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Roubo da pedra fundamental : mais uma estudantada nas Arcadas

Desde sempre destinada a confundir-se com a história de São Paulo e do Brasil, a Faculdade de Direito de São Paulo foi palco de lutas políticas e histórias de acadêmicos irreverentes. Dentre os tantos enredos, a Folha de S. Paulo noticiou, em setembro de 1973, os desdobramentos do roubo da pedra fundamental, ocorrida na ocasião em que se cogitava a transferência da Faculdade de Direito para a Cidade Universitária.

16/7/2009


No centro de SP, um Território Livre

Roubo da pedra fundamental : mais uma estudantada nas Arcadas


A pedra fundamental roubada e a missa de 7o dia pelo enterro da pedra

"No dia 30 de outubro, foi lançada cerimoniosamente, na Cidade Universitária de São Paulo, além do afastado bairro de Pinheiros, a pedra fundamental do novo prédio da Faculdade de Direito, que há 146 anos funciona espalhando a fama das tradicionais arcadas do largo de São Francisco, no centro da cidade. Na quarta-feira passada, com alguns discursos inflamados, muitas velas, hinos e foguetes, os acadêmicos de direito realizaram a 'missa de sétimo dia por intenção da pedra fundamental', enterrada no velho largo sob o epitáfio 'Quantas pedras forem colocadas, tantas arrancaremos'." Revista Veja, 14/11/1973

O roubo da pedra fundamental do pretenso novo prédio da Faculdade de Direito estampava a página 24, da edição 271 da revista Veja, com fotos e passagens que marcam a história das Arcadas.

O fato se deu no dia 30 de outubro de 1973, quando, cerimoniosamente, foi lançada na Cidade Universitária - pelo então reitor da USP, Miguel Reale – a pedra fundamental que simbolizava a transferência da Faculdade de Direito do Largo S. Francisco para o campus da USP, em Pinheiros.

Imbuídos do espírito acadêmico e ideais de liberdade, alguns estudantes manifestaram o desacordo com a situação surrupiando - na calada da noite - a pedra fundamental, marco da construção do pretendido prédio.

Mas nem um só dia permaneceu a pedra fundamental em "território inimigo".

Após o roubo, em meio à boêmia comemoração, fez-se a "sepultura" do objeto furtado. Sobre a lápide, o epitáfio : "Quantas pedras forem colocadas, tantas arrancaremos" – 30/X/1973.

Fiéis ao espírito democrático, os acadêmicos realizaram um plebiscito com os estudantes do 4º e 5º ano noturno. Resultado, 95% dos votos foram contra a transferência da Faculdade de Direito da USP para a Cidade Universitária, permanecendo a Faculdade de Direito de S. Paulo no mesmo endereço : Largo São Francisco, 95, Centro, SP.

Prosseguindo com as cerimônias sepulcrais, os "enlutados" estudantes prestaram, sete dias após o enterro, sua última homenagem à finada pedra com a realização de uma missa.

Entrevistado, na época, pela Folha de S.Paulo, o eterno professor Goffredo da Silva Telles Junior, sempre ao lado dos estudantes, e da tradição acadêmica, declara que "a sede da Faculdade de Direito é o Largo de S. Francisco, tribuna dos nossos políticos, dos nossos poetas e de nossos heróis. Largo que foi regado com sangue dos estudantes na luta contra o despotismo, sempre em favor das liberdades fundamentais da pessoa humana".


E, assim, a Faculdade está lá, onde estava, e onde sempre estará :

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Confira algumas publicações sobre o fato (clique na imagem para ampliar) :

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_Revista Veja___________ Folha de S.Paulo_________ A heróica pancada
_____________________________________________Centro Acadêmico XI de Agosto

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Artigo

Nós ficamos!*

Antônio Clarét Maciel Santos (Paulo Eiró)

1973. Ditadura a todo vapor, sob o comando do General Garrastazu Médici. Reitor da USP Miguel Reale, Diretor da Faculdade de Direito Professor Pinto Antunes (José P. Antunes), secretariado pela Dra. Drinadir Coelho, secretário do XI Chico Elefante. Bedéis, dentre outros, Cachimbinho, Cabeção, Pé de Chumbo, Porteiro Joaquim de Oliveira. A intelligenza, infiltrada no movimento estudantil, verificou que uma das maneiras de neutralizar a influência dos acadêmicos de Direito era confiná-los no campus da Cidade Universitária, onde seria, com certeza, mais fácil manter todos sob controle.

