Planos econômicos
segunda-feira, 19 de outubro de 2015
Atualizado às 12:28
Março de 2009
No início de 2009, as instituições financeiras, preocupadas com uma corrida ao Judiciário duas décadas depois de baixados os planos econômicos, entram no STF com uma ADPF. Pretendem ver confirmada a constitucionalidade das famigeradas medidas.
Agosto de 2010
Diante da repercussão geral reconhecida em recursos extraordinários, o ministro Toffoli, em agosto de 2010, determina a suspensão de todos os processos judiciais em tramitação no país, em grau de recurso, que discutem o pagamento de correção monetária dos depósitos em cadernetas de poupança afetados pelos planos econômicos. Ainda hoje persiste o sobrestamento dos feitos.
Novembro de 2013
Estamos em novembro de 2013. O processo dos planos econômicos finalmente chega à pauta do STF. O clima é de expectativa. As instituições financeiras de um lado, associações que dizem congregar poupadores de outro. O governo, apreensivo com o resultado, teme um impacto fatal nos bancos públicos. Antes do início da assentada já se ausculta a possibilidade da suspeição dos ministros Fux e Barroso, as quais se confirmam. Mas surge uma novidade que começa a correr pelas galerias repletas de interessados : a ministra Cármen Lúcia irá, também, se declarar suspeita. O não comparecimento da ministra para ouvir as sustentações orais indica que pode ser verdade o boato. E, de fato, a ministra deu-se por suspeita. Os motivos, naquele momento, ainda eram incertos. Dizia-se pelo plenário que ela foi pega de surpresa com a informação de que seu pai seria um dos poupadores a ter entrado com ação contra a Caixa Econômica Federal. Por conta disso, declarou-se suspeita. Entendemos a preocupação da ministra com sua inquestionável probidade, mas, convenhamos, isso, por si só, não justifica suspeição. Em todo o caso, como a coisa é por foro íntimo, não nos cabe questionar.
Julho de 2014
Com a aposentadoria do ministro Joaquim Barbosa, somada às suspeições dos ministros (migalha anterior), não havia quórum para que o processo dos planos econômicos fosse julgado.
Setembro de 2015
Mês passado, o ministro Fachin surpreendeu o meio jurídico ao se dizer suspeito para julgar a ação dos planos econômicos. Ao noticiar o caso, este rotativo não poupou críticas dizendo que a justificativa não era condizente com a estatura de seu histórico e muito menos a que se esperava de um ministro do Supremo. Alegar que já deu opiniões sobre a tese, quando advogado, é não perceber que a indumentária agora é outra. E a toga não comporta veleidades. E mais, afirmar que ainda tem honorários para receber é pôr na balança coisas incomparáveis. O mister de um magistrado do Supremo não é monetarizável. Por óbvio, deveria abrir mão dos honorários. Na ocasião, dizíamos ainda que havia uma saída para o deslinde desse tema, o qual representa centenas de milhares de ações sobrestadas. Com efeito, os ministros Fux e Cármen Lúcia apenas se disseram suspeitos, por foro íntimo. Tal suspeição pode ter se dado em razão da parte ou do advogado. De modo que, se outro caso for afetado, com outras partes e advogados, possivelmente eles possam participar.
Outubro de 2015
O jornalista Ancelmo Gois contou no último domingo, em sua coluna n'O Globo, que a ministra Cármen Lúcia pode ser a solução para o problema da falta de quórum no STF para julgar os planos econômicos. Isso porque seu pai, Florival Rocha, nonagenário poupador, teria se prontificado a desistir do processo. Mesmo sabendo que sapo de fora não chia, sugeriríamos que ao invés de desistir da ação, se essa for mesmo a intenção, que ele destine - consignando isso no feito - seu eventual ganho para uma instituição de caridade. Independente da solução, o fato é que se a aparente suspeição desaparecer, a ministra, conquanto não tenha participado da sessão de leitura dos relatórios e sustentações, poderá, sim, participar do julgamento, bastando apenas que se dê por esclarecida (RISTF, art. 134, § 2º).
Abril de 2028
Se os processos ficarem sobrestados até a substituição de um ministro impedido, só teremos julgamento lá por meados de 2028, ano em que o ministro Fux se aposenta, pego que será pela nova compulsória. Isso é, se o ministro que o suceder não se der por suspeito, alegando que já leu sobre o caso nos jornais.
Crônicas da Judicatura
Falando da nobilíssima função da magistratura, lembramo-nos agora de missiva enviada por ilustre magistrado, em 2008, contando uma curiosa passagem :
"Compulsando aleatoriamente arquivos passados, deparei-me com a notícia do passamento do Carlos Alberto Bastos de Matos (Migalhas 980 - 4/8/04). Na ocasião deixei-a gravada em meu computador, talvez levado pela saudade e lembrança do velho amigo. Veio-me à lembrança, agora, um fato até jocoso de nossa antiga convivência. Relato-o para que fique documentado, e também para ressaltar a grande figura que foi esse magistrado exemplar. Era eu Juiz na comarca de Junqueirópolis, na Alta Paulista. Fui designado para acumular a vizinha comarca de Pacaembu. Lá estava o Carlos Alberto, promotor de Justiça. Passados alguns dias fez-me uma oferta : "Antonio, eu tenho pouco serviço. Se você quiser, posso preparar os despachos nos seus processos. Se você estiver de acordo, você assina, senão, você rasga". Aceitei de pronto. Ainda que não fosse volumoso o número de feitos que todos os dias iam à conclusão, era trabalho que se somava ao da minha comarca. A ajuda era preciosa, e de pessoa de extrema lisura e capacidade ! A partir de então, quando chegava a Pacaembu encontrava uma pilha de processos sobre a mesa, devidamente despachados (com a inconfundível escrita da máquina de escrever cujo tipo até hoje me lembro !). Conferia e assinava, todos perfeitos. Certo dia encontrei um dos processos com este despacho : "Indefiro a cota retro do Dr. Promotor"..., seguido de curta fundamentação. E, datilografado em um pedaço de papel, este bilhetinho : "Antonio, eu estou indeferindo o meu pedido porque eu pedi uma coisa absurda !". Justificou-me, depois, verbalmente, a sua decisão.... e o episódio serviu para boas risadas até hoje lembradas ! Grande homem, grande Promotor, grande Juiz ! Fez escola, deixou lembranças ... e saudades !"
*Antonio Augusto Guimarães de Souza - advogado em SP, magistrado aposentado