Credores estrangeiros e os depósitos judiciais
Regina Abbud
Buscando se resguardar de eventuais ações por parte das empresas credoras, diversos devedores propuseram, principalmente após a maxidesvalorização do real ocorrida em janeiro de 1999, ações judiciais visando à revisão de contratos internacionais, em especial o reconhecimento da nulidade das cláusulas que previam o pagamento em moeda estrangeira, pleiteando, conseqüentemente, que o preço previsto no contrato fosse convertido em reais na data da aquisição do bem ou em alguma outra data antes da maxidesvalorização, aplicando-se correção monetária também por índices nacionais.
quarta-feira, 26 de janeiro de 2005
Atualizado em 25 de janeiro de 2005 09:56
Credores estrangeiros e os depósitos judiciais
Buscando se resguardar de eventuais ações por parte das empresas credoras, diversos devedores propuseram, principalmente após a maxidesvalorização do real ocorrida em janeiro de 1999, ações judiciais visando à revisão de contratos internacionais, em especial o reconhecimento da nulidade das cláusulas que previam o pagamento em moeda estrangeira, pleiteando, conseqüentemente, que o preço previsto no contrato fosse convertido em reais na data da aquisição do bem ou em alguma outra data antes da maxidesvalorização, aplicando-se correção monetária também por índices nacionais.
Em algumas dessas ações judiciais, os devedores requereram a concessão de medida liminar para que, mediante o depósito judicial das parcelas em reais, restasse suspensa a configuração da mora, pretendendo também, evitar qualquer medida por parte das empresas credoras para recuperação de seus créditos.
Para alguns, o levantamento destes depósitos significa anuência com o valor menor depositado, embora os tribunais pátrios já tenham reconhecido que até mesmo na típica ação de consignação em pagamento, é possível o levantamento da quantia não controvertida, prosseguindo-se a ação com relação aos valores discutidos.
Nas ações revisionais movidas pelos devedores também é perfeitamente possível o levantamento dos depósitos feitos a menor, permitindo-se ao credor usufruir o valor indiscutível, sem que isso signifique qualquer tipo de anuência ou quitação total.
Tem-se, pois, valor devido incontroverso, sobre o qual restará apenas uma discussão: se os depósitos representam todo o débito referente às respectivas parcelas, ou se apenas parte dele, como entendem os devedores.
O que importa frisar é que, até o limite do valor depositado, não se discute se o mesmo é ou não devido. A existência da dívida é ponto incontroverso entre as partes. Desse modo, havendo concordância com a existência do débito e dissenso apenas quanto ao montante, a parte incontroversa deve de imediato ser disponibilizada ao credor estrangeiro, permitindo-se assim, diminuir os prejuízos advindos do inadimplemento. Esclarecida a possibilidade de levantamento pelos credores, nova questão é trazida à baila: como fazer com que o montante levantado judicialmente chegue efetivamente nas mãos do credor estrangeiro.
Como se sabe, toda remessa de divisas ao exterior é fiscalizada pelo Banco Central do Brasil, através do registro de operação financeira (ROF), gerado por declaração de importação (DI), a qual é fundada em um contrato internacional. Através deste Registro, onde constam como partes (1) o credor e (2) o importador-devedor, o Banco Central fiscaliza a remessa de valores, a título de principal e juros, evitando-se desta forma, a remessa de divisas de forma ilegal.
Para que outra pessoa - diversa do importador-devedor - possa remeter valores ao credor estrangeiro é necessária uma autorização especial, pois conforme orientação do Banco Central do Brasil, tal remessa só poderá ser efetuada pelo próprio importador, no caso o devedor, com quem permanece a travar batalhas nos tribunais.
A situação do credor estrangeiro é no mínimo intrigante: fundada em determinação judicial, e através de seus advogados legalmente constituídos, levantou valores depositados em juízo pelo devedor-importador, que se refere a apenas uma parte do valor devido. O valor levantado está depositado à disposição do credor, que por sua vez, não consegue remetê-lo ao exterior na forma do contrato assinado pelas partes, e devidamente descrito no ROF, haja vista que o terceiro, seja o advogado que levantou o montante, seja a empresa brasileira, não consta no registro da operação financeira.
O ponto fundamental da questão que precisa ser levado em consideração é que os valores levantados judicialmente são os constantes do registro de operação financeira, objeto de um contrato que foi devidamente cumprido pelo credor estrangeiro, e absolutamente descumprido pelo devedor-importador, que não cumpriu com o acordo ou adimpliu apenas com uma parte da dívida.
Desta maneira, é necessário requerer ao Banco Central do Brasil uma autorização específica para que o terceiro - no caso o advogado responsável pelo levantamento judicial ou a empresa brasileira - seja incluído no ROF, permitindo, assim, a remessa do valor levantado judicialmente ao credor estrangeiro.
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*Advogada do escritório Manhães Moreira Advogados Associados
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