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STF derruba marco temporal; confira tese fixada

Marco temporal é uma tese jurídica segundo a qual os povos indígenas têm direito de ocupar apenas as terras que ocupavam ou já disputavam em 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição Federal.

27/9/2023

STF, nesta quarta-feira, 27, concluiu julgamento em que, por maioria de votos (9x2), derrubou a tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas. 

Sobre o tema, foi fixada a seguinte tese: 

“1. A demarcação consiste em procedimento declaratório do direito originário territorial à posse das terras ocupadas tradicionalmente por comunidade indígena;

2. A posse tradicional indígena é distinta da posse civil, consistindo na ocupação das terras habitadas em caráter permanente pelos indígenas, das utilizadas para suas atividades produtivas, das imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e das necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições, nos termos do §1º do artigo 231 do texto constitucional;

3. A proteção constitucional aos direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam independe da existência de um marco temporal em 5 de outubro de 1988 ou da configuração do renitente esbulho, como conflito físico ou controvérsia judicial persistente à data da promulgação da Constituição;

4. Existindo ocupação tradicional indígena ou renitente esbulho contemporâneo à promulgação da Constituição Federal, aplica-se o regime indenizatório relativo às benfeitorias úteis e necessárias, previsto no art. 231, §6º, da CF/88;

5. Ausente ocupação tradicional indígena ao tempo da promulgação da Constituição Federal ou renitente esbulho na data da promulgação da Constituição, são válidos e eficazes, produzindo todos os seus efeitos, os atos e negócios jurídicos perfeitos e a coisa julgada relativos a justo título ou posse de boa-fé das terras de ocupação tradicional indígena, assistindo ao particular direito à justa e prévia indenização das benfeitorias necessárias e úteis, pela União; e quando inviável o reassentamento dos particulares, caberá a eles indenização pela União (com direito de regresso em face do ente federativo que titulou a área) correspondente ao valor da terra nua, paga em dinheiro ou em títulos da dívida agrária, se for do interesse do beneficiário, e processada em autos apartados do procedimento de demarcação, com pagamento imediato da parte incontroversa, garantido o direito de retenção até o pagamento do valor incontroverso, permitidos a autocomposição e o regime do art. 37, §6º da CF;

6. Descabe indenização em casos já pacificados, decorrentes de terras indígenas já reconhecidas e declaradas em procedimento demarcatório, ressalvados os casos judicializados e em andamento;

7. É dever da União efetivar o procedimento demarcatório das terras indígenas, sendo admitida a formação de áreas reservadas somente diante da absoluta impossibilidade de concretização da ordem constitucional de demarcação, devendo ser ouvida, em todo caso, a comunidade indígena, buscando-se, se necessário, a autocomposição entre os respectivos entes federativos para a identificação das terras necessárias à formação das áreas reservadas, tendo sempre em vista a busca do interesse público e a paz social, bem como a proporcional compensação às comunidades indígenas (art. 16.4 da Convenção 169 OIT);

8. A instauração de procedimento de redimensionamento de terra indígena não é vedada em caso de descumprimento dos elementos contidos no artigo 231 da Constituição da República, por meio de procedimento demarcatório até o prazo de cinco anos da demarcação anterior, sendo necessário comprovar grave e insanável erro na condução do procedimento administrativo ou na definição dos limites da terra indígena, ressalvadas as ações judiciais em curso e os pedidos de revisão já instaurados até a data de conclusão deste julgamento;

9. O laudo antropológico realizado nos termos do Decreto nº 1.775/1996 é um dos elementos fundamentais para a demonstração da tradicionalidade da ocupação de comunidade indígena determinada, de acordo com seus usos, costumes e tradições, na forma do instrumento normativo citado;

10. As terras de ocupação tradicional indígena são de posse permanente da comunidade, cabendo aos indígenas o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e lagos nelas existentes;

11. As terras de ocupação tradicional indígena, na qualidade de terras públicas, são inalienáveis, indisponíveis e os direitos sobre elas imprescritíveis;

12. A ocupação tradicional das terras indígenas é compatível com a tutela constitucional ao meio ambiente, sendo assegurados o exercício das atividades tradicionais dos indígenas;

13. Os povos indígenas possuem capacidade civil e postulatória, sendo partes legítimas nos processos em que discutidos seus interesses, sem prejuízo, nos termos da lei, da legitimidade concorrente da FUNAI e da intervenção do Ministério Público como fiscal da lei.”

