Sob o rito dos recursos repetitivos, 3ª seção do STJ entendeu possível aplicar fração máxima de aumento de pena por continuidade delitiva (art. 71, CP) em crimes de estupro de vulnerável, ainda que não haja a indicação específica do número de atos sexuais praticados.
Como representativos da controvérsia foram selecionados dois recursos especiais, ambos de relatoria da ministra Laurita Vaz.
REsp 2.029.482
Em um dos recursos, o réu foi condenado a 50 anos de reclusão pela prática reiterada de estupro de vulnerável, mas o TJ/RJ deu provimento à apelação para afastar o concurso material, aplicar a continuidade delitiva entre todos os crimes e reduzir a fração de aumento da pena em decorrência do crime continuado. O argumento foi o de que não houve a especificação das datas nas quais os episódios teriam ocorrido.
O MP/RJ, em REsp, apontou que a aplicação da fração máxima de majoração decorrente da continuidade delitiva, nessa circunstância, dispensa a delimitação específica de cada conduta praticada, sendo possível a verificação do número elevado de crimes com base no período em que ocorreram.
Como amicus curiae no julgamento do primeiro REsp, a ANACrim - Associação Nacional de Advocacia Criminal apresentou tese de que caberia o in dubio pro reo mesmo na dosagem da pena. Ou seja, não seria possível a aplicação da fração máxima não existindo prova da quantidade de atos.
REsp 2.050.195
No segundo caso, mãe e padrasto por quatro anos cometeram atos de natureza sexual contra menina de 10 anos. Os autores filmavam, fotografavam e divulgavam os atos.
Com relação a este REsp, o defensor público sustentou tese de que a mãe da criança não praticou ação, mas omitiu-se, de modo que não seria possível estender a ela a discussão a respeito da majoração da pena, já que a quantidade de situações em que a acusada foi omissa não pode ser provada.
Casos graves
Ministra Laurita Vaz aventou a gravidade dos casos e proveu os recursos do MP, definindo tese no sentido de que é possível "aplicação da fração máxima de majoração prevista no art. 71, caput, do CP, nos crimes de estupro de vulnerável, ainda que não haja indicação específica do número de atos sexuais praticados, desde que o longo período de tempo e recorrência das condutas permita concluir que houve sete ou mais repetições".
Os demais ministros seguiram a relatora, por unanimidade.
Ministro Rogerio Schietti Cruz ressaltou que o Anuário da Segurança Pública de 2023 identificou o maior número de estupros da história, com crescimento de 8% desde 2021, perfazendo, aproximadamente, 74 mil vítimas. S. Exa. ainda considerou que existem sub notificações, pois apenas 10% dos casos são denunciados.
Schietti entendeu que "imaginar que foram poucos os episódios, ou imaginar que um caso como esse deveria ser tratado com apenamento próximo ao mínimo é, com todas as vênias, imaginar um mundo fora da realidade". Ainda, aventou que se trata de verdadeira predação sexual e que a pena do sistema brasileiro é pequena perante a gravidade desse tipo de crime.
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