Na última semana, o encontro entre os presidentes do Brasil e dos EUA, Lula e Joe Biden, teve como um dos pontos centrais debatidos o propósito dos dois países de criarem ferramentas regulatórias que defendam trabalhadores da digitalização do trabalho, em um novo contexto de economia global em que as inteligências artificiais estão cada vez mais presentes. Segundo a sócia da área empresarial do Urbano Vitalino Advogados, Silvana Melo, regular setor é urgente e desafiante. “O desafio atual parece ser construir uma regulação capaz de endereçar tanto os diferentes níveis de riscos, como também possibilitar a inovação, a pesquisa e o desenvolvimento”, explica.
De acordo com Silvana, apesar de não existir ainda uma lei específica para regular a IA no Brasil, há iniciativas em andamento, com inspiração em normas globais sobre o tema, além de PLs mais robustos em tramitação, tanto com origem na Câmara dos Deputados quanto no Senado, que formam o desenho de um primeiro marco regulatório para o setor. Porém, a advogada alerta que uma eventual “concorrência” entre as casas legislativas pode ser um fator de complicação. “Se for configurada uma espécie de disputa para regular primeiro e não houver conciliação completa entre as propostas, pode atrasar a tramitação do marco regulatório, o que seria prejudicial para as empresas e a sociedade”, explica.
Quais são as iniciativas legislativas existentes no Brasil?
Além do novo marco regulatório, Silvana explica que, atualmente, estão em tramitação quatro principais projetos de lei sobre o tema. Foram iniciados no Senado o PL 5051/19, que visa regulamentar a IA no Brasil, o PL 5691/19, com o objetivo de instituir a Política Nacional de Inteligência Artificial e o PL 872/21, que dispõe sobre os marcos éticos e as diretrizes que fundamentam o desenvolvimento e o uso da IA no Brasil. Todos possuem tramitação bicameral, em outras palavras, significa que eles devem passar pelas duas casas legislativas, Câmara dos Deputados e Senado, sendo discutidos, votados, aprovados ou rejeitados antes de, eventualmente, se tornarem leis. Como os projetos tiveram como casa iniciadora o Senado, a casa revisora será a Câmara dos Deputados. Até o fechamento desta matéria, os três projetos permanecem em tramitação no Senado, ou seja, ainda não foram concluídos e encaminhados para a Câmara dos Deputados.
Já o PL 21/20, anteriormente designado como Marco Legal da IA, que também possui tramitação bicameral, foi iniciado na Câmara dos Deputados e teve autoria de Eduardo Bismarck. Em resumo, a proposta legislativa busca estabelecer princípios, direitos, deveres e instrumentos de governança para o uso da IA no Brasil e determinar as diretrizes para a atuação da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, pessoas físicas e jurídicas, de direito público ou privado, e entes sem personalidade jurídica em relação à matéria. A iniciativa que tramitou em regime de urgência na Câmara, foi aprovada no plenário e remetida ao Senado, em setembro de 2021, com alterações no texto. Até hoje, o PL 21/20 se encontra em tramitação no plenário do Senado.
Porém, em março deste ano, foi apresentado na Câmara dos Deputados mais um projeto de lei abrangendo o tema, o PL 759/23, o que, segundo Silvana, reforça o risco de que ocorra uma “disputa” entre as casas legislativas.“Aparentemente, não foi considerado o fato de que a indicação de uma comissão de especialistas, para apoiar a elaboração do marco regulatório, visava justamente conciliar os pontos dos diversos projetos anteriormente apresentados. Essa situação leva a crer que, possivelmente, a conciliação não foi completa, e o marco regulatório de IA no Brasil segue aguardando despacho”, explica.