Migalhas Quentes

Migalheiro protocola recurso no CONAD – Comissão de Negros e Assuntos Anti-Discriminatórios da OAB/SP

14/5/2007


Recurso

O advogado e migalheiro José Roberto Ferreira Militão, um dos membros fundadores da Comissão de Negros na Ordem, em 1985, protocolou recurso no CONAD – Comissão de Negros e Assuntos Anti-Discriminatórios da OAB/SP postulando a apreciação do mérito de projetos de leis que contemplam normas jurídicas com base em "raças".

Veja abaixo a íntegra do recurso.

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EXMO. SR. CONSELHEIRO PRESIDENTE DA CONAD – COMISSÃO DE NEGROS E ASSUNTOS ANTI-DISCRIMINATÓRIOS DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – Secção de São Paulo

RECURSO:
Apreciação no mérito do Projeto de Lei
'ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL'

JOSÉ ROBERTO FERREIRA MILITÃO, advogado OAB/SP 82.946, um dos membros fundadores da Comissão de Negros na Ordem, em 1985, e atual membro efetivo da CONAD – Comissão de Negros e Assuntos Anti-Discriminatórios, tendo em vista manifestações de 'apoio incondicional' em nome da OAB favoráveis a projetos de leis raciais, d.v., viciados de origem, sem apreciação do mérito pela via institucional da V. Ordem, vem respeitosamente requerer ao D. Presidente, o recebimento e processamento do presente Recurso pelas razões e ponderações que anexa.

Requer ainda, sejam consideradas como razões recorrentes, o anexo artigo da lavra da Exmo. Sr. Ministro Joaquim Barbosa, do Supremo Tribunal Federal, elaborado e publicado em 2002, enquanto Professor de Direito e Procurador Federal cujas lições subsidiará, suficientemente, os ilustres advogados, a respeito da pertinência e amplo acolhimento da doutrina jurídica de AÇÕES AFIRMATIVAS sob as regras da Constituição Federal, na forma ampla e desde que não racial.

Neste sentido, as razões recursais postulam a apreciação do mérito dos aludidos projetos de leis que contemplam normas jurídicas com base em 'raças', sem entretanto desconsiderar a oportunidade e necessidade do Brasil contemplar em sua ordem jurídica uma generosa e indispensável legislação civil, que pode ser um inédito ESTATUTO DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE CIVIL, com fulcro na doutrina jurídica de Ações Afirmativas (o que não se confunde com cotas raciais), assegurando a todos os brasileiros, especialmente os discriminados historicamente: os negros, as mulheres, idosos, deficientes, índios etc., a garantia de inclusão e igualdade de tratamento e de oportunidades civis, sociais, educacionais e econômicas.

Relevante ponderar o entendimento que a população negra, vítima histórica do racismo, será ainda mais estigmatizada e discriminada com a estatização de raças, o que deve ser repudiado, não sendo plausível ainda a imposição de a submeter a mais uma dor e gravame moral que produzirá efeitos colaterais permanentes afetando as próximas gerações.

O recorrente ressalta ainda, que o pedido recursal se deve a reiteradas manifestações da E. Ordem dos Advogados do Brasil – Seção de São Paulo, favoráveis a tais projetos, sem que tais propostas legislativas tenham sido apreciadas, em seu mérito, de forma institucional, assim não podendo prevalecer esse posicionamento sobre a relevante matéria não debatida e deliberada, como se expressão consolidada a todos os advogados, que assim espera, seja inclusive remetida para apreciação até o nível do Conselho Federal da OAB, por seus eméritos integrantes, o que virá conferir, pela sabedoria, cultura e experiência jurídica dos Nobres Conselheiros, a melhor e mais adequada posição institucional, que então, bem apreciada será oferecida ao Congresso Nacional e também ao Poder Executivo, a fim de ser acolhida a melhor legislação no interesse público.

Termos em que, anexa e respeitosamente P. Processamento e deliberação coletiva e institucional.

P. Deferimento.

São Paulo, 09 de maio de 2.007

José Roberto Ferreira Militao – OAB/SP 82.946

"Não lutamos por integração ou por separação. Lutamos para sermos reconhecidos como seres humanos. Lutamos por direitos humanos." Malcolm X, ou El-Hajj Malik El-Shabazz

CONAD-Comissão de Negros e Assuntos Anti-Discriminatórios

ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL – São Paulo

Assunto: Projetos de Leis de Estatuto RACIAL e cotas RACIAIS

Recurso: Razões contrárias ao Apoio sem Apreciação do mérito

RAZÕES RECURSAIS:

Ilustres colegas Advogados,

Sr. Presidente, demais colegas:

"Não é possível subjugar homens sem logicamente os inferiorizar de um lado a outro. E o racismo não é mais do que a explicação emocional, afetiva, algumas vezes intelectual, desta inferiorização. Numa cultura com racismo, o racista é, pois, normal." a) FANON, Frantz.Racismo e Cultura,I Congresso Escritores Negros,Paris,1956,in'Livr.Sá Costa,Lisboa, 1980, p.47-48.

Em 2006, dois projetos de leis considerando 'raça' como identidade jurídica - Projetos de Leis do ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL e extensiva também à Lei das Cotas Raciais nas Universidades - estavam prestes a serem votados e aprovados na Câmara Federal, ambos tramitam no Congresso Nacional desprovidos de melhor avaliação e mais aprofundado debate sobre sua verdadeira eficácia e, mais relevante, sem uma profunda avaliação sobre os efeitos colaterais decorrentes do acolhimento na ordem jurídica brasileira, pela vez primeira, da crença em 'raças humanas', como identidade jurídica para a concessão de direitos. Agora, em 2007, com o início de renovadas gestões nos E. Conselhos da Ordem dos Advogados, Federal e Estadual, coincidentes com uma nova legislatura nos Parlamentos Estadual e Federal, viabilizando assim, uma indispensável interlocução com os nobres operadores de direito que farão a eficácia das novas leis em prol da cidadania.

Na condição de advogado, negro, comprometido com a luta contra o racismo e as discriminações e, em especial, membro Comissão de Negros da OAB/SP criada em 1985, exatamente para trazer à V. Ordem os temas jurídicos e legais inerentes ao combate ao racismo e às discriminações de qualquer espécie, ora conceituada CONAD – Comissão de Negros e Assuntos Anti-Discriminatórios da OAB/SP e desde a campanha pela Constituinte, comprometido pelo Estado de Direito em sua plenitude, acredito que, com meus pares, temos por dever refletir e debater os projetos de Leis Raciais em apreço, considerando seus defeitos de origem, SMJ. a fim de ser transmitido ao renovado Parlamento o melhor entendimento e os questionamentos, conforme a tradição da Ordem nestas questões que afetem ou possam afetar a íntegra dos direitos de cidadania.

