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Reforma da Previdência: entenda como o envelhecimento da população afeta os cofres públicos

Ana Carolina Ianovali Pera

Segundo estudos intersindicais, proposta de reforma da Previdência vai dificultar acesso à aposentadoria.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

Atualizado às 11:57

Diante do rombo registrado em 2016, estimado em R$ 149,2 bilhões (2,3% do PIB), o governo encaminhou ao Congresso Nacional proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/16, alterando o Regime Geral da Previdência Social.

Por não ter sido afetado pelas reformas anteriores, a proposta dispõe de regras de acesso a benefícios, forma de cálculo e financiamento dos regimes previdenciários, permanecendo, no entanto, o critério básico da Previdência: financiamento dos benefícios dos trabalhadores inativos pelos que estão operantes no mercado de trabalho.

Com a queda de arrecadação e a crescente baixa na economia, atualmente, as despesas previdenciárias consistem em cerca de 55% do total da despesa primária, quando os gastos com saúde e educação giram em torno de 10% da receita.

Segundo dados da lei orçamentária de 2017, aprovada pelo Senado pouco antes do recesso, as despesas com a Previdência Social estão projetadas em R$ 562,3 bilhões, valor que representa um rombo exacerbado aos cofres públicos.

Considerando o aceleramento constante da despesa previdenciária, bem como o endividamento global do setor público, o governo julga primordial a reforma geral da Previdência Social. Com o teto dos gastos públicos, o crescimento da despesa previdenciária obrigaria o governo a cortes profundos em outros segmentos, fato que impulsiona cada vez mais a discussão de reformas.

Alguns, satisfeitos com as justificativas do governo, atreladas à má gestão pública, creem tratar dos fatores responsáveis pelo déficit previdenciário, enquanto, particularmente entendo abranger questão mais profunda, que demanda maior acompanhamento.

Já mencionado, o aceleramento da despesa previdenciária consiste em fator responsável pela atual crise no sistema, mas o que precisa ser examinado se refere ao aumento de sobrevida, em outras palavras, o envelhecimento da população brasileira.

Mundialmente falando, a população tem crescido de forma acentuada, morrendo menos e nascendo mais pessoas num mesmo ano. No Brasil, por sua vez, a diminuição de nascituros e o aumento da expectativa de vida consiste no chamado "envelhecimento da população".

A mudança do perfil etário do cidadão brasileiro contribui, significantemente, para o aumento da carga previdenciária e, por consequência, aos cofres públicos.

Dados indicam que o número de servidores ativos no mercado de trabalho chegará a ser inferior ao número de aposentados em 2060, fato que revela a ineficiência do sistema vigente. Segundo o ministro da Fazenda Henrique Meirelles, esse novo perfil deve gerar uma situação insustentável, de modo que a renda proveniente da população ativa no mercado de trabalho não será suficiente para arcar com as despesas dos aposentados.

Tal fato se deve à queda da taxa de fertilidade por mulher no Brasil, isto pois, conforme dados comparativos, é a menor registrada na América do Sul desde 2005. Posto que a Previdência opera pelo sistema de financiamento de recursos provenientes de trabalhadores ativos, em muito pouco tempo, o atual regime previdenciário será imprestável e desastroso.

De um lado, menos pessoas estão nascendo para contribuir com o processo de financiamento e, de outro, a expectativa de vida dos aposentados está aumentando, recebendo os benefícios por mais tempo. De certo, não há conta que feche!

Pensando nisso, o governo não só apoia a reforma geral da Previdência, como reputa vital para a sobrevivência econômica do País.

Mas o que de fato mudará se a reforma for promulgada?

Basicamente, por reconhecer a ineficiência do regime previdenciário por compensação, o governo propõe fixar idade mínima de 65 anos para requerer aposentadoria e elevar o tempo mínimo de contribuição de 15 anos para 25 anos.

Atualmente, não há uma idade mínima para o trabalhador se aposentar. Pelas regras em vigor, é possível pedir a aposentadoria com 30 anos de contribuição, no caso das mulheres, e 35 anos no caso dos homens.

A medida reformulará o patamar mínimo de concessão para 65 anos de idade, para ambos os gêneros, extinguindo, inclusive, as formas de cálculo anteriores (fator previdenciário e fórmula 85/95 - que estaria prevista até 2026). Ainda, reduz o tempo de contribuição para a aposentadoria (25 anos), provocando a unificação das regras de aposentadoria por idade e por tempo de contribuição.

Portanto, se aprovada, não haverá mais distinção de idade mínima para homens e mulheres, ressalvada a regra de transição, ou seja, a mudança no requisito idade não valerá imediatamente à aprovação da reforma, sendo certo que homens com 50 anos ou mais, e mulheres com 45 ou mais, ficarão isentos da idade mínima.

No tocante ao valor da aposentadoria, o cálculo recairá sobre 51% da média dos salários, acrescida de 1% por ano de contribuição, dispensada a aplicabilidade da regra de transição. Como o mínimo de contribuição passa a ser de 25 anos, o menor valor será de 76% da média dos salários.

