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Google deve bloquear acesso a blog de denúncias políticas

Textos anônimos traziam acusações a políticos.

Da Redação

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Atualizado às 08:26

A Google Brasil Internet deve bloquear o acesso a blog de denúncias políticas anônimas em Xanxerê/SC. A determinação, de restringir o acesso à pagina "quadrilha.blogspot.com", é da câmara especial regional de Chapecó, e mantém determinação da comarca de Xanxerê. A multa diária em caso de descumprimento é de R$ 500.

A liminar foi concedida em ação ajuizada por um homem que questionava o fato de o blog trazer acusações anônimas e sem qualquer seriedade ou cunho jornalístico. O homem teria sido citado no blog como "um dos braços fortes" de político local.

O Google pediu suspensão do bloqueio alegando que a página apenas retrata a vida política da cidade, sem registro de violação aos termos de uso, e que não há base para o bloqueio. A empresa defendeu a livre manifestação de pensamento e a liberdade de expressão e afirmou não ser possível o bloqueio provisório, o que tornaria a liminar irreversível.

O desembargador substituto Jorge Luis Costa Beber, relator do caso, observou que no caso há colisão entre a liberdade de opinião e de manifestação através dos meios de comunicação e o excesso e o abuso, que ferem o direito individual e violam a honra e a imagem das pessoas. Assim, entendeu que a liberdade de expressão deve saber distinguir o que é direito do que é abuso de direito, e analisou que a matéria divulgada no site não se limita a retratar a vida política do município como alega a agravante.

"Na verdade, o autor do blog - que é pessoa desconhecida - faz diversas acusações a políticos, dando a entender que formam uma quadrilha e que o agravado seria 'um dos braços fortes do Chefão'. Aliás, os textos expressamente divulgam que o agravado faz parte de uma máfia, com atividades ilícitas acobertadas por 'laranjas'. As aludidas increpações inegavelmente ostentam peso suficiente para afrontar a dignidade e a honra objetiva e subjetiva do recorrido", finalizou Beber. A decisão foi unânime.

_________

Agravo de Instrumento n. 2011.085784-3, de Xanxerê

Relator: Des. Subst. Jorge Luis Costa Beber

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DECISÃO QUE DETERMINA O BLOQUEIO DE ACESSO À PÁGINA DE BLOG NA INTERNET. CONTEÚDO OFENSIVO À HONRA E À IMAGEM DO AGRAVADO. INEXISTÊNCIA DE CARÁTER INFORMATIVO NAS INFORMAÇÕES POSTADAS. CONSTITUIÇÃO FEDERAL QUE, AO TEMPO EM QUE GARANTE A LIVRE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO, VEDA O ANONIMATO. DEVER DA EMPRESA, QUE HOSPEDA O CONTEÚDO DIVULGADO, DE SUSPENDER O ACESSO AO BLOG. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

Quando o Poder Judiciário, como órgão encarregado de aplicar as leis, exerce o controle jurisdicional da legalidade em torno de valores constitucionais colidentes, como soe acontecer no confronto entre a liberdade de expressão ou de opinião e o direito à inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem das pessoas, não está atuando como censor ou com autoritarismos. Está, na verdade, assegurando os princípios mais comezinhos de democracia, impondo os limites necessários para proteção de interesses privados, revestidos de caráter público, que se sobrepõe à livre manifestação do pensamento, dentre eles o direito ao bom nome, à reputação, à imagem e à reserva da intimidade da vida privada e familiar.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n.2011.085784-3, da comarca de Xanxerê (1ª Vara Cível), em que é agravante Google Brasil Internet Ltda., e agravado Ivo Crescêncio de Borba:

A Câmara Especial Regional de Chapecó decidiu, por votação unânime, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

O julgamento, realizado nesta data, foi presidido pelo Exmo. Des. Paulo Roberto Camargo Costa, e dele participou o Exmo. Des. Subst. Guilherme Nunes Born, como revisor.

Chapecó, 28 de fevereiro de 2012.

