétrica e as prestações de serviços de comunicação devem recolher um acréscimo de 4% (quatro por cento).

Acrescente-se a isso, o fato de ter sido criado um fundo estadual antes mesmo de Lei Federal definir sobre quais bens e serviços o adicional pode ser cobrado.

Diante disso, verifica-se que a Lei nº 4.056/02 padece de inconstitucionalidade, cabendo aos contribuintes o questionamento judicial com boas perspectivas de êxito.

________

1. Art. 158 - Pertencem aos Municípios:

IV - vinte e cinco por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação.

2. Artigos 3º, 4º, 5º, 6º, 7º, 8º e 9º da Lei n.º 6.556 de 30.11.89, legislação que vigorou até 31.12.90, no Estado de São Paulo

3. prevista na alínea "b" (consumo superior a 300 quilowatts/hora mensais) do inciso VI do art. 14 da Lei nº 2657, de 26 de dezembro de 1966 com a redação que lhe emprestou a Lei nº 2880, de 1997

4. Inciso VIII do art. 14 da Lei nº 2657, de 26 de dezembro de 1996 com a redação que lhe emprestou a Lei nº 3082, de 1998

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*sócio e associado do escritório Amaro, Stuber Advogados Associados.

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