Neste sentido, solicitei a apreciação da matéria perante a CONAD - Comissão de Negros e Assuntos Anti-Discriminatórios, na qual tive a honra de participar desde a sua criação, ao lado de ilustres colegas da Comissão de Negros designados pelo então D. Presidente, Emérito conselheiro Dr. Antonio Cláudio Mariz de Oliveira e que foi constituída naquela fase pré-constituinte que veio culminar com a Carta Cidadão de 1988.

Ilustres Advogados, o recorrente está convencido que não coaduna com nosso dever cívico e de ofício, oferecer APOIO INCONDICIONAL a projetos de leis que, a despeito da boa intenção anunciada, são acolhedores de 'raça' como identidade jurídica estatal trazendo consigo vícios de origem, que produzirão danos irreparáveis à cidadania dos brasileiros, em especial, trazem o gene do ideal da crença em raça.

Destarte, neste sentido recorro à plenária da conceituada CONAD, visando o aprofundamento deste debate, com o objetivo de um posicionamento em nome da V. Ordem, sereno, refletido e bem sopesado, o que foi acolhido pelo Ilustre Presidente e Conselheiro da Seccional Paulista, Dr. Marco Antonio Alvarenga Zito.

Em nosso respeitoso debate, o Ilustre Presidente da CONAD esclareceu ao plenário da Comissão que o posicionamento anterior pronunciado em 2006 pela CONAD a favor de tais projetos de leis, foi apenas político sem apreciação do mérito nem dos pré-requisitos, o que, com a merecida vênia, não poderá prevalecer nem subsistir.

Neste sentido, o presente recurso a fim de ser suspenso o APOIO EXPLÍCITO e INCONDICIONAL ao projeto de lei e previamente submetida a deliberação da Ordem, esse apoio manifesto ao ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL a fim de viabilizar o necessário debate e novas conclusões da CONAD e sua remessa ao E. Conselho Seccional e até mesmo ao Conselho Federal a fim de ser recolhida no conjunto da advocacia brasileira, operadores do direito que na prática, no dia a dia, conferem a eficácia aos princípios da cidadania plena, na condição e responsabilidade de indispensáveis à Administração da Justiça conforme o status constitucional, para a emissão de um posicionamento institucional com toda a sua fundamentação basilar.

Sucede que as matérias tratadas no projeto de lei do ESTATUTO DE IGUALDADE RACIAL, por ser reconhecidamente necessária, agregam grande apelo e oportunidade política, porém, o questionamento é que, além de efeitos imediatos precários, sua implementação produzirá com a estatização de raças, como identidade jurídica, efeitos colaterais permanentes e duradouros e que se obedecidas boas técnicas de produção de leis, impedem a sua aprovação pelo Parlamento.

PRÉ-REQUISITOS EXIGIDOS DA LEGISLAÇÃO EFICAZ:

Assim, a primeira preocupação com a técnica legislativa, para adiantar a inviabilidade de tais leis raciais, é que, conforme a doutrina, para a vigência e eficácia, na elaboração de uma boa legislação são indispensáveis que a norma coercitiva traga em seu bojo, integralmente contemplado os cinco princípios básicos de qualquer nova lei: a necessidade; a oportunidade; a adequação; a proporcionalidade e a razoabilidade de seu império ao universo da cidadania. Neste sentido, o requerente adianta que, SMJ., às aludidas leis raciais em apreço, falece o atendimento a três destes pré-requisitos: a adequação, a proporcionalidade e a razoabilidade, conforme a seguir será demonstrado.

Os nobres advogados na condição de militantes contra o racismo e pela garantia da cidadania de todos os brasileiros têm a ciência que a sociedade como um todo, e o movimento negro em especial, exigem com premência uma boa legislação, para que se efetive neste Brasil, tão desigual, um novo Contrato Social que podemos designar por ESTATUTO DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE CIVIL, (que dispensa adjetivação racial) para ser acolhida na ordem jurídica. Portanto, patente a necessidade do enfrentamento das desigualdades sociais através da regulamentação legislativa pró-ativa.

Também temos ciência do acolhimento em diversos países de leis baseados na de Ações Afirmativas, com fulcro na doutrina formulada por John Rawls (A Teoria da Justiça, 1971) admitida pela doutrina de Ronald Dworkin e Norberto Bobbio e festejada por Jürgen Habermas, em que os renomados filósofos do Direito, concebem a possibilidade de Programas Nacionais de Ações Afirmativas, em que haja harmonia e eqüidade, a despeito de alguma restrição a princípios tidos por invioláveis como a Liberdade e a Igualdade, a fim de ser promovida a igualdade material de tratamento e de oportunidades, o que não se confunde com cotas nem com leis raciais. Nesse aspecto entendemos presente o princípio da adequação de leis Afirmativas, condicionada a não contemplar o ideal do racismo que é a institucionalização de raças como identidade jurídica.

Por seu lado, conforme o estágio das aludidas propostas legislativas ora em apreço, resta bem claro que a sociedade brasileira tem a disposição e considera oportuno que o Parlamento aprecie e aprove novas leis que façam a PROMOÇÃO DA IGUALDADE, o que consideramos inédito no ordenamento jurídico nacional. Assim também presente a oportunidade para esse tipo de leis. O que nos resta apreciar são as demais pré-condições para a gestação de uma norma legal, ou seja, a proporcionalidade e a razoabilidade e a adequação, quando acolhida sob a qualificação adjetiva de ser racial.

Em matérias legislativas, os advogados possuem inato interesse e não podemos permanecer omissos em matérias que, por seus efeitos colaterais, se aprovada a legislação na forma proposta, afetará, alterando de forma substancial as relações sociais e até mesmo afetivas da população e o cotidiano dos brasileiros nas próximas décadas e gerações.

LEIS QUE ESTATIZAM 'RAÇAS': (a proporcionalidade)

Preliminarmente, em anexo cópia do Manifesto que foi subscrito por expoentes intelectuais, professores, cientistas e ativistas de políticas sociais e entregue aos Presidentes da Câmara e Senado Federal, em 2006, que faz parte integrante destas razões.

Pondera o requerente, conforme expresso no referido Manifesto, subscrito pelo recorrente, que tais leis não poderiam ser admitidas desprovidas de um profundo debate com a sociedade brasileira, com os operadores do direito e com os estudiosos das ciências jurídicas e sociais. Essa é uma reflexão que vale a pena ser feita: leis raciais é matéria relevante de direito que envolve questões éticas da sociedade e seu acolhimento equivale a violação de princípios caros ao ordenamento jurídico da cidadania, como a igualdade formal e a vedação ao acolhimento da crença em raças como identidade jurídica, consagrados pela ordem constitucional.

Com isso, em razão de seus efeitos colaterais, a avaliação do projeto de Lei do ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL não pode ficar restrita a simples avaliação de oportunidade política ou mesmo a seu vasto apoio popular.

Neste sentido, a ponderação inerente a qualquer nova legislação é suas pré-condições essenciais além da adequação; da oportunidade e da necessidade; exigem o cumprimento dos requisitos da proporcionalidade e razoabilidade de seu acolhimento em face dos compromissos <_st13a_personname productid="em Tratados Internacionais" w:st="on">em Tratados Internacionais, das cláusulas pétreas da Constituição e dos objetivos permanentes da nação declarados nos arts. 1º., 2º., 3º., e 4º c/c. art.19 da CF.

