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STF julga autonomia do Ministério Público de Contas do Pará

Análise começou no plenário virtual e foi remetida ao físico após pedido de destaque do ministro André Mendonça.

15/8/2024

Nesta quinta-feira, 15, STF voltou a analisar a constitucionalidade de leis do Pará que conferem autonomia administrativa e financeira aos Ministérios Públicos de Contas do Estado e dos municípios.

Na ação, o então PGR, Rodrigo Janot, afirma que órgãos do MP que atuam junto aos Tribunais de Contas não possuem tais autonomias, consoante decidido pelo Supremo nas ADIns 789 e 2.378.

O caso era julgado no plenário virtual, mas pedido de destaque do ministro André Mendonça o levou ao plenário físico. Até o momento foram realizadas as sustentações orais. Devido ao adiantado da hora, o julgamento foi suspenso e retornará na próxima quarta-feira, 21.

STF começou a julgar constitucionalidade de autonomia administrativa e orçamentária de MP de Contas do Pará.(Imagem: Gustavo Moreno/STF)

Caso

O então PGR, Rodrigo Janot, apresentou ADIn no STF contestando leis complementares que conferem autonomia administrativa e financeiras ao Ministério Público de Contas do Pará e de seus municípios. 

Janot argumenta que as expressões “independência financeira e administrativa, dispondo de dotação orçamentária global própria” e “independência funcional, financeira e administrativa, dispondo de dotação orçamentária global própria”, presentes nas LC 9/92 e 86/13, são inconstitucionais. 

Argumenta que o Supremo já entendeu que o MP junto aos Tribunais de Contas não tem uma "fisionomia institucional própria" e, portanto, não deve gozar das prerrogativas de autonomia jurídica nas dimensões político-administrativa e financeiro-orçamentária.

Janot reforça que a CF não confere autonomia administrativa e financeira ao MP junto aos Tribunais de Contas, mas apenas estende aos seus membros, os direitos, vedações e formas de investidura próprios ao MP comum. 

Voto do relator

Em voto no plenário virtual, o relator, ministro Luís Roberto Barroso, havia entendido pela inconstitucionalidade dos dispositivos questionados.

Segundo Barroso, embora a independência funcional seja assegurada pela Constituição, as garantias institucionais do Ministério Público tradicional não se aplicam ao Ministério Público de Contas. A autonomia administrativa e financeira não foi estendida a esse órgão.

Barroso entendeu que há vício de inconstitucionalidade nos dispositivos impugnados das leis complementares do Pará, pois eles estão em desacordo com o art. 130 da CF.

Na oportunidade, considerando o tempo em vigor das normas e a necessidade de ajustes legislativos, orçamentários e administrativos, o ministro propôs a modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade. 

Sugeriu que os efeitos fossem prorrogados até 31/12/24, para garantir a segurança jurídica e a continuidade das funções do órgão.

Manifestação da procuradoria

Nesta quinta-feira, 15, o atual PGR, Paulo Gonet, destacou a longa trajetória histórica do Ministério Público de Contas, uma instituição com raízes seculares que remonta a 1892, quando sua estrutura foi regulamentada, estabelecendo a presença de um representante do MP na Corte especializada.

Gonet relembrou que, em 1918, o MP foi novamente mencionado como um dos quatro corpos distintos que integravam a estrutura do Tribunal de Contas. Já em 1946, a lei orgânica do TCU formalizou a integração do MP à estrutura do tribunal, situação mantida na Constituição Federal de 1967.

O PGR enfatizou que a Constituição de 1988, nos arts. 73 e 130, garantiu a existência autônoma do MP junto ao TCU, e a atual lei orgânica do TCU prevê que o Ministério Público de Contas funcione dentro da estrutura da Corte de Contas.

Ele ressaltou que essa configuração permite ao MP exercer sua vocação institucional, atuando junto a um órgão do capítulo do Legislativo, o Tribunal de Contas, cujas decisões tem caráter decisório com força de título executivo extrajudicial.

Ao comentar sobre a CF, Gonet afirmou que o art. 130 reconhece prerrogativas aos membros do MP que garantem sua independência e autonomia funcional, mas não prevê autonomia administrativa ou orçamentária.

Segundo ele, isso ocorre porque o constituinte seguiu a tradição de manter o MP junto ao TCU integrado à estrutura e organização do próprio tribunal. Ele explicou que o número reduzido de procuradores e a limitada estrutura necessária para seu funcionamento não justificam a concessão de autonomia orçamentária e administrativa ao órgão.

Gonet garantiu que a independência dos membros do MP não é comprometida, pois é assegurada pela Constituição. Frisou que os Tribunais de Contas têm a obrigação de fornecer os recursos burocráticos necessários para a atuação adequada do MP.

