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TJ/MT - Estado é condenado a fornecer medicamento para hepatite C

2/8/2007


TJ/MT

Estado é condenado a fornecer medicamento para hepatite C

O gestor do Sistema Único de Saúde, a Prefeitura Municipal de Cuiabá e o Estado de Mato Grosso foram condenados a fornecer o medicamento "Interferon Alfa Peguilado" a um paciente portador de hepatite C que não tem condições financeiras de adquirir o medicamento. A sentença foi proferida pelo juiz Márcio Aparecido Guedes, da 2ª Vara Especializada da Fazenda Pública de Cuiabá, que julgou procedente a ação cominatória de obrigação de favor interposta pelo paciente. O medicamento deverá ser fornecido na quantidade e tempo prescrito pelo médico.

Na ação inicial, o autor da ação disse que por recomendação médica do SUS tentou, sem sucesso, obter o medicamento junto ao Estado. Como o remédio é de alto custo, ele não tem condições de adquiri-lo.

De acordo com o magistrado, a Constituição da República atribuiu à União, aos Estados e aos Municípios competência para ações de saúde pública, devendo cooperar, técnica e financeiramente entre si, mediante descentralização de suas atividades, "com direção única em cada esfera de governo, executando serviços e prestando atendimento direto e imediato aos cidadãos".

Para ele, é legítimo que o paciente do SUS a qualquer ente público o fornecimento de remédios para tratamento de sua doença. "Se a União, os Estados e os Municípios são solidariamente responsáveis pelo fornecimento de medicamentos às pessoas carentes, segundo disposto na Lei n. 8080/1990, tem-se que a requerente pode exigir de qualquer um deles o cumprimento de sua obrigação", destacou.

Na decisão, o juiz Márcio Aparecido Guedes ressaltou o artigo 6º da Constituição da República, que elenca a saúde dentre os direitos sociais. Direito este que constitui "direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação".

Além disso, o artigo 23 da Constituição estabelece que é da competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiências.

"E, em cumprimento das disposições constitucionais retro, a Lei Federal n°. 8080, de 19.09.1990, igualmente assegura a universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis e reafirma que a saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício (...) Juízes que somos, não podemos discutir em seara alheia. Não nos cabe, em matéria de medicina, questionar se o medicamento indicado pelos médicos é ou não imprescindível para combater o quadro patológico apresentado pelo Requerente. Se os médicos e os demais profissionais dizem que o tratamento indicado por eles é necessário, não somos nós, simples juízes, que vamos discutir em seara alheia", finalizou o magistrado.

Confira abaixo a decisão na íntegra.

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Vistos em correição;

R. F. F., qualificado nos autos, ingressou com a presente Ação Cominatória de Obrigação de Fazer c/c pedido de Antecipação de Tutela, em desfavor do GESTOR DO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE, PREFEITURA MUNICIPAL DE CUIABÁ E O ESTADO DE MATO GROSSO, pessoa jurídica de direito público, objetivando o fornecimento do medicamento denominado “INTERFERON ALFA PEGUILADO 180 MCG/ML/SC, para tratar da “HEPATITE C” de que é portador.

Aduz em seu pedido, que por recomendação médica do SUS, tentou obter o referido medicamento junto ao último Requerido, mas este se negou a atender o pedido formulado pelo médico.

Aduz, ainda, que o medicamento indicado pelo médico é de alto custo e, portanto, não tem como fazer a sua aquisição.

Assevera, que é dever constitucional do Estado prestar assistência integral à sua saúde, citando, inclusive, diversos dispositivos constitucionais, bem como, doutrinas e jurisprudências.

Por derradeiro, pugna pelo deferimento da liminar e, ao final, pela procedência da ação.

Com a inicial, vieram acostados os documentos de fls. 11/17.

A liminar foi deferida – fls. 21/23.

Os Requeridos, regularmente citados. apresentaram a contestação. O Município de Cuiabá às fls. 33/37, e o Estado de Mato Grosso às fls. 49/54, onde, após alguns apontamentos sobre algumas questões jurídicas e técnicas sobre o tema, requer, ao final, a improcedência da ação.

Impugnação às contestações às fls. 60/67.

Manifestação do Ministério às fls. 73/77, opinando pela procedência da ação.

EM SÍNTESE, É O RELATÓRIO.

DECIDO.

Não havendo necessidade de produção de provas em audiência, passo ao julgamento antecipado da lide, eis que presente “in casu”, a hipótese do art. 330, inc. I do Código de Processo Civil.

