A maioria dos ministros do STF entende que a Corte deve analisar se é constitucional a aplicação da lei de anistia (lei 6.683/79) a crimes permanentes, como o de ocultação de cadáver (Tema 1.369).
O objeto da discussão é a possibilidade, ou não, de reconhecimento de anistia a crime de ocultação de cadáver, cujo início da execução ocorreu antes da vigência da lei da anistia, mas continuou de modo ininterrupto a ser executado após a sua vigência, à luz da EC 26/85 e da lei 6.683/79.
O relator, ministro Flávio Dino, ressaltou que o tema exige atenção por sua complexidade jurídica e relevância histórica, e propôs que seja tratado sob a sistemática de repercussão geral.
Os ministros, agora, analisam em plenário virtual, se há constitucional e repercussão geral no recurso.
Até o momento, Fux, Barroso, Cármen Lúcia, Moraes e Fachin acompanharam Dino pela análise do tema.
A discussão envolve denúncia apresentada em 2015 pelo MPF contra os militares do Exército Lício Augusto Ribeiro Maciel e Sebastião Curió Rodrigues de Moura (morto) pelas acusações de ocultação de cadáver e homicídio cometidos na Guerrilha do Araguaia.
Na 1ª instância, a denúncia do MPF foi rejeitada com base na lei da anistia. O TRF da 1ª região manteve a decisão, levando o caso ao STF.
Crime permanente
Ao manifestar-se pela repercussão geral, ministro Dino enfatizou que a ocultação de cadáver, por exemplo, continua acontecendo enquanto o paradeiro da vítima permanece desconhecido. "A manutenção da omissão do local onde se encontra o cadáver, além de impedir os familiares de exercerem seu direito ao luto, configura a prática do crime, bem como situação de flagrante."
A lei da anistia, promulgada em 1979, concedeu perdão a crimes políticos e conexos ocorridos entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979. O relator esclareceu que a proposta não revisa a decisão do STF na ADPF 153, que reconheceu a constitucionalidade da lei da anistia. A questão que se coloca agora é se delitos como a ocultação de cadáver, que se prolongam após 1979, podem ser punidos.
Dino detalhou que, por ser um crime permanente, a ocultação de cadáver tem sua ação prolongada no tempo."A aplicação da lei de anistia extingue a punibilidade de todos os atos praticados até a sua entrada em vigor. Ocorre que, como a ação se prolonga no tempo, existem atos posteriores à lei da anistia."
Para ilustrar o impacto humano desse tipo de crime, Dino mencionou o filme "Ainda Estou Aqui", inspirado no livro de Marcelo Rubens Paiva, que relata o desaparecimento do ex-deputado Rubens Paiva.
"A história do desaparecimento de Rubens Paiva, cujo corpo jamais foi encontrado e sepultado, sublinha a dor imprescritível de milhares de pais, mães, irmãos, filhos, sobrinhos, netos, que nunca tiveram atendidos os seus direitos quanto aos familiares desaparecidos."
- Processo: ARE 1.501.674