Jorge Luis Costa Beber

RELATOR

RELATÓRIO

Google Brasil Internet Ltda interpôs agravo de instrumento contra a decisão que concedeu o pedido de antecipação de tutela, determinando que a agravante efetuasse o bloqueio do acesso ao blog "www.quadrilha.blogspot.com" sob pena de multa diária no valor de R$ 500,00.

Sustentou que o blog em questão não é ofensivo, apenas retrata a vida política da cidade de Xanxerê/SC, não havendo violação a qualquer norma relativa aos termos de uso, e que por isso não há sustentáculo para o seu bloqueio.

Alegou que não é possível o bloqueio provisório do site, de modo que a liminar se afigura irreversível.

Discorreu sobre os princípios da livre manifestação de pensamento e da liberdade de expressão, clamando pela reforma da decisão.

Alternativamente, pugnou que seja especificada a parte do blog que supostamente é ofensiva, justo que o site não trata exclusivamente de assuntos relacionados ao ora agravado, e requereu a concessão do efeito suspensivo.

O agravado compareceu espontaneamente e ofertou contrarrazões, vindo-me, então, os autos conclusos.

VOTO

Conheço do recurso, porquanto atendidos os pressupostos de admissibilidade.

Pretende a agravante a reforma da decisão interlocutória que determinou o bloqueio do acesso ao blog especificado nos autos, em cinco dias, sob pena de multa diária no valor de R$ 500,00.

A agravante não se furta da sua responsabilidade pelo bloqueio de acessos ao blog, sustentando apenas que o site em questão não é ofensivo, limitando-se a retratar a vida política da cidade de Xanxerê/SC. Disse, ainda, que não há qualquer violação às normas relativas aos termos de uso do blog, e por isso não há sustentáculo para o seu bloqueio.

O agravado, contudo, alega que há no blog diversas acusações, todas anônimas e sem qualquer seriedade ou cunho jornalístico, de modo que a decisão não ofende o princípio constitucional da livre manifestação do pensamento.

Pois bem, a Constituição Federal assegura ser livre, não só a manifestação do pensamento, vedado o anonimado (art. 5º, inc. IV), mas também a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença (art. 5º, inc. IX), proclamando, de outra parte, através do inciso X do referido artigo, que são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas.

Como se vê, a Constituição da República, com a mesma hierarquia normativa, procurou salvaguardar os direitos da pessoa ofendida em razão da livre manifestação de opiniões, pensamentos ou informações prestadas pelos meios de comunicação.

E nem poderia ser diferente. Apesar da liberdade de expressão ser fundamental para o estado democrático de direito em que vivemos, não se pode cogitar de direito inatingível, pois é inocultável que todo o direito sofre restrições. Até mesmo o direito à vida não é ilimitado, pois sucumbe às excludentes de antijuridicidade, como a legítima defesa.

Não se pode, portanto, compreender que a liberdade de opinião ou de exposição do pensamento seja absoluta. Ela deve, sem dúvida, ser exercida de forma livre, porém com responsabilidade, expungindo os excessos, com observância da ética e do respeito.

Não foi outra a interpretação proclamada pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul em situação semelhante:

"[...] a liberdade de opinião e de crítica, especialmente quando se refere a situações que envolvem interesse público, é um esteio da democracia. Interessa aos cidadãos, que, com seus impostos, custeiam toda a máquina pública, que eventuais irregularidades sejam identificadas e trazidas à luz do sol. Todavia, é perfeitamente possível combinar a liberdade de expressão com urbanidade e civilidade, evitando-se expressões que desnecessariamente denigram a personalidade da pessoa atingida, ferindo-lhe a dignidade" (Grifos meus, TJRS, Recurso Cível nº 71001948348, Terceira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Eugênio Facchini Neto, Julgado em 28/05/2009).

O que ocorrem em situações como a que se encontra plantada nos autos é a colisão de dois valores. De um lado, a liberdade de opinião e de manifestação através dos meios de comunicação, e, de outro, o excesso e o abuso, que fere o direito individual e viola a honra e a imagem das pessoas.