Constantes dos autos elementos de prova documental suficientes para formar o convencimento do julgador, inocorre cerceamento de defesa se julgada antecipadamente a controvérsia.” (STJ – 4ª Turma – Ag. 14.952-DF-AgRg, rel. Min. Sálvio de Figueiredo, j. 4.12.91, negaram provimento, v.u., in Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, Theotônio Negrão, 1.996, pág.283)

Como se sabe, a Constituição da República atribuiu à União, aos Estados e aos Municípios, competência para ações de saúde pública, devendo cooperar, técnica e financeiramente entre si, mediante descentralização de suas atividades, com direção única em cada esfera de governo (Lei Federal nº 8.080 de 19/09/1990, art. 7º, IX e XI), executando os serviços e prestando atendimento direto e imediato aos cidadãos (vide art. 30, VII da Constituição da República).

Neste contexto, é legítimo que a Requerente postule a qualquer ente público o fornecimento de remédios para tratamento de sua doença.

Neste sentido, já decidiu a jurisprudência:

"FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. PRESERVAÇÃO DA VIDA - ARTS. 196 E 198, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 - LEGITIMIDADE PASSIVA - Ordinária. Saúde Pública. Fornecimento gratuito de remédio a portadores de AIDS. É dever comum dos Entes Federados cuidar da saúde e da assistência pública, como determinado pelos arts. 196 e 198 da Constituição Federal, que atribuiu papel relevante ao Estado, nessa tarefa, outorgando-lhe competência comum para, juntamente com a União e o Município, cuidar da saúde pública e da proteção e garantia dos portadores de enfermidades graves. É ele, portanto, parte passiva legítima, no pleito. Sendo o direito à vida garantia constitucional, não podem os portadores de doenças graves estar adstritos a procedimentos burocratizados, que não atendem, no caso concreto, ao devido tratamento, ensejando a que a doença progrida incessantemente. Inocorre violação ao princípio da separação de poderes, se o Judiciário, no exercício da jurisdição, assegura aos jurisdicionados as garantias constitucionais outorgadas. Desprovimento do recurso voluntário e confirmação do julgado em reexame necessário".

(TJRJ - AC 3.689/1999 - (Ac. 25101999) - 8ª C.Cív. - Rel. Des. Luiz Odilon Bandeira - J. 09.09.1999)" (fl. 87/88-TJMG)(os grifos constam do original).

No mesmo sentido, já decidiu este Eg. TJMG:

"E M E N T A - MANDADO DE SEGURANÇA - DISTRIBUIÇÃO GRATUITA DE MEDICAMENTO - RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA, UNIÃO/ESTADO/MUNICÍPIO - DIREITO CONSTITUCIONAL ASSEGURADO - Conforme iterativo entendimento jurisprudencial, são responsáveis, solidariamente, o Estado e o Município pelo fornecimento gratuito de medicamentos para o tratamento contínuo de enfermos. É preceito constitucional (arts. 6º e 196, da CF/88) o direito do cidadão à garantia de sua saúde." (TJMG - MS 1.0000.00.306460-7/000, Relator Des. Geraldo Augusto, pub. DJMG 07/05/2003).

Se a União, os Estados e os Municípios, são solidariamente responsáveis pelo fornecimento de medicamentos as pessoas carentes, segundo disposto na Lei n°. 8080/1990, tem-se que a Requerente pode exigir de qualquer um deles o cumprimento de sua obrigação.

Segundo se infere dos autos, o Requerente é portador de ‘HEPATITE C, com indicação de tratamento clínico com o uso do medicamento “INTEERFERON ALFA PEGUILADO 180 MCG/ML/SC”.

Assim, a doença do Requerente e a necessidade do medicamento restaram provadas.

Ocorre que o Requerente não dispõe de recursos para adquiri-lo. A Constituição da República, em seu artigo 6º, elenca dentre os direitos sociais a saúde, direito este que, ainda na forma da Carta Política, constitui "direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação" (art. 196).

Por sua vez, o art. 198 e incisos, da mesma Carta, estabelecem que "as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado" de forma descentralizada, "com direção única em cada esfera do governo" e "atendimento integral".

Também o art. 23, da mesma Constituição da Republica, dispõe em seu inciso II que é da competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, "cuidar da saúde e assistência pública, da proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiências".

E, em cumprimento das disposições constitucionais retro, a Lei Federal n. 8080, de 19.09.1990, igualmente assegura a universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis e "reafirma que a saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício".

MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, comentando o disposto no art. 198, II, da CR, afirma que:

"...manda ele que o atendimento à saúde seja integral, o que significa, na medida em que as palavras têm valor, que todas as doenças e enfermidades serão objeto de atendimento, por todos os meios ao dispor da medicina moderna" ("in" Comentários à Constituição Brasileira de 1988. São Paulo: Editora Saraiva, 1995, v. 4, p. 54 a 56).