STF derruba marco temporal; foi fixada tese sobre o tema.(Imagem: Ton Molina /Fotoarena/Folhapress)

Marco temporal

Marco temporal é uma tese jurídica segundo a qual os povos indígenas têm direito de ocupar apenas as terras que ocupavam ou já disputavam em 5 de outubro de 1988, data de promulgação da Constituição Federal. Ela se contrapõe à teoria que considera que o direito desses povos sobre as terras tradicionalmente ocupadas é anterior à criação do Estado brasileiro, cabendo a este apenas demarcar e declarar limites territoriais.

O processo que motivou a discussão trata da disputa pela posse da Terra Indígena Ibirama, em Santa Catarina. A área é habitada pelos povos Xokleng, Kaingang e Guarani, e a posse de parte da terra é questionada pela Procuradoria do Estado.

Na última semana, chegou ao fim o debate, quando a Corte derrubou a tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas. Conforme a decisão, a demarcação independe do fato de que as comunidades estivessem ocupando ou disputando a área na data de promulgação da Constituição Federal. 

Propostas - Teses

Nesta tarde, no início da sessão, ministro Edson Fachin propôs a seguinte tese:

“1. A proteção constitucional aos direitos originários sobre as terras tradicionalmente ocupadas por indígenas não se sujeita ao marco temporal ou a configuração do remitente esbulho, como conflito físico ou controvérsia judicial persistente a data da promulgação da Constituição de 1988, sendo o laudo antropológico um dos elementos importantes para a respectiva caracterização, garantidos os princípios próprios do devido processo administrativo.

2. Ao terceiro de boa-fé que esteja na posse da terra declarada de ocupação tradicional indígena assiste direita indenização prévia pelas benfeitorias, bem como àquela decorrente do regime de responsabilização covil do Estado por eventuais danos causados por Estados e pela União, em decorrência da titulação indevida de terras indígenas, apurada esta para fim de justa e prévia indenização em processo administrativo judicial apartado do procedimento demarcatório sem direito a retenção, admitida a composição e o levantamento da parte incontroversa.”

Em seguida, com a palavra, ministro Alexandre de Moraes aderiu integralmente ao item 1 do ministro Edson Fachin, contudo, quanto ao segundo tópico, o ministro propôs a seguinte mudança:

“2. Inexistindo a presença do marco temporal ou de remitente esbulho como conflito físico ou controvérsia judicial persistente a data da promulgação da Constituição, são válidos e eficazes, produzindo todos os seus efeitos, os atos e negócios jurídicos perfeitos e a coisa julgada que tenham por objeto a posse lícita e de boa-fé ou o domínio com justo títulos das terras de ocupação tradicional indígena ou exploração das riquezas no solo, rios e lagos nela existentes, assistindo ao particular direto a prévia e justa indenização em face da União e do ente federativo que titulou a terra, correspondente ao valor da terra nua e benfeitorias e úteis, pago em dinheiro ou em títulos da dívida agrária se for de interesse do beneficiário e processado em autos apartados do procedimento de demarcação, garantido o direito de retenção se não houver do depósito do valor incontroverso, admitida a composição.”

Ministro Dias Toffoli, por sua vez, destacou a necessidade de uma formulação mais ampla e apresentou tese jurídica com 14 itens.

Posteriormente, ministro Luís Roberto Barroso ressaltou que na tese do ministro Toffoli quanto na do ministro Fachin deve-se qualificar o que significa indenização prévia. “Se a indenização prévia significa o poder público fazer um depósito antes de se emitir na posse, eu estou de acordo. Se significa esperar acabar o processo de desapropriação, eu estou em manifesto desacordo”, asseverou o ministro. 

Após muito debate, os ministros da Corte formaram consenso e firmaram tese sobre o tema. 

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