O artigo 225 da Constituição Federal e sua influência sobre a legislação ambiental brasileira
Evandro Alves da Silva Grili*
O art. 225, da CF/88 dispõe que: todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e de preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
De se observar que destacamos no texto os dois verbos que imputam o comando de ordem sobre as questões de ação ambiental. O art. 225, da CF, como redigido, estabeleceu que compete ao Poder Público e à coletividade o dever de defender e de preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações. E aqui, como se trata o Direito de uma ciência que se manifesta pela linguagem, é de rigor a interpretação semântica do texto constitucional. Só se pode defender e preservar aquilo que, efetivamente, existe na atualidade. Essa é a obrigação imposta pelo legislador constituinte, que estabeleceu um norte para o legislador ordinário.
Esse norte, na questão específica do Código Florestal, é no sentido de que a lei poderá fazer previsões de criação de algum tipo de reserva legal e até mesmo de áreas de preservação permanente, mas só poderá incidir a legislação sobre aquilo que existe. Ela não pode dar fundamento a nenhum tipo de norma que obrigue qualquer proprietário a recuperar aquilo que já não existe mais, especialmente naqueles casos em que a situação fática da área em questão já data de dezenas de anos; às vezes de centenas de anos.
Nesse passo, qualquer norma infraconstitucional que venha impor aos proprietários de imóveis no Brasil, sejam rurais, sejam urbanos, o dever de constituir áreas de reserva legal onde já não existe mais resquício de vegetal original, esbarrará na ordem constitucional. Mais inconstitucional ainda será impor ao proprietário do imóvel o dever de, além de averbar, reconstituir a vegetação.
E isso ainda fica mais claro quando se verifica o parágrafo primeiro do art. 225, da CF/88, onde está disposto que: "Parágrafo 1º Para assegurar a efetividade deste direito, incumbe ao Poder Público: I – preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;... ...III - definir, em todas as Unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;"
Note-se que no quesito obrigatoriedade de restaurar processos ecológicos desfeitos, a Constituição Federal é taxativa e transferiu este ônus ao Poder Público. Por mais que não se concorde com este posicionamento por questões ideológicas, por pressão de ONGs ambientais, etc, o fato, incontroverso, é a que a Carta Magna foi expressa: é o Poder Público que tem o dever de promover restaurações. O particular, em meio à sua posição na coletividade, só tem que se ater ao dever de preservar aquilo que existe. O que foi desfeito no passado, ainda mais por ações de terceiros, muitas vezes antes de 1965, quando foi publicado o Código Florestal atual, não pode ser imputado ao atual proprietário, sob pena de criação de norma inconstitucional que será questionada em juízo. E o mesmo vale para toda legislação ambiental brasileira (Lei de Crimes Ambientais (clique aqui), Lei de Política Nacional do Meio Ambiente (clique aqui) e outras)
Reserva Legal, como o próprio nome diz é uma reserva mesmo, na acepção da palavra. E só se pode reservar algo que existe. O que não existe mais, não pode ser objeto de reserva. E recriar espaços de vegetação para restauração de processos ecológicos é, como constitucionalmente definido, dever do Estado, por força do inciso I, do parágrafo 1o, do art. 225, da CF/88.
E é no mesmo artigo 225 que o legislador constituinte originário deu a solução para o problema, caso o Poder Público resolva cumprir a sua função/dever de restaurar processos ecológicos. A Constituição, no inciso III, do parágrafo 1º, do art. 225, acima transcrito, estabelece que o Poder Público pode criar, em cada uma das Unidades de Federação, espaços especialmente protegidos, que deverão ficar intocados para garantir a busca por um meio ambiente ecologicamente equilibrado. Nesse ponto do texto constitucional, com a interpretação sistemática de todas as demais normas já citadas, situadas todas elas no citado art. 225, surge com clareza cristalina, aquela que pode ser a solução para o impasse de garantir plena produtividade agrícola, com preservação ambiental. Basta que sejam definidas áreas nos Estados que serão objeto de preservação ambiental. E todos os Estados, certamente, possuem áreas públicas capazes de servir a este fim, com investimento em reflorestamento, diversidade de fauna e flora, tudo isso como ação governamental para o fim de cumprir o que determina a Constituição Federal.
Superadas as disputas ideológicas em torno do assunto, que é bem polêmico, nos parece que a solução para o impasse está claramente definida no texto constitucional, o que muito facilitará o trabalho do legislador ordinário, que não tem outra via, senão a de seguir o trilho do caminho constitucional, sob pena de produzir norma inconstitucional que será questionada no Judiciário.
Este, portanto, nosso entendimento técnico-jurídico, desapegado de ideologismos de toda ordem.
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*Sócio do escritório Brasil Salomão e Matthes Advocacia
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