Não se deve desconhecer que o SUS é financiado "com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes" (cf. parágrafo primeiro do art. 198 da CR). A conjugação deste dispositivo com o mencionado artigo 23, II, da Constituição, conduz à inexorável conclusão de que àqueles entes compete fazer as gestões necessárias, junto aos responsáveis pelo financiamento do Sistema e/ou pela compra dos medicamentos, de forma a manter a unidade sob sua direção em condições de atendimento integral.

A propósito, neste tema oportuna a anotação do eminente Ministro Celso de Mello, do EXCELSO PRETÓRIO, no seu voto em um processo que se amolda ao caso dos autos:

"Entre proteger a inviolabilidade do direito à vida, que se qualifica como direito subjetivo inalienável assegurado pela própria Constituição da República (art. 5º, caput), ou fazer prevalecer, contra esta prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, - uma vez configurado esse dilema de razões de ordem ético-jurídica - impõem ao julgador uma só e possível opção: o respeito incondicional à vida." (PETMC 1246/SC, em 31.01.1997).

Na mesma linha de entendimento, tem decidido o Egrégio Superior Tribunal de Justiça:

"E M E N T A - RECURSO ESPECIAL. MANDADO de SEGURANÇA. FORNECIMENTO GRATUITO de MEDICAMENTOS. SUS. LEI N. 8.080/90.

O v. acórdão proferido pelo egrégio Tribunal a quo decidiu a questão no âmbito infraconstitucional, notadamente à luz da Lei n. 8.080, de 19 de setembro de 1990.

O Sistema Único de Saúde pressupõe a integralidade da assistência, de forma individual ou coletiva, para atender cada caso em todos os níveis de complexidade, razão pela qual, comprovada a necessidade do medicamento para a garantia da vida da paciente, deverá ser ele fornecido. Recurso especial provido. Decisão unânime". (Superior Tribunal de Justiça, RESP 212346/RJ, Reg. 199900390059, Segunda Turma, julg. 09/10/2001, Rel. Min. Franciulli Netto, pub. DJ 04/02/2002, p. 321)

"E M E N T A - CONSTITUCIONAL. RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. FORNECIMENTO DE MEDICAÇÃO (INTERFERON BETA). PORTADORES DE ESCLEROSE MÚLTIPLA. DEVER DO ESTADO. DIREITO FUNDAMENTAL À VIDA E À SAÚDE (CF, ARTS. 6º E 189). PRECEDENTES DO STJ E STF.

1. É dever do Estado assegurar a todos os cidadãos o direito fundamental à saúde constitucionalmente previsto.

2. Eventual ausência do cumprimento de formalidade burocrática não pode obstaculizar o fornecimento de medicação indispensável à cura e/ou a minorar o sofrimento de portadores de moléstia grave que, além disso, não dispõem dos meios necessários ao custeio do tratamento.

3. Entendimento consagrado nesta Corte na esteira de orientação do Egrégio STF.

4. Recurso ordinário conhecido e provido". (Superior Tribunal de Justiça, ROMS 11129/PR, Reg. 199900781210, Segunda Turma, v.u., julg. 02/10/2001, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, pub. DJ 18/02/2002, p. 279)

Ainda que mantenha reservas quanto à aplicação de tais conceitos incondicionalmente à generalidade dos casos, sem avaliação dos elementos fáticos específicos de cada pretensão deduzida, sem conjugá-los com outras normas constitucionais estruturantes do Estado brasileiro, na espécie dos autos as lições e arestos citados encontram campo para sua aplicação, inclusive aquelas que impõem responsabilidade aos gastos públicos e coíbem dissipação de recursos ao lado da disciplina orçamentária.

Pois bem. Juízes que somos, não podemos discutir em seara alheia. Não nos cabe, em matéria de medicina, questionar se o medicamento indicado pelos médicos é ou não imprescindíveis para combater o quadro patológico apresentado pelo Requerente.

Se os médicos e os demais profissionais dizem que o tratamento indicado por eles é necessário, não somos nós, simples juízes, que vamos discutir em seara alheia. Não podemos ser imprevidentes!

Tratando-se, como se trata, de procedimento de urgência, nada mais natural do que atento aos princípios constitucionais impor ao Estado a obrigação de proporcionar ao Requerente o tratamento necessário para garantir a sua vida e saúde.

EX POSITIS, e tudo o mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTE a presente Ação Cominatória de Obrigação de Fazer para determinar que o Requerido cumpra a obrigação constitucional de tornar efetivo o direito à assistência a saúde do Requerente, fornecendo o medicamento indicado: “INTERFERON ALFA PEGUILADO 180 MCG/ML/SC, na quantidade e tempo prescrito pelo médico.

Condeno o Requerido no pagamento da verba honorária que arbitro em R$=1.500,00 (hum mil e quinhentos reais).

Com ou sem recuso voluntário, remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal de Justiça para o reexame necessário.

P.R.I.C.

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