Destarte, mesmo que aprovados pelo parlamento, tal tipo de legislação além de produzir a crença em raças, estará violando preceitos insuperáveis da CF/88.

Como visto, para a adequação (desde que sem a raça jurídica), oportunidade e necessidade não restam dúvidas que as discriminações históricas, com base na cultura racista que justificava a escravidão negra e vitimou cerca de quatro milhões de africanos, seqüestrados e traficados para o Brasil e submetidos à degradante escravidão por quase três séculos, de 1600 a 1880 e continua vitimando a seus descendentes, ao lado da cultura machista e sexista, autorizando, senão exigindo, um grande programa de políticas públicas através de legislação acolhedora da referida doutrina jurídica de ações Afirmativas destinada a neutralizar as discriminações correntes, acolhedoras da eqüidade para a garantia da Promoção da Igualdade de Tratamento e de Oportunidades, com equidade.

Se, entretanto as leis propostas atendem aos princípios da adequação, necessidade e da oportunidade, conforme demonstrado, ainda resta ponderar as razões pelas quais esse tipo de legislação, se formulada como leis raciais, isoladas e não extensivas ao mesmo tempo, aos demais discriminados históricos, não contempla a outros princípios fundamentais: adequação se 'racial'' ; a proporcionalidade e a razoabilidade.

Portanto, Nobres Advogados, a questão exigente de reflexão é quanto à adequação, proporcionalidade e quanto à razoabilidade desse tipo de legislação, se fundada na identidade jurídica que tenha por base a 'raça' de beneficiários.

O desafio é como fazer essa reflexão, pois o tema, sob o ponto de vista da ação e expectativa política, por óbvio, desperta muita paixão, o que não é compatível com a esperada serenidade. Sucede, por exemplo, que por ter subscrito o referido 'Manifesto à Nação' contrário à aprovação dos projetos de leis raciais, em razão do vício racista apontado em seu conteúdo e em razão desse posicionamento público, em vez de contra-argumentos lúcidos em razões, lógicos e razoáveis, o recorrente tem recebido muitas ofensas e ameaças até mesmo à integridade física pessoal e familiar, fatos ora declinado, exclusivamente como evidencia do grau de perplexidade do tema.

Como visto, I. Advogados, diante da realidade de desigualdade social, decorrente da prática de discriminações com base na cultura doentia do racismo, ainda assim não é razoável a admissão de leis de bases raciais, sem, entretanto, abdicar da defesa das experiências positivas alcançadas pelas políticas neutras de Ações Afirmativas, concebida por Ralws, admitidas por Dworkin, Bobbio, e homenageadas por Habermas. No Brasil, merece destaque a doutrina do Prof. Joaquim Barbosa, atual Ministro da Suprema Corte.

ESTATUTO DA PROMOÇÃO DA IGUALDADE CIVIL:

Destarte, nobres colegas, o requerente na condição de antigo defensor de Ações Afirmativas para o Brasil, reconhece que a efetividade da IGUALDADE DE TRATAMENTO e de OPORTUNIDADES é um direito que também tem faltado a outros segmentos: as mulheres, aos portadores de necessidades especiais, aos idosos e às vítimas da homofobia, que da mesma forma que os afrodescendentes sofreram e sofrem discriminações e desigualdades sociais, históricas, portanto, o melhor entendimento é que a ordem jurídica nacional precisa acolher a doutrina de Ações Afirmativas para um ESTATUTO DA IGUALDADE CIVIL não deve, nem pode ser exclusivamente 'racial', merecendo ser um programa amplo, ancorado na mesma legislação, que declare à nação brasileira o cumprimento das declarações Constitucionais, desde o Preâmbulo e artigos iniciais da Carta Republicana.

No aludido manifesto à Nação, em linguagem sociológica foi denunciado o temor que antevemos pela estatização de raças e que os projetos, se aprovados, seriam cavalos de Tróia, introduzindo em nosso território e em nossas relações sociais, um poderoso inimigo da paz social: o racismo institucional. Consideramos, de fato, uma irresponsabilidade ética com o futuro tendo em vista que a crença em 'raça' passará a servir como identidade jurídica no dia a dia dos brasileiros. Foi também alegado que se encontravam no Congresso Nacional projetos criando legislações defeituosas e ineficazes que violam princípios rígidos da Constituição democrática. Com a repercussão na mídia, impediu-se que aprovassem na fase pré-eleitoral (2006), uma vez que os monstrengos introduziriam no seio da ordem jurídica Republicana do Brasil, pela primeira vez, o ideal do racismo, ou seja, a institucionalização de 'raças distintas' como status jurídico de cidadania.

Entretanto, agora em 2007, essa oportunidade de reflexão prossegue e ela é relevante diante da realidade social brasileira, da persistência de discriminações, que merecem e precisam, senão que exigem do poder público as medidas que façam a indução e a promoção da igualdade de tratamento e de oportunidades e, sabemos que o delongado processo legislativo para um novo projeto de ESTATUTO DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE CIVIL será muito demorado.

Por essa razão, o recorrente não defende a simples rejeição da proposta, mas que seja oferecido ao Congresso Nacional, em perfeita harmonia com os Parlamentares autores do Projeto e com os órgãos interessados do Poder Executivo Federal, um substitutivo, em que se retira o apontado defeito de sua concepção 'racial'.

Postula o requerente que a OAB lidere essa proposta generosa, contemplando, de forma inédita ao Brasil, esse novo Contrato Social, com fulcro na doutrina de Ações Afirmativas para fazer a promoção da igualdade, de tratamento e de oportunidades sociais aos que foram historicamente excluídos e discriminados: os negros, as mulheres, os índios, os deficientes, os idosos, os de origens nacionais distintas, enfim, um generoso Programa Nacional de ESTATUTO DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE CIVIL.

A DOUTRINA DE AÇÕES AFIRMATIVAS = políticas inclusivas

Nestas razões, cabe relembrar que as ações afirmativas foram consolidadas nos Estados Unidos a partir da 'Civil Righs Act' (1964) a legislação resultante do inesquecível movimento pelos Direitos Civis liderados por ativistas negros afro-americano e que teve como expoente o Doutor Martin Luther King reconhecido pelo mundo com o Prêmio Nobel da Paz e assassinado logo depois pela paixão do racismo que tanto infelicita a humanidade desde o século XV até hoje. De seu famoso discurso (I have a Dream) o mundo reverencia uma frase síntese: "Eu tenho um sonho que minhas quatro pequenas crianças vão um dia viver em uma nação onde elas não serão julgadas pela cor da pele, mas pelo conteúdo de seu caráter!"

