Lançamento da obra "A Firma, o Mercado e o Direito"
Em Brasília, das 18h30 às 21h.
quinta-feira, 20 de outubro de 2016
Atualizado às 08:27
Acontece, no próximo dia 25, o lançamento do livro "A Firma, o Mercado e o Direito" (Forense), da coleção Paulo Bonavides, de Ronald H. Coase, com direção do ministro Toffoli e do professor Otavio Luiz Rodrigues Junior. O estudo introdutório do livro é de autoria do ministro Antonio Carlos Ferreira e Patricia Cândido Alves. O evento será em Brasília, no Espaço Cultural STJ, das 18h30 às 21h.
Confira o convite da obra :
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Confira a resenha de Francisco Niclós Negrão sobre a obra :
A Coleção Paulo Bonavides, editada pela Forense Universitária (Grupo Editorial Nacional - GEN) e dirigida pelo Ministro do Supremo Tribunal Federal José Antonio Dias Toffoli e pelo Professor Otavio Luiz Rodrigues Junior, fiel ao seu objetivo de publicar traduções de obras clássicas inéditas, lança A Firma, o Mercado e o Direito do célebre Ronald H. Coase. A cerimônia de lançamento do livro ocorrerá na próxima terça-feira (25/10/2016), às 18h30, no Espaço Cultural do Superior Tribunal de Justiça, com uma palestra de apresentação do Excelentíssimo Dr. Henrique Meirelles, Ministro de Estado da Fazenda.
Um dos fundadores do movimento de Law and Economics e recipiente do Prêmio de Ciências Econômicas em Memória de Alfred Nobel do Banco Central do Reino da Suécia aos 80 anos (1991), Coase revolucionou o pensamento econômico ao introduzir custos de transação e direitos da propriedade como ferramentas fundamentais para a análise da estrutura institucional e do funcionamento da economia, buscando sempre trazer o racional econômico mais próximo da realidade fática. Os desdobramentos de sua obra sobre o estudo de instituições, contratos, distribuição de direitos de propriedade, alocação ótima de recursos, externalidades e a real efetividade da regulação e intervenção do Estado na economia o tornam um dos economistas mais influentes do século XX - seu artigo The problem of social cost, por exemplo, é o mais citado de todos os tempos em periódicos jurídicos. A publicação deste livro indubitavelmente trará enormes benefícios para os estudiosos das áreas do Direito, Economia, Sociologia, Ciências Políticas e Ciências Sociais.
As obras publicadas pela Coleção Paulo Bonavides têm como característica marcante estudos introdutórios de elevada qualidade técnica e rigor acadêmico1. Neste caso, o estudo é assinado pelo Ministro do Superior Tribunal de Justiça Antonio Carlos Ferreira e pela mestra em Direito Patrícia Cândido Alves Ferreira, que oferecem excelente contexto sobre o autor, permitindo que o leitor se situe historicamente e se aproxime da pessoa de Coase e de suas influências ao longo da leitura da obra. Além disso, o cuidado da tradução, almejando total fidelidade ao texto original, é refletido na revisão técnica pelos Professores Alexandre Veronese, Lucia Helena Salgado e Antônio José Maristrello Porto, com revisão total da tradução por Francisco Niclós Negrão (este autor) e revisão final do Professor Otavio Luiz Rodrigues Jr.
A obra contém um compêndio dos principais trabalhos de Coase, dentre eles A natureza da firma (The nature of the firm - 1937), O problema do custo social (The problem of social cost - 1960) e A controvérsia do custo marginal (The marginal cost controversy - 1946), O farol na Economia (The lightouse in Economics - 1974). Traz, ainda, dois textos inéditos à época de sua publicação: (i) A Firma, o Mercado e o Direito (The Firm, the Market, and the Law - 1988) apresenta uma detalhada introdução acerca dos artigos compilados no livro, permeada por uma intenção de esclarecer de forma mais precisa as suas ideias, que, segundo o autor, foram interpretadas de forma incorreta e/ou incompleta ao longo dos anos; e (ii) Notas sobre o problema do custo social (Notes on the problem of social cost - 1988), cujo objetivo é justamente o de aprofundar seus argumentos expostos em O problema do custo social em mais detalhes e fornecer respostas às críticas recebidas.
Coase parte da premissa de que os custos de transação determinam a existência e o tamanho de firmas, dos mercados e afeta (ou deveria afetar) a lógica da intervenção do Estado na economia. O direito, igualmente, deveria levar em consideração os custos de transação, tanto na legislação e na regulação como, igualmente, na forma em que os juízes o aplicam em suas decisões cotidianas.
Essa análise começa a ser desenvolvida em A natureza da firma (The nature of the firm - 1937), o primeiro dos artigos contidos na obra. Buscando responder questões fundamentais sobre instituições básicas da economia (por que existem as firmas? Por que são maiores ou menores?), chegou à conclusão de que as empresas existem porque geram economias em termos de custos de transação. Custos de transação são aqueles custos associados à utilização do mecanismo de mercado: encontrar outras partes, obter informações fundamentais para o negócio, negociar, fechar o acordo, cumpri-lo e monitorar seu correto cumprimento. O tamanho da firma dependerá justamente do tamanho das economias envolvidas: enquanto for mais eficiente/forem menores os custos de acessar o mercado, maior será a firma.
