Nesta quarta-feira, 21, STF voltou a julgar dispositivos do chamado pacote anticrime, que institui a figura do "juiz das garantias".
Na última semana, as sessões foram destinadas à leitura do relatório do relator, ministro Luiz Fux e de manifestações das partes e de terceiros interessados.
Nesta tarde, o julgamento foi retomado com a continuidade das sustentações orais. Em seguida, ministro Luiz Fux, relator do caso, iniciou a leitura de seu voto que será finalizado na sessão plenária desta quinta-feira.
Entenda
A implantação da figura do juiz das garantias foi suspensa por liminar do ministro Luiz Fux, relator do processo, em 2020. Até o momento, o caso não foi julgado definitivamente pela Corte.
A adoção do juiz das garantias estava prevista para entrar em vigor no dia 23 de janeiro de 2020, conforme o pacote anticrime aprovado pelo Congresso Nacional.
Entre diversas alterações no CPP, o pacote estabeleceu o juiz das garantias, que é o magistrado que deve atuar na fase de investigação criminal, decidindo sobre todos os pedidos do Ministério Público ou da autoridade policial que digam respeito à apuração de um crime, como, por exemplo, quebras de sigilo ou prisões preventivas. Ele, contudo, não poderá proferir sentenças.
De acordo com nova a lei, a atuação do juiz das garantias se encerra após ele decidir se aceita eventual denúncia apresentada pelo Ministério Público. Caso a peça acusatória seja aceita, é aberta uma ação penal, na qual passa a atuar outro juiz, que ficará encarregado de ouvir as partes, estudar as alegações finais e proferir uma sentença.
Processos
Há quatro ADIns no STF questionando dispositivos do pacote anticrime que criam a figura do juiz das garantias.
Em janeiro de 2020, o então presidente da Corte, Dias Toffoli, suspendeu a implementação do juiz das garantias por 180 dias, porque demandaria certa organização, devendo ser iniciada "de maneira consciente em todo o território nacional".
Dias depois, Luiz Fux, no exercício da presidência do Supremo durante as férias forenses, suspendeu a aplicação do juiz das garantias por tempo indeterminado. Para ele, cabe à Corte dizer se o instituto é ou não constitucional, e destacou o alto impacto financeiro ao Judiciário.
Sustentações orais
Nesta tarde, dando continuidade nas sustentações orais, o defensor público Pedro Paulo Lourival Carriello, falando em nome da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, destacou a importância do juiz das garantias. Segundo ele, “é importante criar parâmetros e filtros para que o juiz, autoridade que praticou aquele ato, não tenha ela dificuldade em ver um erro, um equívoco”.
Da Tribuna, representando a defensoria pública da União, Gustavo Zortea da Silva sustentou pela constitucionalidade dos dispositivos que tratam acerca do juiz das garantias.
Pelo IAB - Instituto dos Advogados Brasileiros, Marcio Gaspar afirmou que o instituto “trata-se de inovação legislativa fundamental para garantir o devido processo legal no Estado Democrático de Direito, para consolidar o sistema acusatório, para fortalecer e dar concretude a essência da jurisdição, que é a imparcialidade do juiz”.
Na mesma vertente sustentou Flávia Bresser Pereira, pelo IDDD – Instituto de Defesa do Direito de Defesa. “Não podemos perder a chance histórica de avançar”, asseverou.
Por sua vez, a PGR sustentou que o instituto do juiz das garantias deve ter seu campo de atuação restrito à proteção dos direitos fundamentais da pessoa contra quem se volta a persecutio criminis. Assim, de acordo com Augusto Aras, não cabe atribuir ao juiz a prática de atos que interfiram no andamento do inquérito.
"Permitir que o magistrado interfira na condição do inquérito policial viola o sistema acusatório por comprometer a sua imparcialidade”, afirmou.
Voto do relator
Inicialmente, ao votar, relator do caso, ministro Luiz Fux destacou que “todos os juízes brasileiros são juízes de garantias, seja durante a investigação ou instrução processual, incumbindo-lhes, por óbvio, zelar pelos direitos fundamentais assegurados pela CF/88”.
De acordo com S. Exa., a verdadeira questão do processo não consiste apenas na função do juiz das garantias, mas sim na imposição, com vacatio legis de 30 dias, de um juízo investigativo novo. E, segundo ele, tal imposição ignorava “a carência de magistrados do nosso país, bem como as suas dimensões continentais”.
Ao comentar a liminar que concedeu, em janeiro de 2020, para suspender a vigência das normas referentes ao juiz das garantias, Fux destacou a necessidade de encontrar um ponto de equilíbrio, o que demanda aprofundados estudos, pesquisas empíricas, reflexão e diálogo institucional, que seriam impossíveis em curto espaço de tempo. “Quando tratamos de alterações da monta que a figura do juiz de garantias causaria ao sistema da Justiça criminal, essa necessidade se torna muito maior”.
Frisou, ainda, que 65,6% das comarcas do país têm apenas uma vara, e, como as regras impedem o juiz de participar de todas as fases do processo criminal, serão necessárias adaptações no funcionamento dos tribunais.
“A suspensão da lei por mim, e antes pelo ministro Dias Toffoli, foi gerada pelo dever judicial de responsabilidade, e não de passionalidade.”