Destarte, ao contrário do que alegam os que defendem leis raciais, a 'Civil Righs Act', veio exatamente revogar as antigas legislações segregacionistas e racistas em diversos estados dos EUA. Não foi, em absoluto, uma legislação racial, mas uma legislação que visava assegurar Direitos e Liberdades Civis, em garantia da Igualdade formal e material, como o direito a empregos, escolas e garantias de cidadania, o direito ao voto.

A adoção de Ações Afirmativas despertou muita polêmica, até ser sistematizada como uma doutrina jurídica pelo filósofo liberal John Rawls (A Teoria da Justiça) em 1971. Conforme já referido, a doutrina mereceu apreciação de várias correntes filosóficas, merecendo destaque e apoio da filosofia jurídica contemporânea, como instrumento indispensável em sociedade plurais, até sua atual consolidação em diversas nações modernas, especialmente às que foram frutos da imigração voluntária ou compulsória diante da realidade da globalização dos povos e suas diferenças étnicas, que, para a efetivação da cidadania, merecem que sejam respeitadas em prol da diversidade humana.

Fazia poucas décadas, a civilização humana tinha um desafio real, o fim da escravidão africana, o direito a igualdade das mulheres, os efeitos terríveis do racismo de Estado, enfim, reconhecendo que as discriminações continuavam produzindo vítimas no dia a dia, exigia-se do Estado políticas ativas de combate e de neutralização das culturas racistas, machistas, homófobas, etc. e isso se faria através do incentivo à diversidade, da garantia e da promoção da igualdade de tratamento e oportunidade.

Era o reconhecimento pela filosofia jurídica que a democracia liberal e a declaração formal da IGUALDADE tinham sido insuficientes e não conseguiam responder, com eficácia, aos desafios sociais. Sob este ponto de vista de construção da igualdade em sociedades demograficamente plurais, o que, a partir de 1950 constituía uma novidade e um desafio para a humanidade, ainda sob os efeitos da 2ª. Guerra Mundial provocada pelo nazismo e fascismo racistas e sacudida pelos negros norte-americanos e pela elite africana que conduzia a independência das nações Africanas e o fim do colonialismo Europeu. Ao mesmo tempo, as mulheres conseguiam a emancipação do patriarcado e queriam cidadania.

Nos Estados Unidos o 'Movimento pelos Direitos Civis' conduzidos pelos afro-americanos, colocaram em cheque a leis raciais que limitavam as liberdades e a igualdade civil. Em resposta ao desafio, nos EUA produziram as primeiras leis visando promover Ações Afirmativas e, nos anos 1960, foi desenvolvida as bases da teoria jurídica de AA's, consubstanciada na Justiça da Igualdade com base na Eqüidade, hoje de uso corrente no mundo baseada nos estudos da doutrina de John Rawls e que veio contemplar sofisticado embasamento teórico à doutrina de AÇÕES AFIRMATIVAS autorizadora de leis destinadas a fazer a promoção da igualdade e respeito à diversidade. Um princípio nuclear de AA é que exige o reconhecimento estatal da ocorrência de discriminações históricas declarando-as expressamente, assim como declarando quem são as vítimas.

Segundo Habermas,

durante anos, Rawls debruçou-se sobre um dos mais espinhosos dilemas da sociedade democrática: como se conciliarem o ideal de direitos iguais numa sociedade desigual e como harmonizar as ambições materiais dos mais talentosos e adestrados com os anseios dos menos favorecidos em melhorar sua vida e sua posição na sociedade? Tratava-se de um alentado esforço intelectual para conciliar a meritocracia e seus defeitos com a idéia da igualdade e da oportunidade a talentos que não tiveram acesso a certos saberes e a certas tecnologias de ponta, como a computação.”

O que faz e como se faz Ações Afirmativas.

A legislação acolhendo a doutrina deve em primeiro lugar, reconhecer e declarar de forma expressa a existência de discriminações históricas e traz em seu bojo normas objetivas para as neutralizar, removendo práticas viciadas e impedindo sua manifestação silenciosa. Atua de forma ativa e retira a subjetividade de critérios de escolha, de seleção, admissão, treinamento e promoção assegurando nas oportunidades a diversidade e fazendo a PROMOÇÃO DA IGUALDADE CIVIL de tratamento.

Assim, ao contrário de cotas e leis raciais compulsórias, ela não visava separar, segregar ou fazer reservas baseada <_st13a_personname productid="em ra?as. Ela" w:st="on">em raças. Ela induz os agentes sociais a promoverem e garantirem as oportunidades a todos os segmentos da sociedade.

O reconhecimento estatal das discriminações históricas, pela lei, visa identificar e caracterizar a existência institucional do racismo, do machismo, da homofobia, é que será a mola propulsora. As legislações baseadas em AA's visam criar mecanismos objetivos destinados a impedir que a exclusão, por ser institucional, se manifeste quase de forma imperceptível e por códigos não escritos. Neutraliza assim as atitudes discriminatórias praticadas por pessoas no ambiente social, escolar e profissional, mesmo sem consciência.

Na verdade, Ações Afirmativas é uma doutrina generosa que visa concretizar os ideais aristotélicos, consagrados por Rousseau no Contrato Social, em que afirma: se a desigualdade é inerente de relações sociais, a lei deve assegurar a igualdade.

A PROPORCIONALIDADE e a RAZOABILIDADE:

Assim, o requerente pondera pelo acolhimento da Doutrina jurídica das políticas de Ação Afirmativa, ora argumentando radicalmente contra a institucionalização de raças com status legal e assegura não ser contraditório, pois, tal como a melhores lições, nacional e estrangeira, as ações afirmativas (AA's) não exigem nem o pressuposto de raças nem o de cotas compulsórias.

Eis que, baseada em raças e cotas, tal tipo de legislação, traz consigo o vírus letal da racialização, da separação, da segregação e enfatiza a crença em raças, ideal do racismo, não se apresentando proporcional ao benefício social que promete, além de não conferir aos cidadãos brasileiros os direitos iguais conforme assegura o art. 5º, c/c. art.19 da Carta Cidadã e Republicana de 1988, violando assim aquele requisito indispensável à lei nova, ou seja, a proporcionalidade entre o benefício prometido e o bem violado.

Embora os defensores de leis raciais, as denominem também por Ações Afirmativas, de fato, estas não se coadunam com a identidade racial nos projetos de leis, especialmente o ESTATUTO DA IGUALDADE RACIAL.

As Ações afirmativas, como doutrina, são instrumentos generosos de equalização de direitos fundamentais como a igualdade e a liberdade e se destina a fazer a promoção da IGUALDADE DE TRATAMENTO E DE OPORTUNIDADES a todos os setores da população que sofreram ou ainda são vítimas de históricas discriminações institucionalizadas. Ações Afirmativas não se faz, obrigatoriamente com cotas, se faz com uma série sistêmica, sucessiva e constante de incentivos e desestímulos, visando construir em todos os agentes sociais o dever de garantir a igualdade de tratamento e de oportunidades. Destarte, as Ações Afirmativas não devem ser elaboradas para um único setor dos discriminados históricos, devendo ser igualmente extensivo aos negros, às mulheres, aos idosos, deficientes, carecendo, portanto os projetos de leis, do pré-requisito de razoabilidade.

