Migalhas Quentes

Boticário indenizará vendedora alérgica obrigada a borrifar perfumes

Após constatada a alergia, superior começou a exigir que a empregada fizesse a borrifação de perfumes e "body-splash".

19/11/2022

A 11ª turma do TRT da 3ª região determinou o pagamento de indenização, no valor de R$ 10 mil a vendedora que sofreu assédio moral em uma loja do Boticário. Segundo a profissional, após o diagnóstico de alergia respiratória ocupacional, ela passou a sofrer perseguição da gerente.

Contou que chegou a pedir mudança de setor. Porém, em contrapartida, explicou que a superior começou a exigir, com maior frequência, que a ex-empregada fizesse a borrifação de perfumes e “body-splash” - produtos que tornavam mais graves as crises respiratórias.

Com o fim do contrato, ela ajuizou ação trabalhista requerendo a indenização por danos morais e materiais. Contou que, em função das atividades exercidas, foi acometida por crises alérgicas e respiratórias frequentes, acompanhadas de outros problemas de saúde, como fortes dores de cabeça, cansaço, dores no corpo e mal-estar.

Informou que o médico responsável pelo tratamento sugeriu a alteração de função no trabalho, para evitar o contato com os agentes alergênicos. Explicou que, ao comunicar o quadro à gerente, foi aconselhada a “pedir demissão para cuidar da saúde”. Disse ainda que, após frequentes consultas médicas, afastamentos do trabalho e tentativas frustradas de negociação com a gerente, enviou e-mail ao setor de recursos humanos da empresa solicitando a alteração de função. Segundo ela, o pedido foi negado.

A profissional explicou que, a partir desse episódio, passou a sofrer perseguição da gerente: “Ela começou a exigir, com maior frequência, que fizesse a borrifação de produtos que agravavam as crises respiratórias”. A ex-empregada narrou ainda que a gerente passou a afastar os demais empregados da convivência com ela e a fazer piadas pejorativas envolvendo a sua condição de saúde.

Sentença

O caso foi decidido pelo juízo da 16ª vara do Trabalho de Belo Horizonte/MG, que julgou parcialmente procedentes os pedidos da trabalhadora, garantindo a indenização. Determinou ainda o pagamento de aproximadamente R$ 1.068 pelos gastos com vacina e medicação. Porém, ela interpôs recurso, pretendendo a majoração do valor arbitrado à reparação por danos morais.

A empregadora alegou que a perícia médica concluiu pela existência de alergia respiratória ocupacional, sem inspecionar o local de trabalho ou os produtos comercializados pela empresa, inexistindo, ainda, análise do histórico da trabalhadora em período anterior à admissão. Afirmou que o laudo do assistente técnico concluiu que a rinite crônica da trabalhadora é anterior à admissão. Negou ainda a existência de perseguição e argumentou, por fim, que não foram provados prejuízos à honra, à dignidade e à boa fama da trabalhadora.

Mas a prova pericial demonstrou que a doença se desenvolveu em razão das funções desempenhadas no trabalho. E o documento juntado pela profissional no processo evidenciou a tentativa de alterar a colocação, com a finalidade de preservar a saúde e o emprego. Em depoimento, a trabalhadora explicou que foi mencionada uma vaga em uma loja do mesmo grupo. Porém, como nessa unidade haveria perfumes, não houve proposta de transferência.

Boticário indenizará vendedora por danos morais por prejuízo a saúde.(Imagem: Freepik)

Recurso

Para o juiz convocado Márcio Toledo Gonçalves, não há prova de que a profissional já apresentava problemas de saúde relacionados aos constatados quando admitida. “Isso reforça a possibilidade de a doença ter se desencadeado em razão das atividades exercidas”.

O julgador ressaltou que cópia do e-mail comprovou a ciência da empresa sobre o estado de saúde da profissional e o pedido de alteração de colocação, com o intuito de preservação de saúde e emprego. “Por outro lado, a empregadora não comprovou a tentativa de recolocação em outra função ou em outro local de trabalho”.

Assim, segundo o magistrado, ficou provado o nexo causal entre a atividade exercida e a doença. “À luz deste quadro clínico, além de não adotar as medidas de cuidado à saúde, houve o aludido assédio moral em desfavor da trabalhadora”.

Para o julgador, a prática do assédio moral foi evidenciada pela prova oral. A testemunha contou que a gerente explicou para ela que havia uma empregada dando muito problema. “Disse que a vendedora era muito dissimulada, alertando para manter distância; disse que a trabalhadora era ruiva, de cabelo tipo ‘chanel’, sendo que a única com essas características era a ex-empregada que apresentou a ação”.

Informou ainda que a gerente disse aos empregados que havia gente fazendo corpo mole e apresentando atestado falso para ser mandada embora. Disse também que presenciou a ex-empregada passando mal, “com secreção verde”“Ela ficava gripada, congestionada e apresentava muitos atestados por problema de saúde”.

Danos morais

Diante das provas, o magistrado negou provimento ao recurso da vendedora, por entender correta a sentença que condenou a empresa a pagar indenização pelo dano moral no valor de R$ 10 mil. Na decisão, o julgador considerou os fatos evidenciados sobre o adoecimento no trabalho, a ciência da empresa sobre a patologia, a inércia em adotar medidas que amenizassem o risco à saúde da ex-empregada, a conduta ilícita praticada pela gerente e, ainda, o tempo do contrato de trabalho (pouco mais de dois anos) e o potencial econômico da empregadora.

Danos materiais

A empresa foi condenada ainda ao pagamento de indenização por danos materiais pelas despesas com medicamentos, no valor de R$ 1.068. “Comprovado o adoecimento da trabalhadora pelas atividades desenvolvidas, é acertada a sentença que determinou o ressarcimento dos valores gastos com vacina e medicação”, concluiu o julgador. Já foi iniciada a fase de execução.

Leia o acórdão.

Informações: TRT da 3ª região.

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