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O STF e as contratações temporárias pelos municípios

Em 25 de agosto passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) proporcionou ao País maior margem de liberdade para suprir seus quadros de pessoal, quando definiu em termos mais abrangentes e realistas as hipóteses constitucionais da contratação pelo Estado de agentes públicos por prazo determinado. O Pleno do STF decidiu ser possível contratar por prazo determinado em caso de necessidade temporária por interesse público relevante, mesmo em atividades estatais permanentes

7/3/2005


O STF e as contratações temporárias pelos municípios


Fábio Barbalho Leite*

Em 25 de agosto passado, o Supremo Tribunal Federal (STF) proporcionou ao País maior margem de liberdade para suprir seus quadros de pessoal, quando definiu em termos mais abrangentes e realistas as hipóteses constitucionais da contratação pelo Estado de agentes públicos por prazo determinado. O Pleno do STF decidiu ser possível contratar por prazo determinado em caso de necessidade temporária por interesse público relevante, mesmo em atividades estatais permanentes. A decisão refere-se à Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 368 proposta por um partido político contra a legislação que autoriza esse tipo de contratação pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).

Segundo o ministro Eros Grau, que expôs o pensamento majoritário da Corte, o artigo 37, IX da Constituição Federal “não separa de um lado atividades em caráter eventual, temporário ou excepcional e de outro atividades de caráter regular e permanente. Não autoriza exclusivamente a contratação por tempo determinado de pessoal que desempenha atividades de caráter eventual, temporário ou eventual. Amplamente autoriza contratações para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público”.

Além das figuras do servidor público; do cargo comissionado; do trabalhador público ocupante de posto de trabalho regular; e do servidor que exerce função, a Constituição Federal aponta ainda, em seu artigo 37, IX, um quinto modo de relacionamento funcional com a administração pública, o “contratado por prazo determinado”. Essa contratação estaria condicionada à previsão legal de hipóteses voltadas a atender “necessidade temporária de excepcional interesse público”.

Tradicionalmente a doutrina e os órgãos de controle da administração pública têm considerado duas classes de atividades estatais. Uma, das atuações regulares, correntes, não efêmeras e já inseridas na rotina da operação estatal; outra, das atividades que surgem por demandas de caráter inesperado, emergencial ou excepcional e, portanto, episódicas. Esse entendimento conclui que a contratação de agente público por prazo determinado só é possível no âmbito das atividades estatais de caráter não regular. A interpretação gerou recorrentes problemas e inspirou várias ações de improbidade administrativa ajuizadas, em geral, por atropelo.

Ocorre que as demandas de serviço superiores à capacidade de um dado quadro de pessoal em atividades regulares do Estado são muito mais comuns do que se imagina. Circunstâncias conjunturais – para as quais o quadro de pessoal e o planejamento orçamentário não estão satisfatoriamente preparados – podem impor demanda superior de serviços cuja única solução é a de contratar trabalho por prazo determinado ou terceirização.

É o caso do incremento de serviços públicos exigidos pelo crescimento conjuntural da economia, sobre o qual dificilmente a União Federal, os estados, o Distrito Federal e os municípios têm condições de dimensionar exata e antecipadamente a quantidade de funcionários para suportar as exigências prementes. Ou das necessidades de engenheiros, sanitaristas, educadores, advogados para enfrentar projetos inseridos em atividades regulares da administração, mas com marcadas demandas temporárias, não emergenciais nem efêmeras, que se estendam por vários exercícios fiscais. É o caso de demandas súbitas de mão-de-obra para suprir licenças, afastamentos, suspensões, falecimentos e aposentadorias proporcionais de agentes públicos.

Há também contingências da Democracia, cuja solução não deve substituir o respeito aos poderes nem prejudicar a sociedade, quando os trâmites do Poder Legislativo promovem a discussão, a seu tempo, da conveniência de expansão de quadros funcionais. Nesse caso, presente a necessidade inadiável de pessoal, é lícito que o Executivo use, segundo lei municipal, a contratação por prazo determinado, até para não arcar com a responsabilidade pela frustração do atendimento de demanda coletiva.

Os novos mandatos políticos que se avizinham ensejarão ainda, legitimamente, que seus executivos, no uso de discrição político-administrativa consistentemente fundamentada, possam considerar insuficientes quadros de pessoal deixados pela administração anterior e necessitem para o atendimento de regular demanda coletiva– segundo lei e salvo grave emergência – a contratação temporária, enquanto se promovem medidas legais e administrativas de expansão estável do quadro deficitário.

Outra forte realidade – comum em médios e pequenos municípios – é a difícil fixação de um profissional na localidade por um prazo incerto e estável, por características do mercado de trabalho. Isso não poucas vezes impõe às prefeituras a contratação por prazo determinado de médicos e dentistas, por exemplo. Embora a prestação de serviço social seja demanda permanente, a contratação temporária será aí sempre viável, enquanto não se realizar concurso público para preenchimento de cargo ou emprego público estável.

Esses e outros casos podem agora ser mais tranqüilamente resolvidos por contratações de pessoal por prazo determinado, segundo a interpretação constitucional do STF. Todos cuidam rigorosamente de necessidades temporárias de pessoal da administração pública em serviços regulares, seja por dificuldade de formar ou suprir um quadro de pessoal ou por impossibilidade de dimensionar seguramente o nível de demanda estável.

Enfim, questão crucial está no procedimento a ser seguido para escolha dos contratados. Aqui, é óbvio, as premências não se resolvem com a realização de concurso público nos moldes tradicionais. Basta a realização dos chamados “procedimentos seletivos simplificados” (como aponta, no âmbito federal, a Lei n°. 8.745/93, art. 3º; e recentemente indicado em Resolução do TCE/SP, TCA 15248/026/04), desde que se trate de procedimento apto a – diante das circunstâncias concretas – proporcionar uma escolha isonômica.
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*Advogado do escritório Manesco, Ramires, Perez, Azevedo Marques Advocacia









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