Acontece ainda que a doutrina jurídica de Ações Afirmativas visa ser indutora de promoção da igualdade, neutralizando e removendo preconceitos e discriminações, cuja implementação faculta diversas espécies de medidas práticas, especialmente induzindo a pedagogia da diversidade e o auto-estabelecimento de metas e até mesmo cotas em situação muito especial e justificadamente indispensável, se assim o agente social deliberar, em prol da diversidade humana, sem a coação da obrigatoriedade legal.

Assim tem sido feito, por exemplo, faz anos, nos EUA, Canadá, Austrália e outros países, inclusive no Brasil em que algumas universidades implantando políticas voluntárias de inclusão, alterando critérios e processos de seleção pela constatação de que apenas a medição de mérito no vestibular, tem sido falha e injusta (exige conhecimento de quem não teve acesso a certas matérias e certos saberes como línguas, computação etc), além da viciosa prática de fórmulas de adestramento preparatório. Entretanto somente a reserva numérica de vagas com base em raça é equívoca e padece do mesmo mal, descuidando assim, mais uma vez do princípio da razoabilidade, inerente ao mérito de uma legislação.

Sem aprofundar o debate político ideológico da adequação e da necessidade, altamente discutíveis enquanto raciais, evidente que leis raciais violam o princípio da PROPORCIONALIDADE ao admitir e consagrar a crença em 'raça' cujo conceito encontra-se definitivamente desacreditado em razão do dever geral e inalienável do respeito à Dignidade da Pessoa Humana, princípio consagrado desde o final da 2ª. Guerra mundial através da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, pela ONU.

Por seu lado, nobres advogados também o princípio da proporcionalidade, surgiu na evolução histórico-jurídica do Estado de Direito para o Estado Democrático de Direito como princípio implícito à leitura da Legalidade, do Devido Processo Legal e do respeito à Dignidade da Pessoa Humana.

ELEMENTOS DA PROPORCIONALIDADE

A doutrina tradicionalmente divide os elementos - também chamados por requisitos ou subprincipios - da Proporcionalidade em três que merecem respostas adequadas, que o recorrente as formula e as responde para justificar um novo posicionamento da E. OAB:

1º Elemento ? Adequação: A adequação também é conhecida como aptidão ou pertinência, e exige uma "conexão lógica" entre "meio e fim". Nela se estabelece que deva haver uma coerência entre o direito fundamental a ser limitado e a finalidade que a norma deseja alcançar, exigindo um raciocínio lógico: precisamos averiguar se a medida é adequada: "o meio escolhido contribui para a obtenção do resultado pretendido?".

R:. as leis racias, conforme a experiência no mundo, JAMAIS resolveu por si, solucionando as discriminações e os preconceitos raciais anteriormente existentes. Não. Elas reforçaram a idéia de raças e aprofundaram a hierarquização delas, conforme ocorreu nos EUA, com as de segregação do século XIX; na Alemanha, até 1.945 e na África do Sul, até 1.995.

2º. Elemento ? necessidade: A necessidade requer que sua eficácia seja indispensável para alteração do status quo, ou seja: o menor sacrifico possível de um direito fundamental para se atingir uma finalidade. Paulo Bonavides, citando Ulrich Zimmerli e Xavier Philippe, esclarece: "a medida não há de exceder os limites indispensáveis à conservação do fim legítimo que se almeja... de dois males, faz-se mister escolher o menor".

R:. também é negativa a resposta. O Brasil necessita de legislação que faça a garantia e a promoção da IGUALDADE porém não pode violar o conceito de espécie humana em prol da crença em raças que foi uma construção social desenvolvida para sustentar a ideologia de hierarquia das raças. Portanto, um ideal racista.

Desta forma, se há diversas maneiras de se obter um determinado "fim", deve ser escolhida a que cause o menor sacrifício aos direitos da cidadania no seu contexto universal. Em outras palavras, se presente a necessidade, deve-se escolher o meio mais suave para se resolver uma determinada questão ou um problema. Utilizando-se do ditado popular, os juristas têm afirmado que na "necessidade" evita-se que se utilize um "canhão para um passarinho", ou seja, não deve ser utilizada uma legislação grotesca para se resguardar uma finalidade.

O princípio da necessidade objetiva-se vedar excessos ou arbitrariedades do Poder Público. Portanto, para aferir a necessidade, deve-se perguntar no caso em concreto: o meio escolhido foi o mais suave entre as opções existentes?

R:. Evidente que um ESTATUTO RACIAL e as COTAS RACIAIS não se apresentam como meios 'mais suaves' dentre as opções existentes e necessárias para também combater e neutralizar as outras discriminações históricas (sexistas, homófobas, machistas ao lado e concomitante com a racista), que por se tratar de um mesmo fenômeno cultural e histórico, devam ser tratados pelo mesmo diploma de cidadania, de forma neutra a favor da espécie humana, declarando as vítimas das discriminações, por óbvio os negros, as mulheres, os deficientes, os índios, os idosos etc., que merecerão doravante um tratamento especial destinado a INCLUSÃO e não a privilégios.

3º. Elemento ? Proporcionalidade em sentido estrito: Este terceiro elemento está diretamente relacionado aos conflitos de direitos fundamentais. Há casos em que o julgador ficará perplexo diante do choque (ou aparente choque) de direitos de igual carga axiológica no ordenamento jurídico. Sua adequação vem bem fundamentada no alentado trabalho do então Prof. Joaquim Barbosa, atual Exmo. Ministro da Suprema Corte.

A doutrina jurídica de Ações Afirmativas (neutra) é que se nos impõe enquanto nação multirracial, como requisito essencial para proporcionar a equidade entre a liberdade e a igualdade, por exemplo.

Neste sentido impera a doutrina de John Rawls, com os acréscimos pertinentes de Ronaldo Dworkin, Jürgen Habermas e Norberto Bobbio, todos admitindo que os princípio Aristotélicos acolhidos pela sociedade moderna desde 'O Contrato Social' de J. J. Rousseau, exige o império de legislação normativa e coercitiva para induzir a IGUALDADE de tratamento e de oportunidades equalizada com o da liberdade.

A ilustrativa e culta doutrina de Joaquim Barbosa, atual ilustre Ministro do Superior Tribunal Federal, publicado em 2002, nos demonstra cabalmente a pertinência constitucional baseado desde o Preâmbulo e artigos iniciais da Carta Magna de 1988, permissiva de legislação de Ações Afirmativas destinada a garantira a inclusão dos setores da população brasileira, historicamente vítimas de discriminação como condição essencial para garantia da erradicação da pobreza e promoção do desenvolvimento social brasileiro, conforme o art. 3º. da CF/88, 'sem preconceitos ou discriminação de qualquer espécie'.

