O equívoco de Ibsen
Sérgio Roberto Hall Brum de Barros*
Este é o equívoco da emenda Ibsen, que acaba por invalidá-la completamente: ao menos juridicamente, tem toda a lógica vincular o mar territorial, a plataforma continental e a zona econômica exclusiva ao território propriamente dito.
Mar territorial, plataforma continental e zona econômica exclusiva integram o chamado domínio marítimo, regulamentado principalmente pela Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar. Sua principal característica, no que interessa à questão dos royalties, é sua decorrência do domínio terrestre. Não existe domínio marítimo sem a correspondente base terrestre.
Tem havido clara confusão, na discussão, entre as noções de território e de bens da União. A União não tem território, quem tem território é a República Federativa do Brasil, todo ele atribuído a algum Estado-membro da Federação. Os últimos territórios federais foram extintos pela Constituição (arts. 14 e 15 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias). Mesmo o arquipélago de São Pedro e São Paulo, distante quase 1000 km do continente, é atribuído ao Estado de Pernambuco, e as ilhas de Trindade e Martim Vaz, situadas a aproximadamente 1200 km do continente integram o território do Estado do Espírito Santo.
Ora, se o domínio marítimo decorre do terrestre, e todo o território nacional está atribuído a algum Estado-membro da Federação, será inconstitucional qualquer solução que retire dos Estados-membros cujo território é base do domínio marítimo sobre as áreas produtoras o direito à participação no resultado da exploração de petróleo, previsto no art. 20, § 1º da Constituição. Não há, sem modificação da ordem constitucional vigente, como afastar a distinção entre estados produtores e não produtores.
A questão dos royalties, na realidade, acaba por desviar o foco do grande problema da Federação brasileira: a excessiva concentração de recursos no âmbito federal. Estima-se que, de toda a arrecadação tributária brasileira, aproximadamente 60% sejam direcionados à União, 25% aos Estados-membros e 15% aos Municípios, isso mesmo após os repasses previstos na legislação tributária.
Ao invés de, por vias transversas, buscar, nas prometidas riquezas do pré-sal, a solução para a crônica limitação de recursos dos Estados-membros da Federação e dos Municípios, o Congresso Nacional tem o dever de enfrentar o verdadeiro desafio: a reforma tributária. O quorum necessário para aprovação é inferior ao atingido na votação da inconstitucional emenda Ibsen.
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*Procurador Federal
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