A proposta de emenda modifica o atual método de cálculo utilizado pelo INSS: reputa-se 80% dos maiores salários, nos termos do art. 29 da lei 8.213/91, sob a incidência do fator previdenciário ou a fórmula 85/95.

Com o advento da lei 13.183/15, o fator previdenciário foi substituído pela fórmula 85/95, que permite aos segurados requerer o benefício integral de aposentadoria desde que a soma de idade e tempo de contribuição atinjam 85 pontos para mulheres e 95 para homens. Por exemplo, um homem de 59 anos de idade, cujo período de contribuição corresponda a 36 anos, pode requerer a integralidade do benefício, bem como uma mulher de 53 anos de idade e 32 de contribuição.

Ocorre que, segundo estudos do Ipea, a fórmula de cálculo vigente agravará a despesa previdenciária em aproximadamente 0,5% do PIB em tempos futuros, o equivalente a R$ 24 bilhões.

Com a unificação das espécies de aposentadoria por idade mínima e por tempo de contribuição, a diferença entre os segurados dar-se-á apenas no que se refere ao valor do benefício, de acordo com o tempo de contribuição.

Ao implementar as regras da PEC 287, o governo pretende estabilizar o déficit previdenciário com o propósito de estancar despesas e não sobrecarregar os cofres públicos, mesmo porque a questão do envelhecimento da população é uma realidade e deve ser tratada com tamanha relevância.

A norma geral que regula a concessão dos benefícios, prevê 3 modalidades de aposentadoria: por idade mínima, por tempo de contribuição e por invalidez. Este último voltado àqueles permanentemente incapazes de exercer qualquer atividade laborativa e que também não possam ser reabilitados em outra profissão.

Assim como as outras espécies, a aposentadoria por invalidez também entrou na pauta da reforma do regime geral previdenciário, tornando o benefício proporcional ao tempo de contribuição do segurado.

Outrossim, o benefício não será mais pago na sua integralidade, seguindo-se as regras de cálculo das demais modalidades (51% + 1% por ano de contribuição, mais 25% se houver necessidade de cuidador). Note que a medida reformadora busca padronizar o método de cálculo dos benefícios, salvo em caso de acidente de trabalho, cujo valor fora mantido na sua integralidade.

A pensão por morte, por sua vez, também traz novidades na forma de cálculo: o valor da pensão passaria a ser de 50% do que o segurado recebia, se aposentado, ou tinha direito a receber se aposentado por invalidez, acrescido de 10% por dependente. Nessa lógica, tratando de cinco ou mais dependentes, a pensão deverá ser paga na sua integralidade.

O benefício estaria atrelado ao sistema de irreversibilidade de cotas, isto é, na hipótese de um dos dependentes do pensionista perder a qualidade de dependente, o valor que ele recebia não mais retornaria aos demais vinculados.

Quanto aos segurados que se enquadram no regime especial, quais sejam: servidores públicos, policiais civis, bombeiros e militares, passarão a responder as regras do regime geral (idade mínima, tempo de contribuição, regra para cálculo de aposentadoria por incapacidade permanente para o trabalho, além das hipóteses de aposentadorias especiais).

Aprovada a reforma previdenciária, os policiais civis e militares, bombeiros e servidores públicos devem seguir o mesmo regramento do regime geral: idade mínima 65 anos para homens e mulheres somados a 25 anos de contribuição. Salvo os militares das Forças Armadas que seguirão um regime específico, ainda a ser regulamentado.

Por fim, outro aspecto levantado pela PEC trata da desvinculação do salário mínimo, de maneira que o benefício garantido pelo INSS não observará o reajuste de valorização do salário mínimo. Destaca-se: mesmo com a desvinculação do salário mínimo, ficará garantido o reajuste dos benefícios pela inflação do ano anterior, a depender de variação positiva do PIB.

Repare que a PEC traz inovações com a finalidade de minimizar gastos desnecessários, tornando a concessão dos benefícios mais rigorosa, levando de maneira súbita, mormente fontes sindicais, à divulgação de um contexto superficial: "reforma da Previdência vai dificultar acesso à aposentadoria".

De acordo com a nota técnica do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), divulgada no último dia 20, a reforma previdenciária vai restringir o direito à aposentadoria - "O que esse projeto vai fazer é estender, na verdade, sob a capa de igualdade de tratamento ao impor idade mínima e ampliar o tempo de contribuição, é condenar a maior parte dos trabalhadores brasileiros a não se aposentar mais".

Diante da dramática circunstância do nosso país, podemos entender oportuna a apresentação de uma proposta mais atual e reformadora, pois, ainda que drasticamente, precisamos de mudanças sérias.

Eficaz ou não, o conjunto de medidas da PEC 287, sem dúvida, traz inovações e talvez soluções para o sistema orçamentário, razão pela qual devemos dar ênfase à sua análise, desprezando, sempre que possível, críticas políticas superficiais. Precisamos olhar a diante e imaginar como estará o Brasil daqui a alguns anos se o sistema não for alterado.

De qualquer forma, considerando que a proposta ainda precisa passar pela análise do Congresso Nacional, muita coisa poderá mudar, caso a medida seja aprovada.

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*Ana Carolina Ianovali Pera é sócia do escritório Costamilan Advogados Associados.

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