Ilustres Advogados:

Uma boa legislação não pode ser ancorada apenas num eventual 'apelo' popular. Com o surgimento do Estado de Direito nasce com a idéia que a lei deve limitar a atuação do Soberano. De fato, um direito fundamental só poderia ser limitado pela "vontade geral", a qual seria expressa por meio de um comando normativo. No entanto, a partir da década de trinta alguns sistemas políticos começaram a desvirtuar o conceito de vontade geral para legitimar sua tirania.

Na hipótese de leis raciais, a legislação estatal, sob o duvidoso propósito de garantir oportunidades aos negros, deliberadamente viola dois princípios consagrados pela Carta de 1988: a igualdade formal de todos perante a lei e a liberdade civil que fica restringida aos parâmetros tangenciados pelas cotas. A doutrina de Ações Afirmativas de Ralws, Dworkin e Bobbio, autorizam que a ação do Soberano faça a equalização entre esses direitos fundamentais que são a liberdade e a igualdade.

Por seu lado e mal comparando, para fins de exemplo super dimensionado dos requisitos da proporcionalidade, da razoabilidade e da necessidade, devemos sempre citar como exemplos de desvirtuamento do Estado de Direito o fascismo na Itália (décadas de 20 a 40), o nazismo na Alemanha (1933-1945) e a ditadura stalinista na URSS (décadas de 20 a 50). O impressionante é que Adolf Hitler chegou ao poder na Alemanha respeitando os meios legais e depois segregou e assassinou milhões de judeus, ciganos, homossexuais e outras minorias por meio dos "devidos" instrumentos normativos.

Desta forma, após os horrores da Segunda Guerra Mundial, a consciência da humanidade vedou a possibilidade da 'vontade geral' das maiorias, ou eventuais maiorias parlamentares, impedindo-as de legislar sobre determinados temas, dentre eles, especialmente, esse acolhedor do ideal na crença de raças.

De fato, nos ensina a doutrina e a boa razão de operadores do direito, exige-se na elaboração da lei que sejam também éticas e razoáveis e quando limita direitos fundamentais a essencial presença e respeito também a esses três requisitos essenciais: 1º- adequação, 2º- necessidade e 3º- proporcionalidade em sentido.

Desta forma, deverá o legislador ter a sensibilidade para no caso em concreto (promover a igualdade) medir as conseqüências da limitação (ou mitigação) de um (ou alguns) dos direitos fundamentais <_st13a_personname productid="em conflitos. Apenas" w:st="on">em conflitos. Apenas como palavra de cautela cremos que não deve ser usado de forma absoluta a fórmula de que o interesse público deve prevalecer sobre o particular. Na realidade, o que se deve observar é a proporção existente entre benefícios/malefícios, já que nem sempre atender o suposto interesse público trará mais benefícios. De fato, pode ocorrer de a proteção a um determinado direito do particular ser a medida mais recomendável em determinadas circunstâncias de interesse social e universal conforme entendemos ser o fim do racismo e da crença em raças.

RAZÕES ÉTICAS, POLÍTICAS e DOUTRINÁRIAS:

Se não bastassem os defeitos de origem trazidos pelos projetos, que contemplem leis raciais, há também outras relevantes razões Éticas, e de políticas sociais que precisam ser apreciadas e consideradas nestas reflexões. 

Destarte, é na aludida condição de militantes contra o racismo, em conformidade com a consciência humanitária imperativa desde a trágica 2ª Guerra Mundial, induzida pelo racismo, expressa pela Declaração Universal dos Direitos do Homem pela ONU (1948) que devemos compreender e empreender a destruição do conceito e da crença em raças como prioridade absoluta para a destruição da cultura derivada: o racismo subsiste devido à crença <_st13a_personname productid="em ra?as. Quem" w:st="on">em raças. Quem crê em raças, acredita também na hierarquização delas. Quem aceita o conceito de espécie humana, por ser única, jamais pensa na sua classificação, hierarquização ou sublimação.

No mundo, desde então, não se legisla com bases <_st13a_personname productid="em ra?as. Contra" w:st="on">em raças. Contra as discriminações, os Tratados e Convenções multilaterais, exigem tão somente, as legislações especiais, baseadas <_st13a_personname productid="em A??o Afirmativa." w:st="on">em Ação Afirmativa.

No Brasil, a Carta Cidadã de 1988 também veda a diferenciação de brasileiros (art. 19) e quando se refere a raças é para expressamente a repudiar como conceito, crença ou ideologia e a repudia, proibindo as discriminações decorrentes. Ao contrário do que alegam os defensores da lei, os tratados multilaterais, desde 1958 com a Convenção 111 da antiga OIT e as diversas Convenções da ONU, incluso a de Durban (2001) não determinam adoção de leis raciais, apenas recomendam políticas e leis 'especiais', que na verdade são as políticas neutras de ação afirmativa. Foram estes princípios das Convenções e Tratados que autorizaram a ONU a obter a condenação mundial ao regime legal do 'Aphartheid' racista que vigia na África do Sul, impondo um boicote internacional vigente até a derrocada do regime racista baseado em leis raciais.

Como visto, Ilustres Advogados:

a doutrina de Ações Afirmativas tem por fundamento de Justiça a promoção da eqüidade (Ralwls) exigente que seja racialmente neutra e destinada a fazer a PROMOÇÃO DA IGUALDADE CIVIL para garantia da igualdade de tratamento e de oportunidades a todas as vítimas de discriminações históricas. O acolhimento de Ações Afirmativas como doutrina não visa nem pretende a segregação; não se pratica a separação por cotas; não se legisla sobre raças, há, simplesmente políticas especiais que façam a indução da inclusão, com eqüidade, vedando as discriminações.

Os defensores de leis e cotas raciais, em sua grande maioria são leigos e não afeitos à melhor interpretação da eficácia das leis, precisariam demonstrar, e não o fazem, em que países a experiência de legislação racial ainda exista e seus bons resultados.

Conforme antes anotado, nos EUA, a Lei de Direitos Civis (Civil Righs Act, 1964) veio exatamente revogar as leis segregacionistas e discriminatórias vigentes até então contra as liberdades e as garantias de igualdade dos negros, e ações afirmativas vieram beneficiar também a diversidade em benefício das mulheres e latinos.

Nos Estados Unidos, portanto, já não existem leis baseadas em raças e as políticas de cotas foram vetadas pela Suprema Corte e criticadas pelos cientistas sociais, acabaram abandonadas e permutadas pelos demais mecanismos de ações afirmativas, inclusive para o mercado de trabalho, como o estímulo para a busca de talentos e critérios de diversidade com a remoção de obstáculos subjetivos e injustos. Para o acesso à universidade, as alterações voluntárias de critérios de méritos e avaliações, criaram novas oportunidades.

