Eleições 2022 e o tardio fim do arbítrio
Veremos, nos próximos meses que antecedem o pleito eleitoral de 2022, uma significativa redução dos casos de inelegibilidade junto ao Cadastro Nacional de Condenações Cíveis por Ato de Improbidade Administrativa e Inelegibilidade.
quarta-feira, 13 de outubro de 2021
Atualizado às 15:53
Em abril de 2020 publicamos o artigo "Eleições 2020 e o limbo da improbidade" com o propósito de lançar ao debate público o problema do alijamento de potenciais lideranças políticas e candidatos a cargos eletivos afastados do processo democrático eleitoral em razão de condenações por erros de gestão ou por meras falhas administrativas adjetivadas como "atos ímprobos".
Em geral, funciona desse modo: um prefeito confiante em sua equipe ou um secretário de governo inexperiente não observa alguma formalidade de nossa complexa legislação orçamentária e de contratações públicas, e, por tal erro formal, é processado em ação civil pública por ato de improbidade proposta pelo Procurador Municipal nomeado pelo gestor de situação ou pelo Ministério Público com atuação local; por inércia e em nome do míope punitivismo, o agente público é então condenado. Condenado, ponto e caso encerrado, de nada importando o ínfimo potencial lesivo do erro administrativo, sua baixa reprovabilidade ou a ausência de dolo em sua conduta.
Assim tem sido ao longo das últimas décadas, sangrando o direito fundamental à plena participação política assegurado pelos artigos 14 e 15 da Constituição da República em razão da prematura suspensão de carreiras políticas e da franca marginalização de novas lideranças intimidadas com a certeza de vindouras ações de improbidade.
Porém e como pontuou Miguel Rodrigues Nunes Neto no trabalho "Sobre direitos fundamentais e o Estado" (Revista Prática Jurídica, Ano VIII, nº 85, 2009), os direitos fundamentais estão sob contínua proteção das Cortes Constitucionais, instituições capazes de harmonizar o espírito do constituinte passado ao agir do legislador presente. Sob tal ministério constitucional e já tarde após quase 30 (trinta) anos de vigência da Lei de Improbidade Administrativa, no último dia 1º de outubro sobreveio uma faixa de luz sobre o arbítrio.
Iluminar que se deu por meio da decisão proferida nos autos da ADI 6.678/DF, onde Sua Excelência o Min. Gilmar Mendes estabeleceu que a sanção de suspensão de direitos políticos não se aplica a atos de improbidade que atentem contra os Princípios da Administração Pública e, também, não se aplica a atos de improbidade culposos que causem dano ao erário - aplicando-se apenas a atos dolosos, portanto.
Contando com o apoio da Frente Nacional de Prefeitos que atua como amicus curiae na ADI 6.678/DF, a arquitetura da decisão atribuiu, em um pilar, interpretação conforme à Constituição ao inciso II do Art. 12 da lei 8.429/92 e, em outro pilar, suspendeu a vigência da última figura do inciso III do art. 12 da norma. Desse modo e em linha com o art. 23 da Convenção Americana de Direitos Humanos, a pena de suspensão de direitos políticos passa a ser aplicável apenas a atos de improbidade dolosos - e não mais culposos - ou a atos que importem em enriquecimento ilícito do agente público - onde se pressupõe o dolo, por óbvio, já que ninguém enriquece à revelia, sem vontade própria ou consentimento consciente.
Trata-se de importante avanço em prol da maximização do direito fundamental à plena participação política dos cidadãos, conforme dizeres e fundamento nuclear da decisão em voga: "a tutela do erário e da probidade administrativa não justifica, nos casos de atos de improbidade culposos e das condutas elencadas no artigo 11 da lei 8.429/1992, a supressão dos direitos fundamentos do cidadão relativos à participação política."
Veremos, nos próximos meses que antecedem o pleito eleitoral de 2022, uma significativa redução dos casos de inelegibilidade junto ao Cadastro Nacional de Condenações Cíveis por Ato de Improbidade Administrativa e Inelegibilidade (CNCIAI/CNJ), e acreditamos na promessa de futuras eleições mais plurais e justas.
Franklin da Costa
Advogado, Subprocurador-Geral da República aposentado e consultor do escritório Burjack, Nunes & Vasconcelos Advogados.
Paulo Burjack
Advogado criminalista e sócio do escritório Burjack, Nunes & Vasconcelos Advogados.