Concluiu afirmando que houve uma clara intenção do constituinte de preservar a existência secular do ramo especial do MP junto ao TCU, conferindo-lhe prerrogativas semelhantes às do MP tradicional e delegando aos tribunais de contas a responsabilidade de fornecer os meios materiais para o desempenho de suas funções.

Por fim, Gonet reiterou o pedido de inconstitucionalidade da lei do estado do Pará, com base na previsão constitucional de que a organização do TCU deve ser replicada pelos Tribunais de Contas Estaduais, conforme o art. 75 da CF.

Manifestação do Estado do Pará

Após o PGR, a procuradora Viviane Rufel, representando o Estado do Pará, defendeu a legalidade das leis estaduais e municipais que garantem autonomia administrativa e financeira ao Ministério Público de Contas no Estado, vigorando desde 1992 e 2013, respectivamente.

Segundo ela, as cortes de contas e o Ministério Público de Contas no Pará já operam sob esse modelo há 70 anos, sem nunca ter conhecido outra realidade.

Rufel argumentou que a CF permite margem de atuação dentro da competência política e legislativa dos Estados no que se refere à autonomia administrativa e financeira dessas instituições.

Sustentou que, embora a União, em sua legislação específica, tenha optado por não conferir tal autonomia ao MP de Contas Federal, isso não impede que os Estados decidam de forma diferente.

A procuradora destacou que o art. 130 da CF não proíbe a concessão de autonomia administrativa e financeira e que o art. 75 estabelece que as normas Federais sejam aplicadas aos Estados "no que couber", permitindo certa flexibilidade.

Viviane Rufel defendeu que essa interpretação valoriza os princípios do federalismo, sem se afastar completamente do princípio da simetria constitucional. Ela propôs que o princípio da simetria seja aplicado de forma equilibrada, permitindo que os Estados adotem modelos de gestão diferenciados.

Segundo Rufel, essa diversidade de modelos pode enriquecer o federalismo, oferecendo opções e experiências que podem, inclusive, contribuir para o aperfeiçoamento do modelo federal.

Dessa forma, a procuradora reforçou que a concessão de autonomia ao MP de Contas no Pará é uma escolha legítima do Estado, que prestigia a ideia federativa e respeita as especificidades locais.

Amici curiae

Ainda nesta quarta-feira, 15, representando os amici curiae Ministério Público de Contas do Estado do Pará e Ministério Público de Contas dos Municípios do Pará, o advogado Orlando Magalhães Maia Neto, do escritório Ayres Britto Consultoria Jurídica e Advocaciadestacou, em sua manifestação, que o STF, na ADIn 789, já havia analisado a lei orgânica do TCU. Na ocasião, o ministro Celso de Mello afirmou que a independência funcional não implica necessariamente autonomia institucional.

O causídico argumentou que a CF não proíbe a autonomia institucional em nenhum de seus artigos. Ele defendeu que não há incompatibilidade entre autonomia institucional e funcional, afirmando que a autonomia institucional pode, de fato, fortalecer a autonomia funcional.

Questionou, ainda, qual seria o preceito fundamental violado pela autonomia de um TCE, especialmente quando se trata de um modelo que tem sido bem-sucedido no Pará por décadas.

O advogado ressaltou que a questão está inserida no âmbito do federalismo e da competência estadual, sem qualquer vedação constitucional. Em relação ao art. 75 e ao princípio da simetria, enfatizou que a extensão das normas do TCU aos tribunais de contas estaduais se limita ao campo de simetria das disposições previstas naquela seção da CF, que não trata especificamente dos Ministérios Públicos de Contas.

Destacou o crescente reconhecimento, na jurisprudência do STF, de espaços significativos de autonomia estadual, permitindo uma margem de conformação institucional. Ainda apontou que os Estados muitas vezes funcionam como laboratórios de experiências institucionais, que, em muitos casos, são bem-sucedidas.

No caso do Pará, o advogado observou que os Ministérios Públicos de Contas do Estado e dos Municípios sempre operaram com autonomia institucional, uma tradição consolidada ao longo de décadas e que tem se mostrado eficaz. Mencionou que ambos os tribunais de contas do Pará aprovaram, por unanimidade, moções de apoio à continuidade dessa autonomia, evidenciando sua eficácia, na prática.

Ainda argumentou que a autonomia institucional dos MPs de Contas no Pará traz a consequência positiva de capacitar seus membros, que, ao atuarem como gestores e ordenadores de despesas, adquirem competências importantes. Essa experiência promove uma empatia funcional que aprimora o desempenho dos procuradores.

Ele concluiu afirmando que, no caso do Pará, os MPs de Contas prestam contas aos respectivos tribunais, o que assegura que a autonomia seja acompanhada de responsabilidade, destacando a necessidade de reconhecer espaços federativos de autonomia com a correspondente responsabilidade.

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