Desejada como política social inclusiva, além dos efeitos colaterais apontados, as leis raciais e as cotas raciais apenas atacam os efeitos das desigualdades, sem remover as causas. Ações afirmativas, por seu lado, quando implementadas em seu caráter inclusivo e neutro e com espírito da DIVERSIDADE humana, atuam sobre efeitos (a desigualdade) e ataca as causas (racismo, machismo, sexismo), neutralizando os preconceitos e discriminações.

OS EFEITOS COLATERAIS DE LEIS RACIAIS:

Cabe ainda nestes arrazoados contrários aos aludidos Projetos de Leis, apontar outros fatores ainda mais graves agasalhados em sua eventual eficácia. Além de cotas raciais adotadas por lei racial não ter sustentação na bem elaborada doutrina jurídica de Ações Afirmativas há também o trágico efeito que precisa ser reafirmado: a adoção de cotas representará sim, a estatização de raças como identidade jurídica e, se estatal, raças ficará institucionalizada e virá estimular a ideais e ações racistas.

A negação disso tão evidente é equivalente à negação que adição de anilina não turvará a água cristalina.

O direito, como ciência, contempla na sua formulação a aplicação de um princípio universal: a árvore venenosa, mesmo que suas flores sejam belas, produzirá sempre frutos e sementes venenosos. Num certame qualquer, a despeito das boas intenções desejadas, ao se retirar vagas de brancos mais pobres (menores notas) e as entregar a negros mais privilegiados (melhores notas), pessoas que estudam, freqüentam e habitam e oriundas de um mesmo espaço social e na mesma escola pública, estarão estabelecidas condições para o conflito racial latente.

Os recentes episódios ocorridos na Universidade de Brasília com atentados racistas contra os dormitórios de estudantes africanos somente confirmam nosso temor que a sublimação da raça é um equívoco tendente a despertar o sentimento mesquinho do ódio racial, ideal dos racistas. Em vez da descrença em raças, a estatização apenas reforça sua crença, reduzindo o conceito da espécie humana. Também sob o aspecto ético-político da negativa e repúdio à figura institucional de raça como personalidade jurídica, um fato concreto o repúdio aos efeitos colaterais de leis raciais: se somente existe a espécie humana, não há raças humanas. Portanto, as leis raciais atuariam sobre uma crendice do povo. E se é produto de crendice, tal como ET's e chupa-cabras em que o povo de Varginha (MG) crê, o Estado não pode legislar sobre crenças.

Logo, contra cotas raciais e Estatuto RACIAL, na condição de advogados e operadores do direito e das garantias da cidadania, ponderamos ainda mais duas objeções, dentre várias outras: uma dirigida ao futuro, é não ser compatível com a responsabilidade ética, que a atual geração faça uma interferência, negativa, de tal magnitude, alterando doravante a trajetória da juventude e do povo, nessa direção, salvo melhor juízo, que enfraquece a luta geral contra o racismo, sem avaliar os resultados disso a médio e longo prazo.

A outra objeção relevante, tem fulcro no passado e nos efeitos maléficos da alforria (precursora das cotas ao selecionar e beneficiar poucos) visto que alienava o beneficiário e o retirava da luta contra a escravidão.

O recorrente pondera ainda que a luta dos negros, em todo o mundo, jamais foi separatista e o princípio de cotas é separar, segregar e dividir.

Nobres advogados,

cabe ainda, pontificar o pensamento de nossos grandes líderes pelo fim do racismo e pela igualdade civil e nunca pela defesa de identidade 'racial'.

O Doutor Luther King, lutou intensamente e foi assassinato pelo sonho de construir uma sociedade em que a pessoa fosse considerada 'pelo seu caráter e não pela cor de sua pele'.

O herói brasileiro Zumbi acolhia em Palmares negros, índios, mestiços, judeus e brancos pobres.

Malcon X, afro-Americano, líder do 'Movimento pelos Direitos Civis' nos EUA, também assassinado em 1965 em razão dessa mesma luta sintetizava: “Não lutamos por integração ou por separação. Lutamos para sermos reconhecidos como seres humanos. Lutamos por direitos humanos."

Nelson Mandela, nosso paradigma contemporâneo, exemplo vivo da luta contra o Estado racista da África do Sul, após 27 anos de cárcere edificou a nova Azânia para todos, com a adoção da legislação baseada <_st13a_personname productid="em A??es Afirmativas" w:st="on">em Ações Afirmativas, em 1996/1997.

Franz FANON, o grande revolucionário contra o colonialismo na África e na Martinica, primeiro grande antirracista, decretava em 1956: 'numa sociedade racializada, a presença do racista é, pois, natural'.

Por fim, "Não basta que seja pura e justa a nossa causa . É necessário que a pureza e a justiça existam dentro de nós." nos ensinava o legado síntese do grande Agostinho Neto, poeta e líder angolano na luta pela independência de Portugal (1974) e ex- primeiro Presidente da República Popular de Angola, pois, inspirador dessa defesa de um ESTATUTO DA IGUALDADE CIVIL, que venha, além de contemplar os negros vítimas do racismo, estaremos também contemplando, com a pureza e a justiça que existem dentro de nós, também aos demais discriminados historicamente, como as mulheres, os índios, os idosos, os portadores de deficiência, enfim, garantido a todos o legítimo e prometido direito à igualdade de tratamento e de oportunidades.

Sucede ainda, uma última objeção, agora na condição de negro e descendente de escravos, que na condição de vítimas da hedionda escravidão baseada na crença de raças, cuja cultura ficou perpetuada, não interessa aos negros uma sociedade racial. Nos interessa aprofundar e radicalizar o conceito de espécie humana, IGUAIS em todos os sentidos, sem exceção. A harmonia social no Brasil, entre os mais pobres, comprova que os negros não são racistas. Não queremos ser racistas. Desejamos apenas o integral respeito à nossa humanidade, o que tem sido denegado por práticas discriminatórias.

Outros fatores relevantes também precisam ser ponderados: a violação do princípio geral da isonomia e da desconsideração de raças, se possível fosse em face da Carta Magna, beneficiaria a quem detém o poder. A outra, é que a divisão da humanidade em raças é a negação da ciência, violação da Ética social e rompimento de princípios republicanos que exigimos preservar: somos humanos e iguais em direitos e obrigações. Enfim, a crença em raça não pode ser admitida, por lei, para a cidadania.

CONCLUSÕES DO RECURSO:

Sr. Presidente e demais Ilustres Advogados:

Portanto, destina-se o presente recurso a apreciação da oposição do recorrente ao APOIO da OAB, sem a devida deliberação à proposta de legislação racial, que é uma posição dogmática por não se configurar como a melhor solução para o conjunto da sociedade, nem ser do interesse dos afrobrasileiros, além dos óbices constitucionais que seriam violados (art.5º, cabeça e art. 19, III).

Também militam contra leis raciais os efeitos colaterais (desejados por alguns) e não previstos pela maioria, diante de nossa responsabilidade ética com o futuro, na condição de combatentes contra o racismo devemos ter por nosso interesse maior a incondicional destruição da idéia de 'raças' e não a sua consolidação institucional.