O aludido confronto, todavia, não permite confundir o direito à opinião e à crítica, sobretudo quando tendenciosa e exacerbada, com a ofensa ao nome e à honorabilidade das pessoas. A liberdade de expressão deve saber distinguir o que é direito do que é abuso de direito.

Por isso, diferentemente do que foi anunciado pela agravante, quando o Poder Judiciário, como órgão encarregado de aplicar as leis, exerce o controle jurisdicional da legalidade em torno desses valores constitucionais colidentes, não está atuando como censor ou com autoritarismo. Pelo contrário, está, na verdade, assegurando os princípios mais comezinhos de democracia, impondo os limites necessários para proteção de interesses privados, revestidos de caráter público, que se sobrepõe à liberdade de expressão, dentre eles o direito ao bom nome, à reputação, à imagem e à reserva da intimidade da vida privada e familiar.

No caso em liça, analisando os documentos que repousam às fls. 82/84, denota-se que a matéria divulgada do referido site não se limita a retratar a vida política, como alega a agravante. Na verdade, o autor do blog - que é pessoa desconhecida - faz diversas acusações a políticos, dando a entender que formam uma quadrilha e que o agravado seria "um dos braços fortes do Chefão" (fls. 83).

Aliás, os textos expressamente divulgam que o agravado faz parte de uma máfia, com atividades ilícitas acobertadas por "laranjas".

As aludidas increpações inegavelmente ostentam peso suficiente para afrontar a dignidade e a honra objetiva e subjetiva do recorrido.

Colhe-se do magistério de CARLOS ALBERTO BITTAR:

"O reconhecimento do direito em tela prende-se à necessidade de defesa da reputação da pessoa (honra objetiva), compreendendo o bom nome e a fama de que desfruta no seio da coletividade, enfim, a estima que a cerca nos seus ambientes, familiar, profissional, comercial ou outro. Alcança também o sentimento pessoal de estima, ou a consciência da própria dignidade (honra subjetiva) (...)" (Os direitos da personalidade. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999, p. 129).

Destarte, considerando que as notícias veiculadas no blog não possuem caráter meramente informativo, sendo possíveis de ofender a honra e a imagem do agravado, não havendo razão plausível para ser chancelado pelo Poder Judiciário um sistema que prestigie o anonimato, servindo de trincheira para os que agem com maledicência, propagando difamações e ofensas de toda ordem, deve ser mantida a decisão agravada, que determinou o bloqueio do acesso ao site

Nesse sentido, já se decidiu:

"APELAÇÃO CÍVEL - Obrigação de Fazer e Não Fazer - "Blog" - Veiculação virtual de conteúdo ofensivo por parte do responsável pelo "Blog" e por terceiros - Tutela antecipada deferida para Retirada do Conteúdo Ofensivo à Honra e Imagem do Autor - Deferimento - Indeferimento da petição inicial por impossibilidade jurídica do pedido e extinção do processo sem resolução do mérito. Réu citado e que integrou a relação processual. Na fase recursal ofereceu contrarrazões ao recurso - Extinção afastada. Julgamento nos termos do art. 515, § 3o, do CPC. Responsabilidade pelo autor do Blog em Gerenciar o Conteúdo da Matéria Postada - Desnecessidade de Enviar o número dos IP's (internet protocol) dos correspondentes do referido Blog. Recurso Parcialmente Procedente" (TJSP, apelação cível n° 994.09.319036-5, rel. Des. Egidio Giacoia, julgado em 17/08/2010).

E mais:

"OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS

- Divulgação de matérias com conteúdo ofensivo na internet - Se de um lado é garantido o direito constitucional de liberdade de expressão, este não é absoluto, devendo ser feito desde que não atinja a intimidade e a reputação de outrem [...]" (Agravo de Instrumento nº 990.10132458-0, da Comarca de Santo André/SP, rel. Des. Salles Rossi, julgado em 19.05.2010).

Outrossim, é certo que a alegada impossibilidade técnica de bloqueio do site não pode servir de justificativa ao descumprimento da liminar, devendo a agravante buscar meios de obstar o acesso à homepage.

Voto, pois, pelo desprovimento do recurso, mantendo-se hígida a decisão açoitada.

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