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Senado: Comissão de juristas aprova anteprojeto de processo estrutural

Proposta busca promover um modelo mais colaborativo e inclusivo, onde a Justiça atua como facilitadora na resolução de litígios complexos.

31/10/2024

A comissão de juristas responsável pela elaboração de um anteprojeto de lei que regulamenta o processo estrutural no Brasil aprovou, em 31 de agosto, o relatório final apresentado pelo desembargador Federal Edilson Vitorelli. O documento, que será submetido ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, até 12 de dezembro, estabelece normas gerais para a tramitação desse tipo de processo, já empregado nos tribunais brasileiros, ainda que sem legislação específica.

O conceito de “processo estrutural”, originário dos Estados Unidos entre as décadas de 1950 e 1970, refere-se a litígios judiciais decorrentes da insuficiência de políticas públicas ou privadas na garantia de certos direitos. Nesses casos, a Justiça assume a discussão, utilizando técnicas de cooperação e negociação para alcançar uma solução efetiva. O acordo judicial para reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem de Brumadinho, em Minas Gerais, exemplifica esse tipo de processo. Em vez de inúmeras ações individuais, o caso foi consolidado em um único procedimento, resultando em indenizações que ultrapassaram R$ 37 bilhões, um dos maiores acordos de reparação já firmados pelo poder público.

A comissão decidiu por definir o conceito de processo estrutural, classificando-o como “ações civis públicas destinadas a lidar com problemas estruturais”. Estes, por sua vez, “são aqueles que não permitem solução adequada pelas técnicas tradicionais do processo comum, individual ou coletivo”. Suas características incluem: multipolaridade, impacto social, natureza duradoura das intervenções, complexidade, situação grave de irregularidade contínua e permanente, e intervenção no funcionamento de instituições públicas ou privadas.

O anteprojeto prioriza o diálogo entre juiz, partes e demais interessados, incluindo os afetados pela decisão. Prevê a participação de todos os grupos impactados por meio de consultas, audiências públicas e outras formas de participação. Além da consensualidade e da ampla participação, o processo deve considerar a capacidade de cada instituição e os limites financeiros das partes, buscando uma solução abrangente.

A atuação do juiz difere do modelo tradicional. Em vez de apenas proferir julgamentos, o magistrado busca articular soluções entre os envolvidos e elabora um plano de trabalho para monitorar o cumprimento da decisão. Ele pode delegar funções decisórias e executivas a outras entidades, como, por exemplo, solicitar ao IBAMA a elaboração de um plano para corrigir uma infração ambiental.

O documento deve ser entregue ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, até o dia 12 de dezembro.(Imagem: Jefferson Rudy/Agência Senado)

O objeto do processo, uma vez definido, só pode ser alterado por consenso entre as partes, evitando processos que se prolongam indefinidamente por mudanças de foco. Metas e indicadores, contudo, podem ser modificados por acordo ou decisão judicial, considerando a dinamicidade da realidade. O juiz pode adotar diversas técnicas processuais, como convocar pessoas ou entidades dos grupos afetados, realizar reuniões técnicas e comunitárias, promover audiências públicas, designar peritos e consultores, e utilizar plataformas tecnológicas para garantir transparência.

O plano de atuação estrutural, ferramenta para alcançar o resultado final do processo, deve conter: diagnóstico do litígio, metas aferíveis, indicadores, cronograma, prazos, responsáveis pela implementação, metodologia de supervisão e revisão, e previsão de recursos orçamentários. O monitoramento do plano e o processo são encerrados quando comprovada a adoção das medidas necessárias à proteção dos direitos violados.

As novas regras se aplicam a processos estruturais trabalhistas, administrativos ou de controle, podendo ser utilizadas no processo penal em casos específicos. Dada a complexidade desses processos, o anteprojeto prevê a revisão de decisões, permitindo ajustes em metas, indicadores e acordos, considerando a evolução da realidade.

O CNJ e o CNMP criarão uma base de dados pública sobre acordos e processos estruturais, com mecanismos para avaliar a atuação de magistrados e membros do Ministério Público. Em casos complexos, o juiz pode ser dispensado de outras funções. Tribunais podem criar órgãos de assessoramento para auxiliar na solução do problema.

Segundo o desembargador Edilson Vitorelli, o processo estrutural não se configura como intervenção em políticas públicas, mas sim como uma forma mais ordenada e colaborativa de lidar com violações recorrentes de direitos. “A edição de uma lei sobre o processo estrutural tende a fomentar uma condução mais participativa, democrática e construtiva dos processos judiciais, permitindo que as violações recorrentes a direitos sejam endereçadas de forma mais ordeira e com a colaboração de todos os envolvidos”.

A comissão de 22 especialistas, presidida pelo subprocurador-geral da República Augusto Aras, foi instalada em junho por Rodrigo Pacheco. O anteprojeto será convertido em projeto de lei e analisado pelo Congresso Nacional. Augusto Aras destacou a necessidade de um processo estrutural no Brasil, citando casos como o da Braskem em Maceió, as enchentes no Rio Grande do Sul, o caso de Mariana e o sistema penitenciário como exemplos de situações que exigem a garantia de direitos fundamentais.

O relatório de Edilson Vitorelli incorporou emendas propostas pelos membros da comissão, que realizou três audiências públicas com especialistas e representantes da sociedade. 

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