Ampliando sua análise da firma para o mercado, Coase entende que os mercados existem para facilitar as trocas ou, o que seria o mesmo, reduzir os custos de transação. Para tanto, são necessárias a garantia de segurança e a existência de mecanismos de solução de controvérsias (o sistema legal), que são usualmente responsabilidade do governo no mercado moderno. Daí a importância do Direito e do sistema legal do Estado para o papel da minimização dos custos de transação na sociedade moderna.
Abordagens mais gerais sobre a estrutura institucional da economia observada considerando os custos de transação e a influência do Direito no sistema econômico são desenvolvidas nos demais artigos, especialmente em O problema do custo social (1960). Nesse artigo fundamental, Coase defendeu que se um direito de propriedade (o direito de exercer livremente uma escolha sobre um bem ou serviço) é bem definido, ele pode ser negociado. A compra, venda, subdivisão e combinação destes direitos seria feita de acordo com aqueles agentes que maior valor atribuíssem ao seu uso, levando em conta os custos de transação necessários para se chegar ao arranjo ótimo dos direitos.
Para desenvolver seu raciocínio, Coase analisa uma situação hipotética na qual haveria zero custos de transação. Nessa hipótese, a utilização e alocação de recursos independe de para qual das partes o direito estaria originalmente atribuído. Se na configuração inicial a distribuição dos direitos fosse sub-ótima, o melhor resultado se daria espontaneamente e por meio de contratos entre as partes, considerando que não há qualquer tipo de custos de transação e que ambas as partes sairiam ganhando.
Essa postulação foi cunhada como "Teorema de Coase" posteriormente por George Stigler e, para certa (e declarada) decepção de Coase, foi uma das ideias de maior influência na teoria desde então, utilizada de forma no mínimo incompleta. Coase lamenta que outros aspectos mais importantes de sua análise não tenham tido o mesmo nível de atenção, justamente porque a sua ideia ao utilizar um exercício com zero custos de transação era a de ressaltar a importância da consideração da existência de custos de transação positivos na análise econômica.
O autor entende que os juízes tentam, em suas decisões, distribuir os direitos entre as partes de forma similar ao que ocorreria se estas tivessem chegado a um acordo entre si. Esta seria uma forma racional para a tomada de decisões visando a chegar a precedentes que orientem os agentes econômicos em uma direção que os permita, no futuro, chegar a um acordo entre eles, sendo desnecessário recorrer ao judiciário. O foco da decisão deve ser o da redução dos custos de transação. Assim, os tribunais seriam uma extensão do mecanismo de mercado, no qual ele não funciona em razão de custos de transação. Esta foi a origem do que passou a se chamar de Law and Economics.
A intervenção do Estado na economia é também abordada por Coase, sempre considerando uma análise que leva em conta os custos de transação. Os economistas da época consideravam que, na presença de externalidades - os efeitos das ações de um agente sobre terceiros não envolvidos (e.g. poluição decorrente de uma fábrica) - sempre seria desejável uma intervenção governamental (por meio de imposição de impostos, criação de normas, etc.) para minimizar os efeitos negativos observados. Coase, no entanto, é claro ao afirmar que, como custos de transação existem e por vezes - especialmente na presença de externalidades - são elevados, as externalidades são extremamente frequentes. Assim, a avaliação sobre a necessidade de intervenção governamental dependeria de uma cuidadosa análise do caso concreto e das condições de custo na economia.
Coase iniciou e terminou sua trajetória com uma marca inconfundível: trazer a análise econômica muito mais próxima da vida real, do dia a dia dos empresários e dos agentes econômicos em geral, aumentando assim sua aplicabilidade e utilidade por meio da incorporação dos custos de transação. Demonstrou sempre uma inocultável - e intensa - irritação ao observar o desenvolvimento de teorias distantes e inaplicáveis à vida real. Em artigo publicado por Coase na Harvard Business Review em 2012, aos 101 anos, o autor continuava a expor seu inconformismo: "Economics as currently presented in textbooks and taught in the classroom does not have much to do with business management, and still less with entrepreneurship. The degree to which Economics is isolated from the ordinary business of life is extraordinary and unfortunate"2.
O inconformismo do autor poderia encontrar algum conforto no denso legado que nos deixou. Como um dos pais do Law and Economics, Coase entusiasmou incontáveis estudiosos que debateram, acolheram e desenvolveram intensamente as suas ideias. O autor alterou a forma de estudo das inter-relações entre a Economia e o Direito, da criação de incentivos por meio de normas e regulações, da forma de decidir dos tribunais e mesmo da adequação da imposição de tributos e de regulamentações administrativas. Sua contribuição para o desenvolvimento da sociedade moderna é incomensurável e, certamente, continuará trazendo benefícios ao longo de gerações que estão por vir.
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