Pondera ainda o recorrente, que conforme a Carta Magna, o Soberano somente pode legislar pela vontade geral, tendo por objeto a Dignidade da Pessoa Humana e suas nuances características e diferenças inatas como sexo e idade. Conforme a vontade do constituinte, a raça não pode ser acatada como 'discriminen' humano tal como se faz, se hierarquiza e se valorizam qualidades, aptidões e qualidades diversas de raças dos eqüinos, bovinos, aves e outros animais que não sejam da espécie humana.

Por seu lado, a Constituição de 1988 não confere nem admite raças como possibilidade de direito (art. 19) e quando se refere ao racismo (arts. 3°, 4º e 5º, XLII) somente o faz para repudiar o seu conceito e refutar a crença em raças distintas. Portanto, operadores de direito, atuar contra a institucionalização de leis de cotas raciais é questão de princípio, o que não implica, em absoluto, na repulsa a doutrina de Ações Afirmativas que servindo a todos os 'discriminados históricos', atenderá também aos negros.

Ainda mais relevante, para os operadores de direito, é que, abstraindo as paixões militantes de ativismo político, qualquer legislação com base em raças não atende aos princípios exigidos, tais como a adequação, proporcionalidade e a razoabilidade, exigindo desde o processo legislativo toda a atenção e rigoroso conhecimento público para que a sociedade, inteirada, influencie positivamente na ordem jurídica de relações sociais substanciais para as garantias e pleno exercício da cidadania.

Neste sentido, conforme adverte o Douto Ministro do Supremo Tribunal Federal, Prof. Joaquim Barbosa, além da necessidade, da proporcionalidade e da razoabilidade a legislação que trata de ações afirmativas, exige-se, seja adotada e implementada com toda a cautela por estar fazendo equalização de direitos fundamentais e acima de tudo, tem o dever de remover, destruindo a crença em raças, não podendo em hipótese alguma, servir de instrumento para a consolidação da crença defeituosa em desserviço ao conceito da única espécie humana.

Destarte, Sr. Presidente e Nobres Advogado e Doutos Conselheiros:

Qualquer uma boa legislação não pode ser ancorada apenas num eventual respaldo em 'apelo' popular. Todos nós sabemos que se hoje for submetida ao povo, uma Lei de Pena de Morte, ela será acolhida sem qualquer debate e sem quaisquer outras ponderações éticas ou constitucionais. Porém, com o surgimento do Estado de Direito nasce a idéia de a lei limitar a atuação do Soberano. De fato, um direito fundamental só poderia ser limitado pela "vontade geral", a qual seria expressa por meio de um comando normativo. No entanto, a partir da década de 1930 alguns sistemas políticos começaram a desvirtuar o conceito de vontade geral para legitimar sua tirania, resultaram no fascismo, no nazismo e nos regimes racistas e totalitários, tão deploráveis para a humanidade.

Na hipótese de leis raciais, sob enganoso propósito de garantir oportunidades exclusivamente aos negros, sob o rótulo de raça, viola a dois princípios consagrados pela Carta de 1988: a igualdade formal de todos perante a lei e a liberdade civil que fica restringida aos parâmetros tangenciados pelas cotas raciais. Mais ainda, abandona ao relento os demais discriminados e viola preceitos éticos caros a toda a humanidade, como é o conceito da espécie humana e a destruição da indigitada crença em raças humanas.

Assim e mal comparando, para fins de exemplo super dimensionado, podem ser citados como exemplos de desvirtuamento do Estado de Direito o fascismo na Itália (décadas de 20 a 40), o nazismo na Alemanha (1933-1945) e a ditadura stalinista na URSS (décadas de 20 a 50). O impressionante é que Adolf Hitler chegou ao poder na Alemanha respeitando os meios legais e depois segregou e assassinou milhões de judeus, ciganos, homossexuais e outras minorias por meio dos "devidos" instrumentos normativos.

Desta forma, Doutos Advogados:

Após os horrores da 2ª. Guerra Mundial, a consciência da humanidade vedou a possibilidade da 'vontade geral' para legislar sobre determinados temas, dentre eles, especialmente, esse acolhedor da idéia de raças. Os tribunais na Europa Central passaram a estabelecer parâmetros às leis que limitam direitos fundamentais. De fato, os juristas, sobretudo na Alemanha, começaram a desenvolver a idéia de que não basta a lei ser elaborada segundo os requisitos formais, nem se coadunar à primeira vista com o texto constitucional para ser "aceita" no ordenamento jurídico. A lei precisa ser, também ÉTICA.

ISTO POSTO, considerando as razões e os anexos, até que seja manifestada deliberação institucional da V. Ordem dos Advogados do Brasil, REQUER seja sustada qualquer manifestação de APOIO IRRESTRITO e INCONDICIONAL da CONAD- Comissão de Negros e Assuntos Anti-Discriminatórios, bem como em nome da V. Ordem dos Advogados do Brasil, sem prejuízo de aprofundamento dos debates e esclarecimentos a respeito dos aludidos projetos de Leis, bem como a seja implementada a interlocução institucional com os parlamentares interessados, especialmente o Nobre Senador Paulo Paim, a fim de colher subsídios e oferecer-lhes ponderações;

Requerendo ainda, diante da inquestionável oportunidade, adequação, necessidade, proporcionalidade e razoabilidade de um ESTATUTO DE PROMOÇÃO DA IGUALDADE CIVIL com fulcro na doutrina jurídica de Ações Afirmativas que nos foi legada por John Ralws, requer a deliberação favorável a um projeto de substitutivo ao Estatuto RACIAL pelo de um ESTATUDO DE IGUALDADE CIVIL;

Requer assim, que o presente apelo seja submetido aos nobres advogados da CONAD, e sucessivamente ao E. Conselho da Seccional de São Paulo, e Conselho Federal, para ao fim, ser recolhida em deliberação institucional, com o provimento, que o recorrente espera seja CONTRÁRIO AOS PROJETOS DE LEIS RACIAIS e favorável a um ESTATUTO DA PROMOÇÃO DA IGUALDADE CIVIL, acolhedora da referida doutrina filosófica jurídica de Ações Afirmativas, retirando de seu bojo, desde a nomenclatura das leis, qualquer referência a raça, tudo em prol da consolidação do conceito da única espécie humana.

Termos em que, R. e espera Provimento.

José Roberto Ferreira Militão, OAB/SP 82.946

Militante do movimento negro contra o racismo. Membro da fundação da Comissão de Negros da OAB e atual membro efetivo da CONAD-Comissão de Negros e Assuntos Antidiscriminatórios da OAB/SP (2007). Ex-Secretário Geral do Conselho da Comunidade Negra do Governo de São Paulo (1987/1994). Membro da Comissão de Terras de Quilombos do governo de São Paulo junto ao ITESP (1997/98).

"Não basta que que seja pura e justa a nossa causa . É necessário que a pureza e a justiça existam dentro de nós." a) Agostinho Neto, líder da independência e ex-Presidente da República Popular de Angola.

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