Mesmo com julgamento suspenso por pedido de vista do ministro Alexandre de Moraes, dois ministros anteciparam o voto e, agora, o STF conta com cinco votos para validar a cobrança de contribuição estabelecida em acordo ou convenção coletiva, desde que o trabalhador não se oponha ao pagamento.
Entenda
Na última sexta-feira, 21, pedido de vista de Moraes suspendeu julgamento de processo que analisa a cobrança da contribuição assistencial a sindicato.
Na ocasião, três ministros (Cármen, Barroso), já haviam acompanhado o relator, ministro Gilmar Mendes, no sentido de validar a cobrança estabelecida em acordo ou convenção coletiva, desde que o trabalhador concorde com o pagamento. E, em contrapartida, o ministro aposentado Marco Aurélio já havia votado pela inconstitucionalidade da contribuição assistencial.
Contudo, apesar da vista, dois ministros (Fachin e Toffoli) decidiram antecipar o voto para acompanhar o relator.
Relembre
Em junho de 2018, o Supremo, em processo com repercussão geral, assentou a inconstitucionalidade da contribuição assistencial imposta por acordo, convenção coletiva de trabalho ou sentença normativa a empregados não sindicalizados. O acórdão ficou assim ementado:
"Recurso extraordinário. Repercussão geral. 2. Acordos e convenções coletivas de trabalho. Imposição de contribuições assistenciais compulsórias descontadas de empregados não filiados ao sindicato respectivo. Impossibilidade. Natureza não tributária da contribuição. Violação ao princípio da legalidade tributária. Precedentes. 3. Recurso extraordinário não provido. Reafirmação da jurisprudência da Corte."
Desta decisão foram interpostos embargos, nos quais o ente sindical sustenta omissão e contradição no acórdão embargado, ao argumento de que teria ocorrido confusão entre a jurisprudência relacionada à contribuição assistencial e à confederativa.
Indica que a Corte já teria entendimento consolidado no sentido de ser matéria de índole infraconstitucional a discussão sobre a cobrança de contribuição assistencial, instituída por assembleia, a trabalhadores não filiados ao sindicato.
Aduz, ainda, a existência de jurisprudência do STF, no sentido de que a contribuição assistencial prevista em norma coletiva pode ser cobrada de todos os integrantes da categoria profissional, independentemente de sua associação a sindicato, havendo divergência de posicionamento entre os ministros apenas no tocante à garantia do direito de oposição dos trabalhadores não sindicalizados à cobrança.
Cronologia
O feito foi inicialmente levado a julgamento virtual na data de 14/8/20, quando o relator Gilmar Mendes se manifestou pela rejeição dos embargos de declaração, tendo sido seguido pelo ministro Marco Aurélio.
Na oportunidade, Dias Toffoli pediu destaque do processo, o qual foi levado a julgamento presencial em 15/6/22, sob a presidência do ministro Luiz Fux.
Em julgamento presencial, Gilmar foi acompanhado pelos ministros Dias Toffoli, Nunes Marques e Alexandre de Moraes. O ministro Edson Fachin divergiu, para acolher e sanar as omissões e contradições apontadas, porém sem efeitos modificativos. Naquela ocasião, pediu vistas dos autos o ministro Luís Roberto Barroso.
O feito foi novamente devolvido a julgamento na sessão virtual que se iniciou na sexta-feira, dia 14/4/23, oportunidade em que Barroso trouxe uma nova perspectiva sobre a matéria.
Mudança de entendimento
De acordo com o posicionamento de Barroso, os embargos de declaração devem ser acolhidos para reconhecer a constitucionalidade da cobrança da contribuição assistencial a trabalhadores não sindicalizados, desde que lhes seja garantido o direito de oposição.
"Refletindo sobre os fundamentos de seu voto, entendo que é caso de evolução e alteração do posicionamento inicialmente por mim perfilhado para aderir àqueles argumentos e conclusões, em razão das significativas alterações das premissas fáticas e jurídicas sobre as quais assentei o voto inicial que proferi nestes embargos de declaração, sobretudo em razão das mudanças promovidas pela Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) sobre a forma de custeio das atividades sindicais", disse Gilmar em seu voto.
"Isso porque, como mencionado pelo Ministro Roberto Barroso, a exigência de autorização expressa para a cobrança da contribuição sindical prevista na nova redação do art. 578 da CLT impactou a principal fonte de custeio das instituições sindicais. Caso mantido o entendimento por mim encabeçado no julgamento de mérito deste Recurso Extraordinário com repercussão geral reconhecida, no sentido da impossibilidade de cobrança da contribuição sindical a trabalhadores não filiados aos Sindicatos respectivos, tais entidades ficariam sobremaneira vulnerabilizadas no tocante ao financiamento de suas atividades."
Segundo o relator, há uma necessidade de evolução do entendimento anteriormente firmado pela Corte sobre a matéria, de forma a alinhá-lo com os ditames da Constituição Federal.
"Tendo em vista que a contribuição assistencial é prioritariamente destinada ao custeio de negociações coletivas, as quais afetam todos os trabalhadores das respectivas categorias profissionais ou econômicas, independentemente de filiação, entendo que a solução trazida pelo Ministro Roberto Barroso é mais adequada para a solução da questão constitucional controvertida por considerar, de forma globalizada, a realidade fática e jurídica observada desde o advento da Reforma Trabalhista em 2017, garantindo assim o financiamento das atividades sindicais destinadas a todos os trabalhadores envolvidos em negociações dessa natureza."
Assim sendo, Gilmar votou no sentido de alterar seu entendimento anteriormente proferido, de modo a acolher o recurso com efeitos infringentes, para admitir a cobrança da contribuição assistencial prevista no art. 513 da CLT, inclusive aos não filiados ao sistema sindical, assegurando ao trabalhador o direito de oposição.
O relator incorporou ao seu voto a tese sugerida por Barroso:
"É constitucional a instituição, por acordo ou convenção coletivos, de contribuições assistenciais a serem impostas a todos os empregados da categoria, ainda que não sindicalizados, desde que assegurado o direito de oposição."
A ministra Cármen Lúcia e os ministros Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Dias Toffoli acompanharam o entendimento.
Migafalha
Migalhas havia divulgado, nesta matéria, que havia seis votos pela validade da contribuição sindical, equívoco que foi corrigido.
A confusão se deu porque já estava computado no sistema o voto do hoje aposentado ministro Marco Aurélio, no sentido de "acompanhar o relator".
Posteriormente, o relator, Gilmar Mendes, aprimorou seu voto e alterou posicionamento, acompanhando o entendimento apresentado por Barroso.
No sistema, o voto de Marco Aurélio segue como "acompanhando o relator". S. Exa., no entanto, teria se manifestado pela inconstitucionalidade da contribuição.
- Processo: ARE 1.018.459
Veja o voto do relator.