Daí a decisão de transferir a Faculdade de Direito, do Largo São Francisco para a Cidade Universitária, situada na zona oeste da capital, bairro do Butantã, marcando-se a data de 30 de outubro para o festivo lançamento da pedra fundamental do prédio.

No Largo, a notícia soou rapidamente. Luiz Antonio Alves de Souza, presidente do XI de Agosto, eleito pelo Movimento 23 de Junho, que, aliás, compareceu à solenidade, conduziu referendo entre os alunos sobre a decisão, sem, contudo, materializar iniciativa que pudesse manifestar o descontentamento reinante nas Arcadas.

Coube à oposição, representada por integrantes do PRA (Partido de Representação Acadêmica), mais precisamente a Caio Luiz de Carvalho, Luiz Eduardo Gotilla, José Renato Teixeira, Fernando Assumpção Galvão e Walter Lapietra, sob a coordenação do Caio Pompeu de Toledo, antigo aluno, a iniciativa da implementação do furto da pedra fundamental.

Inicialmente designado para horas mortas da noite, o furto se concretizou, no início da tarde de 30 de outubro, num local ermo da Cidade Universitária, após findas as festividades do enterramento de uma caixa de cobre, contendo no seu interior pergaminho assinado pelos presentes, moedas da época e jornais do dia.

O apressamento da operação foi decidido por Gotilla e Zé Renato, que foram ao local para traçar o plano do resgate noturno e, diante da total ausência de vigilância, se sentiram atraídos para completar o apossamento naquele exato momento sem perda de tempo, aproveitando ainda o estado de novo do cimento que cobria a caixa e frustrando, assim, os demais grupos que se formavam para a mesma empreitada.

Com valoroso troféu nas mãos os acadêmicos não demoraram em enterrá-lo bem ao lado da Tribuna Livre, sob uma lápide com a inscrição ditada por Caio Pompeu “Quantas pedras forem colocadas, tantas arrancaremos 30-X-1973”.

A imprensa, logo, se fez presente no Largo e manteve o fato em pauta por mais de uma semana, relatando, inclusive, as festividades do sétimo dia, estas realizadas pelos demais grupos que não lograram chegar antes da turma do PRA. Fundou-se a seguir a Ordem da Pedra, com o escopo de impedir a mudança, tendo como grão chanceler Clóvis Caparaó.

O assunto da transferência da Faculdade prorrogou-se até 1976. Em maio desse ano, a Congregação de Professores aprovou decisão concordando com a mudança para o campus da USP. De imediato, a Ordem da Pedra, no dia 25 de maio, realizou-se ato público no Largo, denominado “enterro do espírito acadêmico”, sob o comando de Paulo Afonso Lucas. Na noite de 11 de agosto, início dos festejos do sesquicentenário da fundação dos cursos jurídicos, os integrantes da Ordem da Pedra encenaram a “Noite do Fico”, no Páteo das Arcadas. Conseguiram-se três cavalos de raça, um deles branco, sobre o qual me encontrava vestido de Dom Pedro I, e realizamos cavalgada no Largo. Após a entrada do Governador Paulo Egidio Martins, sob os acordes da marcha batida por parte da Banda da Polícia Militar, o cortejo adentrou o prédio da Faculdade em direção ao pátio, onde li manifesto contrário à mudança para o campus da USP, terminando, espada içada, com grito de “nós ficamos!”, que foi repetido pelos presentes por mais de dez minutos, interrompendo a cerimônia que então se realizava no salão nobre. O Jornal da Tarde do dia seguinte relatou que “as últimas palavras da proclamação foram acompanhadas, em coro, por gritos dos ouvintes, que repetiam: ‘nós ficamos, nós ficamos, nós ficamos’. Logo mais os estudantes estendiam faixas com a inscrição ‘Noite do Fico’”.

A luta não foi em vão, pois quando Dalmo Dallari assumiu a direção da Faculdade obteve empréstimo internacional e construiu um prédio na esquina das Ruas Riachuelo e Cristovam Colombo, ligando-o ao prédio principal por meio de uma passarela.

* Capítulo do livro "Arcadas no tempo da ditadura", organizado por Henrique d'Aragona Buzzoni (1a edição, Editora Saraiva, 2007, 235 páginas).




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